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3 de Maio de 2024

Concurso Público: É possível anular questões de concurso na justiça?

há 2 anos

É muito comum, em uma conversa com estudantes que prestam concurso, o relato de estar fora da lista de classificados de determinado concurso por três, dois e, até mesmo, por um ponto.

Essa angustia de não ter conseguido a classificação nem sempre é ocasionada pela falta de estudo, mas, sim, por má formulação, controversas, ausência de informações, extrapolação do conteúdo do edital, dubiedades presentes nas questões.

Para corrigir essas questões controversas, os candidatos buscam recorrer administrativamente, recurso o qual é julgado pela própria banca examinadora que formulou as questões. Assim, ficam reféns do entendimento dela naquele momento.

SERÁ QUE É POSSÍVEL PROVOCAR O JUDICIÁRIO PARA CORRIGIR ESSAS QUESTÕES?

Os tribunais têm o entendimento consolidado de que não é possível o Poder Judiciário julgar o mérito, interpretar e avaliar as questões formuladas pela banca examinadora, ou seja, se o gabarito da questão está certo ou errado.

No entanto, atualmente, tem aumentado a demanda de candidatos que provocam o judiciário para que esse corrija flagrantes ilegalidades de questões objetivas de concursos públicos, principalmente as que têm causado dúvidas entre os candidatos.

Nesse caso, estamos diante de uma espécie de controle feita na esfera de atividade do Poder Público.

Quando falamos em Poder Público, é importante entender que a Administração Pública estará sempre respaldada por cinco princípios basilares, elencados pela Constituição Federal: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Juntamente a esses princípios, cabe destacar o Princípio Da Inafastabilidade Da Jurisdição (artigo , XXXV, da Constituição Federal), o qual deixa claro que a Administração Pública não está imune da análise do judiciário, quando se trata de questões de concurso público.

Pois bem, esse controle jurídico está presente em todas as esferas de atividade do Poder Público e não há poder imune ou que esteja acima da Justiça para que permita cometer injustiças.

Existem, portanto, situações concretas que justificam a intervenção do judiciário, são elas: evitar injustiças ou flagrantes ilegalidades.

Eu falo, também, do Princípio da Isonomia nos Teste de Aptidão Física em outro artigo (não deixe de acessar).

O QUE FALAM OS TRIBUNAIS SUPERIORES

Diante desse tema, o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que, se houver flagrante de ilegalidade o qual seja resultado de erro grosseiro, está o Poder Judiciário autorizado a anular a questão impugnada.

Nesse mesmo sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o qual, diante de flagrante ilegalidade de questão objetiva de prova de concurso público que possa causar dúvida, entende que isso gera ofensa ao princípio da legalidade.

Sendo assim, faz-se necessário entender que a finalidade, nesses casos, é corrigir a ilegalidade.

TODOS OS CANDIDATOS SERÃO BENEFICIADOS?

Aqui surge um ponto muito polêmico. Quando falamos de alteração de gabarito, mesmo que seja de apenas uma questão, a lista de classificação pode sofrer grandes alterações.

Ao observamos a lista de um concurso, quanto mais próximo do final da lista, menor fica a diferença de pontuação. Isso quer dizer que qualquer pontuação mudaria boa parte da lista de classificação, e isso, por sua vez, pode definir entre o candidato estar aprovado ou não e, até mesmo, estar entre os que vão tomar posse.

No entanto, o efeito dessa provocação ocorre apenas para quem ingressar no judiciário, sob a justificativa que é apenas uma expectativa de direito.

QUAL O IMPACTO PARA O CANDIDATO

Um dado importante, na prova da PRF, no ano de 2019, é que, do total de 120 questões, 12 delas foram ANULADAS, o que corresponde a 10% da prova. Como consequência disso, poderia o candidato conseguir até 24 pontos em relação a essas anulações. Além dessas questões, muitas outras foram dadas como possíveis de troca de gabarito ou, até mesmo, de anulação.

Nesse cenário, teve candidato que não estava próximo da nota de corte e, no outro dia, estava com uma expectativa de receber mais de 10 mil reais mensais, pagos pelo cargo, ou seja, mudou totalmente o “jogo”.

Recentemente, têm-se observado inúmeras controversas de gabaritos extraoficiais pelos diversos cursos preparatórios, por professores renomados e especialistas na matéria, ao dar o gabarito divergente da banca, ou, em alguns casos, até ficar em dúvida em relação à resposta correta, mesmo com inúmeros materiais para realizar uma busca e com a possibilidade de discutir com outros profissionais antes de anunciar o gabarito.

Agora, imagina para o candidato que tem de estudar diversas matérias, o qual se encontra em um cenário de pressão, que está anos estudando e precisa decidir a resposta em poucos minutos.

ATENÇÃO A ESSAS QUESTÕES

Para melhor ilustrar, vamos analisar algumas questões recentes que apresentaram questionamentos recorrentes no judiciário.

