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27 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

FERNANDO BRASIL DE OLIVEIRA PINTO

Documentos anexos

Inteiro TeorCARF__16561720050201748_c5a4c.PDF
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Inteiro Teor

Processo nº 16561.720050/2017-48

Recurso Especial do Procurador e do Contribuinte

Acórdão nº 9101-006.779 - CSRF / 1a Turma

Sessão de 05 de outubro de 2023

Recorrentes VOTORANTIM S.A.

FAZENDA NACIONAL

ASSUNTO: PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL

Ano-calendário: 2012

RECURSO ESPECIAL. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CARACTERIZADA. NÃO CONHECIMENTO.

Não se conhece de recurso especial cuja divergência suscitada está amparada na análise de circunstâncias fáticas distintas nos acórdãos recorrido e paradigmas apresentados.

RECURSO ESPECIAL. DECISÃO QUE UTILIZARAM FUNDAMENTOS DIVERSOS. NÃO CONHECIMENTO.

Não se conhece do recurso especial quanto os julgados cotejados utilizaram fundamentos legais diferentes para decidir. No caso dos autos, os paradigmas apresentados não se valeram do previsto no art. 16, § 2º, II da Lei nº 9.430/1996 para aferir a validade dos documentos apresentados.

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ)

Ano-calendário: 2012

BRASIL-ÁUSTRIA. BRASIL-ARGENTINA. TRATADOS PARA EVITAR DUPLA TRIBUTAÇÃO. TRIBUTAÇÃO DO LUCRO DA CONTROLADORA NACIONAL. AUSÊNCIA DE ANTINOMIA.

Não há incompatibilidade entre os tratados internacionais para evitar dupla tributação e a aplicação do art. 74 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001. No caso concreto, os Tratados firmados entre Brasil e a Áustria e entre o Brasil e a Argentina não impedem a tributação do resultado de empresa domiciliada no Brasil em função de sua renda obtida por intermédio de sua participação em sociedades domiciliadas no exterior.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em não conhecer do Recurso Especial da Fazenda Nacional e por conhecer do Recurso Especial do Contribuinte. Votaram pelas conclusões os conselheiros Luis Henrique Marotti Toselli, Luciano Bernart,

Original

DF CARF MF

Fl. 1349

Fl. 2 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Guilherme Adolfo dos Santos Mendes, Viviani Aparecida Bacchmi e Maria Carolina Maldonado Mendonça Kraljevic. No mérito, por voto de qualidade, acordam em negar-lhe provimento, vencidos os conselheiros Luis Henrique Marotti Toselli, Luciano Bernart, Viviani Aparecida Bacchmi e Maria Carolina Maldonado Mendonça Kraljevic que votaram por dar provimento. Manifestou intenção de apresentar declaração de voto o conselheiro Luis Henrique Marotti Toselli. Julgamento realizado após a vigência da Lei nº 14.689/2023, a qual deverá ser observada quando do cumprimento da decisão.

(documento assinado digitalmente)

Fernando Brasil de Oliveira Pinto - Presidente em exercício e Relator

Participaram do presente julgamento os Conselheiros: Edeli Pereira Bessa, Luis Henrique Marotti Toselli, Luiz Tadeu Matosinho Machado, Maria Carolina Maldonado Mendonça Kraljevic (suplente convocada), Guilherme Adolfo dos Santos Mendes, Viviani Aparecida Bacchmi, Luciano Bernart (suplente convocado) e Fernando Brasil de Oliveira Pinto (Presidente em exercício).

Relatório

Trata-se de Recursos Especiais interpostos pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e pela Votorantim S.A. em face do Acórdão nº 1302-004.272, de 22/01/2020 (fls. 1.064 a 1.093) cuja ementa, e respectivo dispositivo, restaram assim redigidos:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ)

Ano-calendário: 2012

PROCESSUAL. LUCROS APURADOS NO EXTERIOR. INCOMPETÊNCIA DA FISCALIZAÇÃO BRASILEIRA PARA AUDITAR AS DEMONSTRAÇÕES DE EMPRESA ESTRANGEIRA.

É impossível, por falta de competência legal, promover-se a glosa de valor utilizado para reduzir o montante do lucro líquido de companhia estrangeira e devidamente informado em suas demonstrações financeiras, já que isso só caberia a Autoridade Fiscal do país sede daquela empresa, até mesmo porque, se tal glosa fosse possível, deveria ser fundamentada na lei do Estado Estrangeira e não em mera pesquisa feita em "literatura especializada" pela Autoridade Fiscal brasileira.

BRASIL-ÁUSTRIA. BRASIL-ARGENTINA. TRATADOS PARA EVITAR DUPLA TRIBUTAÇÃO. TRIBUTAÇÃO DO LUCRO DA CONTROLADORA NACIONAL. AUSÊNCIA DE ANTINOMIA.

Não há incompatibilidade entre os tratados internacionais para evitar dupla tributação e a aplicação do art. 74 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001. No caso concreto, os Tratados firmados entre Brasil e a Áustria e entre o Brasil e a Argentina não impedem a tributação do resultado de empresa domiciliada no

Original

DF CARF MF

Fl. 1350

Fl. 3 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Brasil em função de sua renda obtida por intermédio de sua participação em sociedades domiciliadas no exterior.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em afastar a alegação de ilegalidade da MP. 2158/2001 e, no mérito, em negar provimento ao recurso voluntário quanto à tributação dos lucros da empresa controlada indireta na Argentina (Acergroup). Acordam, ainda, por voto de qualidade, em negar provimento ao recurso quanto à tributação dos lucros da empresa controlada na Áustria (Votorantim GmbH), vencidos os conselheiros Gustavo Guimarães da Fonseca (relator), Flávio Machado Vilhena Dias e Marcelo José Luz de Macedo. Por unanimidade de votos, acordam em dar provimento ao recurso para reconhecer o direito à compensação dos tributos pagos pela empresa controlada Votorantim GmbH e em negar provimento ao recurso quanto a incidência de juros sobre a multa. Acordam também, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de ofício, votando o conselheiro Ricardo Marozzi Gregório pelas conclusões do relator. Designado para redigir o voto vencedor o conselheiro Paulo Henrique Silva Figueiredo.

A exigência em discussão no processo refere-se a autos de infração de IRPJ e CSLL em decorrência da verificação da existência de lucros auferidos no exterior no ano- calendário de 2012 por controladas da Contribuinte cujos valores não foram incluídos pela autuada na apuração do Lucro Real e da base de cálculo da CSLL.

A discussão diz respeito à aplicação, ou não, do previsto no art. 74 da MP nº 2.158-35/2001, considerando-se que há tratados firmados entre Brasil e os países (Áustria e Argentina) onde estão sediadas as coligadas da Recorrente para fins de evitar dupla tributação de renda.

Remanesce, igualmente, a discussão sobre a compensação de imposto pago no exterior, objeto de recurso especial da Fazenda Nacional.

O Sujeito Passivo apresentou Impugnação, arguindo, essencialmente, que não teria ocorrido o fato gerador do IRPJ e da CSLL; que o disposto no art. 74 da MP nº 2.158- 35/2001 padece de ilegalidade; e que a autuação não deveria prosperar já que deveria prevalecer o previsto nos tratados internacionais para evitar a bitributação celebrados entre o Brasil e os países acima mencionados.

Requereu, ainda, a compensação de valores que afirma ter pago no exterior (Áustria), bem como o aproveitamento de saldo de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa

Analisando a Impugnação apresentada, a turma julgadora de primeira instância considerou-a parcialmente procedente para reduzir a base tributável auferida pela empresa Votorantim Gmbh, domiciliada na Áustria.

Inconformado, o Sujeito Passivo interpôs Recurso Voluntário que foi parcialmente provido para, na parte que ainda interessa à presente lide, reconhecer o direito à compensação dos valores pagos pela controlada Votorantim Gmbh.

Original

DF CARF MF

Fl. 1351

Fl. 4 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Cientificada do acórdão de recurso voluntário, a Fazenda Nacional manejou embargos declaratórios que foram rejeitados, conforme despacho de fls. 1.103 a 1.109.

Os autos foram encaminhados em 16/04/2020 (fl. 1.110) para ciência do despacho que rejeitou os embargos declaratórios pela PGFN. O art. 79 do Anexo II do RICARF determina que o "Procurador da Fazenda Nacional será considerado intimado pessoalmente das decisões do CARF, com o término do prazo de 30 (trinta) dias contados da data em que os respectivos autos forem entregues à PGFN, salvo se antes dessa data o Procurador se der por intimado mediante ciência nos autos". Portanto, a PGFN foi considerada fictamente intimada em 16/05/2020. Antes disso, em 27/04/2020 (fl. 1.126), apresentara tempestivamente o Recurso Especial de fls. 1.111 a 1.125.

O Despacho de Admissibilidade de fls. 1.129 a 1.135 admitiu parcialmente o Apelo Fazendário, nos seguintes termos:

1) DA COMPROVAÇÃO DO RECOLHIMENTO NO EXTERIOR

Sobre a matéria objeto dessa divergência interpretativa, a recorrente afirma o seguinte, in verbis:

Para satisfazer esta exigência de comprovação de dissídio jurisprudencial, apresenta-se o acórdão nº 1101-000.892, cuja ementa segue integralmente transcrita:

(...)

IMPOSTO DE RENDA PAGO NO EXTERIOR. COMPROVAÇÃO. EXIGÊNCIAS LEGAIS.

Os documentos que comprovam o recolhimento do imposto de renda pago no exterior devem guardar estrita consonância com o Contribuinte brasileiro, devem ser traduzidos para o português e consularizados, em atenção ao disposto no § 6º do artigo 129 e artigo 148, ambos da Lei n.º 6.015/1973.

Para melhor demonstrar a divergência, convém transcrever o seguinte trecho do precedente acima:

"Outrossim, não consta dos autos qualquer documento que certifique a consularização perante o Ministério de Relações Exteriores do Brasil, através de seus consulados. Documentos estrangeiros, para terem validade e serem reconhecidos no Brasil, necessitam ser primeiramente consularizados em repartição Consular brasileira que tenha jurisdição sobre o Departamento em que os mesmos foram emitidos ou expedidos."

Nesse mesmo sentido, segue o paradigma a seguir:

(...)

Acórdão nº 1401-003.052 - 4a Câmara / 1a Turma Ordinária (...)

Original

DF CARF MF

Fl. 1352

Fl. 5 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

COMPENSAÇÃO. IMPOSTO PAGO NO EXTERIOR. REQUISITOS. O artigo 26 da Lei 9.249/1995 estabelece requisitos para que se aceite a dedução do imposto pago no exterior, impondo, dentre outros, que o documento relativo ao imposto estrangeiro seja reconhecido pelo respectivo órgão arrecadador e pelo Consulado da Embaixada Brasileira no país em que for devido o imposto. A não observância de tal formalidade impede a respectiva compensação. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

Quanto à prova de recolhimento de imposto de renda no exterior, o colegiado a quo dispensou a exigência de autenticação dos documentos estrangeiros pelo Consulado da Embaixada Brasileira em que devido o imposto.

De outro lado, a 1a Turma Ordinária da 1a Câmara da 1a Seção de Julgamento do CARF e a 1a Turma Ordinária da 4a Câmara da 1a Seção de Julgamento do CARF, nos acórdãos paradigmas, entenderam que os documentos estrangeiros devem necessariamente ser consularizados, para o efeito de comprovar o recolhimento de imposto devido no exterior. Deste modo, fica comprovada a divergência sobre a matéria.

(...)

Em breve síntese, alega a recorrente que (i) enquanto no acórdão recorrido entendeu-se que não é necessária a autenticação, pelo Consulado da Embaixada Brasileira, dos documentos apresentados pelo sujeito passivo com vistas a comprovar que teria pago tributo no exterior, (ii) nos acórdãos apontados como paradigmas, nos XXXXX-000.892 e 1401-003.052, entendeu-se que essa formalidade é necessária.

Pois bem, sobre o assunto consta o seguinte no voto condutor do acórdão recorrido, in verbis:

A luz do que foi decidido anteriormente, diga-se, os pedidos sucessivos deduzidos pela recorrente estariam irremediavelmente superados. Nada obstante, e até pelo fato de saber que a posição majoritária deste Colegiado diverge, em substância e conclusão, daquele anteriormente proposta, tomo a liberdade de tecer algumas considerações, em especial, acerca do pleito da empresa concernente à compensação dos tributos porventura pagos pela controlada Votorantim GmbH à Áustria . (g.n.)

Com efeito, diga-se, a empresa não trouxe aos autos os comprovantes de recolhimento do imposto pago no exterior (e, por conseguinte, e por óbvio, não os consularizou, na forma do art. 26, § 2º, da Lei 9.249/95). Os únicos documentos apresentados, diga-se, restringem-se, como descrito no relatório que precede este voto, à: (g.n.)

a) um parecer de escritório austríaco explicando o tratamento legal do imposto de renda pela legislação austríaca e atestando o pagamento do tributo pela empresa lá sediada;

b) um extrato "da conta fiscal das Votorantim GmbH";

Original

DF CARF MF

Fl. 1353

Fl. 6 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

c) extratos de pré-pagamento do IR austríaco; e

d) algumas decisões administrativas que se reportariam à apuração e recolhimento do imposto naquele país).

Todos os documentos mencionados acima se encontram juntados à impugnação da empresa, particularmente à e-fls. 696/720, devidamente acompanhados de tradução juramentada.

Como é sabido, a Lei 9.430/96, por seu art. 16, § 2º, II, amenizou as exigências contidas no art. 26, § 2º da Lei 9.249/95, dispensando-se, pois, a autenticação dos comprovantes de pagamento por meio de autoridade consular se, e quando, o contribuinte demonstrar que "a legislação do país de origem do lucro, rendimento ou ganho de capital prevê a incidência do imposto de renda que houver sido pago, por meio do documento de arrecadação apresentado". Notem que a dispensa realizada pelo preceptivo em exame cinge à desnecessidade de consularização dos comprovantes e não da apresentação destes, propriamente. E, como dito, os documentos exibidos não são, até segunda ordem, comprovantes de pagamento do imposto.

Nada obstante, a força probatória dos elementos apresentados pela insurgente é inegável... os extratos de pré-pagamento, diga-se, foram emitidos por instituições bancárias e as explicações constantes do parecer tratado em a, supra, dão conta de que tais "pré-pagamentos" se assemelhariam às nossas estimativas. Outrossim, as cópias das decisões administrativas trazidas (cuja autenticidade não foi, em qualquer momento, questionada, nem pela Autoridade Lançadora e nem pela DRJ), parecem dar credibilidade aos registros apostos no extrato tratado em b e à assertiva contida no precitado parecer quanto ao efetivo recolhimento das exações à Áustria.

É óbvio que quando a Lei exige a exibição de documento que comprove o efetivo pagamento do tributo, ela está se referendo a qualquer documento e não, e tão somente, guias de recolhimento.

Os extratos e as decisões colacionadas, se não se questionadas a sua autenticidade, comprovam o pagamento do IR Austríaco e asseveram, mais, a efetiva exigência deste tributo pelo mencionado País.

Assim, e caso seja superada a tese central abordada no tópico I.3, supra, seria, realmente, de se acatar o pedido sucessivo em exame para se autorizar a compensação dos valores comprovados pelos documentos ora apreciados do valor remanescente do crédito tributário (já que a DRJ, como lá alardeado, reduziu sobremaneira o montante originariamente lançado). (g.n.)

(...)

Pelo cotejo entre o acórdão recorrido e os acórdãos paradigmas (vide trechos anteriormente transcritos, bem como seu inteiro teor) é possível verificar que a recorrente logrou êxito em demonstrar que entre esses julgados há divergência interpretativa no que concerne à necessidade de autenticação, pelo Consulado da Embaixada Brasileira, dos documentos apresentados

Original

DF CARF MF

Fl. 1354

Fl. 7 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

pelo sujeito passivo para fins de comprovação de que teria pago tributo no exterior .

Por fim, é de se dizer que os demais pressupostos para admissibilidade do especial encontram-se presentes, senão vejamos:

[...]

Com base nas razões expostas, ADMITO PARCIALMENTE o recurso especial da Fazenda Nacional, para:

a) dar-lhe seguimento relativamente à seguinte matéria:

- Comprovação do recolhimento no exterior.

No mérito, a Fazenda Nacional requer a reforma do acórdão recorrido em relação a esta matéria.

Cientificada do despacho que admitiu parcialmente o apelo especial, a Fazenda Nacional manejou recurso de agravo que foi rejeitado pela Presidência deste Conselho, conforme despacho de fls. 1.145 a 1.153.

Intimado em 21/09/2020 (fl. 1.161) da decisão recorrida, do Recurso Especial interposto pela Fazenda Nacional e do despacho que o admitiu parcialmente, o Contribuinte opôs em 06/10/2020 (fl. 1.163), tempestivas Contrarrazões de fls. 1.164 a 1.180.

Em seu documento de defesa, o Contribuinte insurge-se contra o conhecimento do recurso especial Fazendário, afirmando que os paradigmas apresentados não se manifestaram sobre dispositivo legal que fundamentou a decisão recorrida. No mérito, pugna pela manutenção do acórdão de recurso voluntário quanto à matéria suscitada pela PGFN.

O sujeito passivo, em 06/10/2020 (fl. 1.185), apresenta recurso especial de divergência (1.186 a 1.206) que foi admitido pelo despacho de fls. 1.312 a 1.321 nos seguintes termos:

A Recorrente aponta divergência de interpretação em relação a uma única matéria: "DA INCOMPATIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 74 DA MP N.º 2.158-35/01 E AS CONVENÇÕES PARA EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO".

ANÁLISE DA DIVERGÊNCIA

Em relação a esta matéria, indicou-se como paradigmas não reformados: os Acórdãos nº 1402-002.388 (2a Turma/4a Câmara/1a Seção) e 101- 95.802 (Primeira Câmara do então Primeiro Conselho de Contribuintes).

[...]

