Página 2507 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 13 de Setembro de 2019

ocorrido na cidade de São Paulo e que se tratava de “doublê”, sendo constatada em exame pericial, elaborado pela Polícia Técnica-Científica, a adulteração dos números do chassi e do motor (fls. 56/206). Assim, sustenta o autor que experimentou danos materiais, pois foi obrigado a devolver ao terceiro adquirente (Sr. Ernesto) o valor recebido, além de prejuízos de ordem moral pela aquisição de boa fé de veículo adulterado e pela suposta falha na inspeção veicular realizada pela ré. É incontroverso que o autor adquiriu do réu o veículo Toyota, em 18.10.2016, conforme o Certificado de Registro de Veículo e a Autorização para Transferência de Propriedade de Veículo, juntados a fls. 26, assim como é incontroversa a constatação pela autoridade policial de adulteração do chassi. Resta apurar se tal evento danoso é de responsabilidade ou não dos réus. DA RESPONSABILIDADE DA EMPRESA RÉ A ré foi contratada pelo autor para fazer a vistoria, sendo certa a aprovação do veículo em discussão, de acordo com o laudo por ela emitido, em 05.06.2017 (fls. 30/32). Certo ainda que, anteriormente à vistoria efetuada pela ré, o Detran/SP havia emitiu laudo, na data de 08.09.2016, aprovando o veículo (fls. 28). E a perícia elaborada pelo Instituto de Criminalística, em 09.06.2017, a que foi submetido o veículo em questão, no âmbito do inquérito policial, concluiu que as numerações do motor e chassi são oriundas de uma “marcação não original.” (fls. 128/133). Ao final do inquérito relatou a autoridade policial: “No dia da apreensão do veículo as gravações dos números do chassi e motor pareciam perfeitas, porém com o apoio da concessionária Toyota, juntamente com a equipe de perícia, através do equipamento módulo eletrônico, revelouse a numeração original do chassi, 9BRDWHEXF0234485, que pertence à placa FXX 7536/São Paulo, apurando ser produto de roubo na cidade de São Paulo, referente ao RDO- 54688/16, conforme Relatório de fls. 44. Com essas informações a perícia, mesmo com tratamento físico-químico adequado, constatou que os números do chassi e motor não eram originais, não conseguindo as numerações primitivas.” (fls.193). Diante desse quadro, é forçoso concluir que a adulteração do aludido chassi não era algo que se pudesse perceber desde logo num primeiro e superficial exame. Foi necessária a realização de perícia minuciosa, mediante a utilização de técnicas próprias e adequadas pelos peritos da Polícia Técnica-Científica, para a constatação da remarcação irregular e procedência do veículo, não permitidas às empresas de vistoria credenciadas pelo DETRAN, as quais realizam mera inspeção. Portanto, não pode se atribuir à empresa ré responsabilidade pela aquisição de um veículo clonado, pois apenas o inspecionou e emitiu o laudo, estando o automóvel na ocasião com a documentação e os caracteres de identificação aparentemente em ordem. Assim, não há elementos nos autos para o reconhecimento de falha na prestação de serviços por parte da empresa ré e do liame de causalidade com os supostos danos que autor alega ter sofrido. Nesse sentido: “RESPONSABILIDADE CIVIL PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS Danos morais e materiais atribuídos à empresa de vistoria veicular (...) MÉRITO - Provas dos autos indicam a inexistência de qualquer influência da parte da requerida na aquisição do veículo A adulteração no chassi só foi constatada pela polícia, através de métodos cuja utilização é vedada às empresas de vistoria credenciadas (...) Nexo de causalidade incomprovado Indenização indevida - Sentença mantida Apelo desprovido, com majoração dos honorários sucumbenciais (NCPC, art. 85, § 11).” (TJSP; Apelação Cível 100XXXX-50.2015.8.26.0019; Relator (a):José Wagner de Oliveira Melatto Peixoto; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro de Americana -2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/04/2017; Data de Registro: 12/04/2017); “RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. Danos Morais e Materiais. Afastada a pretensão à reparação pecuniária, eis que não configurado nexo de causalidade entre os prejuízos afirmados e a suposta imperícia do agente estatal que realizou a vistoria veicular, não detectando adulteração nos caracteres identificadores do motor. Ação improcedente. Precedentes. RECURSO DESPROVIDO.” (TJSP; Apelação Cível 100XXXX-52.2016.8.26.0081; Relator (a):Jarbas Gomes; Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Público; Foro de Adamantina -3ª Vara; Data do Julgamento: 13/06/2017; Data de Registro: 14/06/2017); “RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO