Possibilidade da prisão por alimentos pactuados em acordo entre os pais.
O principal motivo que nos levou à redação deste estudo de caso se refere à uma dúvida apresentada por uma mãe: Tenho um acordo de alimentos firmado com o pai da criança que ele não vem cumprindo. É possível o pedido de prisão?
Confesso que - já de pronto - minha primeira reação à pergunta seria a de responder "não", considerando a redação expressa do caput do art. 528 do Código de Processo Civil.
No entanto, ao realizar uma pesquisa de julgados sobre o tema, percebi que a questão envolve controvérsias e o que o Superior Tribunal de Justiça já se posicionou favoravelmente à prisão mesmo em execução lastreada em acordo extrajudicial.
E diante das divergências encontradas, se torna relevante a análise da decisão proferida pelo STJ no REsp: 1557248 MS 2015/0230134-1, julgado em 15.02.2018.
Qual a diferença entre o acordo extrajudicial e a decisão judicial que determina o pagamento de alimentos.
Antes de ingressar no tema sobre a possibilidade de prisão do devedor de alimentos com base em acordo particular descumprido, é importante destacar que a obrigação alimentar pode ter se originado de causas diferentes:
- Acordo de alimentos firmado entre os pais: Nesses casos, temos o denominado "título executivo extrajudicial” que pode ter natureza alimentar, mas foi firmado entre os pais, sem a homologação pelo Poder Judiciário;
- Decisão judicial sobre os alimentos: aqui se trata de uma decisão do próprio juiz homologando o acordo feito entre as partes ou - no caso de falta de acordo - determinando o pagamento de quantia certa para a prestação alimentar.
Vale a pena destacar que é importante que o acordo de alimentos firmado entre os pais seja realizado preferencialmente por escrito e preveja - além da quantia alimentar - temas adjacentes como: (i) correção monetária, (ii) valores em caso de emprego e desemprego, (iii) conta bancária para pagamento, (iv) data e encargos moratórios para os casos de descumprimento.
No entanto, mesmo com todas essas previsões, o acordo extrajudicial pode ser descumprido pelo devedor de alimentos, assim como as decisões judiciais que fixam o encargo alimentar.
E nesse caso, o que fazer? Podemos pedir a prisão?
A falta de pagamento da pensão pode gerar a prisão do devedor em qualquer situação?
A prisão do devedor de alimentos é uma medida de coação gravíssima cuja finalidade é justamente impelir o devedor a quitar o débito alimentar essencial à própria dignidade do alimentando.
Assim, considerada justamente a gravidade da medida, não são todas as situações que permitem o requerimento de prisão civil.
O nosso ordenamento jurídico prevê que a execução dos alimentos possa ser instaurada por dois procedimentos:
- O procedimento expropriatório: que visa a satisfação do débito alimentar através da constrição de bens do devedor e;
- O procedimento da prisão: permitido somente para a cobrança do período que compreende até as 03 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.
A execução que permite a prisão civil é aquela que - por escolha do beneficiário dos alimentos - é promovida sob o rito específico da prisão, o que afasta o cabimento do pedido para todas as prestações devidas pelo Alimentante.
Se a prisão civil só é possível para as execuções promovidas sob o rito da prisão, qual a dúvida da mãe da criança?
A controvérsia se consubstancia no fato de que o art. 528 do Código de Processo Civil - que prevê a hipótese de execução pelo rito da prisão - possui a seguinte redação:
Art. 528. No cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo.
Como se vê, em sua literalidade, o artigo dispõe que a execução sob o rito da prisão se refere àquelas demandas lastreadas em títulos judiciais (decisões judiciais), o que afastaria a possibilidade dos acordos particulares entre os pais ensejarem a penalidade de prisão.
Acontece que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp: 1557248 MS 2015/0230134-1, julgado em 15.02.2018 entendeu que:
4. A eleição do rito de execução por dívida alimentar é de livre escolha do credor, tanto na hipótese de versar sobre título judicial, como extrajudicial (arts. 528, §§ 3º e 8º, e 911 do CPC/2015).
