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25 de Maio de 2024
  • 1º Grau
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TJRN • AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA • XXXXX-04.2017.8.20.0155 • Vara Única da Comarca de São Tomé do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte - Inteiro Teor

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Vara Única da Comarca de São Tomé

Juiz

JOSE RONIVON BEIJA MIM DE LIMA
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Vara Única da Comarca de São Tomé
Rua Ladislau Galvão, 187, Centro, SÃO TOMÉ - RN - CEP: 59400-000


AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (64)

Processo nº XXXXX-04.2017.8.20.0155

Promovente: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

Promovido (a): ANTEOMAR PEREIRA DA SILVA


S E N T E N Ç A

I – RELATÓRIO

Cuida-se de ação de improbidade administrativa movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face de ANTEOMAR PEREIRA DA SILVA pela suposta prática de conduta que configura ato de improbidade administrativa tipificada no art. 11 da Lei nº 8.429/92, pedindo, ao final, a condenação do réu nas sanções contidas no art. 12, inciso III da referida lei.

De acordo com a inicial, o demandado incorreu em ato de improbidade que atentou contra os Princípios da Administração (art. 11 da Lei nº 8.429/1992) ao descumprir os preceitos contidos no art. 42 da Lei Complementar 101/2000, que veda ao titular de Poder ou órgão a assunção de obrigação, nos dois últimos quadrimestres do mandato, que não possa ser integralmente adimplida dentro dele ou que enseje parcela a ser paga no exercício seguinte, quando não houver disponibilidade de caixa para este efeito.

Ainda conforme a inicial, o requerido contraiu despesas no valor de R$ 1.250.402,76 (um milhão, duzentos e cinquenta mil, quatrocentos e dois reais e setenta e seis centavos) nos dois últimos quadrimestres do exercício de 2012, ao mesmo tempo em que o saldo disponível em 31/12/2012 era de R$ 569.218,12 (quinhentos e sessenta e nove mil, duzentos e dezoito reais e doze centavos), restando ao final do mandato restos a pagar sem a devida provisão de fundos no valor de R$ 681.184,64 (seiscentos e oitenta e um mil, cento e oitenta e quatro reais e sessenta e quatro centavos).

Com a inicial juntou o inquérito civil nº 06.2013.00005687-8.

Notificado (53234771 - Pág. 4), o demandado apresentou manifestação preliminar no ID XXXXX - Pág. 1, embora intempestiva.

Decisão de ID XXXXX - Pág. 2 e seguintes recebeu a denúncia e determinou a citação do requerido.

No ID XXXXX - Pág. 1 o Município de São Tomé manifestou a ausência de interesse no feito.

Citado, o requerido apresentou contestação no ID XXXXX - Pág. 1, alegando, em suma: a) a crise financeira do Município, relatando aumento do piso salarial dos professores pelo Governo Federal, quada na arrecadação do FPM, o que culminou na geração de dívidas e consequente inclusão em restos a pagar; b) as contas de 2012 sequer foram apreciadas pela Câmara Municipal; c) os atrasos no pagamento dos servidores não importam em improbidade administrativa; d) ausência de dolo; e) ausência de violação aos princípios da administração pública.

Na data de 23/01/2020 realizou-se audiência de instrução, ocasião em que se colheu o depoimento pessoal do réu.

Em seguida, o Ministério Público apresentou alegações finais, manifestando-se pela procedência da ação.

Por fim, o requerido apresentou suas alegações derradeiras (ID XXXXX), alegando a ausência de dolo e de provas acerca do ato ímprobo, requerendo a improcedência dos pedidos.

No ID XXXXX juntou-se o processo XXXXX/2013 junto ao TCE-RN.

Eis o relatório do caso sob apreciação. Passo a fundamentar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

Ausentes questões preliminares, debruço-me desde logo sobre o mérito da questão posta nos autos.

