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16 de Maio de 2024

TRT4 mantém sentença que anulou autos de infração por descumprimento do critério da dupla visita

Empresa de pequeno porte é protegida por tratamento jurídico diferenciado

Publicado por Tiago Adede y Castro
há 6 anos

Em abril deste ano, a Justiça do Trabalho de Santa Maria, RS, anulou 6 autos de infração lavrados pela fiscalização trabalhista em desfavor de EPP do ramo da construção civil, considerando indevidas as multas aplicadas em função da inobservância do “critério da dupla visita”.

Empresas de pequeno porte possuem tratamento jurídico diferenciado

A União recorreu dessa decisão, e no dia 22 de novembro o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região manteve a sentença de 1º grau, concluindo que a lavratura dos autos de infração não primou pela natureza orientadora da fiscalização e pelo critério da dupla visita. Deste modo, os 6 autos de infração foram anulados pela Justiça do Trabalho:

AUTO DE INFRAÇÃO. CRITÉRIO DA DUPLA VISITA. Nulo o auto de infração lavrado em face de empresa de pequeno porte sem a observância do critério da dupla visita, nos termos do art. 55, §§ 1º e , da Lei Complementar n. 123/2006, uma vez que as irregularidades constatadas na fiscalização são sanáveis. Nega-se provimento ao recurso da ré.

PROCESSO nº 0020075-02.2016.5.04.0701 (RO). RECORRENTE: XXXXXXXXXX LTDA - EPP. RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL (AGU). RELATOR: ANDRE REVERBEL FERNANDES

Você sabe o que é o "Critério da Dupla Visita”?

A Lei Complementar nº 123/2006, concede tratamento especial em matéria de fiscalização estatal, por exemplo, nas inspeções do Ministério do Trabalho.

A fiscalização dessas empresas deverá ser prioritariamente orientadora, devendo ser observado o chamado “critério da dupla visita” para a lavratura de autos de infração.

Isso significa que, em um primeiro momento, a fiscalização estatal deverá orientar o empresário, indicando as correções a serem realizadas em sua empresa, e concedendo prazo hábil para sua regularização.

A multa só poderá ser aplicada em uma segunda visita, após a devida orientação, e os autos de infração que forem lavrados em desrespeito a este critério podem ser anulados judicialmente.

LEIA A ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO:

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA DO TRABALHO

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO

Identificação

PROCESSO nº 0020075-02.2016.5.04.0701 (RO)

RECORRENTE: XXXXXXX LTDA - EPP

RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL (AGU)

RELATOR: ANDRE REVERBEL FERNANDES

EMENTA

AUTO DE INFRAÇÃO. CRITÉRIO DA DUPLA VISITA. Nulo o auto de infração lavrado em face de empresa de pequeno porte sem a observância do critério da dupla visita, nos termos do art. 55, §§ 1º e , da Lei Complementar n. 123/2006, uma vez que as irregularidades constatadas na fiscalização são sanáveis. Nega-se provimento ao recurso da ré.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ORDINÁRIO DA PARTE RÉ, União.

Intime-se.

Porto Alegre, 22 de novembro de 2017 (quarta-feira).

RELATÓRIO

Inconformada com a sentença de procedência (id. 7c3b7f2), a União recorre (id. 95d6dab), sustentando a validade dos autos de infração.

Contrarrazões da parte autora no Id. 390d2a4.

Os autos são remetidos a este Tribunal para julgamento.

O Ministério Público do Trabalho apresenta parecer pelo conhecimento do recurso ordinário e, no mérito, pelo seu desprovimento (id. 126a1c7).

É o relatório.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

RECURSO ORDINÁRIO DA PARTE RÉ (matéria prejudicial)

REEXAME NECESSÁRIO.

A reclamada, União, pugna pelo reexame necessário da sentença, conforme o Decreto-Lei nº 779/69.

Sem razão.

Considerando que o valor atribuído à condenação (R$ 20.870,85) não ultrapassa 60 salários mínimos, deixa-se de proceder ao reexame necessário. Adota-se o entendimento consubstanciado na Súmula nº 303 do TST:

Fazenda Pública. Duplo grau de jurisdição. I - em dissídio individual, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, mesmo na vigência da CF/88, decisão contrária a Fazenda Pública, salvo: a) quando a condenação não ultrapassar o valor correspondente a 60 (sessenta) salários mínimos.

