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24 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal Regional Federal da 5ª Região TRF-5 - AGRAVO DE INSTRUMENTO: XXXXX-98.2023.4.05.0000

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

7ª TURMA

Julgamento

Relator

LEONARDO AUGUSTO NUNES COUTINHO
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Ementa

EMENTA. ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. IMPOSIÇÃO DE MULTA. TERRENO DE MARINHA. ATERRO E CONSTRUÇÃO. ALEGAÇÃO DE IMPEDIMENTO DE SERVIDOR QUE ASSINOU O AUTO DE INFRAÇÃO E ELABOROU NOTA TÉCNICA. ART. 18, I DA LEI N. 9.784/99. AUSÊNCIA DE CONTEÚDO DECISÓRIO. NÃO ENQUADRAMENTO. MULTA APLICADA. EFEITOS IMEDIATOS. PERIGO DA DEMORA. NECESSIDADE DE SUSPENSÃO. PROVIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto por CABANGA IATE CLUBE DE PERNAMBUCO, em face de decisão proferida pelo juízo da 6ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco, que, em sede de ação anulatória, indeferiu o pedido de tutela de urgência do ora agravante que objetivava a suspensão dos efeitos do auto de infração n.º 292/2021 e da multa cominada - por suposta ocupação irregular decorrente de aterro e construção permanente em área de manguezal, bem de uso comum do povo, até o julgamento final da ação.
2. Em suas razões recursais, o agravante argumentou, em síntese: 1) é tradicional clube náutico da Cidade do Recife, além de uma das principais agremiações esportivas do Nordeste em esportes de Vela; 2) foi indevidamente autuado pela Secretaria do Patrimônio da União, por meio do auto de infração de nº. 292/2021, oriundo de processo administrativo de nº. XXXXX-45, em razão de suposto "aterro irregular" em bem de uso comum de domínio da União, na espécie, em área de manguezal (art. 6º, § 1º, do Decreto-lei 2.398/98, com redação determinada pela Lei nº. 13.139/2015);
3) intimado da infração, ofertou defesa administrativa no prazo legal;
4) mantido o auto de infração, apresentou recurso não dotado de efeito suspensivo;
5) a decisão administrativa de primeira instância foi fundamentada em nota técnica elaborada pelo mesmo fiscal responsável pela lavratura do auto de infração - Sr. B.M.M.S. -, o que a tornaria nula, em razão do impedimento do servidor supracitado;
6) mesmo se estando diante de auto de infração que determina a demolição de parcela significativa do clube, com imposição de uma multa mensal absurda e confiscatória que pode ocasionar, inclusive, o fechamento da agremiação, o juízo a quo indeferiu a tutela provisória, impondo ao Agravante, antecipadamente, a exigência de penalidades que podem ser afastadas em razão do acolhimento dos pedidos formulados nesta ação e, não menos importante, sequer estando definitivamente decidido o recurso administrativo interposto;
7) as ilegalidades do autos não se restringem ao vício de impedimento que o macula, mas, também, a diversas outras questões jurídicas que simplesmente não foram apreciadas pelo juízo de piso, quais sejam: i) nulidade da decisão - impedimento - a nota técnica está assinada por dois servidores, em hipótese de co-autoria e, conquanto pudesse referido servidor fornecer argumentos e elementos técnicos complementares para a instrução do processo, ele jamais pode funcionar, concomitantemente, como acusador e julgador, aniquilando, objetivamente, a imparcialidade que deve governar o processamento administrativo do caso, degenerando o processo em mera simulação; ii) cerceamento de defesa, em face da ausência de instrução do processo administrativo, cuja solução demandaria produção de prova técnica; iii) a notificação recebida acerca dos termos do auto de infração, que veicula a imposição de uma multa altíssima à agremiação, não foi acompanhada de nenhum documento e nem de cópia do processo administrativo em que se apurou a suposta infração, não se mostrando cognoscíveis, portanto, os elementos de suporte do órgão para a lavratura da autuação; iv) segundo o auto de infração em comento, a suposta infração ocorreu em águas/mangue do rio Tejipió - ou no estuário do Rio Capibaribe e Tejipió. Assim, a competência fiscalizatória seria do Estado de Pernambuco, por se tratar de rio estadual e não de bem hídrico federal;
8) risco de irreversibilidade dos efeito do auto e periculum in mora, face à nítida a plausibilidade do direito invocado, evidenciando-se a existência de gravíssimas e complexas questões legais, a existência de impedimento e ausência de decisão administrativa definitiva de segunda instância;