O cerne do presente litígio é saber se o demandado ANTEOMAR PEREIRA DA SILVA incorreu em ato de improbidade , pela suposta prática de conduta que configura ato de improbidade administrativa tipificada no art. 11 da Lei nº 8.429/92, consistente em ter descumprido os preceitos contidos no art. 42 da Lei Complementar 101/2000, que veda ao titular de Poder ou órgão a assunção de obrigação, nos dois últimos quadrimestres do mandato, que não possa ser integralmente adimplida dentro dele ou que enseje parcela a ser paga no exercício seguinte, quando não houver disponibilidade de caixa para este efeito.

De acordo com Maria Sylvia Zanella di Pietro, para que um ato possa acarretar a incidência das penalidades estabelecidas na lei de improbidade administrativa, são necessários alguns elementos. Em primeiro lugar, destaca que o sujeito passivo deve ser uma das entidades mencionadas no art. da Lei 8.429/92. Ademais, o sujeito ativo deve ser agente público ou terceiro que induza ou concorra para a prática do ato ou dele se beneficie de forma direta ou indireta (arts. 1º e 3º).

Além disso, faz-se imprescindível a ocorrência de conduta que possa ser subsumida a uma das hipóteses descritas entre as três categorias de atos de improbidade administrativa: atos que importam enriquecimento ilícito do agente público (art. 9º); atos que causam efetivo prejuízo ao erário (art. 10); e atos contrários aos princípios da Administração Pública (art. 11).

Por fim, para que seja caracterizado o ato como de improbidade administrativa, é forçoso que se vislumbre um traço de desonestidade por parte do agente público, porquanto a conduta ilegal só se torna ímproba se revestida também de má-fé. Nesse passo, para que seja configurado o ato de improbidade de que trata a Lei 8.429/92, é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para todos os casos de improbidade, conforme recente alteração na Lei 8.429/92, operada pela Lei 14.230/21, não sendo admitida a culpa em qualquer hipótese.

E após a instrução processual, tem-se que a ação é procedente, estando presente elementos que comprovam a violação ao art. 42, da Lei de Responsabilidade Fiscal e o dolo do requerido.

Com efeito, foi realizada perícia contábil pelo perito José Jailson da Silva, Professor do Departamento de Ciências Contábeis da UFRN, consubstanciado no laudo de ID XXXXX – pág. 26-37, nos autos do Inquérito Civil nº 06.2013.00005687-8, em relação ao qual não houve impugnação.

No referido laudo, o perito relacionou as dívidas contraídas pela edilidade e os saldos das contas bancárias, concluindo “10.1 – Considerando os procedimentos aplicados sobre o que consta dos autos, a perícia conclui que há indícios de que existem dívidas deixadas pelo então gestor do Município de São Tomé ao final do ano de 2012, notadamente após as eleições, sem reservas de recursos em caixa para sua quitação no exercício seguinte, em afronta ao artigo 42, da Lei de Responsabilidade Fiscal”.

Ademais, a conclusão da perícia restou corroborada por decisão do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Norte, por meio do acórdão 03/2017 que desaprovou as contas do requerido.

Em julgamento de pedido de reexame formulado pelo requerido, o TCE-RN manteve sua decisão anterior de desaprovação das contas do ano de 2012 do demandado, consoante acórdão 1/2020. A propósito, confira-se a conclusão emitida pelo pelo Corpo Técnico do TCE-RN na informação de vento 32, disponível no site da corte de contas do RN (http://portal.tce.rn.gov.br/#/servicos/processos/326960/autos):

"Por fim, o quadro 5 demonstra que o município continua descumprindo o art. 42 da LRF mesmo após considerar os saldos de FNS e SUAS alegados no recurso, pois tinham restos a pagar inscritos nos dois últimos quadrimestres a serem cobertos com o saldo do ativo financeiro líquido de R$ 495.040,05, enquanto que o saldo financeiro líquido é de apenas R$ 146.835,21, evidenciando que houveram restos a pagar inscritos nos 2 últimos quadrimestres sem suporte financeiro no montante de R$ 348.204,84."

No relatório de pág. 353/356 (evento 1 do mesmo link acima) consta a relação discriminada das dívidas inscritas em restos a pagar e o valor da disponibilidade em caixa.

