Página 1877 do Diário de Justiça do Estado do Maranhão (DJMA) de 25 de Setembro de 2020

público, que passa a exigir das decisões nas esferas administrativas – além de judiciais e de controladoria –, diversas medidas de validação das soluções de demandas no âmbito da administração pública, tendo a Lei 13.726/2018 trazido orientação para a racionalização de atos e procedimentos, além de estimular medidas que visem à desburocratização e à simplificação para melhoria do atendimento. Partindo-se do princípio de que não existe norma inútil, a compreensão adequada da validade desses dispositivos é a de que se devem empreender os esforços necessários para solução extrajudicial dos conflitos, sendo essas medidas garantia do preceito constitucional do ACESSO à Justiça, distinto da EXCLUSIVIDADE DE ACESSO ao Judiciário. Note-se que o uso do meio adequado não é uma faculdade, mas verdadeira obrigação, como acentua a Lei 13.460/2017: Art. 8º São deveres do usuário: I – utilizar adequadamente os serviços (...); É assim que Thamay e Rodrigues introduzem a condição da ação de interesse de agir, como necessidade e adequação do provimento solicitado, deixando evidenciada essa exigência reproduzindo Ada Pellegrinini Grinover, que disse: Embora nem sempre claramente apontado, outro requisito exsurge, para configuração do interesse de agir: a adequação do provimento e do procedimento. O Estado nega-se a desempenhar sua atividade jurisdicional até o final, quando o procedimento pedido não é adequado para atingir o escopo, no caso concreto (pág. 268). Retorno ao RE 63124022 para trazer a visão do seu relator quanto aos aspectos de validação do interesse de agir, a saber, utilidade, adequação e necessidade, fazendo apego a este último para questionar se era necessária a propositura da demanda. Conceitua o Min. Luis Roberto Barroso: A necessidade, por fim, consiste na demonstração de que a atuação do Estado-Juiz é imprescindível para a satisfação da pretensão do autor. Nessa linha, uma pessoa que necessite de um medicamento não tem interesse em propor ação caso ele seja distribuído gratuitamente. Portanto, revela-se compatível o princípio do acesso à justiça ou da inafastabilidade da prestação jurisdicional, e a observação de cumprimento de pressupostos à propositura de uma demanda e como confirmam os precedentes do Supremo Tribunal Federal nos Recursos Extraordinários nº 631.240 e nº 839.353, que enfrentaram o antecedente do processo administrativo como preenchimento de condição para propositura da ação, prestigiando o pressuposto do interesse na prestação do serviço jurisdicional. Nas demandas de relação de consumo também se assegura aos consumidores uma via simplificada para exigirem dos fornecedores que respondam pelos vícios que deram causa, inclusive se praticados sem a ciência destes, que não podem recorrer a esse argumento para eximir-se de responsabilidade (art. 23, CDC). Contudo, não pode esperar que o fornecedor corrija erro sem que seja dado conhecimento do vício, quando sequer lhe tenha sido dada as opções de solução previstas nos arts. 18, 19 e 20 da Lei 8.078/90, cujo entendimento pela devolução de valores não eliminam eventuais direitos de danos. Não houve, como revelado pelos fundamentos mencionados antes, uma criação de um pressuposto pelo Poder Judiciário do Estado do Maranhão, como o que se chegou a cogitar, que se estaria diante de uma violação de hierarquia legislativa. Conforme se nota da Resolução 432017 do Tribunal de Justiça do Maranhão, o que se prestigia é a oportunidade da demonstração de uma pretensão resistida, ou seja, que se aponte uma tentativa de solução do conflito antes da propositura da demanda, até para que se ponha em atividade a máquina estatal de solução de conflitos, assegurando maior eficiência no processo judicializado. Não impede a validade de sua determinação a imprevisão legal do elenco do CPC, como anota CAMPOS: A indeterminação na hipótese fática sobre a qual o princípio da eficiência incidirá não lhe retira o caráter normativo e, portanto, impositivo (...). Dessa maneira, a cláusula geral da eficiência processual possui uma indeterminação no antecedente, isto é, na hipótese fática sobre a qual incidirá a norma jurídica resultado de sua interpretação. Essa indeterminação se dá pela utilização de um conceito jurídico indeterminado, qual seja, o agir com eficiência (pág. 107). No Recurso Extraordinário 631240, o Min. Roberto Barroso consignou na ementa que (6) nas ações ajuizadas até aquela data, sem que tivesse ocorrido prévio requerimento administrativo, em que ainda não houvesse contestação de mérito, (7) elas deveriam ser sobrestadas por 30 dias, para que o interessado comprovasse a entrada em um pedido administrativo. O direito de buscar o Estado para assegurar a proteção de direito contra ameaça ou lesão não decorre apenas do cometimento de fato prejudicial, mas da ineficácia do empenho disponível, e do desforço desenvolvido pelo prejudicado na reversão da ocorrência. Também não se deve transcender para além da ação necessária para retorno do direito e suas reparações, sob pena de ultrapassar o limite do razoável, produzindo-se, com o ato defesa, lesão a outrem. O reconhecimento de aplicação de um mecanismo eficiente para solução mais célere e econômica das demandas importou na aprovação pelo Plenário do TJMA do DPA 532017, de 27.02.2017, que implantou o Programa de Estímulo ao Uso dos Meios Virtuais de Soluções de Conflitos. A Resolução 432017 é proveniente da implantação de uma Política Nacional do Judiciário para o tratamento adequado de conflitos, idealizada pelos Pactos firmados pelos Poderes da República, e consolidada pelo