Página 1432 da Judicial - 1ª Instância - Capital do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 27 de Novembro de 2014

morais decorrente de inadimplemento imputável ao réu do contrato de empreitada celebrado pelas partes em setembro de 2008, cujo objeto consistia na construção de centro esportivo, orçado em R$ 150.000,00, a ser entregue até dezembro daquele ano (fls. 12/13). Considerando a obrigação como uma relação jurídica complexa composta por deveres de prestação e de proteção, preordenados para a consecução do propósito comum eleito pelos contratantes, Jorge Cesa Ferreira da Silva considera que o inadimplemento “pode ser tido como o não cumprimento por uma das partes de qualquer dever emanado do vínculo obrigacional” (A Boa-fé e a violação positiva do contrato. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 124). Apenas do inadimplemento absoluto decorre a resolução do negócio, na forma do art. 475 do Código Civil, ensejador da relação de liquidação consequente da extinção contratual. E haverá inadimplemento absoluto “quando a obrigação não foi cumprida, nem poderá sê-lo” (Agostinho Alvim, Da Inexecução das Obrigações e suas Consequências, 3. ed., Jurídica e Universitária, 1965, p. 25), porque inútil ao credor. É o interesse do credor o critério de constatação da inutilidade da prestação contratada, aferido não segundo os “interesses subjetivos deste ou daquele credor, mas da necessidade e utilidade da prestação no conjunto das circunstâncias objetivas do vínculo” (Jorge Cesa Fereira da Silva, A boa-fé e a violação positiva do contrato, Renovar, 2002, p. 138). Nesse sentido é o enunciado n. 162 do CJF. Na hipótese, controvertem as partes acerca do inadimplemento absoluto imputado pela autora ao réu, sustentando aquela que a construção parcial é mínima (dez por cento), enquanto este, reconhecendo o cumprimento parcial de apenas quarenta por cento, o justifica com fundamento na ausência do pagamento contratado mediante cheques sem provisão de fundos. Na responsabilidade contratual, presume-se a culpa do devedor inadimplente. Há, pois, uma inversão do ônus da prova, competindo ao devedor comprovar a inexistência de culpa ou a presença de força maior ou outra excludente da sua responsabilidade civil pelo descumprimento da prestação contratada, tal como estabelecida. Lecionam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart que “a regra do ônus da prova é um indicativo para o juiz se livrar do estado de dúvida e, assim, julgar o mérito e colocar fim ao processo. Tal dúvida deve ser paga pela parte que tem o ônus da prova” (Prova, Revista dos Tribunais, 2009, p. 160). Acrescente-se a isso que “[o] réu deve provar aquilo que afirmar em juízo, demonstrando que das alegações do autor não decorrem as consequências que pretende. Ademais, quando o réu excepciona o juízo, nasce para ele o ônus da prova dos fatos que alegar na exceção, como se autor fosse (réus in exceptione actor est)” (Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 12ª ed., RT, 2012, 729). No caso, o recibo de pagamento de fs. 14, no total de R$ 82.500,00, parcela inicial contratada a ser desembolsada antes do término da execução (fls. 12), não foi impugnado especificamente, ônus que incumbia à defesa (CPC, art. 302), não tendo sido carreado aos autos comprovação da ausência da compensação financeira alegada com relação aos cheques, tampouco foi demonstrada notificação tempestiva a esse respeito. Sem ignorar que o pagamento por meio de cheque tem natureza pro solvendo [para pagamento], dependente da compensação junto ao banco sacado, é descabida a exceção de contrato não cumprido genericamente alegada, na forma do art. 476 do Código Civil, por ausência de correspectividade entre a prestação e a contraprestação, pois a construção não estava atrelada ao adimplemento integral, tanto que o saldo remanescente do preço foi relegado para data futura, posterior à da entrega da obra (dezembro de 2008). Nem todo contrato bilateral é sinalagmático. O sinalagma contratual se verificará na hipótese de se estabelecer entre as prestações um vínculo de correspectividade e de interdependência, que de ordinário há, mas pode ser afastado pelas partes. Nas palavras de PONTES DE MIRANDA (1959, p. 89), “[se] não há toma-lá-dá-ca, ou se não está vencida a dívida do promissário, não há pensar-se em exceção non adimpleti contractus”. Desse modo, a exceção de contrato não cumprido, por ausência da interpedependência entre as prestações, ressaltando que o contrato previu que “[todo] o material bruto e mão-de-obra de execução para esta construção