A referida súmula não tem como pressuposto de aplicabilidade a existência de sentença líquida, sendo necessária apenas a estimativa da condenação, valorada pelo Juízo de origem. Observa-se, ademais, que o valor atribuído à condenação está manifestamente aquém do limite legal que torna obrigatório o reexame necessário.

Nega-se provimento.

RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ (matéria remanescente)

REGULARIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO.

O Magistrado de origem declara" nulos os autos de infração formalizados contra a empresa nas ações fiscais do Ministério do Trabalho, indevidas as multas aplicadas e insubsistentes as medidas administrativas decorrentes adotadas pela ré UNIÃO ".

A União recorre. Afirma que o critério de dupla visita constitui uma exceção à regra geral e, como tal, há de ser interpretado stricto sensu, sob pena de enfraquecimento do poder coercitivo, essencial a todo dispositivo legal substancialmente imperativo, de ordem pública, tal como é a natureza daqueles que tratam da proteção ao trabalho. Aduz que a aplicação do critério da dupla visita dependerá de ser, ou não, sanável a infração. Entende que as infrações objeto do auto de infração não se caracterizam como sanáveis. Por tudo, defende a validade do auto de infração. Requer a reforma da sentença.

Sem razão.

A empresa autora, XXXXXXXXXXX LTDA - EPP, foi autuada em 18.1.2013, 24.1.2013 e 26.02.2013 pelo Auditor Fiscal do Trabalho Williams de Medeiros Soares, com a lavratura dos Autos de Infração ns. 25302698, 25302701, 25302710, 25302728, 25304577 e 25305964, com as seguintes irregularidades:

- Auto de infração n. 25302698 - Falta de recolhimento de lixo, entulhos e madeirame retirados da obra, espalhados pelo canteiro de obras, no térreo, nos pisos superiores, junto às escadas usadas pelos trabalhadores. Enquadramento legal: Art. 157, inciso I, da CLT c/c item 18.29.5 da NR 18, redação da Portaria 04/1995.

- Auto de infração n. 25302701 - Falta de vestimenta em quantidade suficiente para uso no verão (camisetas e calças). Maioria dos trabalhadores com uso de roupas próprias ao invés de vestimenta fornecida pelo empregador. Receberam vestimentas, mas estavam sujas ou lavando. Enquadramento legal: Art. 157, inciso I, da CLT c/c item 18.37.3 da NR 18, redação da Portaria 04/1995.

- Auto de infração n. 25302710 - Acesso ao poço de elevador definitivo da obra fechado com painéis de madeira fixados frouxamente por arame ou ainda soltos, deslocados e retirados sem dificuldades. Falta de proteção resistente e afixada de forma segura na estrutura da edificação. Enquadramento legal: Art. 157, inciso I, da CLT c/c item 18.13.3 da NR 18, redação da Portaria 04/1995.

- Auto de infração n. 25302728 - Betoneira em uso na obra com cremalheira desprotegida, portinhola do compartimento do motor e transmissão de força aberta e sem cadeado. Enquadramento legal: Art. 157, inciso I, da CLT c/c item 18.22.2 da NR 16, redação da Portaria nº 04/1995.

- Auto de infração n. 25305964 - Retorno à obra. Elevador de cargas. Falta de proteção contra quedas de altura com diferença de nível para as aberturas de cancelas na torre do elevador, como evidente no segundo piso da obra. Enquadramento legal: Art. 157, inciso I, da CLT c/c item 18.14.21.13 da NR 18, redação da Portaria nº 224/2011.

-Auto de infração n. 25304577: Empregados admitidos antes do exame clínico admissional. Enquadramento legal: Art. 157, inciso I, da CLT c/c item 7.4.3.1 da NR 7, redação da Portaria 24/1994.

A regularidade dos autos de infração é discutida nessa ação. O art. 627 da CLT prevê que, a fim de promover a instrução dos responsáveis no cumprimento das leis de proteção do trabalho, a fiscalização deverá observar o critério de dupla visita nas situações de mudança do ordenamento jurídico ou, ainda, quando da primeira visita em novos estabelecimentos.

A Lei Complementar n. 123/2006, que institui o estatuto nacional da microempresa e da empresa de pequeno porte, determina a aplicação do critério da dupla visita àquelas pessoas jurídicas, nesses termos:

Art. 55. A fiscalização, no que se refere aos aspectos trabalhista, metrológico, sanitário, ambiental, de segurança e de uso e ocupação do solo das microempresas e empresas de pequeno porte deverá ter natureza prioritariamente orientadora, quando a atividade ou situação, por sua natureza, comportar grau de risco compatível com esse procedimento.

