Página 1884 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 7 de Abril de 2014

ou anulação - José Patricio de Souza - Banco do Brasil - VISTOS, Dispensado o relatório nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95. Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo réu. Isso porque a responsabilidade do réu não decorre de sua participação na fraude, mas sim da falha na prestação de serviços ao autor. Além disso, o autor é seu correntista e o requerido deveria se cercar de todas as cautelas para evitar que fraudes em seu cartão de crédito fossem realizadas. No mérito, a ação é procedente. O autor relatou que seu cartão estava em estado precário e que procurou a ré para solicitar um novo cartão. Afirmou que dias após a solicitação recebeu ligação telefônica em sua residência onde uma pessoa se dizia funcionário do banco réu, solicitando que digitasse a senha pessoal para utilização através de teclado telefônico, o que fez. Em março de 2013 verificou que foram feitas diversas compras em seu cartão que diz desconhecer. É incontroverso nos autos que o autor é titular de um cartão de crédito administrado pela ré e que o autor teve registrado em 15.03.2013 operações que ele diz que não realizou (fls. 20). Procurada a agência bancária, o autor adotou todas as providências reclamadas pela gerência, inclusive com a elaboração de boletim de ocorrência (fls. 13/14), mas os valores reclamados não foram cancelados. Registre-se desde logo a incidência do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor na análise do negócio jurídico celebrado pelas partes. Com efeito, trata-se de relação de consumo, na qual o autor figura como consumidor, pois adquiriu o serviço, como destinatário final, das mãos da fornecedora, ora ré, assim qualificada por força do disposto no artigo , parágrafo 2º da Lei nº 8.078/90. Destaco que é certa a aplicabilidade do C.D.C. nas relações bancárias. Confira-se a propósito a Súmula nº 297 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. A propósito da responsabilidade bancária, observa Aguiar Dias: “depósito bancário é, com efeito, considerado depósito irregular ou de coisas fungíveis. Neste, os riscos da coisa depositada correm por conta do depositário, porque não se lhe aplica o disposto acerca do mútuo (Código Civil artigo 1.280 [atual artigo 645]). Na ausência de culpa de qualquer das partes, ao banco toca suportar os prejuízos. Assumir o risco é, na hipótese, o mesmo que assumir a obrigação de vigilância, garantia ou segurança sobre o objeto do contrato. Em outras palavras, compromete-se a guardar a coisa e restituí-la sã e salva no momento em que o exigisse o depositante sem poder recorrer a nenhuma escusa”. E mais: “Mesmo, porém, que se considerasse depósito regular, recordaríamos o princípio de que o depositário não responde pelos casos fortuitos nem de força maior, desde que os comprove (artigo 1.277 do Código Civil [atual artigo 642])” (Da responsabilidade civil, 6ª ed., ed. Rio de Janeiro: Forense, v. I, p. 388, n. 150-A). Leciona Rui Stoco que “o banco, como depositário do numerário confiado à sua guarda, responde por esses valores, independentemente de qualquer indagação ou circunstância, por força da teoria da guarda da coisa, quando assume a obrigação de guardar e manter e a incolumidade do bem, tendo em vista que a responsabilidade deve recair sobre quem aufere os lucros com a utilização da riqueza alheia”. “De sorte que, se houver estelionato, fraude, furto ou roubo, de modo a privar o correntista dos valores depositados, a responsabilidade do banco é objetiva, não se indagando acerca da culpa” (“Tratado de Responsabilidade Civil”, 6ª ed., Ed Revista dos Tribunais, p.627). Outrossim, é público e notório que, cotidianamente, são feitos ataques a depósitos bancários, mediante uso de ardis e estratagemas vários, principalmente artifícios introduzidos nas máquinas eletrônicas, para clonagem de cartões, leituras de senhas, inclusive troca de cartão magnético (RT 836/225, 806/331). Os jornais e a televisão trazem notícias, quase diárias, da prisão de terceiros que se dedicam a esse mister criminoso, que permitem concluir: os cartões de crédito ou de saque não são totalmente seguros. Em verdade, é forçoso reconhecer que nem sempre o saque indevido ocorre por negligência do correntista, por falta de zelo no uso do cartão e senha. É evidente que o consumidor, hipossuficiente, não tem possibilidade de comprovar que as retiradas foram feitas mediante artifício fora de seu controle ou que a instituição financeira tenha falhado na prestação do serviço: “Ainda que os elementos dos autos não