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3 de Maio de 2024

Infidelidade Virtual

Infringência à ordem matrimonial

Publicado por Joao Paulo Barboza
há 5 anos

RESUMO

Este artigo se propõe em analisar a infidelidade virtual como forma de violação de um dos deveres do matrimônio, bem com abordar sobre o dissenso doutrinário que trata esse tema e a influência que o ambiente virtual traz a uma relação conjugal. Onde uma pessoa casada ou que viva em união estável utiliza dos meios virtuais a fim de se relacionar com pessoas estranhas aquela relação. Assim, fazendo com que dessa relação nasça relacionamentos afetivos, amorosos e sexuais em bytes. Através desse meio virtual pode ocorrer de se externar ao mundo real e alcançar romances reais e duradouros. Essa infidelidade virtual infringe diretamente a ordem matrimonial, vez que, maculam os deveres de respeito, lealdade e principalmente fidelidade entre os consortes. Este comportamento poderá ocasionar sérios danos de caráter psicológico ao consorte traído e consequentemente repercussão no âmbito jurídico, podendo ensejar o pleito indenizatório em juízo pelos danos morais sofridos concomitantemente com o divórcio. Este trabalho fundamenta-se na investigação através do método hipotético, desenvolvidos a partir de ideias teóricas, as quais são publicadas, quais sejam, Leis, jurisprudências, doutrinas e artigos eletrônicos.

Palavra-chave: Desamor, dissolução matrimonial, infidelidade virtual, dano moral

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo possui o escopo em analisar a infidelidade virtual como forma de infringir a ordem matrimonial por violar os deveres recíprocos que recai sobre os consortes, que são atribuídos como responsabilidades e impondo direitos e deveres. A Fidelidade é um desses deveres, conforme o padrão da família monogâmica definida pela sociedade dos povos de origem cristã.

Esse tipo de relacionamento virtual são mantidos por meios eletrônicos e redes sociais, como: facebook; skype; whatsapp; mensagens de texto do celular; e-mails; salas de bate-papo; dentre outros.

Existem igualdades de direitos e deveres no casamento e na união estável, e a reciprocidade é algo que se impõe. Quando o matrimônio se origina, logo nasce a reciprocidade na relação.

Com a evolução tecnológica desde a revolução industrial, nos trouxe muitos benefícios e comodidades, com ela veio a internet que é usada para facilitar o trabalho, estudo, lazer, e aproximar pessoas. Com essa aproximação, há uma maior interação entre indivíduos, dessa interação no ambiente virtual pode ocorrer uma maior afinidade entre duas pessoas, e nascer alheio a relação conjugal uma relação de afeto ou até mesmo sexual. Essa infidelidade mesmo que seja no meio virtual, ao menos no primeiro momento causa o mesmo sentimento da infidelidade real, ensejando muitas vezes o rompimento da sociedade conjugal, por tornar a convivência insuportável diante de tal conduta do consorte traidor.

É bem da verdade que a Infidelidade Virtual infringe um dos deveres do matrimonio, qual seja, a fidelidade. Consoante a isso, nasce o direito do consorte traído de pleitear o divórcio, vez que, tal conduta pode tornar a convivência com o cônjuge insuportável diante desse desconforto e o desgaste que a infidelidade traz a relação. Essa mesma conduta poderá ensejar a aplicação da Teoria do Desamor, criada pela Drª Giselda Maria Fernandes Moraes Hironaka, cuja qual da azo a possibilidade de indenização ao consorte traído, nas hipóteses em que houver difamação de seu cônjuge, podendo ser cumulado com o pedido de divórcio ou dissolução da união estável. Vez que, caracteriza ofensa a honra e dignidade da pessoa humana do consorte ofendido. Não há um conceito formado que possa definir essa teoria, é também chamado por parte da doutrina de abandono afetivo. Não é cediço afirmar que é um dever amar e um direito de ser amado, mas, pode-se afirmar que é um direito de se ter uma relação afetiva sem ser enganado ou até mesmo difamado pelo consorte.