Os 2 (dois) primeiros paradigmas a serem apreciados possuem as seguintes ementas:

Paradigma 1 - Ac. nº 1402-002.388:

Original

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Fl. 1355

Fl. 8 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA - IRPJ

Ano-calendário: 2006, 2007

LUCROS OBTIDOS POR CONTROLADA NO EXTERIOR. DISPONIBILIZAÇÃO PARA CONTROLADORA NO BRASIL. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.158-35/01. EMPRESAS NO URUGUAI.

Para fim de determinação da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, os lucros auferidos por controlada no exterior são considerados disponibilizados para a controladora no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados. Disciplina conferida pelo art. 25, da Lei nº 9.249/95, c/c art. 74 da MP nº 2.158-35/01.

COMPENSAÇÃO DE TRIBUTOS PAGOS NO EXTERIOR. Os comprovantes dos tributos pagos no exterior devem estar à disposição da fiscalização imediatamente após o encerramento dos respectivos exercícios a que se referem. Em não havendo nos autos nenhuma razão que justifique, a teor do art. 16, § 4º, do Decreto nº 70.235/72, a impossibilidade de sua apresentação no tempo devido, cumulada com a ausência de fumus boni juris de que os mesmos seriam capazes de comprovar o alegado recolhimento do imposto, para efeito de compensação, impõe-se a sua rejeição para tal desiderato. Acresça-se a exigência do necessário reconhecimento do respectivo órgão arrecadador no exterior, sua consularização na repartição brasileira, cumulada com a tradução por tradutor juramentado.

LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR POR INTERMÉDIO DE SOCIEDADE CONTROLADA. ADIÇÃO DOS RESULTADOS NA INVESTIDORA BRASILEIRA.

No julgamento da ADI XXXXX/DF, em relação à constitucionalidade da aplicação do art. 74 da MP nº 2.158/01 aos lucros auferidos por empresa controlada, situada fora de paraísos fiscais ou de países com tributação favorecida, não houve a apreciação necessária da matéria para promover o resultado típico dessa Ação, capaz de produzir efeitos erga omnes.

LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR POR INTERMÉDIO DE SOCIEDADE CONTROLADA LOCALIZADA NA ARGENTINA. EXISTÊNCIA DE CONVENÇÃO DESTINADA A EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO. IDENTIDADE. APLICAÇÃO DO ART. 7º. O art. 74 da MP nº 2.158/01 tem efeito de norma CFC por considerar transparente as controladas e coligadas no exterior, mas não possui a sua finalidade típica, antiabusiva, específica e excepcional, o que permitiria sua aplicação em

Original

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Fl. 1356

Fl. 9 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

harmonia com as disposições das normas internacionais, firmadas com o intuito de se evitar a dupla tributação.

A hipótese de tributação delineada pelo art. 25 da Lei nº 9.249/95, em comunhão com a disposição do art. 74 da MP nº 2.158/01, atrai e confirma a incidência do art. da Convenção firmada entre Brasil e Argentina, sendo norma de bloqueio, afastando a legislação doméstica, prevalecendo o disposto no pacto internacional, como previsto no comando do art. 98 do CTN, reiteradamente confirmado pelo E. STJ. ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL Ano-calendário: 2006, 2007

TRATADO BRASIL-ARGENTINA PARA EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO. APLICAÇÃO À CSLL. DISPOSIÇÃO NORMATIVA EXPRESSA.

A norma interpretativa contida no art. 11 da Lei nº 13.202/15 (modalidade que guarda eficácia retroativa) expressamente estende à referida Contribuição Social as disposições dos Acordos e Convenções internacionais para se evitar a dupla tributação. (Destacou-se).

2º Paradigma -Acórdão nº 101-95.802

[...]

LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR. DISPONIBILIZAÇÃO FICTA PARA A CONTROLADORA AQUI NO BRASIL (MP nº 2.158-34/2001, ART. 74, § ÚNICO)- A partir da vigência do art. 74 da MP XXXXX-35/2001, para fim de determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior até 31 de dezembro de 2001 serão considerados disponibilizados em 31 de dezembro de 2002, salvo se ocorrida, antes desta data, qualquer das hipóteses de disponibilização previstas na legislação em vigor.

LUCROS AUFERIDOS POR INTERMÉDIO DE COLIGADAS E CONTROLADAS NO EXTERIOR- Na Lei 9.532/97 o fato gerador era representado pelo pagamento ou crédito (conforme definido no art. 1º da Lei 9.532/97), e o que se tributavam eram os dividendos. A partir da MP 2.158- 35/2001, a tributação independe de pagamento ou crédito (ainda que fictos), deixando, pois, de ter como base os dividendos.

LUCROS ORIUNDOS DE INVESTIMENTO NA ESPANHA - Nos termos da Convenção Destinada a Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Imposto sobre a Renda entre Brasil e a Espanha, promulgada pelo Decreto nº 76.975, de 1976, em se tratando de lucros apurados pela sociedade residente na Espanha e que não sejam atribuíveis a estabelecimento permanente situado no

Original

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Fl. 1357

Fl. 10 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Brasil, não pode haver tributação no Brasil. Não são também tributados no Brasil os dividendos recebidos por um residente do Brasil e que, de acordo com as disposições da Convenção, são tributáveis na Espanha.

[...] (Destacou-se).

[...]

Mesmo arcabouço jurídico e da similitude fática

O recorrido e os paradigmas versam sobre o mesmo arcabouço jurídico, ou seja, a tributação do art. 74 da MP nº 2.158-35 c/c art. 98 do CTN no que diz respeito à tributação dos lucros de controladas considerados auferidos pela investidora brasileira (Estado da residência) e sua compatibilidade com o art. 7º das Convenções sobre Dupla Tributação.

Outrossim, o fato de os tratados constantes nos paradigmas se referirem a países distintos do recorrido não torna as situações desassemelhadas entre eles, uma vez que as referidas convenções se utilizam de um modelo-padrão com matriz na ONU/OCDE bastante assemelhados e, principalmente, porque a redação art. 7º dessas convenções - objeto do litígio - são absolutamente equivalentes.

Da divergência constada

Apesar de as situações fáticas serem assemelhadas, as conclusões são divergentes no que diz respeito à interpretação dos fatos às normas, nos seguintes termos:

A decisão recorrida concluiu que as materialidades previstas no art. 74 da MP nº 2.158-35/2001 e as dispostas nos referidos tratados que adotam o art. 7º das Convenções sobre Dupla Tributação não impediria a aplicação das referidas materialidades (art. 74), dado que a tributação em causa incidiria sobre o residente , e não sobre o não residente, o que seria totalmente compatível com o fato de o artigo 74 da MP 2.158/2001 tributar o lucro da empresa residente no Brasil ; De outra banda, os acórdãos paradigmas apontados decidiram de forma diametralmente oposta , no sentido de que haveria, sim, uma incompatibilidade, ou seja, por se tratar efetivamente da materialidade "lucro" , o art. 7º das respectivas Convenções sobre Dupla Tributação impediria a aplicação do art. 74 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, sob pena de burla aos respectivos tratados ou sob pena de também se fazer letra morta de tal regra (Artigo 7 das Convenções), uma vez que a mesma expressamente afastaria a possibilidade de qualquer ficção jurídica visando alcançar-se o lucro de empresas com domicílio fiscal extraterritorial. O segundo paradigma, subsidiariamente, atesta ainda que mesmo que a referida disponibilização se refira a "dividendos fictos", atraindo o art. 10º da respectiva convenção-padrão, "ainda assim não caberá a tributação, em face do que dispõe o parágrafo 3 do Art. 23".

As ementas do ac. recorrido e dos respectivos paradigmas já transcritas ao norte, e bem espelhando o conteúdo dos seus votos condutores, são suficientes para atestar e ratificar a divergência ora comprovada.

Portanto, resta demonstrada a divergência jurisprudencial.

Original

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Fl. 1358

Fl. 11 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

[...]

Diante das considerações contidas no Parecer acima, que aprovo e adoto, com fundamento nos artigos 18, inciso III, 67 e 68, todos do Anexo II, do RICARF, aprovado pela Portaria MF nº. 343, de 2015, com alterações posteriores, DOU SEGUIMENTO ao Recurso Especial interposto pelo Sujeito Passivo.

Os autos foram encaminhados para a PGFN em 13/11/2020 (fl. 1.311) para ciência do despacho de admissibilidade, decidindo-se o órgão Fazendário por ofertar em 19/11/2020 (fl. 1.346) tempestivas contrarrazões (fls. 1.323 a 1.345), peça na qual não oferece resistência ao conhecimento do recurso especial do Contribuinte. No mérito, pugna para que seja negado provimento ao apelo.

Em seguida, os autos foram submetidos a sorteio, cabendo-me o seu relato.

É o relatório.

Voto

Conselheiro Fernando Brasil de Oliveira Pinto, Relator.

1 CONHECIMENTO

O Recurso Especial Fazendário é tempestivo, conforme já evidenciado no relatório.

O Contribuinte ofereceu resistência ao conhecimento do Apelo Fazendário. Para tanto, afirma que não há divergência de interpretação entre o recorrido e os paradigmas apresentados, posto estes últimos não terem se utilizando do fundamento previsto no art. 16, § 2º, II da Lei nº 9.430/1996 para afastar a necessidade de consularização dos documentos apresentados para comprovar os eventuais pagamentos realizados.

Penso que há substância nas alegações do Contribuinte. E mais, parece haver divergência fática entre os julgados que não permitiria a configuração de divergência interpretativa entre os Colegiados, ainda que a legislação examinada fosse a mesma.

Do primeiro paradigma (acórdão XXXXX-000.892, de 09/05/2013) apresentado, além da ementa já reproduzida no relatório, importa considerar as seguintes informações e fundamentos do voto condutor do julgado, com destaques ora acrescidos:

Não obstante toda a explanação tecida até então, em função das decisões transcritas acima, é indubitável que a compensação levada a cabo pela Recorrente encontra-se absolutamente longe do amparo da legislação, pois não havendo relação jurídica tributária em que tal crédito possa ser inserido, não se pode admitir o reconhecimento do imposto de renda pago no exterior como saldo negativo.

Vale ressaltar que o imposto de renda pago no exterior somente passaria a compor o saldo negativo da Recorrente na hipótese de saldo positivo decorrente

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Fl. 1359

Fl. 12 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

da compensação com IRPJ e, subsidiarimente, com a CSLL, cujas bases de cálculo no Brasil fossem superiores ao lucro apurado no exterior.

Nessa esteira, a única hipótese legalmente admitida para aproveitamento do crédito seria a não escrituração no exercício de 2003, quando foi apurado prejuízo, e sua manutenção na parte B do LALUR, conforme preconiza o inciso III, do artigo 262, do RIR.

Todavia, não se trata do caso em tela, pois, conforme já foi dito e está comprovado inexoravelmente nos autos, o valor foi escriturado tendo sido os lucros, ganhos e os rendimentos do exterior absorvidos por um cenário de prejuízo fiscal.

Assim sendo, como foi dito no início deste voto, a admissão e legitimidade dos documentos em língua estrangeira, assim como o reconhecimento do efetivo recolhimento do tributo no exterior ficam prejudicadas , embora eu não possa deixar de reconhecer que do relatório de fls. 676/688 se conclui que a Autoridade Fiscal analisou os documentos apresentados, mesmo sendo estes redigidos em espanhol.

[...]

Outrossim, não consta dos autos qualquer documento que certifique a consularização perante o Ministério de Relações Exteriores do Brasil, através de seus consulados. Documentos estrangeiros, para terem validade e serem reconhecidos no Brasil, necessitam ser primeiramente consularizados em repartição Consular brasileira que tenha jurisdição sobre o Departamento em que os mesmos foram emitidos ou expedidos.

Ainda sobre o reconhecimento dos documentos como prova do direito creditício, não obstante todas as razões já expostas, constatei que o documento de fls. 376 é mera declaração elaborada e assinada pela própria coligada da Recorrente , portanto, entendo não possuir qualquer efeito probatório das retenções alegadas como efetuadas pelo fisco Colombiano.

Por sua vez, o documento de fls. 343 menciona a retenção de valores de um "sujeto retenido" cujo "domicilio e país de origen" está registrado nos Estados Unidos. Ao consultar o contrato social da Recorrente não constatei qualquer relação com aquele país , donde concluo que o documento em questão não logrou êxito em demonstrar que o sujeito da retenção efetuada pelo Fisco Argentino é a Recorrente.

Com efeito, não demonstrado o vínculo entre o comprovante de recolhimento do tributo no exterior e a Contribuinte Recorrente , esta não faria jus a compensação do imposto de renda pago no exterior caso houvesse apurado lucro.

Por fim, inúmeros documentos juntados, além de não atenderem as exigências legais, no que diz respeito a tradução e consularização, comprometem o juízo do mais voluntarioso analista, pois são ilegíveis.

Portanto, quer pela impossibilidade em função da apuração de prejuízo, quer pela ausência de documentos legítimos e comprobatórios do recolhimento do imposto de renda no exterior, o direito creditório não deve ser reconhecido, tampouco a compensação homologada.

Original

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Fl. 1360

Fl. 13 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

De acordo com o transcrito, a Turma Julgadora do paradigma em questão, considerando que o Contribuinte experimentara prejuízo fiscal no ano que efetuou a compensação dos tributos supostamente recolhidos no exterior, decidiu que a análise dos documentos apresentados restaria prejudicada, haja vista a impossibilidade legal da compensação empreendida.

Ainda assim, e como reforço argumentativo, já que a decisão do colegiado paradigmático foi pela impossibilidade da compensação, independentemente da força probatória dos documentos apresentados, o Relator do feito apresentou as inconsistências das provas apresentadas.

Elencou os requisitos não foram atendidos pelo Contribuinte interessado, dentre os quais a falta de tradução juramentada; a ausência da consularização; o fato de um documento ter sido emitido pela própria controlada no exterior e a circunstância que vincula uma suposta retenção de empresa sediada nos EUA, país em que o Contribuinte não possuía pessoas jurídicas a ele ligadas. Pela soma das inconsistências, considerou os documentos imprestáveis para comprovar eventual pagamento de imposto no exterior, ainda que a empresa sediada no Brasil tivesse apurado lucro no período em exame, o que não havia ocorrido .

Sobre a matéria, do recorrido importa considerar as seguintes informações, extraídas do voto vencido, de lavra do I. Conselheiro Gustavo Guimarães da Fonseca, vencedor neste tema (com destaques ora acrescidos):

Com efeito, diga-se, a empresa não trouxe aos autos os comprovantes de recolhimento do imposto pago no exterior (e, por conseguinte, e por óbvio, não os consularizou, na forma do art. 26, § 2º, da Lei 9.249/95). Os únicos documentos apresentados, diga-se, restringem-se, como descrito no relatório que precede este voto, à:

a) um parecer de escritório austríaco explicando o tratamento legal do imposto de renda pela legislação austríaca e atestando o pagamento do tributo pela empresa lá sediada;

b) um extrato "da conta fiscal das Votorantim GmbH";

c) extratos de pré-pagamento do IR austríaco; e

d) algumas decisões administrativas que se reportariam à apuração e recolhimento do imposto naquele país).

Todos os documentos mencionados acima se encontram juntados à impugnação da empresa, particularmente à e-fls. 696/720, devidamente acompanhados de tradução juramentada .

Como é sabido, a Lei 9.430/96, por seu art. 16, § 2º, II, amenizou as exigências contidas no art. 26, § 2º da Lei 9.249/95, dispensando-se, pois, a autenticação dos comprovantes de pagamento por meio de autoridade consular se, e quando, o contribuinte demonstrar que "a legislação do país de origem do lucro, rendimento ou ganho de capital prevê a incidência do imposto de renda que houver sido pago, por meio do documento de arrecadação apresentado".

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Fl. 1361

Fl. 14 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Notem que a dispensa realizada pelo preceptivo em exame cinge à desnecessidade de consularização dos comprovantes e não da apresentação destes, propriamente. E, como dito, os documentos exibidos não são, até segunda ordem, comprovantes de pagamento do imposto.

Nada obstante, a força probatória dos elementos apresentados pela insurgente é inegável ... os extratos de pré-pagamento, diga-se, foram emitidos por instituições bancárias e as explicações constantes do parecer tratado em a, supra, dão conta de que tais "pré-pagamentos" se assemelhariam às nossas estimativas. Outrossim, as cópias das decisões administrativas trazidas (cuja autenticidade não foi, em qualquer momento, questionada, nem pela Autoridade Lançadora e nem pela DRJ), parecem dar credibilidade aos registros apostos no extrato tratado em b e à assertiva contida no precitado parecer quanto ao efetivo recolhimento das exações à Áustria.

É óbvio que quando a Lei exige a exibição de documento que comprove o efetivo pagamento do tributo, ela está se referendo a qualquer documento e não, e tão somente, guias de recolhimento.

Os extratos e as decisões colacionadas, se não se questionadas a sua autenticidade, comprovam o pagamento do IR Austríaco e asseveram, mais, a efetiva exigência deste tributo pelo mencionado País.

Assim, e caso seja superada a tese central abordada no tópico I.3, supra, seria, realmente, de se acatar o pedido sucessivo em exame para se autorizar a compensação dos valores comprovados pelos documentos ora apreciados do valor remanescente do crédito tributário (já que a DRJ, como lá alardeado, reduziu sobremaneira o montante originariamente lançado)

É flagrante a falta de similitude entre o recorrido e o primeiro paradigma acima descrito. A começar, como bem salientou o Contribuinte, pela adoção no presente processo do art. 16, § 2º, II da Lei nº 9.430/1996 como fundamento para superar a necessidade de consularização dos documentos apresentados.

Não fosse o preceito legal que "amenizou" as exigências contidas na Lei nº 9.249/1995, provavelmente a Turma Julgadora não teria superado o óbice consistente na necessidade da consularização e teria negado provimento ao recurso nesta matéria.

E, além da força do fundamento legal utilizado para considerar dispensável a consularização, a Turma Julgadora entendeu, por unanimidade, que os documentos colacionados aos autos comprovaram não só o recolhimento do IR na Áustria, mas também a exigência do tributo por aquele país.