fossem suficientes à conclusão de que não houve a concorrência da apelada para a retirada dos valores da sua conta poupança, não é razoável exigir-se da poupadora a prova de que não fez mau uso de seu cartão magnético e senha pessoal, cabendo, ao contrário, exigir-se da instituição bancária a prova de que seu sistema é seguro e inviolável” (RT 819/355). Ora, em casos como o dos autos, sabendo-se ser evidente a possibilidade de fraude com uso de cartão de crédito, inverte-se o ônus da prova, sendo dever do Banco provar que, naquele caso específico, o saque foi efetuado pelo próprio correntista. Nesse sentido: Direito processual civil. Ação de indenização. Saques sucessivos em conta corrente. Negativa de autoria do correntista. Inversão do ônus da prova - É plenamente viável a inversão do ônus da prova (art 333, II do CPC) na ocorrência de saques indevidos de contas-correntes, competindo ao banco (réu da ação de indenização) o ônus de provar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. -Incumbe ao banco demonstrar, por meios idôneos, a inexistência ou impossibilidade de fraude, tendo em vista a notoriedade do reconhecimento da possibilidade de violação do sistema eletrônico de saque por meio de cartão bancário e/ou senha. - Se foi o cliente que retirou o dinheiro, compete ao banco estar munido de instrumentos tecnológicos seguros para provar de forma inegável tal ocorrência Recurso especial parcialmente conhecido, mas não provido. (REsp 727.843/SP, Rei. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15. 12. 2005). Não socorre à requerida, tampouco, a alegação de “fato de terceiro”. A responsabilidade, nunca é demais lembrar, é objetiva, decorrente não só da teoria do risco, como também do Código de Defesa do Consumidor. De fato, não teria o autor a menor condição de fazer prova negativa, vale dizer, que não fez uso do cartão, ao contrário do Banco, que é detentor de tecnologia avançada. Não satisfaz o argumento de que o sistema é inexpugnável, pelo que somente o autor, pessoalmente, por interposta pessoa, ou por negligência, poderia ter dado margem ao uso. O sistema não é perfeito; está sujeito a violações, o que explica a contratação de empresas especializadas na técnica de tornar o mais difícil possível a fraude. Tem razão o Banco neste particular: antes havia uma simples senha; depois a senha foi acrescida de letras; depois o teclado da máquina mudava a posição das letras, e assim por diante. Esse expediente demonstra que os sistemas eram violáveis e por isso há crescente investimento em novos mecanismos de impedir ou dificultar a fraude. Em verdade, cabe ao Banco a responsabilidade de apontar quem efetuou o lançamento e demonstrar com clareza a movimentação da conta em ordem seqüencial lógica. Esse ônus decorre tanto da aplicação do inciso VIII do artigo do CDC, como também do artigo 333, II do CPC, que reza: Art. 333. O ônus da prova incumbe: [...] II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor,... Não há de supor a requerida que o seu sistema é inviolável, como fato impeditivo do direito do autor; o ônus da prova é naturalmente do banco. Em verdade, o autor foi surpreendido pelos lançamentos de compras em seu cartão de crédito, tendo sido orientado a comunicar o banco requerido para comunicação da fraude. Noticiado fato à gerência do estabelecimento bancário para as providências cabíveis, a fim de identificar a origem dessa movimentação, o autor foi orientado pelo gerente a aguardar a solução do problema pelo Banco. A ré sustentou que as compras só poderiam ser realizadas com a utilização do cartão e senha, cuja guarda é da responsabilidade exclusiva do titular do cartão. Em verdade, a prova da realização das operações impugnadas incumbe ao banco, que tem melhores condições para a produção de prova técnica, mediante análise de seus equipamentos, uma vez que a ele cabe oferecer a segurança necessária aos seus usuários. É dever do fornecedor zelar pela efetiva prestação de todos os serviços colocados à disposição do usuário, sob pena de ver-se responsabilizado por qualquer dano causado ao consumidor. Neste dever preventivo, inclui-se a segurança na prestação do serviço: “O STJ, em reiteradas decisões, tem afirmado que os bancos respondem pela falta de segurança nos serviços que presta, pois ‘a segurança é prestação essencial à atividade bancária” (REsp. 126.819- GO, rei. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ 21.8.2000, p. 137). Acerca da segurança na prestação do serviço, Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva afirma que “o

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