2. RELACIONAMENTO AFETIVO

É sabido que o Homem é um ser social desde os tempos mais remotos, tem como objetivo constituir família, mas, pra que se tenha efeitos de direito nessa organização familiar, deve ser observado os rigores da Lei.

O Ser humano difere dos seres irracionais pelo livre arbítrio, isso inclui a capacidade de escolha em que caminho deve seguir, ou seja, a entidade familiar deve ter por objetivo a busca da felicidade sempre.

Quando falamos em relacionamento, se pressupões um envolvimento emocional, um relacionamento afetivo, como no casamento, união estável e namoro, quando se fala em relacionamento, logo somos remetidos a uma ideia de compromisso.

É o que pontua o sociólogo GUIDDENS:

O termo “relacionamento, aplicado à vida pessoal, passou a ser usado amplamente há apenas 20 ou 30 anos, assim com a ideia de que há uma necessidade de “intimidade” ou “compromisso” na vida pessoal. GUIDDENS (2005, p. 151)

Nesse sentido é cediço afirmar que a família como instituição, está sempre em mutação, se moldando a necessidade humana e social.

É incontroverso que a família antes de ser um fator social como entidade, é um fato natural, o casamento é um desses, inclusive. Ou seja, antes mesmo de existir o casamento como instituto jurídico, já existia a união de forma livre. Assim, o casamento foi criado pelo Estado como forma de regulamentar a conduta dos indivíduos do convívio social.

No entendimento de FERREIRA (2002, p. 137) que: “casamento é a união solene entre duas pessoas de sexos diferentes, com legitimação religiosa ou civil”. Sendo assim, tem-se o casamento como algo além de um contrato, e sim o nascimento de um vínculo entre duas pessoas do sexo oposto ou não, reconhecido e homologado pelo Estado. Nesse vínculo é também reconhecido a relação sexual, como uma relação contratual. Para o GIDDENS (2005: 151) “o casamento pode ser definido como uma união sexual entre dois indivíduos adultos socialmente reconhecida e aprovada”.

Contudo, para o universo jurídico, o casamento é um negócio jurídico rígido e formal, conforme conceitua o doutrinador VENOSA:

O casamento é o centro do direito de família. Dele irradiam suas normas fundamentais. Sua importância, como negócio jurídico formal, vai desde as formalidades que antecedem sua celebração, passando pelo ato material de conclusão até os efeitos do negócio jurídico que deságuam nas relações entre os cônjuges, os deveres recíprocos, a criação e assistência material e espiritual reciproca da prole e etc. (VENOSA, 2009, p. 25).

É importante ressaltar que o casamento é um instituto jurídico do direito civil que une dois indivíduos, sejam do sexo oposto ou do mesmo sexo, formando o matrimônio com os consortes e conseguintemente sua prole ou pessoas ligadas por afetividade ou parentesco.

Já na união estável, caracteriza-se o convívio público e contínuo, sendo excluído os casos de incesto[2], e deve haver a caracterização de convivência análoga ao casamento para que caracterize uma família de fato. Para DIAS a união estável é vista da seguinte forma:

Nasce a união estável da convivência, simples fato jurídico que evolui para a constituição de ato jurídico, em face dos direitos que brotam dessa relação. O que se exige é a afetiva convivência more uxório, com características de união familiar, por um prazo que denote estabilidade e objetivo de manter a vida em comum entre o homem e a mulher assim compromissados. (DIAS, 2009, p. 161)

A Lei nº 9.278/96, em seu Artigo , rege a união estável, onde a reconhece como entidade familiar, vez que, se aproxima do casamento, no que diz respeito aos direitos e deveres entre os parceiros, igualmente com relação aos filhos.

O Código Civil de 2002 em seu Artigo 1.634, preceitua que os pais são responsáveis pela direção, criação e educação dos filhos, assim como tê-los em sua companhia e guarda, bem como exigir que sejam obedientes os dispensem respeito.