Conselho Nacional de Justiça através da Resolução 125, de 29.11.2010, alterada pela Emenda n. 2/2016, que estabeleceu a possibilidade de uso de sistema de mediação e conciliação digital para tratamento pré-processual de conflitos ou demandas em curso (art. 4º, 5º, e 6º, inc. X), o que está em consonância com o § 7º, do art. 334 do Código de Processo Civil de 2015. Bastante pertinente aqui a ponderação constante da Recomendação CNJ nº 31/2010, que orienta pela inclusão de informações técnicas para análise eficiente das demandas de saúde, inclusive com a sugestão da oitiva de representantes da demanda, antes da apreciação de tutelas. Ademais, evidenciando a eficiência como norma jurídica, com adoção impositiva de certos comportamentos, CAMPOS esclarece: Com efeito, para que a atuação do juiz seja eficiente [...] é preciso que a atuação [...] se dê numa perspectiva de gestão do processo, com a adaptação do procedimento às peculiaridades do direito material discutido, sem dilações indevidas e com a escolha dos meios mais econômicos (pág. 63). Originariamente, focada na facilitação do diálogo entre as pessoas, as linhas de atendimento aos clientes é uma obrigatoriedade do fornecedor de produtos e serviços que devem prestar informações e atender aos reclames dos consumidores, como regula o Código de Defesa dos Consumidores. Os meios para tal diálogo podem ser pelo atendimento pessoal ou com uso de mecanismos de tecnologia. Dentre as diversas ferramentas que asseguram o acesso ao contato Consumidor – Produtor/Fornecedor, as Plataformas Digitais recomendadas pela Resolução TJMA 432017 são de responsabilidade de entidades do Poder Público (consumidor.gov, do Ministério da Justiça; mediação/digital, do CNJ), sendo um instrumento de diálogo em que o usuário, após cadastro pessoal, formaliza seu registro de reclamação e pedido de providência, sendo-lhe oferecido, em até 10 dias, uma proposta de solução para, sob análise própria ou sob orientação de advogado, poderá manifestar aceitação ou oferecer contraproposta com até igual prazo de tempo, ou seja, com maior tempo e oportunidade de consulta quando comparada a uma audiência. No estudo dos Meios Eletrônicos para Solução de Conflitos – MESC, Eckschmidt et al. esclarecem: Os MESC são um processo de solução de conflitos que se estrutura em ferramentas eletrônicas que promovem a comunicação, interação e formalização de maneira eficiente (p.e. baixo custo), conveniente (p.e. não presencial e previsível em custo e prazo) e aplicável (à questão em disputa), garantindo autenticidade (veracidade das partes envolvidas), privacidade (conteúdo protegido de terceiros não envolvidos), e exequibilidade (o resultado do conflito é exequível e exigível perante a lei) (grifos originais) (pág. 106). A previsão legal estabelecida para uso dos meios eletrônicos para solução alternativa de conflitos está inscrita no § 7º, art. 334 do CPC/2015, art. 46 da Lei 13.140/2015, e com especial destaque para o art. 18-A da Resolução CNJ 125/2010, com Emenda nº 2/2016, consoante o novo CPC, que assim estabelece: Art. 18-A. O Sistema de Mediação Digital ou a distância e o Cadastro Nacional de Mediadores Judiciais e Conciliadores deverão estar disponíveis ao público no início de vigência da Lei de Mediação. Não é de hoje que se admite a homologação de acordos extrajudiciais (art. 57, Lei 9.099/95), situação que se vê consolidada pela Resolução 125/2010 do CNJ, que admite no parágrafo único do art. 1º, a incumbência de oferta de mecanismos de soluções de controvérsias, sem especificações de suas modalidades, apenas indicando ser o meio consensual, por mediação e conciliação, preferenciais, não havendo exclusão de qualquer tipo. Assim, não existe nenhum óbice a que um mecanismo de diálogo como o consumidor.gov seja o instrumento de solução de controvérsias válido e estimulado diante de sua praticidade, economia e acessibilidade. Desta feita, tenho que o processo deve ser extinto sem resolução de mérito por ausência total de pedido na via administrativa, o que acarreta a falta de uma das condições da ação – interesse de agir – na modalidade necessidade, pois, se não há nenhum imposição de obstáculo para o recebimento e apreciação do pleito administrativo, não há direito resistido, não se aperfeiçoando a lide, doutrinariamente conceituada como um conflito de interesses caracterizado por uma pretensão resistida. Às vezes basta um simples pedido administrativo para uma resolução rápida à situação tida por problemática pela parte autora. Um primeiro pedido negado ou não analisado em grau administrativo é o mínimo que deve ser exigido, sob pena de se permitir que a parte requerida responda a processo sem lide, sem ter resistido contra qualquer pretensão e acabe arcando com o ônus de sucumbência sem justo motivo, além de movimentar advogados e o Poder Judiciário local, com todo um custo econômico e de tempo na movimentação das pessoas que trabalham nesse processo, sem falar no incentivo à indústria do dano moral. Utilizar diretamente o Poder Judiciário como se já existisse conflito em relação a um pedido que nunca foi formalmente feito, muito menos indeferido, é inaceitável. Ante o exposto, acolho a preliminar de falta de interesse de agir arguida e, consequentemente, JULGO EXTINTO O PROCESSO, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC. Decorrido o trânsito em julgado, arquive-se. Sem custas nem honorários, ex vi, do art. 55 da Lei 9.900/95, pois não vislumbro litigância de má-fé. P. R. I. C. Santa Inês/MA, data do sistema. Alexandre Antônio José de Mesquita Juiz Titular da 3ª Vara respondendo pelo Juizado.

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