14 de Maio de 2024
- 2º Grau
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Detalhes
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Superior Tribunal de Justiça Revista Eletrônica de Jurisprudência |
RELATOR | : | MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE |
RECORRENTE | : | VERA LUCIA FERREIRA ATTIS |
ADVOGADO | : | GUSTAVO HENRIQUE DOS SANTOS VISEU E OUTRO (S) - SP117417 |
ADVOGADA | : | FERNANDA HOROVITZ FRANKEL - SP195016 |
RECORRIDO | : | JUAN CRUZ ATTIS PAIS |
RECORRIDO | : | NADIA CONSTANZA ATTIS PAIS |
ADVOGADOS | : | LAÍS AMARAL REZENDE DE ANDRADE E OUTRO (S) - SP063703 |
FELIPE GODINHO DA SILVA RAGUSA - SP214723 | ||
INTERES. | : | JUAN PEDRO ATTIS - ESPÓLIO |
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:
Trata-se, na origem, de ação de inventário dos bens deixados pelo falecimento de Juan Pedro Attis, em que sua esposa, Vera Lúcia Ferreira Attis, foi nomeada inventariante.
Após o trâmite legal, a inventariante apresentou declaração nos autos de origem relacionando os herdeiros, os bens a serem inventariados e os gastos de manutenção e custas atinentes ao espólio.
Porém, alguns herdeiros apresentaram impugnação à referida declaração, sob o argumento de que o percentual a eles atribuído estaria equivocado, considerando que os tributos e as taxas condominiais referentes ao imóvel em que reside a inventariante não poderiam ser consideradas dívidas do espólio.
O Juízo de primeiro grau, então, proferiu decisão determinando que a inventariante apresentasse nova declaração, com exclusão das despesas com IPTU e condomínio, em virtude de estar usufruindo, de forma exclusiva e desde o falecimento do de cujus, do imóvel relacionado, excluindo, ainda, os honorários dos advogados por ela contratados em face dos herdeiros terem contratado seus próprios advogados para representá-los no feito.
Contra essa decisão, a inventariante interpôs agravo de instrumento, o qual foi desprovido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, cujo acórdão foi assim ementado:
Posteriormente, os embargos de declaração opostos ao referido acórdão foram rejeitados.
Daí o recurso especial, em que a inventariante afirma que o acórdão recorrido, além de divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça, firmada por ocasião do julgamento do Recurso Especial n. 983.450⁄RS, violou o art. 1.315 do Código Civil, sustentando, em síntese, que, considerando que as despesas do bem comum devem ser divididas entre os condôminos, "a recorrente não tem obrigação de arcar com o pagamento das despesas de IPTU e condomínio do imóvel em que reside, posto que tal bem não lhe pertence" (e-STJ, fl. 102).
Reforça que, "até que a partilha seja efetuada, é o Espólio quem detém a propriedade dos imóveis sobre os quais recaem as dívidas e despesas" , sendo, portanto, "parte legítima para responder pelas despesas condominiais e de IPTU, uma vez que estas são indiscutivelmente despesas propter rem, isto é, obrigações que decorrem do direito de propriedade" (e-STJ, fl. 102). Logo, "os proprietários, no presente caso, os herdeiros, devem arcar com tais despesas simplesmente por serem os donos do bem" (e-STJ, fl. 102), independentemente do uso exclusivo ou não do imóvel pela inventariante.
Busca, assim, o provimento do recurso especial "a fim de reconhecer que as despesas de IPTU e condomínio do imóvel do espólio devem ser suportadas também pelos herdeiros, declarando-se a desnecessidade de retificação das últimas declarações apresentadas pela recorrente" (e-STJ, fl. 105).
É o relatório.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR):
A questão discutida consiste em saber de quem é a responsabilidade, nos autos de inventário, pelos encargos com IPTU e taxa condominial do imóvel objeto de herança, utilizado com exclusividade pela inventariante, ora recorrente.
1. Da alegação de violação do art. 1.315 do Código Civil
Nos termos dos arts. 1.784 e 1.791 do Código Civil, com a abertura da sucessão, a herança transmite-se, desde logo, como um todo unitário, aos herdeiros legítimos e testamentários, sendo que, até a partilha, o direito dos coerdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio.