9) o perigo, na espécie, seria de irreversibilidade das determinações auto - impondo a extinção do Clube - e não somente de risco ao resultado útil do processo, tratando-se, assim, de risco iminente, de grandes proporções e não passível de futura solução. 3. Na origem, trata-se de ação anulatória com pedido de antecipação dos efeitos da tutela ajuizada por Cabanga Iate Clube de Pernambuco contra a União Federal. Alegou o ora Recorrente na exordial, em resumo: 1) é tradicional clube náutico da Cidade do Recife, tratando-se de uma das principais agremiações esportivas do Nordeste em esportes de Vela; 2) o Clube foi indevidamente autuado pela Secretaria do Patrimônio da União, por meio do auto de infração de nº. 292/2021 [Doc. 02], oriundo do processo administrativo de nº. XXXXX-45 [Doc. 06], com espeque no art. 6º, § 1º, do Decreto-lei 2.398/98, com redação determinada pela Lei nº. 13.139/2015, em razão de suposto "aterro irregular" em bem de uso comum de domínio da União, na espécie, em área de manguezal; 3) ofertou defesa administrativa [Doc.03] no prazo legal - mais precisamente no dia 24.11.2022 4) para além da improcedência do auto, verificou-se uma gravíssima mácula no processo administrativo em testilha: a decisão administrativa de primeira instância foi fundamentada em nota técnica [incluída no Doc. 04] elaborada pelo mesmo fiscal responsável pela lavratura do auto de infração - sr. Bruno Maciel Marinho Silva; 5) a decisão, de efeito, é remissiva, adotando como fundamentação o parecer do mesmo servidor que autuou o Demandante; 6) é nula a decisão - cujos efeitos vem sendo inquinados ao Autor em razão do impedimento do servidor acima, em conformidade com o art. 18, I, da Lei nº. 9.784/99, devendo-se destacar, ademais, que a atuação de referido agente no processo administrativo constitui falta grave, em conformidade com o art. 19, § único, da mesma lei. 3. O clube ora agravante foi autuado em 08/11/2022, por incorrer na infração do art. 6º, § 1º, do Decreto-lei 2.398/98, com redação determinada pela Lei nº. 13.139/2015 - ocupação irregular decorrente de aterro e construção permanente em área de manguezal, bem de uso comum do povo -, cuja utilização foi negada em 1985 (id. XXXXX.25701868, fls 36, autos originários). 4. Conforme Relatório de Fiscalização Individual (id. XXXXX.25701868, fls 36 e ss. dos autos originários), ao chegar no local (Cabanga Iate Clube), a equipe de fiscalização (composta pelos servidores, Aldemiro Dantas Mendes, Audesito Fernandes de Oliveira, Bruno Maciel Marinho Silva, Gustavo Henrique Damasceno da Silva Oliveira e Rodrigo Melo Moura, acompanhados do empregado público Rosemar Gomes de Santana Filho), confirmou a existência de uma ocupação irregular decorrente de aterro e construção permanente em área de manguezal, bem de uso comum do povo, cuja utilização foi negada em 1985, em uma área de 2.428,64 metros quadrados, conforme verifica-se no registro fotográfico apresentado. Foi lavrado Auto de Infração nº 292/2021, no valor de R$ 252.068,55 (duzentos e cinquenta e dois mil sessenta e oito reais e cinquenta e cinco centavos). Consoante previsão do Art. 10 da Instrução Normativa nº 23, de 18 de março de 2020, "realização de aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo", sendo o auto de infração assinado pelo sr. Bruno Maciel Marinho Silva e dois outros servidores (id. XXXXX.25701869, fl 4). Apresentada defesa administrativa pelo ora recorrente Cabanga Iate Clube de Pernambuco, o servidor Bruno Maciel Marinho Silva elaborou Nota Técnica sobre o caso (em conjunto com o servidor Luiz Fernando de Souza Rodriguez), que foi ratificada integralmente pelo Superintendente do Patrimônio da União, Marcos Gesteira Costa, conforme Despacho Decisório 3522/2022/ME (id. XXXXX.25701868, autos originários), nos seguintes termos: "No uso das atribuições previstas no art. 102 do Anexo I do Decreto nº 9.745, de 8 de abril de 2019, no § 13 do art. do Decreto-Lei nº 2.398/1987, tendo em vista o disposto na Instrução Normativa nº 23/2020, e considerando os termos da Nota Técnica 55369/2022/ME (30260632), conheço do recurso administrativo interposto pelo CABANGA IATE CLUBE DE PERNAMBUCO - RECIFE/PE para, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo os termos do Auto de Infração 292/2021 (29416103). Que seja encaminhado Ofício ao Interessado, informando que a defesa administrava protocolada foi INDEFERIDA integralmente e mantido os exatos termos das sanções aplicadas no Auto de Infração nº 292/2021. Que seja dada continuidade aos trâmites deste Processo Administrativo, para fins de remoção total das irregularidades e liberação da área ocupada irregularmente". 