No primeiro paradigma, relembre-se, o Colegiado concluiu que, afora a impossibilidade de se compensar eventual recolhimento no exterior se a empresa nacional experimentou prejuízo no período, e excetuando-se os requisitos formais das provas (tradução juramentada e consularização, nenhuma delas atendida), os documentos apresentados não se prestavam a comprovar que teria havido recolhimento de imposto no exterior, tampouco que eventual pagamento tenha sido realizado por empresa ligada ao Contribuinte autuado.

Portanto, além da fundamentação diversa adotada pelos julgados Cotejados, o que já afasta a ocorrência de divergência interpretativa entre eles, constata-se que os fatos levados a

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Fl. 1362

Fl. 15 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

julgamento não tinham similitude que pudesse ensejar o dissídio previsto no art. 67 do Anexo II do RICARF.

Quanto ao primeiro paradigma, concluo, portanto, que não há divergência interpretativa a ser solvida por este Colegiado.

Do segundo paradigma (1401-003.052, de 12/12/2018, relatado pela I. Conselheira Lívia de Carli Germano) apresentado, releva conhecer as seguintes informações e fundamentos (com destaques ora acrescidos):

Por fim, quanto à alegação acerca da dedução do valor do imposto de renda pago no Peru, observo que os documentos foram juntados apenas por ocasião do recurso (o que por si só levaria à discussão acerca da preclusão em vista do disposto no artigo 16 do Decreto 70.235/1972), e ainda assim não foi observada a legislação quanto aos requisitos formais necessários à consideração de tais documentos.

Os documentos juntados com o recurso são cópias simples acompanhados da tradução juramentada para o português, sendo que a Recorrente, em 2014, solicitou a juntada da versão consularizada quando possível. No entanto, até a presente data, em 2018, tal consularização não foi apresentada, nem qualquer outra juntada de documentação foi realizada.

O artigo 26 da Lei 9.249/1995 indica os requisitos para a compensação do imposto pago no exterior, conforme grifamos:

[...]

Observo que costumo considerar que a apresentação de provas em sede recursal somente deve ser admitida nas exatas hipóteses do artigo 16 do Decreto 70.235/1972, sendo necessário que o contribuinte comprove efetivamente a impossibilidade de fazê-lo por ocasião da apresentação de sua impugnação, quando for o caso. No caso, porém, não apenas não há qualquer alegação acerca da impossibilidade de se apresentar os documentos relativos ao imposto pago no Peru por ocasião da impugnação como que os documentos apresentados extemporaneamente não são hábeis a comprovar o alegado, por não cumprirem as formalidades necessárias.

Assim, entendo que não devem ser analisados os documentos apresentados apenas em sede recursal, em vista de sua apresentação extemporânea e, ainda assim, incompleta .

Neste sentido, entendo que não é o caso de se admitir a dedução do imposto pago no exterior.

Do transcrito, ressalta-se, de plano, que os documentos apresentados não foram analisados por terem sido considerados preclusos e estarem incompletos, não restando assentado, portanto, juízo de valor sobre as provas apresentadas. Tal fato torna o julgado dessemelhante do recorrido, já que neste caso o Colegiado tanto apreciou os documentos apresentados, como os considerou aptos a comprovar o recolhimento do IR na Áustria.

Ademais, como salientou o Contribuinte em contrarrazões, a decisão não se valeu do previsto no art. 16, § 2º, II da Lei nº 9.430/1996 para relevar a falta de consularização dos

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Fl. 1363

Fl. 16 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

documentos apresentados. Este dispositivo legal foi usado como fundamento no recorrido, fato que permitiu superar a falta de cumprimento de um requisito formal para que se procedesse à análise das provas apresentadas.

Portanto, também em relação ao segundo paradigma apresentado, a conclusão que se chega é que não há divergência interpretativa entre os Colegiados cotejados, seja por se valerem de fundamentos legais diversos para decidir, seja por não haver a necessária similitude fática entre os casos julgados.

Concluo afirmando que não há divergência interpretativa entre os Colegiados do segundo paradigma e do recorrido, motivo pelo qual não há dissídio a ser solvido por esta Turma Julgadora.

Pelo exposto, meu voto é por não conhecer do recurso especial Fazendário na matéria admitida.

Quanto ao apelo do Contribuinte, a Fazenda Nacional não opôs resistência ao seu conhecimento.

No que diz respeito ao paradigma nº 101-95.802, já me manifestei diversas vezes quanto à sua adequação para fins de divergência aventada por contribuintes em seus recursos versando sobre a tributação de lucros auferidos no exterior.

Contudo, no que diz respeito ao paradigma nº 1402-002.388, em diversos julgados acompanhei a divergência aberta pela Conselheira Edeli Pereira Bessa em razão das peculiaridades examinadas naquele julgado, como, por exemplo, no Acórdão nº 9101-006.243 1 . Por concordar integralmente com os fundamentos da declaração de voto da Conselheira Edeli Pereira Bessa, adoto-os como razões de decidir para não admitir o Acórdão nº 1402-002.388 como formado de dissídio jurisprudencial:

A I. Relatora conheceu do recurso especial da Contribuinte sob o entendimento de que a aplicação do racional do paradigma nº 1402-002.388 reformaria o recorrido por conceber o art. 7º do Tratado Brasil-Argentina como norma de bloqueio da tributação prevista no art. 74 da Medida Provisória nº 2.158- 35/2001.

Contudo, discorda-se de sua premissa, constituída a partir de discussões estabelecidas a respeito do referido paradigma no julgamento consubstanciado no Acórdão nº 9101-004.060, de que o diferencial suscitado por ocasião daquele debate não poderia afetar esta análise de conhecimento, porque significaria exigir de terceiros o conhecimento de peculiaridades não mencionadas no voto condutor do paradigma. Em verdade, como se demonstrará adiante, tais peculiaridades foram expressas em declaração de voto juntada ao paradigma e os votos diferenciados manifestados pelos demais Conselheiros daquele Colegiado permitem validamente concluir que outra foi a

1 Sessão de 09/08/2022. Participaram do julgamento: Edeli Pereira Bessa, Livia De Carli Germano, Fernando Brasil

de Oliveira Pinto, Luis Henrique Marotti Toselli, Luiz Tadeu Matosinho Machado, Alexandre Evaristo Pinto, Gustavo Guimarães da Fonseca e Carlos Henrique de Oliveira.

Votaram por rejeitar o paradigma XXXXX-002.388 os conselheiros Edeli Pereira Bessa, Fernando Brasil de Oliveira Pinto e Luiz Tadeu Matosinho Machado.

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Fl. 1364

Fl. 17 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

matéria discutida naqueles autos. Para além disso, o diferencial presente no paradigma foi reafirmado em julgamento de recurso especial contra ele interposto, publicado em acórdão anterior à interposição do recurso especial sob exame.

Necessário, primeiro, historiar que referido paradigma já se prestou à caracterização de dissídios semelhantes, apreciados nos Acórdãos nº 9101- 004.76313 e 9101-005.80914, e em ambos conhecidos de forma unânime, com votos favoráveis desta Conselheira. Contudo, no primeiro precedente, a ex- Conselheira Viviane Vidal Wagner ressalvou que:

Quanto à outra matéria admitida ("impedimento à tributação dos lucros provenientes da Sadia GMBH, por força do Tratado Brasil-Áustria"), verifica-se que o mesmo paradigma (Acórdão nº 1402-002.388) foi apresentado em recente acórdão da CSRF, em que o recurso de outro contribuinte foi admitido por maioria de votos (Acórdão nº 9101-004060, de 12/03/2019). Em que pese ter sido vencida quanto ao conhecimento naquele caso, curvo-me à decisão da maioria do colegiado que considerou a similitude suficiente para conhecer do recurso a partir desse paradigma. De fato, as discussões estabelecidas para fins de divergência acerca da prevalência ou não dos acordos internacionais em detrimento da aplicação da legislação nacional pautaram-se nas respectivas análises de tratados assinados pelo Brasil com países distintos, porém ambos seguindo a redação da Convenção-Modelo da OCDE e com disposições essencialmente semelhantes.

Como mencionado pela I. Relatora, o ex-Conselheiro Demetrius Nichele Macei também divergiu do conhecimento do recurso especial no citado Acórdão nº 9101-004.060, declarando voto nos seguintes termos:

Com o devido respeito, a presente declaração de voto se presta a esclarecer porque, a meu entender, o recurso especial sob análise não deveria ser conhecido, também, quanto à matéria "prevalência dos tratados internacionais sobre a legislação interna".

O acórdão paradigma nº 1402-002.388 (e-fls. 2.401 a 2.439), apresentado para caracterizar a divergência sobre este tema, não poderia ter sido admitido porque, infelizmente, o entendimento expresso em sua ementa, não traduz ou representa o real conteúdo do que restou discutido naquele julgamento.

Digo isso porque naquele julgamento - sessão de 14 de fevereiro de 2017 - eu compunha a 2a turma ordinária, da 4a câmara, da 1a seção. Inclusive, naquele acórdão, fiz declaração de voto justamente para esclarecer que o cerne da discussão naquele caso não era a aplicação dos tratados internacionais na legislação tributária interna em si, mas discutia-se, na verdade, o critério e coerência da autuação. Reproduzo abaixo, a mencionada declaração:

Trata-se de auto de infração lavrado contra a empresa MARFRIG ALIMENTOS S/A, ("MARFRIG" "autuada") através do qual foi constituído crédito tributário relativo ao IRPJ e à CSLL, relativo aos períodos de apuração de 2006 e 2007.

Mais detalhadamente, os tributos foram exigidos em razão de lucros auferidos pelas controladas diretas da autuada, as empresas TACUAREMBÓ e INALTER, com sede no Uruguai, bem como as empresas AB&P e QUICK FOODS ("QUICK"), com sede na Argentina.

Especificamente em relação às empresas na Argentina, a fiscalização entendeu aplicável o Tratado para evitar a bitributação, firmado entre

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Fl. 1365

Fl. 18 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

o Brasil e a Argentina, para deixar de lançar créditos de IRPJ em relação à AB&P, mantendo apenas a cobrança da CSLL pois, segundo a autoridade autuante, o tratado não teria alcance sobre esta contribuição social, considerando que, ao tempo da celebração do tratado, este tributo não havia sido criado.

Partindo da premissa de que o entendimento desta turma é de que Tratados dessa natureza NÃO servem como norma de bloqueio para a cobrança, nem do IRPJ nem da CSLL, entendimento que pessoalmente não me filio a rigor, se houvesse lançamento sob este fundamento, esta turma teria mantido a cobrança.

Ocorre que, neste caso concreto, a fiscalização sequer chegou a lançar o IRPJ e este Conselho não tem competência de efetuar novo lançamento, apenas rever. Em relação à CSLL a situação é sui generis, pois o lançamento se deu, mas com fundamento do não alcance do tratado em relação ao tributo em si, e não com o fundamento de que o Tratado (mesmo hipoteticamente mencionada a "CSLL" em seu texto) não seria eficaz para bloquear a cobrança em relação aos lucros provenientes do exterior e reconhecidos no Brasil.

Diante disso, este Conselho, a meu ver acertadamente, revendo o fundamento do lançamento no caso concreto, resolveu cancelar a cobrança da CSLL, pois o fato da contribuição não estar prevista expressamente no tratado se deu em virtude de que a lei que criou o tributo (Lei 7689/89) não existia ao momento da celebração do acordo internacional.

Nesta linha de entendimento, sendo a CSLL tributo incidente sobre o lucro das empresas, o tratado passa a ser eficaz também em relação ao "novo" tributo. Esta tese se reforça na medida em que todos os tratados firmados posteriormente a 1989 contemplaram expressamente a CSLL em seus termos.

Mas não é só.

Veja-se que para a outra empresa sediada na Argentina, denominada QUICK, a fiscalização não deu a mesma solução.

Diferentemente da AB&P, a QUICK tratava-se de controlada indireta da autuada, ao menos sob o aspecto formal, pois entre a autuada e aquela, havia um empresa sediada no Estado norte-americano de Delaware, denominada BLUE HORIZON LLC.("BLUE").

Diante desse fato, ao examinar a estrutura societária dessas empresas, a fiscalização entendeu que a empresa norte-americana se tratava de entidade "translúcida", isto é, uma mera empresa de passagem, sem substância, cujo único objetivo seria de obter economia tributária.

A consequência lógica desta postura da autoridade autuante foi considerar a QUICK controlada direta da autuada, lançando os lucros auferidos com base nessa mesma lógica.

Diante desse cenário, este julgador, seguido pelo i. presidente da turma julgadora, entende que não houve a devida coerência da fiscalização ao deixar de aplicar o tratado Brasil Argentina para o caso da QUICK.

Explico: Se os fundamentos para a autuação das demais empresas foram no sentido de que o tratado internacional mencionado serve sim

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Fl. 1366

Fl. 19 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

como norma de bloqueio, a desconsideração da empresa BLUE e a visualização da ligação direta entre a MARFRIG (autuada) e a QUICK não poderia desconsiderar o mesmo tratado.

Em outras palavras: Se a empresa norte-americana fosse considerada válida, apenas eventuais tratados ou regras brasileiras aplicáveis (compensação, por exemplo) entre o Brasil e os EUA (na relação MARFRIGBLUE) e de outro lado, entre os EUA e a Argentina (na relação BLUEQUICK) seriam aplicáveis.

A contrario sensu, desconsiderada como foi a existência, para fins tributários, da empresa BLUE, é imperioso reconhecer a eficácia do tratado Brasil-Argentina no caso concreto. Se o fisco entendeu que a relação entre a autuada e a empresa Argentina é direta, também deveria reconhecer o tratado existente entre os dois únicos países envolvidos, e não o fez.

Repita-se: o entendimento majoritário desta Turma é que o tratado Brasil Argentina não impediria em tese, em nenhuma das hipóteses desses autos, o lançamento. Mas é preciso reiterar também que o fundamento da autuação foi diametralmente oposto.

Pois bem. Se o fundamento da autuação foi este, por uma questão de coerência e lógica, deveria ter sido reconhecido o mesmo bloqueio da tributação na relação (de fato) reconhecida e considerada pela mesma fiscalização, entre a empresa brasileira (autuada) e a Argentina, tal qual foi feito em relação à empresa AB&P no mesmo procedimento fiscalizatório.

Diante do exposto, apresento a presente declaração para justificar o voto que proferi no sentido de seguir o entendimento da maioria dos integrantes da turma no caso concreto, porém, "pelas conclusões", aqui devidamente esclarecidas.

[...]

Desta forma, registro aqui meu posicionamento no sentido de que o acórdão paradigma nº 1402-002.388 não é apto para o conhecimento do recurso especial do contribuinte, na medida em que trata de outra matéria, e não a discutida nos presentes autos.

Tal assertiva se confirma no simples exame do Recurso Especial apresentado neste mesmo paradigma, que foi admitido não pela questão dos tratados, mas pelo critério jurídico do lançamento, e também por este motivo foi mantido.

Diante do enfático apontamento no sentido de que aquela Turma tinha o entendimento majoritário de que o tratado Brasil-Argentina não impediria em tese, em nenhuma das hipóteses de incidência analisadas naqueles autos, quer em relação ao IRPJ, quer em relação à CSLL, cabe observar, com mais vagar, como a decisão daquele Colegiado foi expressa no paradigma:

Acordam os membros do colegiado, por maioria de votos, negar provimento ao recurso de ofício e dar provimento parcial ao recurso voluntário para cancelar a exigência da CSLL exigida sobre o resultado da empresa AB&P e a exigência do IRPJ e da CSLL exigida sobre o resultado da empresa Quick Foods. Vencidos: i) em relação ao recurso de ofício os Conselheiros Luiz Augusto de Souza Gonçalves, Fernando Brasil de Oliveira Pinto e Paulo Mateus Ciccone que votaram por dar-lhe provimento; e ii) em relação ao recurso voluntário o Conselheiro Luiz Augusto de Souza Gonçalves que votou por negar-lhe

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Fl. 1367

Fl. 20 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

provimento integralmente; e os Conselheiros Fernando Brasil de Oliveira Pinto e Paulo Mateus Ciccone, que votaram por dar-lhe provimento em menor extensão apenas para cancelar a exigência da CSLL sobre o resultado da empresa AB&P. Designado o Conselheiro Caio Cesar Nader Quintella para redigir o voto vencedor. Os Conselheiros Demetrius Nichele Macei e Leonardo de Andrade Couto acompanharam o redator designado pelas conclusões em relação ao cancelamento da exigência IRPJ e da CSLL exigida sobre o resultado da empresa Quick Foods.

Centrando foco na decisão acerca dos lucros auferidos por intermédio de "Quick Foods" e "AB&P", tem-se, como referido na declaração de voto antes transcrita, que a primeira é controlada indireta situada na Argentina, considerada controlada direta mediante desconsideração da intermediária situada em Delaware, enquanto a segunda é controlada direta, também situada na Argentina. Os lucros auferidos por intermédio de "Quick Foods" foram tributados pelo IRPJ e pela CSLL, mas a autoridade julgadora de 1a instância atribuiu-lhe a mesma isenção, no âmbito do IRPJ, que a autoridade lançadora havia reconhecido na tributação dos lucros auferidos por intermédio de "AB&P", em razão do Tratado firmado entre Brasil e Argentina. O recurso de ofício neste ponto foi improvido por maioria de votos, vencidos os Conselheiros Luiz Augusto de Souza Gonçalves, Fernando Brasil de Oliveira Pinto e Paulo Mateus Ciccone. Já no âmbito do recurso voluntário tem-se: i) o voto do relator Conselheiro Luiz Augusto de Souza Gonçalves que mantinha integralmente as exigências de CSLL; ii) os votos dos Conselheiros Fernando Brasil de Oliveira Pinto e Paulo Mateus Ciccone que cancelavam a exigência de CSLL relativa à controlada direta "AB&P"; e iii) o voto do redator ex-Conselheiro Caio Cesar Nader Quintella que cancelou integralmente ambas exigências em razão do reconhecimento do Tratado Brasil-Argentina como norma de bloqueio, acompanhado sem ressalvas pelos ex-Conselheiros Leonardo Luís Pagano Gonçalves e Lucas Bevilacqua Cabianca Vieira, e apenas em suas conclusões pelos ex Conselheiros Leonardo de Andrade Couto (Presidente) e Demetrius Nichele Machei.

