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Curso de Processo Civil - Ed. 2023

Curso de Processo Civil - Ed. 2023

3.1.1.. O Direito de Ação Como Direito Abstrato e Sua Proteção Constitucional

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Sumário:

O ordenamento processual necessita de instrumentos para garantir e concretizar a previsão do art. 5º, XXXV, da CF/88. O exercício da tutela jurisdicional como meio de proteção integral ao cidadão depende da previsão de institutos que possam operacionalizar a prevenção de ilícitos e/ou reparação de danos. Cabe analisar, em primeiro plano, o direito de ação, na medida em que representa o instrumento essencial para a postulação da tutela jurídica. Sua construção e seu funcionamento merecem exame aprofundado, pois, sem ele, a sociedade estaria à mercê da autotutela como meio de satisfação dos interesses conflituosos. O direito de ação desenvolve-se por meio dos atos processuais, cujo encadeamento forma a relação jurídico-processual, e que são vocacionados para viabilizar a marcha processual e o cumprimento do art. do CPC, com a entrega não só da tutela de cognição, mas também da tutela executiva, quando necessária.

3.1. O direito de ação em sua projeção constitucional

A jurisdição civil é exercida pelos juízes e tribunais e por meio do direto de ação (art. 16 do CPC). O direito de ação consiste em instituto fundamental do processo civil e pode ser compreendido em sua dimensão material e processual. Essa distinção foi captada com maestria por Pontes de Miranda. 1 A ação material e a processual convivem no sistema jurídico. Em um primeiro momento, prevaleceu a ação material marcada pela autotutela e que ainda se encontra no sistema jurídico atual por meio do desforço pessoal (art. 1210, § 1º, do CCB). Com o surgimento do Estado-Juiz, a ação processual assumiu a posição de destaque como meio racional para a solução dos conflitos, com sua previsão constitucional.

Como direito fundamental de postulação (art. 17 do CPC), o direito de ação permite que a parte (autor, réu, terceiro) possa invocar a tutela jurisdicional para a defesa de suas pretensões em juízo. O direito de ação não está condicionado, a priori , à demonstração do direito material. Trata-se de direito fundamental protegido pelo art. 5º, XXXV, da CF/1988. Essa visão pode ser considerada predominante e progressiva e não importa abandono ou negação de noções clássicas relacionadas à teoria da ação ou da jurisdição. 2

Como direito fundamental instrumental , o direito de ação decorre de uma noção básica e elementar. De nada adiantaria a previsão de garantias fundamentais para a tutela de direitos materiais sem a presença de um instrumento que garantisse a eficácia e permitisse o equilíbrio social, sob a óptica vertical e horizontal. É a missão destinada ao direito de ação.

Sob a óptica vertical, visualiza-se a força do império estatal, que é essencial para a manutenção da ordem social. A formação do Estado Democrático Moderno, com sua estruturação após a Revolução Francesa, representou uma vitória contra o despotismo esclarecido do soberano. O Estado pós-Revolução necessita de uma nova fonte de legitimação do poder, para a consolidação da soberania estatal, antes projetada na figura do príncipe, ou seja, no primeiro homem do reino (Herrscher). 3 O conceito de soberania atrela-se a um novo modelo formulado por Rousseau, ligado à concepção de soberania popular, na qual cada indivíduo é detentor do poder (Träger) e responsável pela legitimação da fonte estatal de ordenação social e política. 4

É notório o fracasso dessa concepção na formação do Estado Liberal do século XIX. O período do individualismo gerou a necessidade de novo fortalecimento do Estado no século XX, o que provocou nova tensão entre a esfera pública e a privada. A necessidade de intervenção estatal era óbvia, e a proteção da esfera individual era essencial, representando conquista que não poderia mais ser abdicada. Foi Jellinek quem formulou a teoria do Status como modelo embrionário para o nascimento dos direitos fundamentais, ao limitar o Estado ao próprio Direito, como meio de proteção do indivíduo (kein Staat ist ohne Recht möglich). 5 A necessidade de limitar a atividade estatal, após a II Guerra Mundial, intensificou-se com a introdução dos direitos fundamentais para a proteção da vida e da integridade do ser humano perante os textos constitucionais modernos. 6

O mesmo deve ser dito sob a óptica horizontal. O conflito marcado pela disputa entre particulares exige a presença do direito de ação como meio de organizar a disputa e permitir a prevalência da lei sobre a força. As diversas relações jurídicas que podem ser estabelecidas entre as partes permitem que pontos controversos possam ser esclarecidos pelo Poder Judiciário por meio do exercício do direito de ação.

A natureza constitucional do direito de ação é indiscutível, e a leitura do art. 5º, XXXV, da CF/1988 demonstra sua previsão como garantia fundamental do jurisdicionado: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. O dispositivo constitucional revela que toda pessoa tem direito de acesso ao Poder Judiciário como meio de pedir a intervenção do Estado para a composição do conflito, tenha ele natureza preventiva ou reparatória .

Isso não significa que o jurisdicionado não possa renunciar ao direito de ação. Trata-se de um direito e não de uma imposição. Por esse motivo, entendemos absolutamente possível a renúncia por meio de negócio jurídico processual (art. 190 do CPC), na modalidade de pacto de non petendo . 7 A mesma solução se aplica na escolha da arbitragem, que corresponde a uma renúncia ao exercício do direito de ação perante o juiz togado.

3.1.1. O direito de ação como direito abstrato e sua proteção constitucional

O direito de ação representa o direito subjetivo público de pleitear a tutela jurídica do Estado. 8 A parte tem o direito à prolação de uma sentença de mérito que assegure a declaração e a satisfação do seu direito em tempo razoável (art. do CPC). O pedido formulado pela propositura da ação é dirigido ao Estado (gegen den Staat). 9 É por esse motivo que a relação processual assume natureza trilateral e pública (autor-Estado-réu). 10 Aqui se percebe a diferença no que tange ao direito privado, no qual a relação jurídica é travada entre as partes, sem interferência imediata do Estado.

Os argumentos contrários, especialmente dos defensores das condições da ação, quanto à possibilidade de multiplicação de processos infundados são absolutamente incoerentes. O exercício abstrato do direito de ação não impede que o juiz possa proferir sentença de mérito ou processual na fase inicial, ou mesmo intermediária, do processo. O fato de “concreção” que seria destinado magicamente às condições da ação é realizado do mesmo modo perante sistemas que não o adotam por técnicas de julgamento liminar ou sumário. Embora não exista estatística, a experiência de duas décadas na Magistratura permite informar que na maioria esmagadora dos casos as decisões proferidas em fase inicial ou intermediária pelo juiz com base na carência de ação são reformadas. E o motivo é simples: a necessidade de maturação probatória, para uma análise adequada do direito material invocado . Em suma: as condições da ação estão indissociavelmente ligadas ao mérito. Na fase atual, em que se buscam celeridade e efetividade, a permanência das condições como categoria autônoma é indesejável.

Em sistemas que não adotam as condições, a inexistência de ilegitimidade ad causam , por exemplo, ao invés de ser causa de extinção do processo por ausência de uma condição da ação, seria causa para julgamento liminar de improcedência, com análise do mérito, propiciando a estabilização da …

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jusbrasil.com.br
1 de Junho de 2024
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/3541-o-pedido-mediato-e-imediato-354-o-pedido-curso-de-processo-civil-ed-2023/2208838783