A possibilidade de levantar valores da herança antes da lavratura do inventário extrajudicial.
A alteração da Resolução 35/2007 CNJ pela Resolução 452/2022 do CNJ.
Para implementar a partilha através das vias administrativas é necessário respeitar, a contrário sensu, o artigo 610 CPC:
Art. 610 CPC: “Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial.”
Ocorre que, não raras vezes, as partes são capazes, a partilha é amigável e não há testamento, mas o inventário e a partilha são processados no Judicial.
Isso porque um dos grandes empecilhos de se realizar o inventário extrajudicial era a impossibilidade dos herdeiros em arcar com as despesas que o inventário os impõe, Impostos, emolumentos e certidões, sem antes ter acesso ao valor deixado pelo falecido.
Muito se especulava a possibilidade de uma cessão hereditária onerosa, mas esta também induz ao pagamento de emolumentos ao cartório, uma vez que se perfaz via escritura pública, e de impostos; outras vezes indo muito além do natural, e contando com o bom senso do Tabelião, se registrava uma promessa de compra e venda na escritura do inventário declarando que esta estaria vinculada aos pagamentos que o inventário impõe.
É indubitável que a via extrajudicial é muito mais célere que a judicial e por vezes mais econômica, com objetivo de desjudicializar alguns procedimentos.
Quando abordamos o tema de partilha via lavratura por atos notariais é preciso atenção especial a Resolução 35 de 24/04/2007 editada pelo Conselho Nacional de Justiça afim de consolidar as divergências trazidas pela Lei 11.441/2007 bem como igualar as decisões em âmbito nacional.
Ocorre que tanto a Lei 11.441/2007 quanto a Resolução 35/2007 CNJ eram omissas quanto a possibilidade de adiantar do monte mor os valores para pagamento de impostos, certidões e emolumentos necessários para finalizar o Inventário extrajudicial.
A questão foi sedimentada com a edição da Resolução 452 de 22 de abril de 2022 que alterou o artigo 11 da Resolução 37/2007, com novos dispositivos para resolver o empecilho e tornar cada vez mais possível as partilhas via tabelionatos; o qual passamos a análise:
“Art. 11. É obrigatória a nomeação de interessado, na escritura pública de inventário e partilha, para representar o espólio, com poderes de inventariante, no cumprimento de obrigações ativas ou passivas pendentes, sem necessidade de seguir a ordem prevista no art. 617 do Código de Processo Civil.
§ 1º O meeiro e os herdeiros poderão, em escritura pública anterior à partilha ou à adjudicação, nomear inventariante.
§ 2º O inventariante nomeado nos termos do § 1º poderá representar o espólio na busca de informações bancárias e fiscais necessárias à conclusão de negócios essenciais para a realização do inventário e no levantamento de quantias para pagamento do imposto devido e dos emolumentos do inventário.
Atualmente será possível, com o único intuito de levantar aportes para o pagamento de custas iniciais impostas pelo inventário, uma escritura pública anterior a lavratura do inventário com o intuito exclusivo de nomear o inventariante, que não precisa ser na ordem de preferência elencado pelo artigo 617 CPC, para que assim,ele levante a quantia necessária para que se proceda então a escritura definitiva do Inventário.
Merece destaque que no parágrafo primeiro há previsão de que somente o meeiro e os herdeiros, são legitimados para nomear o inventariante.
Isso significa que o operador de direito deve ter um conhecimento quanto aos regimes de bens que o falecido havia contraído, se não vejamos:
O cônjuge ou companheiro será meeiro nos regimes da Comunhão Parcial de bens, na Comunhão Universal de bens e na Participação final dos aquestos, este ainda pouco aplicado no dia a dia dos nubentes, mas que toma nuances do regime da comunhão parcial de bens no caso de falecimento de um dos cônjuges ou conviventes.
Logo se o cônjuge ou companheiro não for casado em um desses regimes de bens ele não será meeiro, mas será que ele seria herdeiro, possibilitando nomear inventariante?
A resposta é que também irá depender do regime de bens adotado no casamento e com quem esse cônjuge ou companheiro há de concorrer.