É válido concluir que a negativa de provimento ao recurso de ofício e o provimento do recurso voluntário acerca da incidência sobre os lucros auferidos por intermédio de "Quick Foods" se deram pela discordância do ex-Conselheiro Leonardo de Andrade Couto (Presidente) em relação ao voto do relator, porque se diverso fosse seu entendimento, o recurso de ofício seria provido por qualidade, e os fundamentos do voto vencedor não prevaleceriam, ainda que três fossem as adesões naquele sentido. De toda a sorte, recorde-se que no provimento do recuso voluntário a maioria foi alcançada com a adesão do voto do Presidente e do ex-Conselheiro Demetrius Nichele Macei, mas sob distintos fundamentos, expressos na declaração de voto deste último.

Em discussões semelhantes, esta Conselheira tem concluído que na análise da similitude dos casos comparados, para avaliação da existência do dissídio jurisprudencial, devem ser consideradas as circunstâncias fáticas específicas do caso apreciado e que foram determinantes para a decisão do Colegiado. E assim já fez, inclusive, com o reforço de outro julgado contemporâneo do mesmo Colegiado sobre a matéria, conforme voto declarado no Acórdão nº 9101- 005.767:

Esta Conselheira acompanhou o I. Relator no conhecimento do recurso especial da Contribuinte, mas divergiu no mérito, para negar-lhe provimento.

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Fl. 1368

Fl. 21 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

De fato, diversamente de outros litígios apreciados na mesma reunião de julgamento, no presente caso o recurso especial deve ser CONHECIDO porque a discussão estabelecida nos acórdãos comparados, acerca da repercussão do valor de frete, seguro e tributos incidentes na importação, cujo ônus tenha sido do importador, teve em conta o mesmo referencial normativo, vez que nos períodos de apuração autuados (ano-calendário 2009, no recorrido, e ano-calendário 2007, no paradigma) já estava vigente a Instrução Normativa SRF nº 243/2002.

Interessante notar que o paradigma aqui admitido foi editado pelo mesmo Colegiado que proferiu o paradigma nº 1402-003.275, este rejeitado para caracterização da divergência suscitada em recurso especial interposto nos autos de outro processo administrativo analisado nesta mesma sessão de julgamento (16357.002064/2005-15 - Bridgestone do Brasil Indústria e Comercio Ltda15), fundando-se o não conhecimento do recurso especial na premissa de que os acórdãos comparados se debruçaram sobre cenários legislativos distintos.

De fato, embora ambos acórdãos tenham adotado posição favorável à pretensão dos sujeitos passivos no tema em referência, vê-se que no paradigma destes autos - Acórdão nº 1402-002.814 -, os Conselheiros Paulo Mateus Ciccone, Evandro Correa Dias e Leonardo Andrade Couto foram restaram vencidos em face do provimento dado pelo Conselheiro Lucas Bevilacqua Cabianca Vieira, cujo voto, no ponto em debate, trouxe a mesma doutrina citada naquele paradigma e também referiu a Instrução Normativa SRF nº 38/97, mas com o acréscimo de que a mudança legislativa posterior não foi capaz de alterar a racionalidade por detrás das regras de preço de transferência. Já no paradigma antes referido - Acórdão nº 1402-003.275 - os Conselheiros Paulo Mateus Ciccone e Evandro Correa Dias acompanharam o Conselheiro Leonardo Luis Pagano Gonçalves que, embora citando como fundamento o mesmo voto aqui apresentado pelo Conselheiro Lucas Bevilacqua Cabianca Vieira, dele destacou a referência específica ao tratamento facultativo do ajuste, como estabelecido na Instrução Normativa SRF nº 38/97, tendo em conta exigência pertinente ao ano-calendário 2000. A concordância dos Conselheiros Paulo Mateus Ciccone e Evandro Correa Dias, bem como o destaque à legislação específica, evidenciam que a interferência da interpretação veiculada na Instrução Normativa SRF nº 38/97 foi determinante para a decisão adotada no Acórdão nº 1402-003.275, enquanto a prevalência da Instrução Normativa SRF nº 243/2002 resultou em votos divergentes dos mesmos Conselheiros no Acórdão nº 1402-002.814.

Nos termos do Regimento Interno do CARF, aprovado pela Portaria MF nº 343/2015 - RICARF, em seu Anexo II:

Art. 67. Compete à CSRF, por suas turmas, julgar recurso especial interposto contra decisão que der à legislação tributária interpretação divergente da que lhe tenha dado outra câmara, turma de câmara, turma especial ou a própria CSRF. [...] § 6º Na hipótese de que trata o caput, o recurso deverá demonstrar a divergência arguida indicando até 2 (duas) decisões divergentes por matéria. [...]

Esta Conselheira, assim, tem dirigido seu entendimento em afirmar a existência de dissídios jurisprudenciais a partir da análise de decisões de diferentes Colegiados do CARF, e não necessariamente dos votos condutores dos julgados comparados. Assim, se os casos comparados apresentam dessemelhanças fáticas que afetam a decisão da matéria, não basta a constatação de que alguma passagem do voto condutor do paradigma, isoladamente, reformaria o entendimento expresso no acórdão recorrido. A decisão do Colegiado que proferiu o paradigma é aferida a partir do contexto fático analisado em conjunto com os fundamentos do voto condutor do julgado e com a formatação do voto dos demais Conselheiros que acompanharam o voto condutor. Ou seja, decisão,

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Fl. 1369

Fl. 22 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

nos termos regimentais, não é, apenas, o voto condutor do acórdão, mas sim o conjunto de votos da maioria que faz desse voto o condutor do acórdão.

No paradigma nº 1402-002.388 resta fora de dúvida que o Presidente do Colegiado e o Conselheiro que declarou seu voto somente acompanharam o Conselheiro redator do voto vencedor em suas conclusões porque estavam frente a acusação fiscal que excluíra do litígio a discussão acerca de o Tratado firmado entre Brasil e Argentina impedir, ou não, a incidência sobre os lucros tributados, vez que submetido àquele Colegiado, em sede de recurso voluntário, apenas, o debate quanto à eficácia do acordo em relação à incidência da CSLL, mormente tendo em conta que a divergência do Presidente em relação ao voto do Conselheiro Relator na apreciação o recurso de ofício consolidou a interpretação da autoridade julgadora de 1a instância de que o lançamento em questão deveria ser examinado sob o pressuposto adotado pela autoridade fiscal, ou seja, de que o Tratado firmado entre Brasil e Argentina impediria a incidência do IRPJ sobre os lucros auferidos no exterior pela empresa brasileira. A decisão do outro Colegiado do CARF, assim, afasta a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os lucros auferidos por intermédio da investida de "Quick Foods" porque a própria autoridade fiscal reconheceu, em face da outra investida situada na Argentina, isenção de IRPJ com base no Tratado Brasil-Argentina, efeitos que, assim, deveriam ser estendidos a ambas investidas, inclusive em relação à CSLL.

Adicione-se que à mesma conclusão chegou este Colegiado ao apreciar recurso especial interposto contra este paradigma. A ementa do Acórdão nº 9101- 003.664 é expressa neste sentido:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA - IRPJ Ano-calendário: 2006, 2007 ACORDO DE BITRIBUTAÇÃO. ART. 7º. LUCROS NO EXTERIOR. IMPOSSIBILIDADE DE INOVAÇÃO DO LANÇAMENTO.

No caso de a autoridade fiscal ter reconhecido a incidência do acordo de bitributação, a sua aplicação deve ser realizada de forma consistente. Impossibilidade de inovação de lançamento pelo afastamento do tratado.

TRIBUTAÇÃO DE LUCROS NO EXTERIOR. EXERCÍCIO FISCAL DA EMPRESA ESTRANGEIRA.

Sendo distintos os exercícios fiscais, devem ser adicionados à base de cálculo do IRPJ e CSLL, em 31/12 de um determinado exercício, os lucros apurados conforme o exercício fiscal disciplinado pela legislação estrangeira.

Destaque-se que referido julgado foi publicado em 27/09/2018, antes da interposição do recurso especial aqui sob exame, ocorrida em 10/06/2019 (e-fl. 1653). Assim, para além de o próprio paradigma nº 1402-002.388 trazer as evidências suficientes dos contornos específicos do debate lá estabelecido, tem-se que quando a Contribuinte o selecionou para demonstração da divergência já havia, em acréscimo, a interpretação desta 1a Turma da CSRF acerca daquela distinção.

No presente caso, a Contribuinte pretende afastar a incidência sobre os lucros auferidos por intermédio de investidas situadas nos Países Baixo e na Áustria, acerca dos quais a autoridade fiscal afirmou a tributação pelo IRPJ e CSLL na data da apuração do balanço da investida, sob a premissa de que tal tributação

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Fl. 1370

Fl. 23 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

não seria afastada pelos tratados e convenções internacionais para evitar a dupla tributação da renda. Neste cenário, a autoridade julgadora de 1a instância manteve integralmente tais exigências. O debate no Colegiado a quo, por sua vez, ficou limitado à necessidade de observância, ou não, dos tratados internacionais na tributação de lucros auferidos por intermédio de investidas situadas na Áustria e nos Países Baixos: enquanto o voto do redator do voto vencedor, ex-Conselheiro Roberto Silva Junior, conclui que não há conflito entre o art. 74 da MP nº 2.158-35 e o artigo 7 dos tratados firmado entre Brasil e Países Baixos e Brasil e Áustria, os votos dos Conselheiros divergentes se alinharam ao voto da relatora, ex Conselheira Amélia Wakako Morishita Yamamoto no sentido da prevalência da norma internacional, em caso de conflito, diante de sua especificidade.

Não é possível deduzir, assim, que o outro Colegiado do CARF decidiria a questão em tela de forma de diferente. A discussão lá estabelecida tinha outros parâmetros fáticos.

Conclui-se, do exposto, que o acórdão recorrido e o paradigma nº 1402-002.388 se distinguem em pontos determinantes para a decisão dos Colegiados acerca da repercussão, no âmbito das incidências sobre lucros auferidos por intermédio de controlada no exterior, de acordos internacionais firmados pelo Brasil com o país de domicílio da investida. Em tais circunstâncias, o dissídio jurisprudencial não se estabelece.

Desse modo, encaminho meu voto para CONHECER, quanto à matéria que obteve seguimento, do Recurso Especial do Contribuinte, apenas em relação ao segundo paradigma, acórdão nº 101-95.802, nos termos dos fundamentos do despacho de admissibilidade.

Desse modo, encaminho meu voto para NÃO CONHECER do Recurso Especial da Fazenda Nacional e por CONHECER do Recurso Especial do Contribuinte, apenas em relação ao segundo paradigma, acórdão nº 101-95.802, nos termos dos fundamentos do despacho de admissibilidade.

2 MÉRITO

2.1 RECURSO ESPECIAL DO CONTRIBUINTE

Para a Recorrente, a Fiscalização não poderia ter incluído na determinação das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL os resultados auferidos por intermédio de uma empresa controlada direta na Áustria e outra controlada indireta na Argentina.

Segundo seu entendimento, o art. 74 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, violaria o art. 7º dos Tratado firmados pelo Brasil com os países envolvidos para evitar a dupla tributação da renda. Desse modo, ao aplicar o art. 74 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, a Fiscalização estaria tributando os lucros das empresas ligadas sediadas no exterior-, e não os lucros da Recorrente - domiciliada no Brasil.

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Fl. 1371

Fl. 24 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Entende, a Recorrente, ademais, que seria competência exclusiva dos países onde estão sediadas as empresas controladas tributar os lucros por elas auferidos, nos termos previstos no art. 7º dos respectivos Tratados.

Pois bem, passo a analisar o tema.

O tema não é novo neste colegiado. Na sessão de 04 de outubro de 2016, por meio do acórdão XXXXX-002.321, de minha relatoria, em situação praticamente idêntica (o tratado em questão fora firmado com a Áustria), decidiu-se por negar provimento ao recurso voluntário.

A tributação em bases universais das pessoas jurídicas residentes no Brasil possui seu fundamento legal no artigo 25 da Lei nº 9.249/95, verbis:

Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano.

Depois de inúmeras controvérsias legislativas 2 , pacificou-se o entendimento de que esse dispositivo somente permitiria a tributação após os mencionados lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serem disponibilizados à pessoa jurídica situada no Brasil.

Com o advento da Medida Provisória nº 2.158-35/01 duas significativas mudanças foram introduzidas: (i) no artigo 21 introduziu-se tal tributação à CSLL 3 ; (ii) no artigo 74, determinou-se que a disponibilização se dará antes e independentemente de qualquer distribuição no caso de lucros auferidos por empresas controladas e coligadas da pessoa jurídica brasileira. Veja-se:

Art. 21. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior sujeitam-se à incidência da CSLL, observadas as normas de tributação universal de que tratam os arts. 25 a 27 da Lei no 9.249, de 1995, os arts. 15 a 17 da Lei no 9.430, de 1996, e o art. 1oda Lei no 9.532, de 1997.

[...]

Art. 74. Para fim de determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e do art. 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na forma do regulamento.

A despeito das críticas sobre sua amplitude, atingindo também as empresas coligadas em descompasso com o padrão internacional, além de lucros auferidos em países sem

2 Tais controvérsias surgiram com a transformação do conteúdo que constava na própria Lei nº 9.249/95, na IN/SRF

nº 38/96 e na Lei nº 9.532/97, e já tinha como pano de fundo a tentativa de se tributar os lucros auferidos no exterior pelas Controlled Foreign Corporations - CFC - mediante o princípio da ransparência fiscal. Cf. Luís Eduardo Schoueri, "Imposto de Renda e os Lucros Auferidos no Exterior". In: Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. Vol 7. São Paulo: Dialética, 2003, pp. 303 a 313.

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Fl. 1372

Fl. 25 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

tributação favorecida e rendas ativas, é importante ressaltar que esse artigo 74 vai ao encontro das regras instituídas em inúmeros países em sintonia com o fenômeno da transparência fiscal internacional 4 . A rigor, trata-se de normas antielisivas específicas que tem como escopo evitar o diferimento da tributação dos lucros de empresas qualificadas como controlled foreign corporations - CFC.

Faz-se necessário, portanto, analisar a sistemática adotada em tais dispositivos legais. Nesse sentido, é de se observar que a lei não teria eficácia se quisesse tributar diretamente os lucros de uma empresa não residente. Isso porque não há conexão (residência ou fonte) capaz de dar efetividade à jurisdição tributária brasileira. O que a lei faz é tributar uma renda ficta da própria pessoa jurídica brasileira (a empresa residente). Em outras palavras, ela olha para a empresa residente e, sopesando o fato de que esta possui participação societária em outra empresa que apurou lucro no exterior, assume que há disponibilidade da renda e determina que se tribute como lucro da empresa brasileira um determinado valor estimado com base no lucro apurado pela empresa no exterior.

A adequação dessa determinação ao conceito constitucional de renda é uma decisão que deve ser levada a efeito por quem tem competência para isso, no caso, o Supremo Tribunal Federal STF, à luz dos princípios constitucionais envolvidos (igualdade, capacidade contributiva, etc.). E, como é de amplo conhecimento, o artigo 74 foi apreciado pelo STF, na ADI nº 2.588, restando decidida sua inconstitucionalidade apenas nos casos que tratam de lucros auferidos por coligadas não situadas em países com tributação favorecida. Não nos cabe aqui questionar a exatidão dessa decisão, mas, apenas, reconhecer sua aplicabilidade.

Nem se pode estranhar essa forma de tributação. Afinal, em várias situações a legislação do imposto de renda tributa algo que não é necessariamente renda. Basta ver as margens predeterminadas do controle dos preços de transferência. Aliás, as próprias adições e exclusões ao lucro líquido, que o legislador arbitrariamente elege para se chegar ao lucro real, não deixam de ser uma prova de que o lucro real é muito mais uma ficção do que uma renda ideal. Há de se ressaltar que o conceito de renda adotado no Brasil segue a teoria do acréscimo patrimonial definido numa amplitude global. Isso significa que se considera renda quaisquer fluxos monetários e demais benefícios (que possam também ser avaliados em termos monetários) que ingressem na esfera patrimonial da pessoa durante o período considerado. O que ocorre é que a lei, em situações nas quais o legislador sopesa a confluência de diversos princípios e interesses coletivos, deixa de tributar algumas categorias de renda. A bem da verdade, nem mesmo o lucro líquido contábil pode se enquadrar exatamente no conceito financeiro de renda da teoria do acréscimo patrimonial que inspirou os elaboradores do Código Tributário Nacional CTN na positivação do seu artigo 43 5 .

E não há nenhuma ofensa aos artigos 7 dos acordos destinados a evitar a dupla tributação quando se adota essa forma de incidência tributária. Veja-se o típico conteúdo desses dispositivos, conforme as Convenções-Modelo adotadas pela OCDE e pela ONU, nos termos reproduzidos para o vernáculo pelo acordo celebrado entre o Brasil e a Países Baixos 6 :

4 Cf. João Francisco Bianco. Transparência Fiscal Internacional. São Paulo: Dialética, 2007, pp. 15 a 39.

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Fl. 26 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado; a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante, por meio de um estabelecimento permanente ali situado. Se a empresa exerce suas atividades na forma indicada, seus lucros podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem atribuíveis àquele estabelecimento permanente.

Ora, a parte desses dispositivos que diz que "os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado" não pode ser entendida de maneira desvinculada da parte seguinte: "a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente aí situado". Trata-se da forma que as Convenções-Modelo escolheram para dizer que o país da fonte só pode tributar o lucro do seu não residente se este exercer atividade neste país por intermédio de um estabelecimento permanente. Isso porque é possível que uma atividade seja exercida sem um grau de conexão tal com o país da fonte que seja capaz de qualificá-lo no escopo do conceito de estabelecimento permanente contido nos artigos 5º daquelas mesmas Convenções-Modelo. Ainda assim, existe a conexão e o país da fonte poderia querer exercer sua jurisdição no sentido de tributar os correspondentes lucros. A regra daqueles dispositivos impede, então, que o país da fonte exerça essa jurisdição.