APREENSÃO DE VEÍCULO OBJETO DE CRIME PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS Não cabimento - Estado que não é responsável pela procedência do veículo porque emitiu laudo positivo em inspeção veicular Vistoria que se restringe aos aspectos de regularidade formal Adquirente que deve tomar as cautelas necessárias na compra do bem Apreensão do veículo regular, tendo em vista a constatação, pelo Instituto de Criminalística, de sua adulteração Sentença mantida. Apelo não provido.” (TJSP; Apelação Cível 100XXXX-42.2018.8.26.0032; Relator (a):Spoladore Dominguez; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Público; Foro de Araçatuba -Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 14/08/2019; Data de Registro: 19/08/2019). Isto considerado, não há que se falar em reparação de danos, pelo que improcede a pretensão indenizatória em face da empresa ré. DA RESPONSABILIDADE DO RÉU FILLIPE Em relação ao réu Filipe, os pedidos são parcialmente procedentes. Restou evidenciado nos autos que o veículo adquirido pelo autor (fls. 26) e revendido a terceiro possuía a numeração do motor e do chassi adulteradas, sendo objeto de roubo. O veículo foi apreendido pela autoridade policial, razão pela qual o autor transacionou com o terceiro adquirente (Ernesto), reembolsando-lhe o montante recebido (fls. 204/206). Trata-se na hipótese de evicção, consubstanciada na perda pelo terceiro adquirente (Sr. Ernesto) da posse do veículo por ato administrativo (apreensão policial), em razão da adulteração constatada. Assim, porque respondeu pela evicção perante o terceiro, de forma amigável, nada impede ao autor que discuta o vício com o vendedor, isto é, com o réu Fillipe, podendo exigir dele a reparação pretendida. As ações indenizatórias, como no caso dos autos, não se confundem com as ações edilícias oriundas de vícios redibitórios, não havendo que se falar, portanto, em prazo decadencial. Como é sabido, a pretensão de reparação civil está sujeita à prescrição trienal, prevista no art. 206, § 3º, inc. V, do CPC, o que não ocorreu na espécie. No presente caso, não há prova nos autos que réu e autor soubessem da existência da adulteração no veículo e de que se tratava de produto de crime, quando de sua aquisição e revenda, ônus que não se desincumbiram as partes (art. 373, I e II, do CPC). Assim, restou configurada a boa fé de ambos nas negociações realizadas. No entanto, é dever do réu Fillipe restituir ao autor a importância por este desembolsada frente ao terceiro adquirente, em decorrência dos efeitos da evicção, podendo, do mesmo modo, se voltar contra quem lhe vendeu o veículo, a fim de ser ressarcido por eventuais prejuízos. A Jurisprudência: “ACÓRDÃO Compra e venda de veículos - Apreensão do bem pela autoridade policial devido a adulteração do chassi - Restrição ao direito de propriedade que legitima deferir o direito da evicção - Provimento para, afastada a preliminar de ilegitimidade passiva, julgar, na forma do art. 515, § 3º, do CPC, procedente, em parte, a ação. Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO Nº 875.762-2, da Comarca de OSASCO, sendo apelante ANDREIA ALECRIM ROCHA e apelado CLAUDEMIR BATISTA DE OLIVEIRA VEÍCULOS. ACORDAM, em Décima Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada Civil, por votação unânime, dar provimento, em parte, ao recurso. (...) A compra e venda é um contrato bilateral marcado pela equivalência das obrigações recíprocas; o comprador paga o preço ajustado para receber a coisa objeto da negociação, dentro das expectativas contratuais. O art. 481, do CC de 2002, é bem claro em definir os deveres dos contratantes, sendo que o art. 447, do CC, admite a responsabilidade pela evicção. Esclareceu GUILHERME ALVES MOREIRA [Instituições do Direito Civil Português, Coimbra, 1925, II, p. 589] que a palavra evicção deriva do “latim e-vincere, e-victus, significava entre os romanos o fato de uma parte decair judicialmente. E no moderno direito a evicção, em sentido próprio, significada ainda a perda de uma coisa em consequência de sentença judicial, sendo assim privado dessa cousa, por um terceiro que a ela tinha direito, quem a havia adquirido”. E a esse respeito convém registrar que o sistema jurídico se mantém atualizado com o dever de reciclagem que a dinâmica da vida o obriga a manter, uma necessidade para não perder a sua função de bem solucionar os problemas palpitantes da sociedade contemporânea. Essa constante revitalização fez com que a jurisprudência passasse a dispensar a sentença judicial para o exercício da evicção em caso de venda de carro furtado ou

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