3. FIDELIDADE COMO UM DEVER

Em uma relação afetiva deve haver muito mais que fidelidade, deve ser dispensado por ambos, a lealdade, pois a lealdade é maior que a fidelidade. Não quer dizer que se somos fiéis, consequentemente somos leais. Há momentos que podemos ser infiéis, porém, leais. Pode ocorrer a infidelidade e posteriormente a lealdade em confessar ao parceiro tal ato cometido.

Portanto, a fidelidade está ligada a lealdade, porém, esta última é maior que a primeira. O que não se confunde com o adultério. Este é o mais grave, pois, para caracterizá-lo, deve haver a conjunção carnal, do latin “ad alterum torum”, que significa na cama de outro; conforme se lê, é sugestivo a interpretação do significado. Afirma FERREIRA (2002, p. 696) que “a união da alma e do corpo é o casamento, matrimônio, consórcio”.

Assim, a união é um pacto, um contrato entre indivíduos, do mesmo sexo ou não, com objetivos em comum, o de constituir família. Em razão disso, podemos trazer à baila o Artigo 1.566 do Código Civil de 2002:

Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:

I - fidelidade recíproca;

II - vida em comum, no domicílio conjugal;

III - mútua assistência;

IV - sustento, guarda e educação dos filhos;

V - respeito e consideração mútuos.

Nesse diapasão, o dever de fidelidade está incorporado pela lealdade, como já explicitado, a lealdade é algo mais que a fidelidade. Portanto, há a violação desse dever na ocorrência do ato que tenha como objetivo a satisfazer a sexualidade com o indivíduo alheio a relação afetiva, nesta hipótese a conjunção carnal não é necessária, ao menos que se exteriorize a uma relação fora do ambiente virtual, ou seja, no ambiente real.

É importante deixar claro é que o dispositivo legal mencionado faz nascer aos consortes direitos e deveres de forma recíproca, visando a ordem pública e o interesse da sociedade, trazendo situações jurídicas aos mesmos. A violação desse dispositivo, ou seja, dos deveres do casamento ou união estável, enseja ao cônjuge o pedido de divórcio ou a dissolução da união estável, desde que o consorte não tenha concorrido para tal transgressão.

Podendo ser acionado o judiciário a fim de requerer o fim do casamento ou união estável, sendo imputado ao consorte ato que ensejou a violação aos deveres do casamento ou da relação estável, assim tornando insuportável, ocorrendo desgaste à convivência.

4. OCORRÊNCIA DO DIVÓRCIO

É sabido que atualmente a maioria dos indivíduos pensam primeiramente em ter uma vida profissional estável, e consequentemente alcançar a independência financeira, e somente depois pensar em casamento. Assim, aquela fase de conhecimento um do outro se prolonga no tempo, hipóteses em que ocorre um test drive entre os parceiros antes de assumirem o compromisso do casamento. Talvez por medo de não dar certo, diante de tantos divórcios que existem atualmente.

Por conta disso, acaba ocorrendo a incidência de um maior número de famílias reconstruídas, conforme os ensinamentos de GIDDENS (2005, p. 151), são formulados através de novos casamentos, ou ainda, através de novos relacionamentos envolvendo proles de uniões anteriores.

Posto isso, para indivíduos que estão vivendo um verdadeiro desgaste na relação, aí que entra a internet como forma de aproximar pessoas, consolidar confidências com pessoas estranhas a relação, e até mesmo estranhas ao convívio pessoal. Com essa relação cibernética, por mais que não haja um contato pessoal, acaba sendo um refúgio dos problemas que o relacionamento real está enfrentando.

Essa é a fagulha que faltava, com isso, a aproximação em bytes torna-se cada vez mais intensa, tomada pela fantasia e despreocupação que essa relação virtual possa causar ao relacionamento real. Com essa modernização e reação em cadeia de contatos com novas pessoas acabam originando situações que causam crises ou agravam as já existentes, fazendo ruir uma relação que era real e sólida, o casamento.