Por outro lado, como bem frisado pela PGFN em contrarrazões, os tratados firmados para evitar bitributação se tratam de regras de competência negativa, ou seja, os tratados servem para não tributar um não residente, e jamais não tributar um residente!

Por essas mesmas razões, não há porque se procurar nos tratados dispositivo que autorize determinado país a tributar seu residente, já que os mesmos somente se prestam a impossibilitar a tributação de um não residente, e nas hipóteses em que forem firmados pelos Estados Contratantes.

Há de se salientar, novamente, que a tributação da empresa brasileira, nos termos do art. 74 Medida Provisória nº 2.158-35/01, não diminui o resultado da empresa situada no exterior, uma vez que jamais se refletirá nas demonstrações contábeis e financeiras do não residente no Brasil.

Nesse mesmo sentido, em relação ao art. 7º das Convenções-Modelo, a OCDE é taxativa ao afirmar que normas CFC - como a prevista no art. 74 Medida Provisória nº 2.158- 35/01 - não ofendem os tratados firmados, pois a tributação incidiria sobre o residente, e não sobre não residente.

Segundo a PGFN, os mais recentes posicionamentos da OCDE orientam, inclusive, que normas CFC não se apliquem somente a casos de abuso de tratado, mas que possuam hipóteses de incidência objetivas.

Corroborando o entendimento firmado até aqui, o i. Conselheiro Marcos Aurélio Pereira Valadão, no acórdão XXXXX-002.330, assevera que o "entendimento pela não aplicação do art. 7º às normas CFC, embora objeto de alguma controvérsia, é corrente e aceito na doutrina internacional 7 e nacional e pela jurisprudência de diversos países. A doutrina nacional,

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Fl. 1374

Fl. 27 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

referindo-se à norma CFC brasileira, também tem posições no sentido da não afetação dos tratados, e.g., Marco Aurélio Greco, conforme se transcreve abaixo:

Para Marco Aurélio Greco, uma vez que o referido artigo 74 estabelece a tributação de uma variação positiva de patrimônio da empresa brasileira, não haveria base para se falar em bloqueio da tributação prevista neste dispositivo em função da aplicação do art. 7º das convenções internacionais assinadas pelo Brasil, já que, em nenhum momento, se estaria tributando lucros da empresa residente no outro país. Em sua visão, mesmo nos casos em que determinada convenção prevê a isenção dos dividendos pagos para residentes e domiciliados no Brasil, não estaria afastada a tributação do art. 74, uma vez que, como dito acima, seu entendimento é no sentido de que esta regra prevê a tributação de um acréscimo patrimonial ocorrido no Brasil e não do resultado ainda não distribuído pela empresa brasileira". 8

Em relação à tese de que a redação utilizada no art. 7 das Convenções sobre Dupla Tributação existiria justamente para impedir sistemática de tributação como a do art. 74 da MP XXXXX-35/2001, por outros fundamentos também discordo de tal exegese. Basta analisar a cronologia das normas em questão para se verificar a impossibilidade de tal raciocínio.

A redação do artigo 7 das convenções destinadas a evitar a dupla tributação foi elaborado para se impedir que sejam tributados na fonte receitas ("lucros" - profits) remetidas ao país de residência, sem que haja uma presença efetiva da empresa no outro país, a não ser que o rendimento seja abrangido nos outros itens específicos do tratado.

Logo, se houver um estabelecimento permanente (no que se remete ao art. 5º dessas convenções, que define os critérios para este fim), ou houver uma subsidiária ou controlada, os lucros também podem ser tributados pelo país em que eles são gerados.

Nesse sentido, novamente valho-me dos valorosos argumentos do i. Conselheiro Marcos Aurélio Pereira Valadão traçados no bojo do acórdão XXXXX-002.330: importa ressaltar que à época da proposta de redação do art. 7 (no início do século passado e depois na década de 1940 - modelos do México e Londres), não existiam normas CFC, tendo essas surgido somente na década de 1960, originalmente nos EUA. Portanto, cai por terra o argumento de que a redação do art. 7 dos acordos destinados a evitar a dupla tributação teria como objetivo impedir a aplicação das normas CFC.

Também não se pode, portanto, querer atribuir à expressão "os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado" o sentido restritivo de impedir que um determinado país adote normas de transparência fiscal internacional. Esse, inclusive, é o entendimento esposado pela OCDE nos comentários de sua Convenção-Modelo. Nesse sentido, vide os seguintes excertos, conforme edição atualizada em 2010, com tradução livre:

Parágrafo 23 dos comentários ao artigo 1º:

8 GRECO, Marco Aurélio; ROCHA, Sergio Andre. Tributação Direta: Imposto sobre a Renda. In:

UCKMAR, Victor et al. Manual de Direito Tributário Internacional. São Paulo: Dialética:2012, p. 407-

408.

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Fl. 1375

Fl. 28 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

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23. A utilização de "companhias de base" ["base companies", em inglês] também pode ser tratada através de normas sobre sociedades controladas no exterior ["Controlled Foreign Corporations/CFC", em inglês]. Um número significativo de países membros e não membros tem adotado tal legislação. Conquanto o desenho desse tipo de legislação varie consideravelmente de país para país, um traço comum dessas regras, agora internacionalmente reconhecidas como um instrumento legítimo para proteger a base tributária local, é que elas resultam na tributação, por um Estado Contratante, de seus residentes relativamente à renda proveniente de sua participação em certas entidades estrangeiras. Argumentou-se algumas vezes, com base em certa interpretação de dispositivos da Convenção tais como o artigo 7º, parágrafo 1º, e o artigo 10, parágrafo 5º, que esse traço comum da legislação sobre sociedades controladas no exterior estaria em conflito com tais dispositivos. Pelos motivos expostos nos parágrafos 14 dos comentários ao artigo 7º e 37 dos comentários ao artigo 10, esta interpretação não está de acordo com o texto dos dispositivos. A interpretação também não se sustenta quando os dispositivos são lidos em seu contexto. Portanto, muito embora alguns países tenham considerado útil esclarecer expressamente, em suas convenções, que a legislação das sociedades controladas no exterior não está em conflito com a Convenção, tal esclarecimento não se faz necessário. Reconhece-se que a legislação das sociedades controladas no exterior estruturada dessa forma não é contrária aos dispositivos da Convenção.

Parágrafo 14 dos comentários ao artigo 7º:

14. O propósito do parágrafo 1º é traçar limites ao direito de um Estado Contratante tributar os lucros de empresas situadas em outro Estado Contratante. O parágrafo não limita o direito de um Estado Contratante tributar seus próprios residentes com base nos dispositivos relativos a sociedades controladas no exterior encontrados em sua legislação interna, ainda que tal tributo, imposto a esses residentes, possa ser computado em relação à parte dos lucros de uma empresa residente em outro Estado Contratante atribuída à participação desses residentes nessa empresa. O tributo assim imposto por um Estado sobre seus próprios residentes não reduz os lucros da empresa do outro Estado e não se pode dizer, portanto, que teve por objeto tais lucros (ver também o parágrafo 23 dos comentários ao artigo 1º e parágrafos 37 a 39 dos comentários ao artigo 10).

Outrossim, o recente relatório final divulgado no âmbito da Ação 3 do projeto Base Erosion and Profit Shifting BEPS, conduzido pela OCDE sob determinação de todos os países pertencentes ao chamado G20, tratou como renda "atribuída aos acionistas" (attributed to shareholders) a parcela tributada no país que impõe a norma CFC. Nesse sentido, embora alguns países já o façam, tendo em vista que algumas normas CFC só se aplicam a certos tipos de renda, recomenda que as regras de CFC incluam uma definição de rendimento de Companhias Controladas no Exterior e estabeleça uma lista não exaustiva de abordagens ou combinação de abordagens que as regras de CFC poderiam utilizar para tal definição 9 . Portanto, não se trata de tributar a renda da CFC, mas, sim, uma parcela atribuída na renda do acionista.

9 Conforme OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project 2015 Final Reports, pp 13 e 14. Disponível em: <

https://www.oecd.org/ctp/beps-reports-2015-executive-summaries.pdf>. Acesso em 10 de maio de 2017. Eis o texto em sua originalidade: "Definition of income - Although some countries’ existing CFC rules treat all the income of a CFC as" CFC income "that is attributed to shareholders in the parent jurisdiction, many CFC rules only apply to

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Fl. 29 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

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Por outro lado, também não se pode compreender a sistemática adotada pela lei brasileira como se estivesse tributando uma espécie de"dividendos presumidos".

Primeiro, porque o dividendo é um conceito bem delineado no âmbito da legislação societária. Assim, não basta a mera deliberação dos sócios para que todo o lucro auferido num determinado período se converta em dividendos. Como se sabe, há diversas situações em que os lucros devem ser destinados, por determinação legal ou estatutária, a pessoas distintas dos sócios. Então, não se pode garantir que todo o lucro deve ser dividido segundo as participações societárias.

Segundo, porque quando o dividendo é, de fato, distribuído, seguindo o método de alívio da bitributação jurídica utilizado pela maioria dos países, deve se dar o crédito do imposto retido pelo país da fonte. Porém, a legislação brasileira não faz exatamente isso. Como não houve, de fato, a distribuição do dividendo, não há imposto retido na fonte. Então, o que se possibilita é a compensação do imposto pago sobre o lucro pela empresa não residente. Vejam bem, não se trata de alívio da bitributação jurídica, mas, sim, da bitributação econômica através da compensação de parcelas do imposto apurado pela empresa residente (a brasileira), segundo os complicados critérios estabelecidos no artigo 14 da IN/SRF nº 213/02 10 . E percebam que existe até a possibilidade de compensar aquele imposto do exterior com a CSLL devida pela empresa brasileira (artigo 15 da mesma IN) 11 . Veja-se:

COMPENSAÇÃO DO IMPOSTO PAGO NO EXTERIOR COM O IMPOSTO DE RENDA DEVIDO NO BRASIL

Art. 14. O imposto de renda pago no país de domicílio da filial, sucursal, controlada ou coligada e o pago relativamente a rendimentos e ganhos de capital, poderão ser compensados com o que for devido no Brasil.

§ 1º Para efeito de compensação, considera-se imposto de renda pago no país de domicílio da filial, sucursal, controlada ou coligada ou o relativo a rendimentos e ganhos de capital, o tributo que incida sobre lucros, independentemente da denominação oficial adotada e do fato de ser este de competência de unidade da federação do país de origem.

§ 2º O tributo pago no exterior, a ser compensado, será convertido em Reais tomando-se por base a taxa de câmbio da moeda do país de origem, fixada para venda, pelo Banco Central do Brasil, correspondente à data de seu efetivo pagamento.

§ 3º Caso a moeda do país de origem do tributo não tenha cotação no Brasil, o seu valor será convertido em Dólares dos Estados Unidos da América e, em seguida, em Reais.

certain types of income. The report recommends that CFC rules include a definition of CFC income, and it sets out a non-exhaustive list of approaches or combination of approaches that CFC rules could use for such a definition".

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Fl. 30 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

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§ 4º A compensação do imposto será efetuada, de forma individualizada, por controlada, coligada, filial ou sucursal, vedada a consolidação dos valores de impostos correspondentes a diversas controladas, coligadas, filiais ou sucursais.

§ 5º Tratando-se de filiais e sucursais, domiciliadas num mesmo país, poderá haver consolidação dos tributos pagos, observado o disposto no § 2º do art. 3º e § 5º do art. 4º.

§ 6º A filial, sucursal, controlada ou coligada, no exterior, deverá consolidar os tributos pagos correspondentes a lucros, rendimentos ou ganhos de capital auferidos por meio de outras pessoas jurídicas nas quais tenha participação societária.

§ 7º O tributo pago no exterior, passível de compensação, será sempre proporcional ao montante dos lucros, rendimentos ou ganhos de capital que houverem sido computados na determinação do lucro real.

§ 8º Para efeito de compensação, o tributo será considerado pelo valor efetivamente pago, não sendo permitido o aproveitamento de crédito de tributo decorrente de qualquer benefício fiscal.

§ 9º O valor do tributo pago no exterior, a ser compensado, não poderá exceder o montante do imposto de renda e adicional, devidos no Brasil, sobre o valor dos lucros, rendimentos e ganhos de capital incluídos na apuração do lucro real.

§ 10. Para efeito do disposto no parágrafo anterior, a pessoa jurídica, no Brasil, deverá calcular o valor:

I - do imposto pago no exterior, correspondente aos lucros de cada filial, sucursal, controlada ou coligada e aos rendimentos e ganhos de capital que houverem sido computados na determinação do lucro real;

II - do imposto de renda e adicional devidos sobre o lucro real antes e após a inclusão dos lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior.

§ 11. Efetuados os cálculos na forma do § 10, o tributo pago no exterior, passível de compensação, não poderá exceder o valor determinado segundo o disposto em seu inciso I, nem à diferença positiva entre os valores calculados sobre o lucro real com e sem a inclusão dos referidos lucros, rendimentos e ganhos de capital, referidos em seu inciso II.

§ 12. Observadas as normas deste artigo, a pessoa jurídica que tiver os lucros de filial, sucursal e controlada, no exterior, apurados por arbitramento, segundo o disposto nas normas específicas constantes desta Instrução Normativa, poderá compensar o tributo sobre a renda pago no país de domicílio da referida filial, sucursal ou controlada, cujos comprovantes de pagamento estejam em nome desta.

§ 13. A compensação dos tributos, na hipótese de cômputo de lucros, rendimentos ou ganhos de capital, auferidos no exterior, na determinação do lucro real, antes de seu pagamento no país de domicílio da filial, sucursal, controlada ou coligada, poderá ser efetuada, desde que os comprovantes de

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Fl. 1378

Fl. 31 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

pagamento sejam colocados à disposição da Secretaria da Receita Federal antes de encerrado o ano-calendário correspondente.

§ 14. Em qualquer hipótese, a pessoa jurídica no Brasil deverá colocar os documentos comprobatórios do tributo compensado à disposição da Secretaria da Receita Federal, a partir de 1º de janeiro do ano subsequente ao da compensação.

§ 15. O tributo pago sobre lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior, que não puder ser compensado em virtude de a pessoa jurídica, no Brasil, no respectivo ano-calendário, não ter apurado lucro real positivo, poderá ser compensado com o que for devido nos anos-calendário subsequentes.

§ 16. Para efeito do disposto no § 15, a pessoa jurídica deverá calcular o montante do imposto a compensar em anos-calendário subsequentes e controlar o seu valor na Parte B do Livro de Apuração do Lucro Real (Lalur).

§ 17. O cálculo referido no § 16 será efetuado mediante a multiplicação dos lucros, rendimentos ou ganhos de capital computados no lucro real, considerados individualizadamente por filial, sucursal, coligada ou controlada, pela alíquota de quinze por cento, se o valor computado não exceder o limite de isenção do adicional, ou pela alíquota de vinte e cinco por cento, se exceder.

§ 18. Na hipótese de lucro real positivo, mas, em valor inferior ao total dos lucros, rendimentos e ganhos de capital nele computados, o tributo passível de compensação será determinado de conformidade com o disposto no § 17, tendo por base a diferença entre aquele total e o lucro real correspondente.

§ 19. Caso o tributo pago no exterior seja inferior ao valor determinado na forma dos §§ 17 e 18, somente o valor pago poderá ser compensado.

§ 20. Em cada ano-calendário, a parcela do tributo que for compensada com o imposto de renda e adicional devidos no Brasil, ou com a CSLL, na hipótese do art. 15, deverá ser baixada da respectiva folha de controle no Lalur.

COMPENSAÇÃO COM A CSLL DEVIDA NO BRASIL

Art. 15. O saldo do tributo pago no exterior, que exceder o valor compensável com o imposto de renda e adicional devidos no Brasil, poderá ser compensado com a CSLL devida em virtude da adição, à sua base de cálculo, dos lucros, rendimentos e ganhos de capital oriundos do exterior, até o valor devido em decorrência dessa adição.

Terceiro, porque não há na legislação nada que garanta que se houver uma efetiva distribuição de dividendos a posteriori , estes deixarão de ser tributados, tanto pelo país da fonte, quanto pelo Brasil. Ademais, inexiste qualquer previsão acerca dos efeitos daquela tributação sobre os "dividendos presumidos" em face da eventual tributação dos dividendos efetivamente distribuídos.

É verdade que os parágrafos 38 e 39 dos comentários ao artigo 10 deixam aberta a possibilidade de uma determinada legislação CFC tratar ou não os rendimentos tributados na

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Fl. 32 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

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categoria dos dividendos. Apesar disso, o conteúdo desses parágrafos é claro quanto à chance de haver problemas na efetivação de benefícios concedidos no âmbito do acordo no caso de a legislação CFC tratar os rendimentos tributados na categoria dos dividendos. Veja-se tais comentários, conforme edição atualizada em 2010, com tradução livre:

Parágrafos 38 e 39 dos comentários ao artigo 10:

38. A aplicação de tal legislação ou regras [de acordo com o parágrafo precedente, trata-se da legislação CFC ou de regras com efeitos similares] pode, porém, complicar a aplicação do artigo 23. Se a renda [da CFC] fosse atribuída ao contribuinte, cada item dessa renda teria que ser tratada na conformidade das provisões relevantes da Convenção (lucros de empresas, juros, royalties). Se é tratada como um dividendo presumido, então, ele é claramente derivado da companhia de base [a CFC], constituindo renda do país daquela companhia. Mesmo assim, não está claro se a renda deve ser tratada como um dividendo (artigo 10) ou como rendimentos não expressamente mencionados (artigo 21). Sob algumas dessas legislações ou regras, a renda tributável é tratada como um dividendo, com o resultado de que uma isenção concedida por uma convenção, por

exemplo, uma isenção de uma filial, seja também estendida ao contribuinte. É questionável se a Convenção requer que isso seja feito. Se o país de residência considera que esse não é o caso, pode se alegado que ele está obstruindo a normal operação da isenção de uma filial mediante tributação do dividendo (na forma de "dividendo presumido") antecipadamente.