Esse precedente permite a compreensão de que os acordos extrajudiciais, ou seja, aqueles celebrados entre os pais da criança sem a homologação do Poder Judiciário são instrumentos aptos à instauração da execução sob o rito da prisão desde que as parcelas estejam compreendidas no período de 03 (três) meses anteriores ao julgamento.
Caso não estejam, é possível que o credor dos alimentos também opte por cobrar os valores de forma fragmentada em procedimentos diversos ou mesmo peça a conversão do rito da prisão em expropriação, quando lhe aprouver.
Conclusões
Esclarecidos todos os pontos, esta análise teve o objetivo de demonstrar a controvérsia sobre a possibilidade da prisão civil da dívida alimentar lastreada em acordo extrajudicial e a posição do Superior Tribunal de Justiça, adotada no Recurso Especial de nº 1.557.248 - MS que reconheceu a possibilidade de execução sob este rito para títulos executivos extrajudiciais.
De fato, a interpretação adotada pela Corte Superior encontra guarida constitucional, uma vez que o princípio da paternidade responsável consta da Constituição Federal em seu art. 227, caput, e representa uma das facetas da dignidade humana, sendo um dos seus consectários o dever de prestar alimentos à prole.
Atenção! Esta publicação é meramente informativa. Não substitui uma consulta a um advogado para esclarecimentos de um caso específico.
Vanessa Moliani da Rocha é advogada no escritório Moliani da Rocha Advocacia com foco em direito das famílias e sucessões.
9 Comentários
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Parabéns pelo texto!
Aproveito para deixar uma dúvida de cunho pessoal, por não atuar na área: a prisão civil compele o pai a pagar a pensão, de fato, ou acaba por gerar mais dificuldade nesse pagamento? continuar lendo
Dra. Fernanda, muito obrigada!
O que eu percebo na prática é que compele, sim. Muitas demandas só tiveram algum resultado efetivo depois da decretação da prisão do devedor.
Agora, preciso lhe dizer que já houve casos de o devedor preferir ficar preso e mesmo assim não pagar a pensão. O percentual é muito baixo, mas existe.
Em regra, o rito da prisão costuma ser bem mais efetivo que o rito expropriatório. continuar lendo
Ah sim! Muito obrigada pelos esclarecimentos!
O importante é que os alimentos sejam quitados para o alimentando né? continuar lendo
Muito útil a diferença de julgados pactuados com as jurisprudenciais.
Grtato continuar lendo
Ivoowaldomachado Machado, muito obrigada! continuar lendo
Parabéns; bem explicadas, as duas situações. O RE 1.557.248/MS, aplicou os dispositivos contidos na Lei Adjetiva Civil.
A eleição do rito de execução por dívida alimentar é de livre escolha do credor, tanto na hipótese de versar sobre título judicial, como extrajudicial (arts. 528, §§ 3º e 8º, e 911 do CPC/2015).
A posição do Superior Tribunal de Justiça, adotada no Recurso Especial de nº 1.557.248 - MS que reconheceu a possibilidade de execução sob este rito para títulos executivos extrajudiciais. continuar lendo
Dr. Genival, é isso mesmo. Muito obrigada pela contribuição. continuar lendo
E ossivel atovar.a conta JUS BRASIL ativando minha CONTA CORRENTE5?
Pois eu
Não tenhao.cartao
De crdito sou servidor.público.ha.30 anos e gostaria. De ativar o JUS BRSAIL
MAS COMO hsbilitar
Com. Débito no carta? Isto epossivel continuar lendo
1renato 1santos, eu confesso que desconheço outra opção.
Acho que vale a pena enviar uma mensagem para o suporte do Jusbrasil para saber se eles podem liberar alguma outra modalidade. continuar lendo