Desse modo, está satisfatoriamente comprovado o descumprimento ao art. 42, da LRF, que veda a assunção de despesas nos dois últimos quadrimestres do mandato que não possam ser cumpridas integralmente dentro dele, ou que possuam parcelas a serem adimplidas no exercício seguinte, sem a suficiente disponibilidade de caixa para este efeito.

O artigo visa a garantir o controle do endividamento, protegendo o equilíbrio intertemporal das contas públicas, de modo a evitar a transferência de débitos insolvíveis para os próximos administradores.

Portanto, diante das provas produzidas, conclui-se que as dívidas contraídas no período em questão não foram quitadas no final do exercício financeiro do ano de 2012.

Assim, houve claro desrespeito ao princípio da legalidade, pela assunção de despesas sem a existência de recurso suficiente para saldá-las.

Em seu depoimento pessoal, o demandado não negou as despesas realizadas, assinalando, entretanto, diz que tais despesas referem-se a recursos repassados ao Município apenas no início do ano seguinte, qual seja, 2013. Contudo, tal questão foi afastada pelo relatório da equipe técnica do TCE, e notadamente por meio do relatório de pág. 353/356 (evento 1 do mesmo link acima) consta a relação discriminada das dívidas inscritas em restos a pagar, dentre elas diversos valores a título de material de consumo, aquisição de veículo, aquisição de equipamentos, entre outros.

Alegou ainda dificuldade financeira, com a diminuição dos repasses federais e aumento das despesas, fato que não vem ao abono do requerido, uma vez que a conjugação de tais fatores deveria implicar, na verdade, na adoção de medidas de austeridade fiscal, visando o controle das contas.

Assim, na condição de ordenador das despesas irregulares, está configurado o dolo, sendo evidente o prejuízo à coletividade, porquanto o requerido não se mobilizou para trafegar pela senda da legalidade.

Assim, demonstrado o nexo causal entre a conduta do requerido e o ato de improbidade, passo à dosimetria das penas aplicáveis.

Como cediço, é plenamente possível a aplicação cumulativa, ou não, das sanções previstas no artigo 12 da Lei 8.429/92, procedendo-se à dosimetria das penalidades conforme a gravidade dos fatos, de acordo com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade (STJ - REsp XXXXX / BA, 2ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 25/06/2014, Edcl no Aresp XXXXX/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 16/12/2013; REsp XXXXX / RS, Rel. Min.Luix Fux, Primeira Turma, DJe 23/02/2011).

Assim, em razão da prática de atos que atentaram contra princípio da Administração Pública, e atento ao princípio da proporcionalidade, aplico ao demandado as sanções previstas no art. 12, III da Lei nº 8.429/92,com alteração dada pela Lei nº 14.230/2021, consistente no pagamento de multa civil no valor de quatro vezes a remuneração percebida ao tempo do fato (REsp XXXXX/PE, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/12/2019, DJe 12/12/2019), a ser apurada na fase de cumprimento de sentença.

Tal medida é proporcional à gravidade do fato e adequada à finalidade pedagógica consistente em evitar que condutas análogas sejam novamente praticadas.



III – DISPOSITIVO

Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, JULGO PROCEDENTE a pretensão deduzida na inicial para condenar o ANTEOMAR PEREIRA DA SILVA por violação aos princípios da administração pública, nos termos do art. 11, da Lei 8.429/92 c/art. 42 da LRF, aplicando-lhe a sanção de pagamento de multa civil no valor de quatro vezes a remuneração percebida ao tempo do fato, a ser apurada em liquidação de sentença, acrescido de correção monetária pelo INPC e juros de mora de 1% desde a data do fato.

Condeno o demandado ao pagamento das custas processuais.

Sem condenação em honorários advocatícios, haja vista figurar o Ministério Público no polo ativo da ação.

Com o trânsito m julgado, providencie-se o cadastramento do feito no CNCIA.

Após, dê-se vista à parte autora, para promover a execução.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

São Tomé, data registrada no sistema.



(assinado eletronicamente)

JOSÉ RONIVON BEIJA-MIM DE LIMA

JUIZ DE DIREITO

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