Questão elaborada no concurso da Polícia Rodoviária Federal (PRF), no ano de 2021, matéria de Direito Penal, banca CEBRASPE:

“A remarcação do chassi com o mesmo número original do veículo caracteriza crime contra a fé pública e infração administrativa de trânsito.”

Gabarito da Banca: Errado

Vamos dividir a questão em duas partes. Na primeira parte, o examinador afirma que a remarcação do chassi é um “crime contra a fé pública”. Vejamos o que diz o artigo 311, Título X, Dos Crimes Contra a Fé Pública, do Código Penal:

“Art. 311 – Adulterar ou remarcar número de chassi ou qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento:

Pena – reclusão, de três a seis anos, e multa”

Agora, na segunda parte da questão, é afirmado que a remarcação do chassi é “infração administrativa de trânsito.”. Vejamos o que diz o artigo 230, inciso I, do Código Brasileiro de Trânsito:

“Art. 230. Conduzir o veículo:

I - com o lacre, a inscrição do chassi, o selo, a placa ou qualquer outro elemento de identificação do veículo violado ou falsificado;

Infração - gravíssima;

Penalidade - multa e apreensão do veículo;

Medida administrativa - remoção do veículo;”

Mesmo que não seja usual ocorrer a remarcação do chassi com o número original, a remarcação, por si só, viola a autenticidade do sinal identificador, o que caracteriza o crime do artigo 311 do Código Penal e também a infração administrativa de trânsito do CTB.

Portanto, não é possível afirmar que esta questão está “errada”, o gabarito final mais adequado seria como “correta”. Nesse sentido, foram diversas ações ajuizadas buscando a alteração do gabarito.

Questão elaborada no concurso Polícia Civil do Estado do Paraná (PCPR), no ano de 2021, matéria de Noções de Direito Administrativo, banca Universidade Federal do Paraná (UFPR):

“O controle externo da Administração Pública é exercido pelo Poder Legislativo, com o auxílio dos Tribunais de Contas. Sobre o tema, considere as seguintes afirmativas:

1. Embora a Constituição da Republica de 1988 tenha vedado a criação de Tribunal de Contas Municipal, atualmente existem dois Tribunais de Contas de Município no Brasil.

2. Os Tribunais de Contas dos Estados-membros serão integrados por sete Conselheiros.

Gabarito da Banca: Afirmativas 1 e 2 são verdadeiras.

Nessa questão, houve um equivoco do examinador na hora de formular a questão, uma vez que misturou os termos Tribunal de Contas Municipal e Tribunais de Contas de Municípios. A vedação existente refere-se ao Tribunal de Contas Municipal, existindo apenas dois (São Paulo e Rio de Janeiro), conforme afirma a banca. No entanto, Tribunais de Contas de Municípios são órgãos estaduais existentes em diversos municípios do Brasil e não apenas dois (Paraná, Bahia, Goiás, Pará). Diante disso, fica claro que banca quis se referir à exceção existente, mas cometeu um erro grosseiro de nomenclatura.

Perceba que, em uma breve análise, é possível observar os equívocos, bem como é de fácil elucidação os erros presentes. Entretanto, mesmo diante dos inúmeros recursos apresentados pela via administrativa, a banca examinadora manteve o gabarito.

MANDADO DE SEGURANÇA

Diante desse cenário, para que o candidato consiga pleitear seu direito na justiça a utilização do mandado de segurança, com tutela de urgência, é um caminho a ser seguido. Essa tutela de urgência tem a finalidade de possibilitar que o candidato possa participar das outras etapas do concurso até que seja julgada a ação.

Para isso, é de suma importância um conjunto probatório robusto com apresentação de laudo de professores especialistas, como prova pericial, apontando detalhadamente qual o erro contido na questão, sendo ele de linha gramatical, conforme exemplo dado acima, ou mesmo questão de direito, relacionado com a letra da lei ou entendimento já consolidado pela jurisprudência.

O mando de segurança, é um procedimento mais célere e com isso a decisão pode ser dada com mais velocidade. Isso se dá, pois as provas são produzidas antes do ajuizamento da ação, não sendo possível, tal como, ouvir testemunhas, audiência, produção de prova pericial.

Já em casos de grande complexidade, por exemplo, que é necessário a nomeação de um perito para avaliar a suposta prova, torna-se mais viável o ajuizamento de uma ação ordinária, também com pedido de liminar.

Por esses motivos, a busca é pela correção da flagrante ilegalidade no gabarito da questão e não pela substituição do papel da banca examinadora na elaboração e gabarito, fundado por receio de dano irreparável ou de difícil reparação para o candidato.

Espero que tenham gostado, e que, com essas informações, você consiga conquistar seu cargo público desejado.

Até breve!

Danilo Vilela Ferreira

OAB/PR 77.313

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Conteúdo bastante relevante! continuar lendo

Ótimo texto 👏👏👏

Tema extremamente relevante! continuar lendo

Excelente matéria, parabéns pelo trabalho. continuar lendo

Excelente trabalho! continuar lendo