Cobrança de aluguel enquanto o imóvel estiver retido por benfeitoria
Informativo n. 0370
Período: 29 de setembro a 3 de outubro de 2008.
As notas aqui divulgadas foram colhidas nas sessões de julgamento e elaboradas pela Assessoria das Comissões Permanentes de Ministros, não consistindo em repositórios oficiais da jurisprudência deste Tribunal.
Terceira Turma
DIREITO. RETENÇÃO. BENFEITORIAS. ALUGUEL.
Os recorridos adquiriram de boa-fé o terreno em questão. Nele construíram sua residência. No entanto, o recorrente ajuizou contra eles ação reivindicatória, resolvida pela celebração de transação (homologada por sentença), a qual regulava o direito de retenção: os recorridos obrigavam-se a entregar o imóvel após serem indenizados pelas benfeitorias construídas (art. 516 do CC/1916). Não se estipulou, na oportunidade, qualquer valor a título de aluguel pelo tempo que durasse a retenção. Arbitrado judicialmente o valor das benfeitorias (R$ 31.000,00), o recorrente alegou não ter como ressarci-las por falta de condições econômicas para tanto. Permaneceram os recorridos na posse e uso do imóvel. Contudo, a doutrina admite que, apesar de não ser obrigado a devolver a coisa até que se satisfaça seu crédito, o retentor não pode utilizar-se dela. Assim, é justo que o recorrente deva pagar pelas acessões introduzidas de boa-fé, mas também que os recorridos sejam obrigados a indenizá-lo pelo uso do imóvel (valor mensal a ser arbitrado em liquidação, devido desde a data da citação). A jurisprudência deste Superior Tribunal já admite semelhante solução na hipótese relacionada com a separação ou o divórcio, enquanto um cônjuge permanece residindo no imóvel do outro. Por fim, os créditos recíprocos deverão ser compensados de forma que o direito de retenção seja exercido no limite do proveito que os recorridos têm com o uso da propriedade alheia. Anote-se que a retenção não é um direito absoluto ou ilimitado sobre a coisa, mas mera retentio temporalis : os princípios da vedação ao enriquecimento sem causa e da boa-fé objetiva, ao mesmo tempo em que impõem ao retentor o dever de não usar a coisa, determinam que a retenção não se estenda por prazo interminável. Com esse entendimento, a Turma, por maioria, deu provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 673.118-RS , DJ 6/12/2004, e REsp 23.028-SP , DJ 17/12/1992. REsp 613.387-MG , Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 2/10/2008.
NOTAS DA REDAÇÃO
Trata-se de Recurso Especial interposto com base no art. 105 , III , a e c , da Constituição Federal , contra acórdão do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais que mantivera incólume sentença proferida em primeira instância nos autos da ação de cobrança ajuizada pelo ora recorrente contra o recorrido que se encontra na posse de imóvel de propriedade do recorrente em razão do acordo homologado nos autos da ação reivindicatória outrora ajuizada.
Em sede de primeiro grau o juiz extinguiu a ação de cobrança de aluguéis com julgamento do mérito, pois ao reconhecer a existência da coisa julgada, considerou anterior ação reivindicatória sobre o mesmo imóvel. Ocorre que, não obstante o recorrente e o recorrido terem realizado acordo homologado nos autos da ação reivindicatória concedendo o direito de retenção do recorrido até que o recorrente o indenize pelas benfeitorias construídas não se estipulou, na oportunidade, qualquer valor a título de aluguel pelo tempo que durasse a retenção.
Note-se que benfeitoria é toda obra realizada pelo homem na estrutura de uma coisa com o propósito de conservá-la, melhorá-la ou embelezá-la. Assim, não existe benfeitoria natural, todas são artificiais e trabalhadas no corpo da coisa principal, portanto, não há aumento do bem, diferentemente da acessão, que além de aumentar é modo de aquisição da propriedade.
O Código Civil trata sobre benfeitoria nos seguintes termos:
Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias.
§ 1o São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.
§ 2o São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem.
§ 3o São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore.
Art. 97. Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor. (grifos nossos)
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis. (grifos nossos)
O recorrente sustenta que enquanto os recorridos permanecerem na posse e uso do imóvel em razão do acordo homologado nos autos da ação reivindicatória, não poderiam utilizá-lo gratuitamente, e que a cobrança de um valor por seu uso e fruição não demandaria a existência de um contrato de locação celebrado entre as partes. Portanto, a lide não envolve contrato de locação, mas sim o direito à indenização pelo uso do imóvel enquanto não dirimida a controvérsia possessória.
Diante do exposto a Terceira Turma seguindo orientação doutrinária acolheu os fundamentos do recorrente e ainda fez referência à jurisprudência de casos semelhantes. Por fim, decidiu pela compensação dos créditos recíprocos, isto é, de forma que o direito de retenção seja exercido no limite do proveito que os recorridos têm com o uso da propriedade alheia.
1 Comentário
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perfeito entendimento, uma vez que se pleiteia a indenização de benfeitorias não é razoável que se retenha a coisa fazendo uso da mesma sem nenhuma oneração, viola diretamente a vedação ao enriquecimento ilícito, não obstante, o artigo 1.219 é enfático ao tratar a questão da retenção que se dá pelo valor das benfeitorias, onde é perfeitamente cabível a compensação dos valores, vou mais além, caso o direito de retenção seja abusado, ou seja, usado além dos valores devidos das benfeitorias, no meu entendimento, cabe indenização do saldo, o credor se torna devedor "dura lex sed lex" continuar lendo