STF valida remuneração de custodiados em 3/4 do salário-mínimo
O art. 29, caput, da Lei de Execução Penal (LEP) prevê que “o trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário mínimo”.
Em 2015, o então Procurador-Geral da República (PGR), Rodrigo Janot, propôs a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 336, pleiteando a declaração da não recepção, pela Constituição Federal (CF), do artigo supracitado. Dentre as razões, o Procurador menciona que:
Os valores decorrentes do princípio da isonomia não autorizam a existência de norma que imponha tratamento desigual sem que a situação corrobore a necessidade de diferenciação. A força do trabalho do preso não diverge, em razão do encarceramento, daquela realizada por pessoa livre, consistindo a remuneração inferior não somente ofensa ao princípio da isonomia, como injustificável e inconstitucional penalidade que extrapola as funções e objetivos da pena.
(...) o trabalho do preso, ainda que com caráter educativo e produtivo, é benefício, não pena. O trabalho do apenado visa precisamente a mitigar uma descriminação que lhe seroa possível, em virtude do afastamento do convívio social. Se sua liberdade pode ser restringida pela sentença, sua capacidade laboral, visando a sua integração social futura, não.
(...) Quanto aos demais “benefícios” postos à disposição do preso, em nada servem eles para diminuir o valor de seu trabalho enquanto pessoa, sujeito de direitos. O preso tem direito à assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa, nos termos do art. 41, VII, da Lei de Execução e, mais importante, ele paga o Estado para isso (art. 29, § 1.º, d, da LEP). A remição também é direito e não se aplica exclusivamente ao trabalho, porquanto a pena também pode ser remida pelo estudo (art. 126 da LEP).
Além disso, quanto à não aplicação da Consolidação das Leis Trabalhistas à atividade desempenhada pela pessoa presa, prevista no art. 28, § 2.º, da LEP, trata-se de orientação interpretativa que subverte a primazia constitucional. Não é possível, porém, ler a Constituição Federal à luz da legislação. É a Constituição a fonte de validade das demais normas do ordenamento.
No entanto, o Ministro relator, Luiz Fux, julgou o pleito improcedente, sob o argumento de que a natureza e regime jurídico do trabalho do custodiado divergem da relação do trabalho de cidadão empregado através da CLT.
Assim, a remuneração inferior ao salário mínimo seria acompanhada de medidas compensatórias - e, portanto, justificada -, tais como:
- a) a própria obrigatoriedade de patamar mínimo do pagamento em 3/4;
- b) a imposição ao Estado do dever de prestação material, de modo a suprir as necessidades básicas do custodiado; e
- c) a concessão ao custodiado do benefício da remição, na proporção de 1 (um) dia de redução da sanção criminal para cada 3 (três) dias de trabalho.
Para Fux, há lógica econômica distinta da mão-de-obra de pessoas livres, podendo até mesmo, no caso dos custodiados, ser sustentada com recursos financeiros públicos. Diante disso, não haveria violação aos princípios da dignidade da pessoa humana nem da isonomia, “sendo inaplicável à hipótese a garantia de salário-mínimo prevista na Constituição”.
Os Ministros Alexandre de Moraes, Marco Aurélio, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Nunes Marque e Roberto Barroso acompanharam o relator.
Todavia, o Ministro Fachin divergiu, sendo acompanhado por Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Segundo ele, o trabalho do custodiado, embora tenha caráter educativo e produtivo, não é pena. Assim:
Reforçando o pedido de vênia, tenho que o sentido da proteção constitucional ao salário mínimo foi o de estabelecer a retribuição mínima para o trabalho, piso-garantia aplicável a todo e qualquer trabalhador. Como garantia fundamental, o texto constitucional prevê aplicabilidade imediata (art. 5.º, § 1.º, da CRFB), que não pode ser restringida pela legislação inferior.
Destarte, por 7x4, o Plenário validou dispositivo constante na LEP, que fixa a remuneração para trabalho do custodiado no valor base de 3/4 (três quartos) do salário-mínimo.
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