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1 de Maio de 2024

Direitos Humanos só defendem bandido - Será?

há 7 anos

Direitos Humanos s defende bandido - Ser

Quero, já de início, deixar claro que não tenho pretensão nenhuma de falar de política com este texto. Não quero valorar polos, e muito menos diminuir as visões de mundo que cada pessoa possui.

Escrevo isto da maneira mais pacífica que consigo, com a intenção apenas de fazer você, ser pensante, refletir. Refletir é bom. Mesmo quando temos extrema convicção de algo, a reflexão é uma faculdade maravilhosa que ninguém pode tirar de nós, então, porque não usar sempre que possível?

O meu foco aqui é falar sobre a ideia de que direitos humanos servem apenas para proteger bandidos.

Esse pensamento virou tão popular, que tenho a impressão de que muita gente adotou isto como opinião sem ao menos entender o que exatamente está incorporando no seu próprio âmbito de “pensamentos”.

Vejo filósofos, políticos, médicos e até mesmo juristas gritando pelo “fim dos Direitos Humanos” sob pretexto de que são defesas apenas para “criminosos”, mas será que isso é verdade? Será que alguém no mundo, realmente quer passar a mão na cabeça de assassinos, ladrões e estelionatários?

Primeiramente, vamos deixar claro que Direitos Humanos não é uma organização, não é um grupo e não é uma pessoa. É um conjunto de normas, e pode ser considerado sinônimo de Direitos Fundamentais. Assim, não existem "membros dos Direitos Humanos", uma vez que todos nós somos contemplados por suas normas. Ainda, se uma organização usa dos Direitos Humanos para praticar ato ilícito, claramente o objetivo desta organização não é a promoção dos Direitos.

Dito isto, se a pessoa se der ao trabalho de pesquisar, ao invés de simplesmente engolir uma frase de impacto que ouviu, ela descobrirá que graças aos Direitos Humanos é que nós conseguimos buscar igualdade.

Graças a eles é que não podemos mais classificar as pessoas por raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política, classe social, nascimento ou qualquer outra situação.

Você pode me rebater dizendo que isso é bom senso, e que se acabasse com “o pessoal dos Direitos Humanos”, iam continuar respeitando as pessoas, mas eu digo que não respeitam nem mesmo agora. Em tempos de intolerância e violência, o ser humano ia, sim, procurar formas de subjugar o outro, e de se impôr mais do que já o faz, sob todo aquele que pudesse.

Graças aos Direitos Humanos, também, é que não trabalhamos (ou não devíamos trabalhar) o dia todo, como escravos. Graças a eles é que temos as leis trabalhistas - as férias, a licença maternidade, horas extras e todas as coisas que foram implementadas para garantir a saúde e a dignidade do trabalhador.

Por conta dos Direitos Humanos é que não podemos, de forma alguma, atentar contra a vida alheia e sair matando como bem entendemos. Que não podemos sair agredindo. Que não podemos ser colocados contra a parede e nem sermos torturados pela polícia ou qualquer outra pessoa.

Sabe aquele sentimento que você tem de que ninguém pode te humilhar? De que se alguém te humilhar você mete um belo de um processo? Pois é, adivinha por que que ele existe…

Até mesmo aquela sua “certeza” de que está seguro, e de que não será preso sem ter cometido crime também é trabalho dos Direitos Humanos, que diz que temos direito a liberdade e que não podemos ser presos arbitrariamente (apesar de isto, assim como todas as outras coisas, não serem sempre respeitados).

É graças a este “ramo” do Direito que temos direito à vida, à saúde, a não sermos maltratados, a termos opinião (inclusive, a opinião de que este texto está equivocado) entre vários outros.

Tudo isso é conquista dos Direitos Humanos, e não surgiu desde os primórdios da humanidade, como muita gente pensa.

Por que será, então, que ele é tão ligado a ideia de “prisão”?

O que acontece é que essas coisas elencadas não servem só para você, ser humano que está lendo isto de um computador ou celular, confortavelmente em uma casa.