39. Aonde os dividendos são realmente distribuídos pela companhia de base [a CFC], as provisões da convenção bilateral têm que ser normalmente aplicadas porque há renda de dividendos dentro do escopo da convenção. Assim, o país da companhia de base pode submeter o dividendo a uma tributação na fonte. O país da residência do controlador aplicará os métodos normais de eliminação da bitributação (isto é, o método do crédito ou da isenção). Isso implica que o tributo retido deve ser creditado no país de residência do controlador, mesmo que

o lucro distribuído (o dividendo) tenha sido tributado anos antes no âmbito da legislação CFC ou outras regras com efeitos similares. No entanto, a obrigação de dar o crédito nesse caso permanece questionável. Geralmente tal dividendo é isento da tributação (uma vez que ele já foi tributado no âmbito daquela legislação ou regras) e poderia ser arguido que não há base para o crédito do tributo retido. Por outro lado, o propósito do tratado seria frustrado se esse crédito pudesse ser evitado via simples antecipação da tributação pela oposição da citada legislação. O princípio geral estabelecido acima sugere que o crédito deveria ser concedido mesmo que os detalhes possam depender de tecnicalidades da citada legislação ou regras e do sistema de crédito dos tributos no exterior contra os tributos domésticos (por exemplo, tempo decorrido desde a tributação dos "dividendos presumidos"). Porém, os contribuintes que tenham recorrido a arranjos artificiais estão assumindo riscos que não estão completamente sob a salvaguarda das autoridades tributárias.

Nada obstante a existência dessa possibilidade, como já se disse, não parece que a lei brasileira tenha seguido esse difícil caminho.

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Fl. 1380

Fl. 33 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Registre-se, contudo, que a matéria sofrerá profundas alterações para os fatos geradores futuros por obra do conteúdo introduzido pela Lei nº 12.973/14.

No caso presente, a jurisdição brasileira não tem conexão com o lucro produzido pelas empresas sediadas no exterior. A nossa lei não pode alcançar estas últimas sem que algum critério de conexão se estabeleça. Portanto, o que a nossa lei faz é tributar a nossa empresa, residente, pelo natural critério da residência. Apenas o cálculo da renda tributada nesta empresa, conforme determinado pela lei interna, é que é baseado nos lucros apurados pela empresa no exterior. A compensação do imposto pago sobre o lucro pela empresa não residente, para alívio da bitributação econômica, é mera liberalidade da lei interna. Assim como, se existisse (ou vier a existir) determinação para a não tributação dos dividendos efetivamente distribuídos a posteriori , esta seria (ou será) também outra liberalidade (uma vez que já havia sido concedido o alívio anterior).

Tal entendimento, sublinhe-se, é o mesmo adotado pela RFB oficialmente em por meio da Solução de Consulta Interna Cosit nº 18, de 08 de agosto de 2013, cuja ementa recebeu a seguinte redação:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA IRPJ LUCROS AUFERIDOS POR EMPRESAS COLIGADAS OU CONTROLADAS DOMICILIADAS NO EXTERIOR

A aplicação do disposto no art. 74 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, não viola os tratados internacionais para evitar a dupla tributação. Dispositivos Legais: art. 98 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, arts 25 e 26 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, arts. 21 e 74 da Medida Provisória nº 2.158- 35, de 24 de agosto de 2001, e Artigo 7 da Convenção-Modelo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Convém transcrever as conclusões de tal ato:

34. Em face do exposto, conclui-se que a aplicação do disposto no art. 74 da MP nº 2.158-35, de 2001, não viola os tratados internacionais para evitar a dupla tributação pelas seguintes razões:

34.1. a norma interna incide sobre o contribuinte brasileiro, inexistindo qualquer conflito com os dispositivos do tratado que versam sobre a tributação de lucros;

34.2. o Brasil não está tributando os lucros da sociedade domiciliada no exterior, mas sim os lucros auferidos pelos próprios sócios brasileiros; e

34.3. a legislação brasileira permite à empresa investidora no Brasil o direito de compensar o imposto pago no exterior, ficando, assim, eliminada a dupla tributação, independentemente da existência de tratado.

De igual forma, recentemente o próprio CARF vem adotando tal entendimento, chamando atenção a decisão prolatada pela Câmara Superior de Recursos Fiscais na sessão de 04 de maio de 2016 (Acórdão XXXXX-002.330), em brilhante voto vencedor do i. Conselheiro Marcos Aurélio Pereira Valadão em que são rebatidos todos os argumentos usualmente utilizados pelos que defendem tese contrária à exposta no presente voto.

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Fl. 1381

Fl. 34 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Portanto, não assiste razão à Recorrente. Inexiste ofensa ao Acordos firmados pelo Brasil com os países onde estão sediadas as controladas (Áustria e Argentina), seja pelo artigo 7, seja pelo artigo 23, parágrafo 4.

Desse modo, impõe-se a manutenção integral da exigência.

3 CONCLUSÃO

Isto posto, voto por NÃO CONHECER do Recurso Especial da Fazenda Nacional, e por CONHECER do Recurso Especial do Contribuinte e, no mérito deste, por NEGAR-LHE PROVIMENTO.

(documento assinado digitalmente)

Fernando Brasil de Oliveira Pinto

Declaração de Voto

Conselheiro Luis Henrique Marotti Toselli

Optei por apresentar a presente declaração de voto para evidenciar as razões que levaram a metade do Colegiado a divergir do voto do I. Relator no mérito, bem como, no conhecimento, a maioria tê-lo acompanhado apenas com base em suas conclusões.

Neste último ponto, vale observar que a maioria dos Julgadores, ao contrário do Relator, também considerou como paradigma hábil a demonstrar a necessária divergência jurisprudencial o Acórdão nº 1402-002.388.

Basta verificar o que restou assentado na decisão ora comparada, que diverge justamente no que se busca rediscutir. Veja-se: O art. 74 da MP nº 2.158/01 tem efeito de norma CFC por considerar transparente as controladas e coligadas no exterior, mas não possui a sua finalidade típica, antiabusiva, específica e excepcional, o que permitiria sua aplicação em harmonia com as disposições das normas internacionais, firmadas com o intuito de se evitar a dupla tributação.A hipótese de tributação delineada pelo art. 25 da Lei nº 9.249/95, em comunhão com a disposição do art. 74 da MP nº 2.158/01, atrai e confirma a incidência do art. da Convenção firmada entre Brasil e Argentina, sendo norma de bloqueio, afastando a legislação doméstica, prevalecendo o disposto no pacto internacional, como previsto no comando do art. 98 do CTN, reiteradamente confirmado pelo E. STJ.

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Fl. 1382

Fl. 35 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Quanto ao mérito, considerando que essa mesma matéria foi analisada no Acórdão nº 9101-006.247 , de minha relatoria, em Sessão de 9 de agosto de 2022, sendo que na época o contribuinte saiu vitorioso por maioria de votos, reproduzo o voto vencedor naquela ocasião com alguns complementos, voto este que inclusive foi por mim exposto nesta mesma Sessão de Julgamento em outros casos que figurei como relator (Processos 12448.731470/2013-71, 16682.723006/2015-51 e 16561.720132/2017-92):

Da prevalência dos Tratados Internacionais frente a legislação interna (impossibilidade de aplicação do art. 74 da MP XXXXX-35/2001 nesse caso concreto)

A controvérsia envolve a interpretação sistemática da tributação sobre lucros auferidos por empresas controladas domiciliadas no exterior (no caso Argentina e Áustria), prevista no artigo 74 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, com a norma de "bloqueio" prescrita no artigo 7 do acordo celebrado pelo Brasil com estes Países.

Pois bem.

Sobre o regime jurídico da tributação dos lucros no exterior, o presente Julgador, em coautoria com o I. Conselheiro Alexandre Evaristo Pinto, assim se manifestou: 12

Em primeiro lugar, sempre é importante registrar que as regras de lucros no exterior, também conhecidas como "controlled foreign companies" (CFC), não deveriam ser um regime geral de tributação da renda em bases universais ("wordwide income taxation"), mas sim de normas especiais que deveriam evitar que o contribuinte possa afastar ou diferir o pagamento do imposto de renda sobre rendimentos por ele auferidos no exterior através da interposição de sociedades.

Nesse sentido, as regras CFC seriam normas antiabusivas que apenas deveriam ser aplicadas em situações excepcionais, ou seja, sob certas condições, como, por exemplo, nas hipóteses de (i) autonomia fiscal da autoridade sediada no exterior; (ii) existência de controle da sociedade estrangeira pelo residente; (iii) apuração de rendas passivas pela pessoa jurídica sediada no exterior; e (iv) sua localização em país com tributação favorecida. 13

Com relação à legislação CFC brasileira antes da Lei n. 12.973/2014, Heleno Torres assinalava alguns dos testes que a legislação CFC brasileira poderia ter adotado para fins de definição das hipóteses em que ela deveria ser aplicável, isto é, a controlada no exterior fosse considerada sociedade transparente. Os testes citados pelo referido autor englobam: (i) a comparação entre as alíquotas dos dois ordenamentos, teste do escopo social; (ii) verificação se a sociedade controlada é cotada em bolsa de valores; (iii) verificação da distribuição aceitável de rendimentos; (iv) verificação da data contábil e prazo em que o sujeito se manteve vinculado à sociedade; e (v) o teste do "de minimis", pelo qual se busca um teto aceitável de distribuição. 14

Por sua vez, no tocante ao regime instaurado a partir da Lei nº 12.973/14, Matheus Piconez pontua que tais regras não seguem as definições e objetivos gerais de regras CFC, de modo que as regras brasileiras não são antiabuso, sendo meramente

12 "Dos lucros contábeis registrados por controladas localizadas no exterior e os limites jurídicos para a glosa de

despesas neles registradas". In. Revista de Direito Contábil Fiscal. São Paulo: volume 3. Número 5. Jan/Jun 2021

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Fl. 1383

Fl. 36 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

arrecadatórias, dificultando ou impossibilitando o investimento internacional de empresas brasileiras. 15

Desse modo, a norma brasileira CFC é bem mais ampla do que as normas CFC de outros países, incluindo a tributação de rendas ativas e de investidas localizadas em países com níveis adequados de tributação da renda, fatos estes que trazem o inconveniente de desestimular a expansão internacional das pessoas jurídicas brasileiras, constituindo-se, ademais, em uma grande desvantagem comparativa, para utilizarmos o contrário do jargão desenvolvido pelo economista David Ricardo.

Feitas as ponderações iniciais sobre o que deveria ser uma norma CFC, passamos à evolução histórica das normas brasileiras que regem o tema.

Conforme mencionado anteriormente, a tributação das pessoas jurídicas brasileiras em bases universais começou com o advento da Lei n. 9.249/1995, que prescreveu, em seu artigo 25, que:

Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano.

(...)

§ 2º Os lucros auferidos por filiais, sucursais ou controladas, no exterior, de pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil serão computados na apuração do lucro real com observância do seguinte:

I - as filiais, sucursais e controladas deverão demonstrar a apuração dos lucros que auferirem em cada um de seus exercícios fiscais, segundo as normas da legislação brasileira;

II - os lucros a que se refere o inciso I serão adicionados ao lucro líquido da matriz ou controladora, na proporção de sua participação acionária, para apuração do lucro real.

III - se a pessoa jurídica se extinguir no curso do exercício, deverá adicionar ao seu lucro líquido os lucros auferidos por filiais, sucursais ou controladas, até a data do balanço de encerramento;

IV - as demonstrações financeiras das filiais, sucursais e controladas que embasarem as demonstrações em Reais deverão ser mantidas no Brasil pelo prazo previsto no art. 173 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966.

A redação dos referidos dispositivos legais não passou ilesa a críticas, sendo que foram levantados dois pontos polêmicos: o primeiro em relação ao aspecto temporal, isto é, quando efetivamente o lucro do exterior deve ser tributado: se por ocasião da distribuição ou se automático (por ocasião do fechamento do balanço); e o segundo ponto em relação ao aspecto quantitativo, ou seja, qual a efetiva base de cálculo: se é o lucro líquido "puro" (lucro contábil ou lucro societário) ou se é o lucro líquido ajustado pelas normas tributáveis brasileiras ("lucro fiscal").

(...) até o advento do artigo 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001, tributava-se o lucro efetivamente distribuído, na linha do que dispunham a Instrução Normativa n. 38/1996 e, em seguida, a Lei n. 9.532/1997.

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Fl. 1384

Fl. 37 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Todavia, após a edição da Medida Provisória n. 2.158-35/2001, o momento de tributação passou a ser automático quando do encerramento de cada ano-calendário, o que acabou, a passos tortos, se repetindo sob a égide da lei atual (Lei 12.973/2014).

Mais precisamente, dispunha o artigo 74 da MP XXXXX-35/2001, vigente à época dos fatos geradores, que:

Artigo 74 - Para fim de determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e do art. 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na forma do regulamento.

Parágrafo único. - Os lucros apurados por controlada ou coligada no exterior até 31 de dezembro de 2001 serão considerados disponibilizados em 31 de dezembro de 2002, salvo se ocorrida, antes desta data, qualquer das hipóteses de disponibilização previstas na legislação em vigor.

A constitucionalidade desse dispositivo, notadamente a "distribuição automática" dos lucros auferidos no exterior por intermédio de controladas ou coligadas, foi objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 2588), ação esta que, conforme resumido no voto do Acórdão nº 1402-004.360, da lavra da Conselheira Junia Roberta Gouveia Sampaio, foi julgada pelo STF:

(...) com eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de que a regra prevista no caput do art.744 da MP nº2.1588-35, de 2001:

a) se aplica às controladas situadas em países considerados paraísos fiscais; e b) não se aplica às coligadas localizadas em países sem tributação favorecida.

Dessa forma, o resultado da decisão seria o seguinte:

Ao analisar a ementa da decisão proferida na ADIN 2588 verifica-se que, embora tenha suscitado a inconstitucionalidade na hipótese de tributação das controladas em países de tributação normal não foi obtida decisão definitiva quanto à esse ponto. Confira-se: TRIBUTÁRIO. INTERNACIONAL. IMPOSTO DE RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER NATUREZA. PARTICIPAÇÃO DE EMPRESA CONTROLADORA OU COLIGADA NACIONAL NOS LUCROS AUFERIDOS POR PESSOA JURÍDICA CONTROLADA OU COLIGADA SEDIADA NO EXTERIOR. LEGISLAÇÃO QUE CONSIDERA DISPONIBILIZADOS OS LUCROS NA DATADO BALANÇO EM QUE TIVEREM SIDO APURADOS ("31 DE DEZEMBRO DE CADA ANO"). ALEGADA VIOLAÇÃO DO CONCEITO CONSTITUCIONAL DE RENDA (ART. 143, III DA CONSTITUIÇÃO).

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Fl. 1385

Fl. 38 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

APLICAÇÃO DA NOVA METODOLOGIA DE APURAÇÃO DO TRIBUTO PARA A PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS APURADA EM 2001. VIOLAÇÃO DAS REGRAS DA IRRETROATIVIDADE E DA ANTERlORlDADE. MP XXXXX-35/2001, ART. 74. LEI 5.720/1966, ART. 43, § 22 (LC 104/2000).

1. Ao examinar a constitucionaldade do art. 43, § 2Q do CTN e do art. 74 da MP 2.158/2001, o Plenário desta Suprema Corte se dividiu em quatro resultados:

1.1. Inconstitucionalidade incondicional, já que O dia 31 de dezembro de cada ano está dissociado de qualquer ato jurídico ou econômico necessário ao pagamento de participação nos lucros;

1.2. Constitucionalidade incondicional, seja em razão do caráter antielisivo (impedir "planejamento tributário") ou antievasivo (impedir sonegação) da normatização, ou devido à submissão obrigatória das empresas nacionais investidoras ao Método de de.Equivalência Patrimoníal-MEp, previsto na Lei das Sociedades por Acoes (Lei 6.404/1976, art. 248);

1.3. Inconstitucionalidade condicional, afastada a aplicabilidade dos textos impugnados apenas em relação às empresas coligadas, porquanto as empresas nacionais controladoras teriam plena disponibilidade jurídica e econômica dos lucros auferidos pela empresa estrangeira controlada;

1.4. Inconstitucionalidade condicional, afastada a aplicabilidade do texto impugnado para as empresas controladas ou coligadas sediadas em países de tributação normal, com o objetivo de preservar a função antievasiva da normatização.

2. Orientada pelos pontos comuns às opiniões majoritárias, a composição do resultado reconhece:

2.1. A inaplicabilidade do art. 74 da MP XXXXX-35 às empresas nacionais coligadas a pessoas jurídicas sediadas em países sem tributação favorecida, ou que não sejam "paraísos fiscais";

2.2. A aplicabilidade do art. 74 da MP XXXXX-35 às empresas nacionais controladoras de pessoas jurídicas sediadas em países de tributação favorecida, ou desprovidos de controles societários e fiscais adequados ("paraísos fiscais", assim definidos em lei) 2.3. A inconstitucionalidade do art. 74 par.00., da MP XXXXX-35/2001-de modo que o texto impugnado não pode ser aplicado em relação aos lucros apurados até 31 de dezembro de 2001.

Ação Direta de Inconstitucionalidade conhecida e julgada parcialmente procedente, para dar interpretação conforme ao art. 74 da MP XXXXX-35/2001, bem como para declarar a inconstitucionalidade da clausula de retroatividade prevista no art. 74, par. ún., da MP 2.158/2001.(grifamos)

Todavia, ao analisar a parte dispositiva da decisão, verifica-se que ela se restringe aos pontos mencionados anteriormente:

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a presidência do ministro Joaquim Barbosa, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos em, julgar parcialmente procedente a ação para, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, conferir interpretação conforme, no sentido de que o art. 74 da MP nº 2.158-35/2001 não se aplica às empresas "coligadas" localizadas em países sem tributação favorecida (não "paraísos fiscais"), e que o referido dispositivo se aplica às empresas "controladas" localizadas em países de tributação favorecida ou desprovidos de controles societários e fiscais adequados ("paraísos fiscais", assim definidos em lei). O Tribunal deliberou pela não aplicabilidade retroativa do parágrafo único do art. 74 da MP nº 2.158-35/2001.