Desse modo, o divórcio é o instituto jurídico que dissolve a sociedade conjugal como forma de vínculo matrimonial, consolidando o direito aos ex-cônjuges a contraírem novas núpcias, ou seja, estarem livres para se relacionar e casar novamente.

5. INFIDELIDADE VIRTUAL

5.1 CONCEITO DE FIDELIDADE

A fidelidade está incorporada de certa forma a lealdade, é o dever de dispensar ao parceiro o valor que autoriza uma restrição ao instituto da liberdade. Devendo ser evitado todo o tipo de relacionamento afetivo ou erótico alheio a relação conjugal.

Existem dois tipos de infidelidade, material e moral. A primeira é aquela que ocorre no mundo real, havendo o contato físico, o envolvimento amoroso e consequentemente o adultério. Como já abordado, hipóteses em que há conjunção carnal ou somente troca de carícias, pois, para que caracterize o adultério deve haver a conjunção carnal, algo que não ocorre no ambiente virtual.

Na infidelidade moral é diferente, posto que, ocorre em um ambiente totalmente virtual onde a relação é imaginária, mas, há a correspondência do outro indivíduo. Essa relação ocorre justamente quando a vida a dois dos consortes não anda bem, quando um deixa a desejar, falta de atenção, rotina desgastante são um dos ingredientes básicos pra que possa ocorrer a busca no mundo virtual por algo que falta no relacionamento real.

No conceito de GUIMARÃES, as diferenças entre infidelidade material e moral são:

A distinção entre infidelidade material e moral importa para caracterizar a infidelidade virtual, que é uma forma de infidelidade moral. Na relação virtual estabelece-se um laço erótico-afetivo platônico, mantido à distância através de um computador. A pessoa sai do seu espaço imaginário para relacionar-se com uma pessoa invisível, mas que está lá e corresponde. O enamoramento virtual pode criar um laço erótico-afetivo muito mais forte do que relacionamento real que a pessoa vive, desgastado pela convivência diária, pois é alimentado pela fantasia. Acontece um quase adultério, uma infidelidade moral. A cumplicidade, a intimidade, a paixão estabelecidas no espaço virtual muitas vezes levam o casal ao contato físico, com relações sexuais, quando então acontece a infidelidade material ou adultério. Portanto, não existe adultério virtual e sim infidelidade virtual que pode levar ao adultério propriamente dito. (Disponível em: www.ibdfam.org.br, Acessado em: 05 out 2014).

Não se pode olvidar da consideração e respeito que ambos os consortes devem dispensar ao outro, conforme preceitua a Lei nº 9.278/96, a qual veio regulamentar a união estável. A pratica de infidelidade seja no matrimônio, seja em união estável, não importa. O que deve ser levado em consideração é formação de família como instituto e os direitos e deveres de forma recíproca e devendo ser dispensado sinceridade, respeito à dignidade do cônjuge, não expondo seu consorte em situações constrangedoras e negativas.

Nesse sentido, é cediço trazer à baila que há amparo legal para a prestação do dever de fidelidade, bem como prestação sexual entre os consortes, como juramentado em ato solene ao contraírem núpcias. É o que decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo, senão vejamos:

Se ela se esqueceu de sua condição de companheira, se negou ao dever legal de coabitação com o marido, recusando-se a viver em sua companhia no domicilio conjugal, por ele legalmente fixado, não pode exigir do esposo o dever de fidelidade. Se a mulher se nega a isso, tacitamente prepara e admite a infidelidade do marido, não podendo depois, alegar ignorância, nem vir a juízo pleitear o desquite sob invocação de ser o marido adúltero. Pois para tanto ela concorreu, negando-se ao dever legal de coabitação. (TJSP, 3ª Câmara. Ac. 79.574.31.01.1957, Rel. Prado Fraga, RT 264/280).

O dever de consideração e respeito, privacidade da imagem, honra, liberdade física e psíquica é o principal dever, pois, sem estes direitos garantidos, não existirá qualquer outro. Com a infringência desses direitos, poderá haver um desgaste na relação, tornando-a insuportável, através do adultério, dentre outras condutas desonrosas. Conforme preceitua o Artigo 1.573 do Código Civil vigente.