§ 1o Será observado o critério de dupla visita para lavratura de autos de infração, salvo quando for constatada infração por falta de registro de empregado ou anotação da Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, ou, ainda, na ocorrência de reincidência, fraude, resistência ou embaraço à fiscalização.

[...]

§ 6o A inobservância do critério de dupla visita implica nulidade do auto de infração lavrado sem cumprimento ao disposto neste artigo, independentemente da natureza principal ou acessória da obrigação -

grifa-se.

O Regulamento da Inspeção do Trabalho (Decreto n. 4.552/02) estabelece que"a dupla visita será formalizada em notificação, que fixará prazo para a visita seguinte, na forma das instruções expedidas pela autoridade nacional competente em matéria de inspeção do trabalho"(art. 23, § 3º).

No caso, a autora é sociedade simples por cotas de responsabilidade limitada e se enquadra na condição de Empresa de Pequeno Porte, conforme declaração da Junta Comercial do Estado do RS (Id. fb41bde - Pág. 1). Além disso, os fatos descritos nos Autos de Infração acima mencionados não configuram as exceções ao critério da dupla visita previstas no art. 55, § 1º, da Lei Complementar 123/2006.

Ainda que a parte ré defenda a diferenciação entre as infrações sanáveis e não sanáveis para fins de aplicação do critério da dupla visita, aduzindo que, em relação às últimas, não haveria prevalência da natureza orientadora da fiscalização, considera-se que as irregularidades constatadas pelo Auditor do Trabalho são sanáveis. Ora, as falhas da empresa em relação ao lixo acumulado no ambiente de trabalho, à falta de uniforme, à ausência de proteção no poço do elevador, à betoneira com áreas perigosas expostas e ao elevador de cargas sem proteção, são situações passíveis de correção.

Dessa forma, conclui-se que a lavratura do auto de infração não primou pela natureza orientadora da fiscalização e pelo critério da dupla visita. Assim, nos termos do art. 55, § 6º, da Lei Complementar n. 123/2006, são nulos os Auto de Infração ns. 25302698, 25302701, 25302710, 25302728, 25304577 e 25305964, sendo irretocável a decisão de origem no particular.

Nesse sentido, já decidiu este Tribunal:

AUTO DE INFRAÇÃO. EMPRESA DE PEQUENO PORTE. CRITÉRIO DA DUPLA VISITA. Nos termos do art. 55, caput e § 1º, do Estatuto da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte, a fiscalização trabalhista deverá observar o critério da dupla visita, especialmente nos casos em que a infração praticada não enseja autuação imediata, dada a natureza prioritariamente orientadora. (TRT da 4ª Região, 11a. Turma, 0000210-47.2014.5.04.0641 RO, em 12/02/2015, Desembargador Ricardo Hofmeister de Almeida Martins Costa - Relator)

ANULAÇÃO DE MULTA. FISCALIZAÇÃO DE MICROEMPRESA. CRITÉRIO DA DUPLA VISITA. Consoante o art. 55, caput, da Lei Complementar 123/2006, a fiscalização em micro e pequena empresa deterá caráter instrutório e orientador. O parágrafo 1º do mesmo artigo estabelece que deve ser realizada a dupla visita para instauração do auto de infração. Incontroversa a inobservância da dupla visita, bem como a condição de microempresa, restando nula a multa administrativa. (TRT da 4ª Região, 8ª Turma, 0020686-72.2013.5.04.0405 RO, em 23/10/2014, Desembargador Francisco Rossal de Araujo - Relator)

AUTO DE INFRAÇÃO. É nulo o auto de infração quando, em se tratando de uma microempresa, deixa-se de observar o critério da dupla visita e a denominada fiscalização orientadora de que trata o art. 55, § 1º, da Lei Complementar nº 123/2006. (TRT da 4ª Região, 4a. Turma, 0001785-30.2010.5.04.0771 RO, em 14/07/2011, Desembargador João Pedro Silvestrin - Relator)

Nega-se provimento ao recurso ordinário da parte ré.

ANDRE REVERBEL FERNANDES

Relator

VOTOS

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADOR ANDRÉ REVERBEL FERNANDES (RELATOR)

DESEMBARGADOR GEORGE ACHUTTI

DESEMBARGADOR MARCELO GONÇALVES DE OLIVEIRA

Tiago Adede y Castro é sócio e advogado no escritório Adede y Castro Advogados Associados em Santa Maria, RS: www.adedeycastro.com.br

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