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Fl. 1386

Fl. 39 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

De fato, a decisão proferida na ADIN 2588 não atingiu a tributação de empresas controladas e domiciliadas em países com tributação normal , isto é, países não considerados como paraísos fiscais . De igual modo não foi objeto deste julgado vinculante a análise sobre a aplicabilidade do artigo 74 da MP nº 2158-35/01 em relação aos lucros auferidos por investidas sediadas em países que possuam com o Brasil Acordos ou Convenções para fins de evitar a dupla tributação da renda, como é o caso da Áustria e Argentina.

Nessa situação, ou seja, sobre lucros de controladas domiciliadas nesses Países, que não são considerados paraíso fiscal -, entendo que não é cabível a cobrança de imposto de renda brasileiro no modo piloto automático, como prevê o referido artigo 74 e na linha do que pretende o Auto de Infração ora analisado, justamente em face da prevalência dos artigos 7 e 10 das Convenções Destinadas a Evitar a Dupla Tributação, celebradas entre o Brasil e a República da Argentina e da Áustria, respectivamente pelo Decreto nº 87.976/82 e Decreto nº 78.107/76, que assim dispõem:

Argentina - ARTIGO VII

Lucros das empresas

Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente aí situado. Se a empresa exercer sua atividade na forma indicada, seus lucros são tributáveis no outro Estado, mas unicamente à medida em que sejam atribuíveis a esse estabelecimento permanente.

2. Com ressalva das disposições do parágrafo 3, quando uma empresa de um Estado Contratante exercer sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente aí situado, serão atribuídos, em cada Estado Contratante, a esse estabelecimento permanente, os lucros que obteria se constituísse uma empresa distinta e separada, exercendo atividades idênticas ou similares em condições idênticas ou similares, e transacionando com absoluta independência com a empresa de que é um estabelecimento permanente.

3. No cálculo dos lucros de um estabelecimento permanente, é permitido deduzir as despesas que tiverem sido feitas para a consecução dos objetivos do estabelecimento permanente, incluindo as despesas de direção e os encargos gerais de administração assim realizados.

4. Nenhum lucro será atribuído a um estabelecimento permanente pelo simples fato de comprar bens ou mercadorias para a empresa.

5. Quando os lucros compreenderem elementos de rendimentos tratados separadamente nos outros artigos da presente Convenção, as disposições desses artigos não serão afetadas pelas disposições deste Artigo.

(...)

ARTIGO X

Dividendos

1. Os dividendos pagos por uma sociedade residente de um Estado Contratante a um residente do outro Estado Contratante são tributáveis nesse outro Estado.

2. Todavia, esses dividendos podem ser tributados no Estado Contratante onde reside a sociedade que os paga e de acordo com a legislação desse Estado.

Original

DF CARF MF

Fl. 1387

Fl. 40 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma Processo nº 16561.720050/2017-48

3. O disposto nos parágrafos 1 e 2 não se aplicam se o beneficiário dos dividendos, residente de um Estado Contratante, tiver, no outro Estado Contratante de que é residente a sociedade que paga os dividendos, um estabelecimento permanente ou uma base fixa a que estiver efetivamente ligada à participação geradora dos dividendos. Nesse caso, serão aplicáveis as disposições dos Artigos VII ou XIV, conforme o caso.

4. O termo "dividendos", usado no presente Artigo, designa os rendimentos provenientes de ações, ações ou direitos de fruição, ações de empresas mineradoras, partes de fundador ou outros direitos de participação em lucros, com exceção de créditos, bem como rendimentos de outras participações de capital assemelhados aos rendimentos de ações pela legislação tributária do Estado Contratante em que a sociedade que os distribuir seja residente.

5. Quando uma sociedade residente da Argentina tiver um estabelecimento permanente no Brasil, esse estabelecimento permanente poderá aí estar sujeito a um imposto retido na fonte de acordo com a legislação brasileira.

6. Quando uma sociedade residente de um Estado Contratante receber lucros ou rendimentos do outro Estado Contratante, esse outro Estado Contratante não poderá cobrar qualquer imposto sobre os dividendos pagos pela sociedade, exceto à medida em que esses dividendos forem pagos a um residente desse outro Estado ou à medida em que a participação geradora dos dividendos estiver efetivamente ligada a um estabelecimento permanente ou a uma base fixa situados nesse outro Estado, nem sujeitar os lucros não distribuídos da sociedade a um imposto sobre lucros não distribuídos, mesmo se os dividendos pagos ou os lucros distribuídos consistirem total ou parcialmente de lucros ou rendimentos provenientes desse outro Estado.

Áustria - Artigo 7 Lucros das empresas

1. Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado , a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente ai situado. Se a empresa execer sua atividade na forma indicada seus lucros serão tributáveis no outro Estado mas unicamente na medida em que forem atribuíveis a esse estabelecimento permanente.

2. Quando uma empresa de um Estado Contratante de um Estado Contratante exercer sua atividade no outro Estado Contratante através de um estabelecimento permanente ai situado serão atribuídos em cada Estado Contratante a esse estabelecimento permanente os lucros que obteria se constituísse uma empresa distinta e separada exercendo atividades idênticas ou similares em condições idênticas ou similares, e transacionando com absoluta independência com a empresa de que é um estabelecimento permanente.

3. No cálculo dos lucros de um estabelecimento permanente é permitido deduzir as despesas que tiverem sido feitas para a consecução dos objetivos do estabelecimento permanente, incluindo as despesas de administração assim realizados.

4. Nenhum lucro será atribuído a um estabelecimento permanente pelo simples fato de comprar mercadorias para a empresa.

5. Quando os lucros compreenderem elementos de rendimentos tratados separadamente nos outros artigos da presente Convenção, as disposições desses artigos não serão afetados pelas disposições deste Artigo.

6. O disposto nos parágrafos 1 a 5 também se aplica aos rendimentos recebidos pelo "Stille Gesellschafter" de uma "Stille Gesellschaft" da lei austríaca.

Original

DF CARF MF

Fl. 1388

Fl. 41 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

(...)

Áustria - Artigo 10

Dividendos

1. Os dividendos pagos por uma sociedade residente de uma Estado Contratante a um residente do outro Estado Contratante são tributáveis nesse outro Estado.

2. Todavia, esses dividendos podem ser tributados no Estado Contratante onde reside a sociedade que os paga de acordo com a legislação desse Estado, mas o imposto assim estabelecido não poderá exceder 15% do montante bruto dos dividendos.

Este parágrafo não afetará a tributação da sociedade com referência aos lucros que devem origem aos dividendos pagos.

3. O disposto nos parágrafos 1 e 2 não se aplica quando o beneficiário dos dividendo, residente de um Estado Contratante, tiver, no outro Estado Contratante de que é residente a sociedade que paga os dividendos, um estabelecimento permanente a que estiver ligada efetivamente a participação geradora dos dividendos. Neste caso, serão aplicáveis as disposições do Artigo7.

4. O terno "dividendos" usado no presente Artigo, designa os rendimentos provenientes de ações, ações ou direitos de fruição, ações de empresas mineradoras, partes de fundador ou outros direitos de participação em lucros com exceção de créditos bem como rendimentos de outras participações de capital assemelhados aos rendimentos de ações pela legislação fiscal do Estado Contratante em que a sociedade que os distribuir seja residente.

5. Quando uma sociedade residente da Áustria tiver um estabelecimento permanente no Brasil esse estabelecimento permanente poderá aí estar sujeito a um imposto retido da fonte de acordo com a legislação brasileira Todavia, esse impoto não poderá exceder 15% do montante bruto dos lucros do estabelecimento permanente, determinado após o pagamento do imposto de renda de sociedades referente a esses lucros.

6. A limitação da alíquota do imposto prevista nos parágrafos 2 e 5 não se aplica aos dividendos ou lucros pagos ou remetidos do Brasil antes de 1º de janeiro de 1976.

Interpretando ambos os dispositivos, Heleno Taveira Torres leciona que:

Na combinação dos dispositivos constantes dos art. 7º e 10 da CDT, exsurge o impedimento à tributação dos lucros e dividendos antes de sua efetiva distribuição, sob condição de disponibilidade então qualificada como "dividendo pago", como medida eventual de eliminar eventual dupla tributação ou tratamento discriminatório que são os fins primordiais desses tratados (Tributação de Controladas e Coligadas no Exterior e seus Desafios Concretos. In: Direito Tributário Internacional Aplicado . Vol VI. São Paulo: Quartier Latin, 2012. Pag. 435).

Como se vê, da conjugação dos dispositivos acima (artigos 7 e 10), os lucros provenientes de investimentos em sociedades ndomiciliadas na Argentina e Austria, sem que aqui possuam um estabelecimento permanente - como é a situação presente - apenas podem ser tributados, no Brasil, no momento em que houver pagamento de dividendos à controladora brasileira.

Original

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Fl. 1389

Fl. 42 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Não se pode perder de vista, nesse ponto, que o sistema jurídico brasileiro conferiu um caráter de especialidade aos Tratados Internacionais, os quais, com fundamento no artigo 98 do CTN 16 , devem prevalecer perante a legislação interna.

Como bem observou a Conselheira Junia Roberta Gouveia Sampaio, em voto vencido proferido no referido Acórdão nº 1402-004.360:

Os resultados auferidos em países com os quais o Brasil possui acordos para evitar a dupla tributação são objeto de regras especiais dispostas nas próprias convenções internacionais. Sobre tal matéria o artigo 98 do CTN determina que os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária e serão observadas pela a que lhes sobrevenha.

Sendo assim, as disposições dos acordos para evitar a dupla tributação sobre a renda devem ser aplicadas em detrimento daquelas fixadas pela legislação interna brasileira, mesmo nos casos em que as convenções sejam anteriores à Lei nº 9.249, de 1995, pois a prevalência dos tratados ocorre pelo critério da especialidade e não pelo critério de antiguidade da norma jurídica. Desse modo, os acordos podem ser modificados, denunciados ou revogados somente por mecanismos próprios do Direito dos Tratados. Nesse sentido, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial nº 1.325.709- RJ:

RECURSO ESPECIAL TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA DENEGADO NA ORIGEM. APELAÇÃO. EFEITO APENAS DEVOLUTIVO. PRECEDENTE. NULIDADE DOS ACÓRDÃOS RECORRIDOS POR IRREGULARIDADE NA CONVOCAÇÃO DE JUIZ FEDERAL. NÃO PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356⁄STF. IRPJ E CSLL. LUCROS OBTIDOS POR EMPRESAS CONTROLADAS NACIONAIS SEDIADAS EM PAÍSES COM TRIBUTAÇÃO REGULADA. PREVALÊNCIA DOS TRATADOS SOBRE BITRIBUTAÇÃO ASSINADOS PELO BRASIL COM A BÉLGICA (DECRETO 72.542⁄73), A DINAMARCA (DECRETO 75.106⁄74) E O PRINCIPADO DE LUXEMBURGO (DECRETO 85.051⁄80). EMPRESA CONTROLADA SEDIADA NAS BERMUDAS. ART. 74, CAPUT DA MP XXXXX-35⁄2001. DISPONIBILIZAÇÃO DOS LUCROS PARA A EMPRESA CONTROLADORA NA DATA DO BALANÇO NO QUAL TIVEREM SIDO APURADOS, EXCLUÍDO O RESULTADO DA CONTRAPARTIDA DO AJUSTE DO VALOR DO INVESTIMENTO PELO MÉTODO DA EQUIVALÊNCIA PATRIMONIAL. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, PARA CONCEDER A SEGURANÇA, EM PARTE.

(...)

3. A interpretação das normas de Direito Tributário não se orienta e nem se condiciona pela expressão econômica dos fatos, por mais avultada que seja, do valor atribuído à demanda, ou por outro elemento extrajurídico; a especificidade exegética do Direito Tributário não deriva apenas das peculiaridades evidentes da matéria jurídica por ele regulada, mas sobretudo da singularidade dos seus princípios, sem cuja perfeita absorção e efetivação, o afazer judicial se confundiria com as atividades administrativas fiscais.

4. O poder estatal de arrecadar tributos tem por fonte exclusiva o sistema tributário, que abarca não apenas a norma regulatória editada pelo órgão competente, mas também todos os demais elementos normativos do ordenamento, inclusive os ideológicos, os sociais, os históricos e os operacionais; ainda que uma norma seja editada, a sua

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Fl. 1390

Fl. 43 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

efetividade dependerá de harmonizar-se com as demais concepções do sistema: a compatibilidade com a hierarquia internormativa, os princípios jurídicos gerais e constitucionais, as ilustrações doutrinárias e as lições da jurisprudência dos Tribunais, dentre outras.

5. A jurisprudência desta Corte Superior orienta que as disposições dos Tratados Internacionais Tributários prevalecem sobre as normas de Direito Interno, em razão da sua especificidade. Inteligência do art. 98 do CTN. Precedente: (RESP 1.161.467-RS, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJe 01.06.2012).

6. O art. VII do Modelo de Acordo Tributário sobre a Renda e o Capital da OCDE utilizado pela maioria dos Países ocidentais, inclusive pelo Brasil, conforme Tratados Internacionais Tributários celebrados com a Bélgica (Decreto 72.542⁄73), a Dinamarca (Decreto 75.106⁄74) e o Principado de Luxemburgo (Decreto 85.051⁄80), disciplina que os lucros de uma empresa de um Estado contratante só são tributáveis nesse mesmo Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante, por meio de um estabelecimento permanente ali situado (dependência, sucursal ou filial); ademais, impõe a Convenção de Viena que uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado (art. 27), em reverência ao princípio basilar da boa-fé.

7. No caso de empresa controlada, dotada de personalidade jurídica própria e distinta da controladora, nos termos dos Tratados Internacionais, os lucros por ela auferidos são lucros próprios e assim tributados somente no País do seu domicílio; a sistemática adotada pela legislação fiscal nacional de adicioná-los ao lucro da empresa controladora brasileira termina por ferir os Pactos Internacionais Tributários e infringir o princípio da boa-fé na relações exteriores, a que o Direito Internacional não confere abono.

8. Tendo em vista que o STF considerou constitucional o caput do art. 74 da MP 2.158- 35⁄2001, adere-se a esse entendimento, para considerar que os lucros auferidos pela controlada sediada nas Bermudas, País com o qual o Brasil não possui acordo internacional nos moldes da OCDE, devem ser considerados disponibilizados para a controladora na data do balanço no qual tiverem sido apurados.

9. O art. 7o, § 1o. da IN⁄SRF 213⁄02 extrapolou os limites impostos pela própria Lei Federal (art. 25 da Lei 9.249⁄95 e 74 da MP XXXXX-35⁄01) a qual objetivou regular; com efeito, analisando-se a legislação complementar ao art. 74 da MP XXXXX-35⁄01, constata- se que o regime fiscal vigorante é o do art. 23 do DL 1.598⁄77, que em nada foi alterado quanto à não inclusão, na determinação do lucro real, dos métodos resultantes de avaliação dos investimentos no Exterior, pelo método da equivalência patrimonial, isto é, das contrapartidas de ajuste do valor do investimento em sociedades estrangeiras controladas.

10. Ante o exposto, conheço do recurso e dou-lhe parcial provimento, concedendo em parte a ordem de segurança postulada, para afirmar que os lucros auferidos nos Países em que instaladas as empresas controladas sediadas na Bélgica, Dinamarca e Luxemburgo, sejam tributados apenas nos seus territórios, em respeito ao art. 98 do CTN e aos Tratados Internacionais em causa; os lucros apurados por Brasamerican Limited, domiciliada nas Bermudas, estão sujeitos ao art. 74, caput da MP 2.158- 35⁄2001, deles não fazendo parte o resultado da contrapartida do ajuste do valor do investimento pelo método da equivalência patrimonial.

Da mesma forma, entendo inaplicável a tributação dos lucros da controlada Argentina com fundamento no artigo 10 do Tratado. Isso porque, como se verifica pela leitura do artigo acima transcrito, o seu alcance está restrito aos dividendos pagos. Nesse sentido, esclarecedor o voto do Conselheiro Luís Flávio Neto, no Acórdão nº 9101-002.332: (...)

Original

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Fl. 1391

Fl. 44 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Diante de todo o exposto, o Artigo VII, do Decreto 78.976/82 - Tratado Brasil e Argentina serve como norma de bloqueio e sobrepõe-se às disposições do art. 74 da MP nº 2.15835/ 01, mostrando-se improcedente o lançamento em relação aos lucros das controladas da contribuinte sediadas na Argentina, objeto deste processo administrativo.

Nenhum reparo cabe a esse racional.

Tal como positivado, o artigo 74 da MP nº 2158-35/01 conflita diretamente com o disposto não só do artigo 7, mas também do artigo 10 dos referidos Tratados, afinal todas essas regras notoriamente direcionam-se ao lucro apurado em face de investimentos no exterior.

Ora, é evidente que, enquanto a lei interna busca atingir o resultado do exterior de uma forma ampla e indistinta, os tratados internacionais limitam esse alcance geral, bloqueando a tributação desse mesmo resultado nas situações acordadas no contexto das relações internacionais, como é o caso do lucro de investidas holandesas e portuguesas.

Admitir a generalidade da escolha do Legislador para tributar lucros do exterior no modo piloto automático , ainda que na forma de adição fiscal ao lucro brasileiro, causaria uma indevida colisão com as regras já negociadas pelo próprio Estado no combate a uma dupla tributação da renda, as quais, conforme exposto, devem se sobrepor.

Nesse sentido lecionam Alberto Xavier, José Henrique Longo e Sérgio André Rocha, respectivamente:

Infringiria, por isso, frontalmente, os tratados qualquer tentativa de aplicação de preceito legal que determinasse a adição à base de cálculo do imposto (lucro líquido da sociedade brasileira, contribuinte de um Estado) dos lucros próprios da sociedade controlada domiciliada em outro Estado contratante, pois tal significaria o Brasil arrogar-se uma competência tributária cumulativa, quando o tratado é expresso em atribuir ao Estado de domicílio da controlada ou coligada no exterior uma competência tributária exclusiva. 17

Se o Brasil é signatário da Convenção de Viena que prescreve a interpretação dos Tratados tendo em conta a boa-fé das partes (artigo 31), não é razoável (artigo 32) que se permita o uso de ficção em legislação de origem interna para fraudar o artigo 7º do Tratado que impede a incidência do IRPJ e da CSL sobre o lucro de controlada ou subsidiária na Espanha. 18

... o que se alcança com o artigo 74 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001 é efetivamente a tributação dos lucros da empresa não residente, como deixa claro a própria redação deste artigo, ao determinar que "os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados". Dessa forma, haveria aqui uma espécie de "planejamento tributário abusivo" do Estado brasileiro para se furtar ao cumprimento das obrigações assumidas nos tratados internacionais. 19

Digna de nota, também, é a seguinte passagem do voto de relatoria do ex Conselheiro Marcos Shigueo Takata no Acórdão nº 1103-001.122:

17 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 2010. P. 380.