Para FARIA, (1992, p. 28), ad alterum torum, “é o ato de alterar, adulterar, corromper, falsificar, na cama de outro, ou seja, é o ato de se relacionar com terceiro na constância do casamento, o que é conhecido popularmente como infidelidade”.

É importante lembrar que pra que um relacionamento dê certo, faz necessário além da prestação sexual, a dispensa de carinho, dedicação, compreensão e muitas vezes renúncia de um dos cônjuges, pra que não haja um desgaste na relação e torne insuportável a vida a dois.

5.2 INFIDELIDADE E SUAS ESPECIES

Quando se fala em infidelidade, de maneira equivocada remetemos o pensamento em adultério. Não sendo este último o único meio de infringir a ordem matrimonial pelo não cumprimento do dever de fidelidade, sendo que trata-se de apenas um método de infringência desse dever. Conforme o regramento civil brasileiro vigente aduz em seu Artigo 1.724, que deve se dispensar ao companheiro, os deveres da lealdade, o que de forma implícita remete-se a fidelidade, pois, como já foi abordado, fidelidade está intimamente ligada a lealdade, e mais, lealdade é algo superior a fidelidade, pois este último faz parte do primeiro. Conforme os dizeres da psicóloga Jacqueline Meireles:

Os casais na atualidade tendem muito a querer essa tal fidelidade, entretanto a fidelidade parte do princípio de um dever moral, uma obrigação, um compromisso, quase um contrato. Já a lealdade é muito mais que isso, está relacionada a valores, sinceridade, vínculo afetivo. Em suma, enquanto o leal não trai por valores emocionais o fiel não trai por valores morais.

(Disponível em www.psicologiaemanalise.com.br/2010/04/relacionamentos-lealdade-ou-fidelidade_28.html, Acesso em 27 out 2014)

Em princípio quando se fala em infidelidade logo se pensa na prática de relação sexual com pessoa entranha a relação entre os consortes, mas, outros atos diversos da conjunção carnal, também se enquadra nessa infringência, como troca de caricias, dentre outros.

Com o crescimento da tecnologia e a acessibilidade a esse meio, aumentou o número de usuários na rede mundial de comutadores, com isso, há casos de pessoas que acabam trocando o relacionamento real pelo virtual e não dando mais importância ao real relacionamento em que vive; assim, essa pratica acaba sendo o pivô do fim de muitos casamentos e uniões estáveis, em razão da infringência do dever matrimonial e da impossibilidade de convivência após essa quebra de dever e de confiança.

Conforme do entendimento de LEVY, o mundo virtual é visto da seguinte maneira:

No uso corrente, a palavra virtual é empregada com frequência para significar a pura e simples ausência de existência, a “realidade” supondo uma efetuação material, uma presença tangível. O real seria da ordem do “tenho”, enquanto o virtual seria da ordem do “terás”, ou da ilusão, o que permite geralmente o uso de uma ironia fácil para evocar as diversas formas de virtualização. (LEVY, 1996, p. 11)

Portanto, essa infidelidade virtual acontece a partir do momento em que uma pessoa casada ou que viva em união estável, inicia um relacionamento utilizando-se do meio virtual, passando a manter relação afetiva e muitas vezes eróticas, satisfazendo os desejos e realizando fantasias.

Isso acontece devido a imposição da sociedade em adotar o sistema monogâmico como padrão social, de modo que, toda e qualquer ação que ofenda o respeito mútuo, lealdade e fidelidade, caracteriza infidelidade material ou moral.

5.3 AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL

Percebe-se uma lacuna jurídica referente a esse tema, não há previsão legal que regulamente o tema em comento, mas, como toda questão jurídica merece ser resolvida, ou seja, não podem ficar sem solução, o que se tem é somente decisões jurisprudenciais, devido a existência da lacuna em nosso ordenamento. A interação dos indivíduos por intermédio do meio virtual, somados com a curiosidade, insatisfação com o atual relacionamento real, são combustíveis para que haja a busca do novo, de algo que o relacionamento real não mais proporciona.