Assim, a partir do óbito do de cujus, todo o seu patrimônio, incluído o conjunto de direitos e obrigações correlatos, é transmitido aos herdeiros, de forma indivisível, os quais recebem a propriedade e posse dos bens móveis e imóveis que compõem a herança.
O art. 1.997 do Código Civil, por sua vez, dispõe que o espólio responderá por todas as dívidas deixadas pelo de cujus nos limites da herança e até o momento em que for realizada a partilha, quando então cada herdeiro responderá na proporção da parte que lhe couber na herança.
Logo, em regra, as despesas do inventário serão suportadas pelo espólio, repercutindo, inarredavelmente, no quinhão de todos os herdeiros.
Entretanto, o caso em apreço guarda particularidade que reclama certa ponderação na regra acima destacada.
É que, conforme consignado pelas instâncias ordinárias, a inventariante reside de forma exclusiva no imóvel objeto de discussão, tolhendo o uso por parte dos demais herdeiros, não havendo, tampouco, qualquer pagamento de aluguel ou indenização referente à cota-parte de cada um na herança.
No particular, relembro que esta Corte Superior possui entendimento no sentido de que o herdeiro que ocupa exclusivamente imóvel objeto da herança deverá pagar aluguel proporcional aos demais herdeiros, conforme se verifica do seguinte precedente:
Dessa forma, em relação ao imóvel ocupado exclusivamente pela inventariante, não se mostra razoável que as verbas de condomínio e de IPTU sejam custeadas pelos demais herdeiros, sob pena de enriquecimento sem causa.
Com efeito, ou a inventariante paga aos demais herdeiros valores a título de aluguel proporcional correspondentes à fração de cada um, relacionados ao imóvel em que ocupa com exclusividade, podendo, nesse caso, compartilhar também as despesas correlatas, ou deverá ser responsabilizada pelos respectivos encargos de forma exclusiva.
O que não se mostra plausível é o uso individual e exclusivo do imóvel pela inventariante, com divisão das respectivas despesas entre todos os herdeiros.
Ressalvadas as devidas particularidades, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, embora a regra seja de que os honorários advocatícios devidos ao advogado contratado pelo espólio devam ser computados como despesas deste, na hipótese em que houver interesses antagônicos entre os herdeiros, como no caso em análise, os honorários deverão incidir apenas sobre o quinhão de quem contratou o defensor.
Nesse sentido:
Seguindo essa mesma linha de raciocínio, é de se concluir que os encargos em discussão - taxas condominiais e IPTU -, até a data do óbito do de cujus Juan Pedro Attis, serão de responsabilidade do espólio. Posteriormente, após o falecimento, todas as referidas despesas deverão ser descontadas do quinhão de quem estiver usufruindo do bem imóvel de forma exclusiva e sem contrapartida financeira aos demais herdeiros, ou seja, a inventariante, ora recorrente.
Ressalte-se que não se olvida que as referidas dívidas são propter rem, devendo o imóvel responder por elas. Ocorre que isso se dá frente ao Poder Público (impostos) ou ao Condomínio (taxa condominial). Todavia, internamente, no âmbito do inventário, não há razoabilidade na imposição a todos os herdeiros das despesas decorrentes do uso exclusivo do imóvel pela inventariante.
Ademais, também não se está tratando aqui acerca da legitimidade passiva para responder pelos referidos encargos do imóvel, que, até a partilha, seria do espólio. A questão, como visto, diz respeito à distribuição dos referidos custos do imóvel no bojo do inventário, isto é, se devem ser descontados do monte, responsabilizando-se, assim, todos os herdeiros, ou se da parte da inventariante.
Dessa forma, conquanto o espólio, até a partilha, tenha legitimidade passiva para responder pelos débitos de condomínio ou IPTU sobre o respectivo imóvel, em eventual ação de cobrança ou execução, nada impediria que os demais herdeiros ajuizassem ação regressiva contra aquele que ocupa o imóvel de forma exclusiva.
Por essas razões, afasta-se a apontada violação do art. 1.315 do Código Civil.