são de responsabilidade do Empreiteiro” (fls. 12), é incapaz de afastar a mora em que incidiu o empreiteiro, que não comprovou ter cumprido a prestação no prazo contratado, sem demonstração da utilidade da prestação ao credor. Se assim não fosse, ainda que se considere ser da autora o ônus de comprovar a compensação dos cheques, o que estava ao seu alcance [cópia de seu extrato bancário], o reconhecimento da mora recíproca, associada à inutilidade da prestação - tanto que há alegação de abandono da obra (fls. 4) -, impõe a resolução do contrato por culpa de ambos os contratantes, com restituição das partes ao estado original, para se evitar o enriquecimento sem causa. Da resolução contratual decorre a relação de liquidação para retorno das partes ao estado original, na forma do art. 475 do Código Civil. Oportuna a lição de Ruy Rosado de Aguiar Júnior: “O direito formativo-extintivo de resolver, ao mesmo tempo em que atua negativamente sobre a relação, desfazendo-a, tem consigo uma força criadora de deveres e obrigações, os quais irão compor a relação de liquidação. A geração desses direitos e deveres tem sua fonte na existência do contrato descumprido, pois é com base nele que serão estipulados os conteúdos dos deveres de restituir e de indenizar” (Extinção dos Contratos por Incumprimento do Devedor, 2ª. ed., AIDE, 2003, p. 259). Por consequência, imperiosa a restituição das quantias efetivamente pagas, a ser apurado em fase de liquidação, com demonstração do desembolso. De outra parte, não há danos morais passíveis de tutela. Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho asseguram que “só existe o dano moral quando houver uma agressão à dignidade de alguém” (Comentários ao novo Código Civil, v. XIII, Ed. Forense, 2004, v. 103). Afinal, “não é qualquer mágoa ou desilusão que gera o dano moral, mas aquela que atinge a própria dignidade da pessoa, alcançando-a de forma intensa, a ponto de atingir a sua própria essência” (Nelson Rosenvald, Direito das obrigações, 3ª ed, Impetus, 2004, p. 270). Se por um lado é certo não se poder exigir prova do sofrimento moral, uma vez que sua verificação se dá em “terreno onde à pesquisa probatória não é dado chegar” (Humberto Theodoro Júnior, Dano moral, 5ª ed., Juarez de Oliveira, 2007, p. 121), de outro, como anota Francisco Eduardo Loureiro, firme nas lições de Maria Celina Bodin de Moraes, por vezes a configuração dos danos morais necessita da comprovação de situação causadora de transtornos em intensidade tal que afronte a personalidade da vítima porque inaplicável a presunção hominis (Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Regina Beatriz Tavares da Silva (coord.), São Paulo, Saraiva, 2007, p. 332). E o exame dos autos não convence de que a conduta do réu provocou sentimentos negativos superiores aos próprios do inadimplemento contratual, o qual, “não é imprevisível, não gerando, de forma extraordinária, ofensa a direito de personalidade, ainda que enseje desconforto e frustração na esfera íntima do indivíduo”[STJ - AgRg-Ag 506.143, rel. Des. Conv. Vasco Della Giustina, j. 15.9.2009]. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, na forma do art. 269, I, do Código de Processo Civil, para condenar o réu à restituição dos valores efetivamente recebidos por consequência da relação contratual resolvida, que devem ser comprovadas na subsequente fase de liquidação, os quais devem ser corrigidos do desembolso, pela tabela prática do E. Tribunal de Justiça, e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês (CC, art. 406 c.c. art. 161, § 1º do CTN) a contar da citação. Em razão da sucumbência recíproca, cada qual arcará com metade das custas, despesas processuais e honorários advocatícios de seus respectivos patronos, observada a suspensão da exigibilidade com relação à autora beneficiária da justiça gratuita (Lei n. 1.060/50, art. 12). Sentença submetida ao regime do art. 475-J do Código de Processo Civil P.R.I.C. CERTIFICO E DOU FÉ, em cumprimento ao determinado no Provimento nº 14/2008, que as custas referentes ao preparo (2%) importam no valor deR$ 4.829,01até a presente data, bem como o porte de remessa e retorno importam no valor de R$ 32,70 por volume. - ADV: RENAN PEREIRA DOS SANTOS (OAB 308468/SP), MARIA DE FATIMA MEDEIROS DE SANTANA (OAB 136749/SP)

Processo 005XXXX-49.2012.8.26.0001 - Procedimento Ordinário - Planos de Saúde - Rita de Cassia Batista - Intermédica Sistema de Saúde SA e outro - Ante o exposto, resolvendo o mérito na forma do art. 269, I do CPC, JULGO PARCIALMENTE

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