Diante dessa ausência normativa para regular esse tipo de infidelidade, resta somente a análise do caso em concreto juntamente com algumas doutrinas que se posicionam a esse respeito, para se chegar a um veredito.

6. DANO MORAL COMO REFLEXO DA INFIDELIDADE

Conforme preceitua o inciso X, do artigo de nossa Carta Magna de 88, os direitos da personalidade devem ser protegidos e reparados se houver qualquer violação. Essa violação é um dano que abrange todo atentado aos direitos da personalidade, como a honra, boa fama, integridade física, liberdade individual, dentre outros. Contudo, esse dano não pode decorrer de perda material, posto que, não há que se falar em atingimento do patrimônio material, ou seja, tangível.

Essa violação é imaterial, ou seja, extrapatrimonial; não podendo ser avaliado em pecúnia por não se ter uma roupagem econômica. Conforme entendimento do grande doutrinador Silvio Salvo Venosa, in verbis:

Dano moral é o prejuízo que afeta o ânimo psíquico, moral e intelectual da vítima. Sua atuação é dentro dos direitos da personalidade. Nesse campo, o prejuízo transita pelo imponderável, daí porque aumentam as dificuldades de se estabelecer a justa recompensa pelo dano. Em muitas situações, cuida-se de indenizar o inefável. Não é também qualquer dissabor comezinho da vida que pode acarretar a indenização. Aqui também é importante o critério objetivo do homem médio, o bônus pater famílias: não se levará em conta o psiquismo do homem excessivamente sensível, que se aborrece com fatos diuturnos da vida, nem o homem de poucas ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre às rudezas do destino.

(VENOSA, 2011, p. 49).

Desse modo, as ofensas do dia a dia entre os cônjuges que são meros aborrecimentos, não enseja o dano moral. Contudo, se as ofensas forem graves, que infrinja os direitos da personalidade do consorte traído, e este recorrendo ao judiciário, dará azo a violação e conseguintemente indenização pelo dano moral causado.

O juízo de valor do dano moral é visto sob o caráter punitivo educativo, pelo fato do consorte ter violado esse bem imaterial, do mesmo modo seja minimizado o sofrimento da vítima. Esse juízo de valor deve ser pautado de forma ponderada, dissipando quaisquer forma de enriquecimento sem causa, ou seja, essa compensação pelo dano causado, e também não ser visto como forma de aferição de lucros. Nesse sentido preleciona DINIZ (2007, p. 550), que “na reparação do dano moral, o dinheiro não desempenha a função de equivalência, como no dano material, porém, concomitantemente, a função satisfatória e a de pena”.

Ainda nesse sentido, o quantum debeatur [3] ao ofendido depende de análise do caso em concreto, sendo que o caráter punitivo e compensatório, fazendo jus inclusive da correção monetária contatos a partir da violação causada. Conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, na edição da Súmula 43[4].

Assim, percebe-se que além da responsabilidade ser subjetiva[5], pendente de análise do caso em concreto, deve ser violado o direito de personalidade do cônjuge traído. Termos em que, essa indenização não poderá ensejar enriquecimento sem causa e sim forma de compensar o dano sofrido ao patrimônio imaterial.

7. MEIOS DE PROVAS

Como é sabido por todos, o ônus da prova cabe a quem alega, isso como via de regra. Portanto, o consorte traído que deseja se valer da intervenção do judiciário para ter direito a reparação do dano sofrido, incumbe a este o ônus da prova; ou seja, provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos. Conforme preceitua o Artigo 332, do Código de Processo Civil. Na mesma senda, preceitua o Artigo 333, inciso I, do Código de Ritos.