2. Da alegação de divergência jurisprudencial
A recorrente aponta, ainda, divergência de entendimento do acórdão recorrido em relação ao Recurso Especial n. 983.450⁄RS, da Relatoria da eminente Ministra Nancy Andrighi.
Ocorre que, segundo consta do voto de Sua Excelência, a controvérsia ali instaurada consistia em saber "se, depois de cessada a comunhão de bens pela separação judicial, embora ainda não operada a partilha do patrimônio comum do casal, é facultado a um dos ex-cônjuges exigir do outro, que estiver na posse e uso de determinado imóvel, a título de indenização, parte correspondente à metade da renda de um presumido aluguel".
Assim, verifica-se a manifesta ausência de similitude fática entre o acórdão recorrido e o aresto paradigma.
Com efeito, o caso presente trata da responsabilidade pelo pagamento das despesas do imóvel ocupado exclusivamente pela inventariante, no bojo de ação de inventário, situação completamente distinta daquela examinada no acórdão paradigma.
Ademais, ainda que se admita a apontada divergência jurisprudencial, constata-se que os fundamentos declinados no acórdão paradigma servem para confirmar o entendimento do Tribunal de origem no presente caso, e não para refutá-lo, como equivocadamente alega a recorrente.
Isso porque, por ocasião do julgamento do REsp n. 983.450⁄RS, a Terceira Turma deu parcial provimento ao recurso para "estabelecer a obrigatoriedade de pagamento ao recorrente de indenização correspondente a 50% do valor apurado de aluguel do imóvel, a partir da citação, deduzida de igual fração incidente sobre as despesas de conservação da coisa, bem como os ônus a que estiver sujeita, pagos ou a vencer, no período posterior à separação".
Os fundamentos foram assim consignados, na parte que interessa:
Ora, seguindo a mesma linha de entendimento do referido decisum, tal como já destacado anteriormente no presente voto, somente seria viável impor ao espólio o ônus de pagar as despesas decorrentes do imóvel ocupado exclusivamente pela inventariante se houvesse contrapartida financeira, a título de aluguel proporcional, aos demais herdeiros, circunstância, todavia, não ocorrida no presente caso.
Em outras palavras, no julgado paradigma, embora tenha sido determinada a divisão das despesas do respectivo imóvel, determinou-se o pagamento de indenização a fim de compensar a sua utilização exclusiva pelo outro ex-cônjuge. Já, no presente caso, a recorrente pretende utilizar o imóvel, de forma exclusiva e sem qualquer contrapartida financeira aos demais herdeiros, obrigando-os, porém, ao rateio das despesas correlatas. Ou seja, quer usufruir do bem de forma exclusiva e sem pagamento aos demais herdeiros, dividindo, porém, as respectivas despesas, situação distinta daquela decidida no aresto paradigma.
Tal o quadro delineado, afasta-se, também, a apontada divergência jurisprudencial, seja porque não há similitude fática entre os arestos, seja porque os fundamentos do acórdão paradigma não servem para infirmar os do acórdão recorrido, mas, sim, para confirmá-los.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.
É o voto.
Número Registro: 2016⁄0285715-2 | PROCESSO ELETRÔNICO |
REsp 1.704.528 ⁄ SP |
EM MESA | JULGADO: 14⁄08⁄2018 |
RECORRENTE | : | VERA LUCIA FERREIRA ATTIS |
ADVOGADO | : | GUSTAVO HENRIQUE DOS SANTOS VISEU E OUTRO (S) - SP117417 |
ADVOGADA | : | FERNANDA HOROVITZ FRANKEL - SP195016 |
RECORRIDO | : | JUAN CRUZ ATTIS PAIS |
RECORRIDO | : | NADIA CONSTANZA ATTIS PAIS |
ADVOGADOS | : | LAÍS AMARAL REZENDE DE ANDRADE E OUTRO (S) - SP063703 |
FELIPE GODINHO DA SILVA RAGUSA - SP214723 | ||
INTERES. | : | JUAN PEDRO ATTIS - ESPÓLIO |
Documento: XXXXX | Inteiro Teor do Acórdão | - DJe: 24/08/2018 |