5. Apresentado recurso em 2ª instância, foi elaborado Despacho de n. XXXXX, pelo sr. Bruno Maciel Marinho Silva, encaminhando os autos para julgamento e análise da Coordenação-Geral de Fiscalização e Controle de Utilização do Patrimônio, onde se encontra atualmente o processo. Em resumo, relativamente à atuação do sr. Bruno Maciel Marinho Silva no processo administrativo em questão, verifica-se que o referido servidor atuou na fiscalização, assinou o auto de infração (juntamente com outros dois servidores), elaborou a Nota Técnica 55369/2022/ME (em conjunto com o servidor Luiz Fernando de Souza Rodriguez), no sentido de indeferimento da defesa administrativa (id. XXXXX.25701868, fl. 51 e ss.) e proferiu despachos, dentre eles o que encaminhou o recurso administrativo para a Coordenação-Geral de Fiscalização e Controle de Utilização do Patrimônio, onde se encontra desde janeiro 2023. 6. Relativamente à atuação do referido servidor na elaboração da Nota Técnica 55369/2022/ME (id. XXXXX.25701868, fls. 51 e ss. dos autos originários), ainda que não se tenha como válida a afirmação da UNIÃO - segundo a qual o sr. Bruno Maciel Marinho Silva não a teria elaborado, mas apenas encaminhado à autoridade julgadora (isso por que o documento foi também por ele assinado) - não há nulidade a ser reconhecida. Isso porque as circunstâncias narradas não se mostram aptas a evidenciar o que se tem por essencial para efeito de caracterização de impedimento: o interesse direto ou indireto do servidor/autoridade na questão levada a discussão; a prévia participação do servidor/autoridade na condição de perito testemunha ou representante; a existência de outro litígio (nas searas judicial ou administrativa) entre o servidor/autoridade e o interessado (ou respectivo cônjuge ou companheiro) - art. 18 da Lei nº. 9784/99. Some-se a isso que as atuações do multimencionado servidor em mais de um momento do processo administrativo - justamente em decorrência do posto que ocupa na Secretaria do Patrimônio da União - SPU (Administrador - Chefe do NUFISC - SPU-PE) - não tiveram caráter decisório. 7. Superado este ponto, igualmente não se identifica qualquer nulidade no fato de não haverem, tanto o auto de infração, quanto a notificação endereçada ao ora agravante, sido acompanhadas de documento ou cópia do procedimento administrativo. É que, para além de não ser este requisito de validade do auto de infração ou da respectiva notificação, não se tem qualquer notícia de negativa de acesso aos autos do procedimento administrativo. Saliente-se, ainda neste concernente, que o auto de infração descreveu a irregularidade, a fundamentação legal e a finalidade do ato (Id. XXXXX.25501539). 8. Por fim, no que tange à competência da Secretaria do Patrimônio da União - SPU para fiscalizar/autuar, esta resulta da condição do imóvel do ora recorrente como acrescido de marinha, estando em regime de aforamento - conforme Certidão de Inteiro Teor do Imóvel (RIP 2531 011346267). E, nos termos do art. 20, inciso VII da Constituição, constituem bem da União os terrenos de marinha e seus acrescidos. Assim, a conclusão a que se chega, ao menos neste momento processual, é a de que a atuação da SPU se deu de acordo com o disposto na Lei nº 9.636/98 e no Decreto-Lei nº 9.760 de 1946. 9. Ocorre que, apesar de ter indeferido inicialmente a tutela recursal - por vislumbrar qualquer ato material e concreto de execução ou cobrança do valor que foi aplicado -, após analisar novamente o auto de infração impugnado, considero que, diante do elevado valor da multa aplicada - de aproximadamente R$ 252.000,00 mensais -, e dos possíveis efeitos imediatos decorrente do tempo, especialmente diante da demora na tramitação processual, a que ficará sujeito o agravante (o agrava data de janeiro de 2023), considero presente o perigo da demora a justificar, em parte, o deferimento da medida.
10. Assim, diante do contexto apresentado, da identificação do perigo da demora, levando em consideração a multa mensal e o tempo de tramitação do processo, tanto o administrativo quanto o próprio processo originário, e como forma de permitir uma prestação jurisdicional que atenda o desenvolvimento do processo, inclusive considerando que já foi iniciada a instrução processual, com designação de perícia técnica pelo juízo a quo, mostra-se prudente e razoável a suspensão dos efeitos do auto de infração n.º 292/2021 e da multa cominada, até o final da tramitação da ação originária.
11. Agravo de instrumento provido, para suspender os efeitos do auto de infração n.º 292/2021 e da multa cominada, até o julgamento da ação originária. Agravo interno prejudicado.
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