Não trata-se de uma tarefa fácil, provar que houve infringência do dever matrimonial sem macular o direito de privacidade do cônjuge merece cuidado. Vejamos:

Se o cônjuge traído pleitear o divórcio e ainda requerer indenização por danos morais, deverá comprovar em juízo o conteúdo que violou um ou mais de seus direitos da personalidade. Se o conteúdo que comprove tal violação, como: e-mail; conversas de mensageiros instantâneos; sites de bate-papo; dentre outros meios de interação virtual estiverem ao seu alcance, esteja sem restrição no acesso; ou seja, sem senha; é perfeitamente possível o uso como prova da violação do dever matrimonial. Porventura, se o computador estiver configurado com contas de acesso de forma restrita; ou seja, com senha e acesso ao conteúdo também estiver com acesso restrito, será necessário a permissão do cônjuge para aceder tais arquivos. Pois, a quebra desse acesso, ou seja, a invasão desse acesso ofende diretamente outra garantia constituída em nossa Carta Magna de 1988, qual seja, a intimidade, a vida privada.

Por mais que sejam cônjuges, não dá azo a violação da privacidade alheia. Portanto, havendo alguma violação de acesso ao conteúdo como prova, esta será ilícita; ao passo que será considerada inválida. Nesse sentido preceitua o Artigo 10 da Lei 9.296/96, in verbis:

Art. 10 – Constitui crime realizar interceptação de comunicação telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo de justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa

Conforme já aduzido, pra que essa prova não seja considerada ilícita, deve o cônjuge traído buscar ao judiciário autorização pra que assim possa ser feito a quebra do sigilo no ambiente virtual, ainda, deve ser de forma amplamente motivada. Corroborado pelo Artigo 332 do Código de Processo Civil. Mas, se o cônjuge ou companheiro fazer uso de acesso, usando provas obtidas sem consentimento, ou seja, por intervenção de um técnico em informática ou alguém com habilidades para quebrar essa senha, ou até mesmo o próprio cônjuge traído fazer uso de ferramentas para esse uso, será considerada prova ilícita, conforme mencionado.

Contudo, a indenização por essa violação, é de certa forma difícil de ser provada, conforme já aduzido, há uma linha tênue entre a busca por prova dessa violação e a invasão de privacidade do cônjuge traidor. Pra que seja dirimido esse conflito de interesses, merece ser analisado o caso em concreto, pra que seja aplicado o direito de maneira eficiente e que a justiça seja feita.

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A família é um grupo étnico em que ocorre a intermediação do Estado, regulando as relações sociais por intermédio de normas editadas com o objetivo de organizar a estrutura da sociedade, inclusive as relações afetivas como casamento e a união estável. Quando no casamento existe o vínculo reconhecido pelo Estado e a formalidade desse reconhecimento, a união estável independe desse vínculo formal para se concretizar a relação, basta que se tenha uma relação contínua, duradoura e pública, com animus de constituir uma família de fato. Isso é mera formalidade, haja vista, que nas duas hipóteses deve haver a reciprocidade da fidelidade.

Porém, no casamento deve ser pleiteado o divórcio para que não haja mais vínculo e ocorra a liberação do ex-cônjuge para se relacionar e contrair novas núpcias. De acordo com a Emenda Constitucional n º 66, não mais existe o pré-requisito de estar separado judicialmente a mais de um ano ou de fato a mais de dois anos, o divórcio é medida que pode ser imposta a qualquer tempo, nos casos em que a convivência for insuportável diante da infringência de um dos deveres que é a fidelidade.

Essa infidelidade acontece muitas vezes por insatisfação de um dos cônjuges com o atual relacionamento, assim, buscam no meio virtual uma válvula de escape, adentrando no universo em bytes. Neste cenário encontram pessoas e passam a se relacionar, a intimidade vai aumentando até se ver entregue a um relacionamento amoroso virtual, que com o passar do tempo pode se exterioriza para o mundo real.

Com isso ocorre a infidelidade virtual e consequentemente a infringência do dever de fidelidade que deve ser dispensado aos cônjuges. Assim, o cônjuge traído pode pleitear o divórcio inclusive indenização por danos morais, havendo provas de violação dos direitos da personalidade, como a honra por exemplo.

