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16 de Junho de 2024
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    Direito Penal

    Publicado por Carta Forense
    há 16 anos

    O § 4º do art. 33 da Lei 11.343 , 23 de agosto de 2006, apresenta a seguinte redação:

    § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.

    De logo, convém elogiar a posição do legislador que procurou criar um mecanismo para o qual o juiz possa melhorar a situação daquelas pessoas que, ainda não completamente corrompidas pelas organizações criminosas, têm chance de ser "salvas", ou seja, que uma punição adequada satisfaça às finalidades de retribuição e de prevenção (geral e especial) da pena sem que seja necessária toda a força prevista para o delito, com pena in abstracto que varia entre 05 e 15 anos de reclusão e 500 a 1.500 dias-multa.

    As condições elencadas são extremamente sábias, pois excluem aqueles mais ligados aos diversos crimes, com maus antecedentes, reincidentes e aqueles que integram organizações criminosas - de onde, em regra, não se sai com vida.

    Neste ponto, torna-se conveniente uma pergunta: qual elemento ou quais elementos o magistrado fixador da pena levará em consideração para diminuir a pena diante da amplitude dessas frações, 1/6 a 2/3?

    Veja-se que no ordenamento jurídico penal são contempláveis dois tipos de causas especiais de aumento ou diminuição de pena, as de fração fixa (p. ex. o 1/3 do furto noturno ou o 1/2 pelo fato do agente ser pai da vítima nos crimes contra os costumes) e as de conteúdo variável (p. ex. as majorante do roubo, que variam de 1/3 até 1/2, ou a minorante da tentativa, que variam de 1/3 a 2/3). Aquelas são praticamente objetivas, ou seja, quando verificadas, diminuem ou aumentam a pena com uma fração fixa, não permitindo ponderação, diante daquela objetividade. Essas últimas, no entanto, pedem, normalmente uma maior ponderação do magistrado, pois podem ser mais ou menos cumpridas, isto é, permitem que o magistrado adéqüe a fração que escolha ao caso concreto. A título de exemplo, cito a minorante da tentativa (art. 14 , § 2º , parágrafo único , do CP) que, de acordo com a distância que a conduta ficou da consumação do crime, se mais distante ou menos distante, pode o julgador optar por diminuir mais ou menos a pena, numa direta proporcionalidade. O mesmo acontece claramente noutras minorantes, como a do arrependimento posterior (art. 16 /CP), a semi-imputabilidade (art. 26 /CP) e a participação de menor importância (art. 29 , § 1º , do CP), entre outras.

    A minorante do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas, apesar de conter apenas várias condições objetivas, não traz uma fração fixa, mais uma faixa de frações. Isto é muito incomum na sistemática do ordenamento jurídico penal já esboçada, pois o magistrado não tem um norte em relação a como ponderar a larga faixa de diminuição da pena, de 1/6 a 2/3.

    Ressaltamos, também, que não é de se imaginar que tenciona a norma que algumas daquelas condições possam não ser cumpridas. Todas devem ser cumpridas, a teor da conjunção utilizada ("nem") para ligar seu último elemento.

    Guilherme Nucci - trazendo luz para esta questão - recomenda, de forma interessante a utilização dos "elementos do art. 59 do Código Penal , com a especial atenção lançada pelo art. 42 desta Lei" (Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2008) e tendo o cuidado de alertar para o perigo do bis in idem que pode ocorrer na aplicação, nesta fase (terceira, própria para as minorantes e majorantes) dos mesmos critérios existentes para a fixação da pena-base. Neste ponto, temos o dever de lembrar que constitui princípio da aplicação da pena a utilização, na fase mais qualificada, de circunstância que possa servir em duas fases distintas.

    Outro ponto interessante da norma sob estudo e ainda não descortinado pela doutrina ou pela jurisprudência é a expressa vedação da conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos quando da aplicação dessa causa especial de diminuição de pena. Afinal, à primeira vista, parece ser uma simples restrição.

    Entretanto, para ter outra compreensão devemos estar atentos à regra de interpretação que afirma a inexistência de palavras desnecessárias e inúteis na lei e ao teor do art. 44 da mesma Lei de Drogas:

    Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.

    Ora, se o art. 44 daquela lei já prevê a impossibilidade de conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, para que o mesmo comando no art. 33 , § 4º?

    Entendemos que não há redundância e, ao contrário, como a norma em estudo (art. 33, § 4º) prevê uma série de condições que, se atendidas, gerarão direitos para o agente do ato criminoso, essa aparente restrição pretende, na verdade, conceder ao incriminado que satisfaz aquelas condições todos os direitos que foram negados no art. 44 , restando apenas a impossibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. Observe-se que a regra geral do art. 44 é atenuada pela norma especial do art. 33, § 4º, que, como condição especial, restringe as proibições apenas à impossibilidade de conversão da restritiva de direitos.

    Assim, o condenado por tráfico de drogas a uma pena-base de seis anos que assim permaneceu na segunda fase (de atenuantes e agravantes) e satisfaz as condições do § 4º do art. 33 da Lei 11.343 /06, além de poder ter a pena privativa de liberdade diminuída de 2/3 (indo para dois anos) e, ainda, susceptíveis de sursis, graça, indulto e anistia.

    Essa nos parece ser a sábia vontade da lei, preocupada em dar uma nova chance e a preservar os direitos daqueles que, numa primeira desventura, enveredam pelos crimes mais fortes ligados a drogas e entorpecentes. Ela parece querer acariciar aqueles que ainda podem se redimir e, de forma simultânea, querer punir exemplarmente aqueles que teimarem em se desviar da boa conduta.

    Através da sagaz fórmula do art. 33 , § 4º , da Lei 11.343 /2006 se concretiza uma Constituição Federal que sabe ser um manancial de direitos e, ao mesmo tempo, dar à sociedade a retaliação esperada para uma espécie de crime que a aflige mais e mais a cada dia.

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