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Fl. 1392

Fl. 45 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

Como o pressuposto é a constitucionalidade do art. 74 da MP 2.158/01, só posso concluir que o regime de transparência fiscal adotado não tem como materialidade os dividendos, pois, como se viu, não há como se tributarem dividendos fictos ou dividendos distribuídos fictamente. Adiante esclareço a materialidade do art. 74 da MP 2.158/014.

A técnica de tributação não pode ser manejada ou manipulada para alcançar materialidade ou seu aspecto temporal por ficção legal, nos termos deduzidos alhures.

(...)

Pelo art. 74 da MP 2.158/01 não se tributam dividendos fictos ou dividendos fictamente distribuídos.

O art. 10 dos tratados em discussão, ao estabelecer a competência cumulativa dos Estados contratantes, não alcança os lucros auferidos e não distribuídos por controlada e coligada domiciliadas num dos Estados contratantes: ele delimita a competência cumulativa dos Estados contratantes, para a tributação dos dividendos efetivamente distribuídos.

Prossigo.

Como acentuei alhures, o regime de CFC (Controlled Foreign Corporations) adotado pelo Brasil não tem função antielisiva. É um regime de transparência fiscal distinto do incorporado pela quase totalidade dos países que o agasalham. A transparência fiscal instituída pelo art. 74 da MP 2.158/01 c/c o art. 25 da Lei 9.249/95 é o de considerar os lucros apurados por qualquer controlada ou coligada no exterior como auferidos diretamente pela controladora ou coligada-participante no Brasil.

Logo, o regime de CFC do Brasil, aperfeiçoado pelo art. 74 da MP 2.158/01, é o da tributação dos lucros auferidos no exterior pela pessoa jurídica no País, por meio ou por intermédio de suas controladas ou coligadas no exterior.

Por outras palavras, sem rodeios: a tributação do art. 74 da MP 2.158/01 recai sobre os lucros da investida no exterior que são considerados como auferidos diretamente pela investidora no Brasil.

(...)

A propósito, em sessão de 12 de novembro, esta C. 1a Turma da CSRF, em julgamento do qual participei (Acórdão nº 9101-005.809), afastou a tributação em caso semelhante, de acordo com a seguinte ementa:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ)

Ano-calendário: 2004, 2005 LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR POR INTERMÉDIO DE SOCIEDADE CONTROLADA FORA DE PARAÍSO FISCAL OU PAÍS COM TRIBUTAÇÃO FAVORECIDA. ADIÇÃO DOS RESULTADOS POSITIVOS NA APURAÇÃO DA INVESTIDORA BRASILEIRA. JULGAMENTO STF. AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO EFICAZ.

No julgamento da ADI nº 2.588/DF pelo E. Supremo Tribunal Federal, que tratou da inconstitucionalidade na aplicação do art. 74 da MP nº 2.158/01 aos lucros auferidos por empresa controlada no exterior, situada fora de paraísos fiscais ou de países com tributação favorecida, não houve a deliberação e concordância necessárias sobre essa hipótese específica, dentro da matéria apreciada, para promover o controle de

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Fl. 1393

Fl. 46 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

constitucionalidade concentrado pretendido pela Ação proposta, capaz de produzir efeitos erga omnes.

LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR POR INTERMÉDIO DE SOCIEDADE CONTROLADA LOCALIZADA NA ARGENTINA. EXISTÊNCIA DE CONVENÇÃO DESTINADA A EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO. ONERAÇÃO DOS LUCROS PRÓPRIOS DA ENTIDADE ESTRANGEIRA. APLICAÇÃO DO ART. 7º. BLOQUEIO DAS NORMAS DOMESTICAS.

O art. 74 da MP nº 2.158/01 tem efeito de verdadeira norma CFC (Controlled Foreign Corporation rule) por considerar totalmente transparentes as empresas controladas e coligadas no exterior, mas não possui a justificativa e a finalidade típicas, antiabusivas, o que permitiria a sua aplicação em harmonia com as disposições das normas internacionais, firmadas entre os Estados com o intuito de se evitar a dupla tributação. A hipótese de tributação delineada pelo art. 25 da Lei nº 9.249/95, em comunhão com a disposição do posterior art. 74 da MP nº 2.158/01, na medida que alcança os lucros auferidos pela entidade domiciliada no exterior, atrai e confirma a incidência do art. da Convenção firmada entre Brasil e Argentina, sendo uma norma de bloqueio que impede a incidência regular da legislação doméstica que promove tal oneração fiscal, prevalecendo, assim, o disposto no pacto internacional, como o previsto no comando do art. 98 do Código Tributário Nacional, reiteradamente confirmado pelo E. Superior Tribunal de Justiça.

Do voto condutor desse precedente, do I. ex Conselheiro Caio Cesar Nader Quintella, e que foi por mim acompanhado, extrai-se que:

É certo, então, que a Convenção firmada com a Argentina deve ser observada.

(...)

No entender desse Conselheiro, que se alinha às citações acima colacionadas, é evidente e inquestionável estarmos diante da tributação do lucro auferido por empresas domiciliadas no exterior.

Nesse sentido é a lição do ex-conselheiro e Professor Luís Flávio Neto 20 (Relator do tão emblemático v. Acórdão nº 9101-002.332, proferido por esta mesma C. 1a Turma da CSRF e publicado em 14/07/2016, em que restou vencido por voto de qualidade, em robusto, profundo e histórico embate acadêmico com, o também ex-conselheiro e Professor, Marcos Aurélio Pereira Valadão) que objetivamente comenta e conclui sobre a regra da tributação dos lucros das empresas, dentro das disposições padrão da CM- OCDE, como é no caso da Convenção firmada com a Argentina:

No coração dos acordos de bitributação celebrados pelo Brasil, nos moldes da CM- OCDE, consta a regra de que os lucros de empresas são tributáveis exclusivamente no Estado de residência da pessoa jurídica que os aufere. É o que se dá com a regra de distribuição de competência para a tributação dos "lucros das empresas", prevista no tratado Brasil-Países Baixos, em seu art. 7º.

Por sua vez, os acordos de dupla tributação celebrados pelo Brasil geralmente preveem que rendimentos como dividendos possam ser tributados pelo Estado da fonte, à alíquota máxima de 15%, restando ao Estado de residência exigir apenas o percentual previsto em sua legislação doméstica que exceder tal montante.

20 A Tributação Brasileira dos Lucros de Empresas Controladas em Países com Acordo de Bitributação. In

SCHOUERI, Luis Eduardo; BIANCO, João Francisco; CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e; DUARTE FILHO, Paulo César Teixeira; COSTA, Alcides Jorge. Estudos de direito tributário: em homenagem ao prof. Gerd Willi Rothmann. São Paulo : Quartier Latin, 2016. pp. 237 e 250.

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Fl. 1394

Fl. 47 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

É o que se dá no art. 10º da Convenção Brasil-Países Baixos o qual estabelece que os dividendos pagos por empresa holandesa (Estado da fonte) a residente no Brasil podem ser tributados, pelos Países Baixos, à alíquota máxima de 15%, restando ao Brasil (Estado de residência) exigir apenas o percentual previsto em sua legislação doméstica que exceder tal montante, pela concessão de crédito do imposto pago no exterior.

(...)É possível compreender que, caso o Brasil e os Países Baixos houvessem consentido em permitir que as suas respectivas legislações domésticas CFCs incidissem à revelia do art. 7º do acordo de bitributação celebrado, teriam formalizado um protocolo ou outro instrumento hábil neste sentido.

(...) Por meio das evidências colhidas dos contextos intrínseco e extrínseco (primário e secundário) do acordo Brasil-Países Baixos, adotado como exemplo para a análise do tema proposto, foi possível aferir que o art. 10 daquele tratado não se presta à tutela de tutela de "dividendos" fictos, mas apenas de "dividendos pagos", exigindo-se, para tanto, efetiva transferência de titularidade dos recursos ou diretos da sociedade ao acionista.

(...) Nesse cenário, todas as evidências analisadas corroboram com a conclusão de que a categoria de rendimentos onerada pela tributação brasileira dos lucros de controladas no exterior deve ser sob o escopo do art. 7 do acordo BrasilPaíses Baixos, não descartando a hipótese da mesma conclusão ser aplicável à generalidade dos acordo de bitributação celebrados.

Como consequência, na presença do acordo Brasil-Países Baixos e potencialmente de outros tratados, a legislação brasileira de tributação de lucros de controladas no exterior deixa de ter eficácia, pois o país de residência destas terá competência exclusiva para tributar os lucros de suas residentes (art. 7º). Nosso pais, por sua vez, solenemente acordou exercer a sua competência tributária quando dividendos forem pagos à controladora brasileira. Pacta sunt servanda. (destacamos)

Não se sustenta a afirmação que prevaleceu no v. Acórdão, ora recorrido, como singular fundamento para justificar a suposta inexistência conflito ou antinomia com os Tratados internacionais, de que não havendo nos autos qualquer indicativo de que os dividendos foram tributados na Argentina, descabe falar-se em isenção no Brasil. Sob esse prisma voto no sentido de dar provimento parcial ao recurso para restabelecer a exigência do IRPJ referente aos valores distribuídos pela empresa controlada Holdtotal.

(...)

E, primordialmente, tais resultados positivos (lucros proporcionais) foram auferidos pelas próprias e individuais operações da entidade estrangeira, domiciliada na Argentina, apurados dentro de sua jurisdição fiscal e regras contábeis.

Ainda que se entenda, na verdade, estar se tributando lucro da empresa residente no Brasil - conforme vem sido defendido pela Fazenda Nacional -, os fundamentos por trás de tal entendimento acabam permitindo que determinações domésticas, que simplesmente regulam aspectos da apuração da renda, contornem dispositivo abrangente de norma internacional, regularmente pactuada, válida e vigente, como também confere efeitos jurídico-tributários inflados e indevidos a simples método contábil, pontualmente jurisdicizado na avaliação de investimentos (Método de Equivalência Patrimonial), para então, desse modo, alcançar o lucro de empresa estrangeira, como se de nacional fosse - resguardado todo respeito e admiração àqueles que pensam diversamente: uma grande falácia.

Por sua vez, ainda que seja matéria atualmente incontroversa, é prudente frisar a relação de prevalência dos Tratados Internacionais Tributários sobre a legislação nacional, o que atribui aos comandos dos Acordos e Convenções a natureza de norma de bloqueio

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Fl. 1395

Fl. 48 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

em relação à legislação interna, quando esta não se harmoniza com tais disposições binacionais, como vem reafirmando o E. Superior Tribunal de Justiça:

(...)

Destaque-se que a inserção do art. 98 no CTN confirma a intenção de se assegurar a lealdade doméstica às avenças internacionais, protegendo-as dos câmbios políticos internos, atribuindo rigidez total às suas disposições e segurança jurídica aos contribuintes alcançados pelos Acordos e Convenções.

Assim, uma vez claro que a pretensão e fundamento de tributação doméstica aqui enfrentada, possibilitada e arrimado, ambos, no art. 74 da MP nº 2158-35/01, conflitam com o comando do art. 7º da Convenção Brasil-Argentina, efetiva-se o mencionado bloqueio normativo, mostrando-se improcedente o lançamento em relação aos lucros percebidos (...)

Esse mesmo entendimento também prevaleceu no Acórdão nº 9101-006.097 , cuja ementa recebeu a seguinte redação:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ)

Ano-calendário: 2010 LUCROS AUFERIDOS POR CONTROLADA NO EXTERIOR. CONVENÇÃO BRASIL-ESPANHA. CONVENÇÃO BRASIL-LUXEMBURGO. ARTIGO 74 DA MP XXXXX-35/2001.

O artigo 7º dos acordos para evitar a dupla tributação firmados pelo Brasil impede que os lucros auferidos pelas sociedades controladas estrangeiras sejam tributados no Brasil. O artigo 74 da MP XXXXX-35/2001 foi literal ao dispor que "os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil", ou seja, a norma claramente alcança os lucros da empresa estrangeira, sendo sua incidência bloqueada pelo artigo 7º dos tratados firmados pelo Brasil para evitar a dupla tributação.

Transcrevo a seguir parte do respectivo voto condutor, da Conselheira Livia De Carli Germano:

(...)

Dessa forma, não posso concordar com a afirmação de que o artigo 74 da MP 2.158- 35/2001 não trataria de lucros do exterior, mas sim estabeleceria a tributação da renda dos sócios brasileiros decorrente de sua participação em empresas domiciliadas no exterior. Com a devida vênia, esse raciocínio vale, no máximo, para a posterior legislação que revogou tal dispositivo, ou seja, na vigência da Lei 12.973/2014.

O artigo 74 da MP XXXXX-35/2001 -- vigente à época dos fatos objetos da autuação em questão -- foi literal ao dispor que "os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil", ou seja, a norma claramente pretendeu alcançar os lucros da empresa estrangeira, e não seu reflexo na controladora brasileira, que é o resultado de equivalência patrimonial. Vale notar que, antes da Lei 12.973/2014, a Receita Federal já havia pretendido "interpretar" o alcance do artigo 74 da MP XXXXX-35/2001 como sendo referente aos resultados de equivalência patrimonial, com a edição de da IN 213/2002 (art. 7o, § 1o). Não por acaso, o Judiciário entendeu que tal interpretação seria uma ampliação, sem amparo legal, da base de cálculo do IRPJ e da CSLL (STJ, EDcl no REsp XXXXX/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 26/08/2014; AgRg

Original

DF CARF MF

Fl. 1396

Fl. 49 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma

Processo nº 16561.720050/2017-48

no AREsp XXXXX/BA, Primeira Turma, Relator Min. Benedito Gonçalves, julgado em 18/08/2015, dentre outros).

Nesse contexto, compreendo não haver dúvida de que a materialidade abrangida pela lei brasileira de tributação universal, antes da Lei 12.973/2014, consistia nos lucros das coligadas e controladas no exterior.

Sendo assim, a tributação não é possível quando existe acordo para evitar a dupla tributação firmado entre o Brasil e o país de residência da controlada ou coligada, tendo em vista o disposto no artigo 7º de tais acordos.

Sabe-se que as disposições dos tratados internacionais em matéria tributária prevalecem sobre as normas de direito interno, em razão da sua especificidade, por aplicação do artigo 98 do Código Tributário Nacional ( CTN). Na verdade, o fenômeno é mais bem explicado com a metáfora da máscara, de Klaus Vogel 21 - em tradução livre: se imaginarmos a legislação interna como a luz de uma lanterna e os tratados de bitributação como uma máscara colocada à sua frente, veremos que os tratados limitam a aplicação da legislação interna, somente deixando passar a luz por determinadas "janelas". A legislação interna "barrada" pela máscara continua válida, mas tem sua aplicação contida pelo tratado internacional.

É exatamente o que acontece com o artigo 74 da MP XXXXX-35/2001 no caso de existir acordo para evitar a dupla tributação entre o Brasil e o país de residência da controlada. (...)

O artigo 7º das Convenções para Evitar a Dupla Tributação firmadas pelo Brasil protege do imposto brasileiro as empresas sediadas no exterior, sendo relevante notar que seu escopo não é subjetivo (as empresas), mas objetivo (os lucros das empresas) .22 Neste sentido, "é falso o dilema que examina quem assume o ônus do imposto, posto que a limitação do art. 7º alcança os lucros de uma empresa de um Estado Contratante, pouco interessando, in casu, indagar quem suporta o encargo, seja a empresa estrangeira, seja a nacional, importando que nem uma nem outra estão sujeitas ao imposto brasileiro calculado sobre o lucro da empresa localizada no exterior." 23

A incompatibilidade do artigo 74 da MP XXXXX-35/2001 em virtude da existência de acordos de bitributação já foi reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, ao julgar o Recurso Especial XXXXX/RJ, entendeu pela aplicação do artigo 7º das Convenções celebradas com a Bélgica, Dinamarca e Luxemburgo, afastando assim a aplicação do artigo 74 da MP XXXXX-35/2001. Contra tal decisão, a União interpôs recurso especial -- RE 870.214 -- o qual foi teve o seguimento negado pelo STF em 24 de março de 2021, exatamente porque "O acórdão [do STJ] revela interpretação de normas legais, não ensejando campo ao acesso ao Supremo. A pretexto de ter ocorrido violência à Carta da Republica, pretende-se submeter à apreciação do Tribunal questão não enquadrada no inciso III do artigo 102 da Constituição Federal."

(...)

Conclui-se, assim, que os lucros auferidos pelas controladas da autuada no exterior não podem ser tributados no Brasil com fundamento no artigo 74 da MP XXXXX-35/2001,

21 VOGEL, Klaus. Double Taxation Conventions. 2a Ed., Kluwer Law and Taxation Publishers: Holanda: 1990, p.

23-24.

22 SCHOUERI, Luis Eduardo. Lucros do Exterior e Acordos de Bitributação: reflexão sobre a Solução de Consulta

Interna n. 18/2013. RDDT, n. 219, 2013, p. 74.

DF CARF MF

Fl. 1397

Fl. 50 do Acórdão n.º 9101-006.779 - CSRF/1a Turma Processo nº 16561.720050/2017-48

tendo em vista os acordos de bitributação firmados entre Brasil e, respectivamente, Luxemburgo e Espanha.

Nesse sentido, entendo que a tributação ora pretendida não se sustenta. É a declaração.

(documento assinado digitalmente)

Luis Henrique Marotti Toselli

Original

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/carf/2017963224/inteiro-teor-2017963232

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