Conforme preleciona Maria Helena Diniz e Flávio Tartuce, de que pra que ocorra a infidelidade virtual, basta que exista apenas os atos que levem a prazeres sexuais por meios virtuais, sendo dispensável o envolvimento físico.

O que merece cuidado é a análise de prova desses atos sem que ocorra a violação da privacidade do cônjuge infiel. O acesso a esse meio de prova não deve ser restrito somente o autor da infidelidade, pois, tal acesso sem permissão caracteriza invasão de privacidade, por mais que sejam consortes. Entretanto se o acesso ao dispositivo eletrônico for de ambos, não há que se falar em invasão. Por exemplo, se as provas estão no computador da família de acesso livre a todos, trata-se de prova lícita, porém, se existe uma conta no sistema operacional de uso individual, e o acesso a essa conta não foi autorizado, ou violado por algum meio, esta prova está eivada de ilicitude.

Para o tema em comento, não há previsão legal, entretanto, como as demandas judiciais não podem ficar se ser dirimidas, depende sempre da análise das minucias do caso concreto, principalmente no que diz respeito ao meio de prova.

Diante do que foi exposto, o entendimento de Maria Helena Diniz e Flávio Tartuce é o mais coerente, vez que, há de fato a violação da honra do cônjuge traído, quanto mais, nos casos em que ocorre a ofensa de cunho difamatório a respeito de seu consorte.

9. REFERÊNCIAS

MEIRELES, Jacqueline. Relacionamentos: Lealdade ou Fidelidade. Recife. Disponível em: < http://www.psicologiaemanalise.com.br/2010/04/relacionamentos-lealdade-ou-fidelidade_28.html> Acesso em 27 out 2014.

STOLZE, Pablo Gagliano. Direito Civil. Responsabilidade Civil. 3º v. 12ª Ed. Saraiva: São Paulo, 2012.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Parte Geral. 1º v. 12º Ed. Atlas: São Paulo, 2012.

TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família Brasileiro. Disponível em: www.ibdfam.org.br. Acesso em 10 out 2014.

GUIMARÃES, Mariene Silveira. Adultério virtual, infidelidade virtual. Disponível em: www.ibdfam.org.br. Acesso em 27 out 2014

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Direito de Família. 6ª v. 9ª Ed. Saraiva: São Paulo, 2012.

BRASIL. Código Civil e Constituição Federal. 65. Ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

BRASIL. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 14. Ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

GIDDENS, Anthony. Sociologia. 4ª Ed. Artemed: Porto Alegre, 2005.

FARIA, Ernesto. Dicionário Escolar Latino-Português. 6ª Ed. FAE: Rio de Janeiro, 1992.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da Língua Portuguesa. 4ª Ed. Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 2002.

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5ª Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2009.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Teoria Geral do Direito Civil. 1º v. 24ª Ed. Saraiva: São Paulo, 2007.


[1]Graduando Ciências Sociais Aplicadas – Curso de Direito - UNIVAG, 9º Semestre – Noturno – DIR 10/2B

[2] Incesto é a relação sexual ou marital entre parentes próximos ou alguma forma de restrição sexual dentro de determinada sociedade.

CONTEÚDO aberto. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Incesto > Acesso em: 27 out 2014.

[3] Quantum debeatur: termo em latim que significa “o quanto se deve”

CONTEÚDO aberto. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_express%C3%B5es_jur%C3%ADdicas_em_latim>; Acesso em: 30 out 2014.

[4] STJ Súmula nº 43 - 14/05/1992 - DJ 20.05.1992

Correção Monetária - Ato Ilícito

Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo.

Disponível em: <http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stj/stj__0043.htm>; Acesso em 30 out 2014.

[5] A responsabilidade subjetiva constitui regra geral em nosso ordenamento jurídico, baseada na teoria da culpa. (TARTUCE, 2008, p. 228)


JOÃO PAULO MARTINS DE SOUZA BARBOZA


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