Na forma do artigo 1829, inciso I Código Civil, o cônjuge em concorrência com os descendentes não será herdeiro, se for casado no regime da separação obrigatória, e aqui nem meeiro ele será, salvo comprovação da sumula 377 STF; no regime da comunhão parcial de bens, salvo se deixar bens particulares e no regime da comunhão universal, onde somente lhe comporta a posição de meeiro.
Se em concorrência com o cônjuge estiver ascendente, de qualquer que seja a classe, ele será herdeiro qualquer que seja o regime de bens bem como meeiro se for casado em um dos regimes comunheiros.
Quando o cônjuge for herdeiro universal, ou seja, não estiver concorrendo nem com ascendente nem descente, ele recebe toda herança e também sua meação se for o caso.
Sendo assim, chega-se à conclusão que somente no regime da separação obrigatória, se estiver o cônjuge ou companheiro concorrendo com descendente, será impedido de nomear inventariante.
Outra dúvida que paira é se um legatário poderia nomear o inventariante?
Imaginemos uma situação hipotética em que o autor da herança não deixou herdeiros necessários ou facultativos, mas realizou testamento descriminando bens específicos (legados) para amigos determinados.
Ressaltando que há a possibilidade de se processar a Ação de Registro, Abertura e Cumprimento de testamento na via judicial solicitando ao juízo que se proceda o inventario em tabelionatos.
O parágrafo primeiro é omisso quanto a legatários, e por se tratar de uma resolução, não caberia a nós operadores do direito ampliar essa interpretação, restando mais uma brecha na Resolução.
Dessa forma ou o legatário arca economicamente com a despesa ou se processa o inventário judicialmente.
Importante abordar que a resolução tratou de herdeiros de forma geral, sem distinguir entre necessários ou facultativos.
Analisada a legitimidade para nomeação do inventariante passa-se ao estudo dos poderes do inventariante, presente no parágrafo 2º do artigo 11.
A Resolução limita a atividade do inventariante, em realizar busca de informações bancárias e fiscais necessárias à conclusão de negócios essenciais para a realização do inventário e no levantamento de quantias para pagamento do imposto devido e dos emolumentos do inventário.
Neste tocante o principal é estar atento a esses poderes e elencar algumas palavras específicas na escritura pública prévia, como exemplo “toda e qualquer instituição bancária em que o (falecido) seja correntista” e “levantar, sacar ou transferir valores”, pois os bancos geralmente implicam quando não há especificamente esses poderes explícitos .
Também é de suma importância que o inventariante abra uma conta corrente em nome do espólio, para transferir os valores das despesas com o inventário e ali realizar as movimentações financeiras para os pagamentos, sendo um instrumento de fácil prestação de contas a posterior.
Por fim, e não menos importante, chega-se à análise do parágrafo terceiro do artigo 11 da resolução 35/2007, e aqui está a “cereja do bolo”.
Ficou estabelecido que “A nomeação de inventariante será considerada o termo inicial do procedimento de inventário extrajudicial.”
Essa nomeação vai ocorrer no momento da lavratura da escritura pública que nomear o inventariante, é lógico que se terá um custo a ser pago ao tabelionato, mas bem menor do que a lavratura final do inventário.
Se o marco inicial do inventário extrajudicial é da nomeação do inventariante, isso significa, indiretamente, que o prazo para cobrança da multa do imposto de transmissão causa mortis encerra-se neste momento e não, mas do efetivo pagamento do imposto, como sempre foi.
Isso já não faria mais sentido em virtude de que a nomeação do inventariante é justamente para levantar valores da herança para pagar todas às custas do inventário.
Perceba que a Fazenda Pública terá que se adequar a essa recente alteração na resolução 35/2007 CNJ, devendo possibilitar ao declarante, assim como na declaração do ITCD no processo de Inventário Judicial, uma opção que possibilite informar qual a data da lavratura do termo de inventariante, e assim o contribuinte não sofrer a sanção com a incidência de multa tributária pela demora na abertura do inventário.
Assim caminha-se rumo a desjudicialização de certos procedimentos, tornado a advocacia extrajudicial mais célere, econômica e vantajosa tanto para o cliente quanto para o advogado.
1 Comentário
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Um excelente matéria há se por em prática. Na verdade, a nomeação do INVENTARIANTE tem que se dar logo no início dos trâmites de partilha, para se responsabilizar um dos HERDEIROS na administração do ativo e passivo, dos bens que compõe o ESPÓLIO. continuar lendo