Elas servem para TODOS os seres humanos, até porque, lembra o que eu falei no início do texto? Um dos princípios é o de que somos todos iguais, o que significa que o preso também tem direito de ter uma vida digna, mesmo que tenha algumas limitações - afinal, ele continua sendo um ser humano (o que muitas vezes, as pessoas deliberadamente esquecem).

A prisão cumpre o que deveria cumprir, que é a privação da liberdade. O povo, todavia, acredita que isso não é suficiente e aquele preso deveria ser tratado como um animal, através de uma espécie de “vingança estatal”. Para essas pessoas, o preso tem que sofrer o resto da eternidade por, digamos, ter roubado alguém. (não importa o crime, afinal, “se está preso, gente boa não é”.)

Meu pai é desembargador, e um dia me contou que uma colega Promotora disse uma coisa que impactou muito o seu pensamento, e que eu mesma levo para minha vida.

Segundo ela, as pessoas pensam que existe uma divisão entre “eles” e “nós”, como se “bandidos” fossem pessoas muito distantes da nossa realidade, seres de outro mundo, muito diferente da gente, já que somos “pessoas do bem”.

Isso, todavia, é uma grande ilusão, baseada puramente em confiança e valores morais.

Todos os dias, “cidadãos do bem” cometem crimes, mas continuam sendo “nós” apenas por não terem sido pegos, descobertos.

Além disto, muitos acreditam, ingenuamente, que não podem, jamais, serem incriminados por algo que não fizeram. Que isto só acontece em filmes. Que quem não deve, não teme, e que ele, por fazer parte de “nós”, é imune a qualquer coisa ruim. Bom seria se esta fosse nossa realidade.

Vejam bem, isto foi dito por uma Promotora. É, sabe... Aquela pessoa que trabalha defendendo a sociedade, mandando os criminosos para a prisão. Uma pessoa que vive esta realidade.

Você também pode querer me rebater afirmando que isto é muito lindo na teoria, mas que na prática, os Direitos Humanos defendem apenas aqueles encarcerados, deixando as pessoas livres esquecidas. Mas será que isso é realmente verdade, ou será que, por ser algo polêmico, é simplesmente o que a mídia documenta?

Ninguém leria um jornal dizendo “homem trabalha 40 horas semanais”, afinal, isto não é “notícia”.

E sim, a situação do Brasil infelizmente não é a que queremos. Temos racismo, preconceito, empresas que abusam de seus funcionários, mulheres sendo tratadas como inferiores, mas os DH continuam lutando para melhorar isso.

Será que é certo deixar que o Estado arbitre quem é “digno” e quem “não é”? Quem deve ser tratado como animal e quem não deve…?

A segurança jurídica se baseia em sabermos que todos são tratados da mesma maneira, de que somos todos iguais perante a lei.

Gritar pelo fim dos direitos humanos significa gritar pelo fim do direito à dignidade, a liberdade, a saúde, a privacidade e a inúmeras outras coisas que regem o dia a dia tranquilo de cada um de nós.

Selecionar quem é digno de ter direitos ou não, também é uma coisa extremamente perigosa - mesmo para quem se considera a pessoa mais correta do mundo.

Se você, todavia, mesmo lendo este texto, ainda acredita que as penas são muito leves e que o sistema criminal brasileiro está todo errado, e que devia tratar “eles” de outra maneira, talvez o ideal não fosse pedir o fim dos direitos humanos, mas sim a revisão do Código Penal e de Processo Penal. Se mesmo assim, você quiser continuar pensando como sempre pensou, tudo bem - este é direito seu.

Obrigada!

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108 Comentários

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O que as pessoas questionam é: por quê ninguém dos direitos humanos aparece na hora em que um policial ou cidadão é morto, mas estão sempre lá no enterro de bandidos.

Isso inclusive foi alvo de um desabafo de policiais que estavam no enterro de colegas de farda que foram emboscados por traficantes.

Ou seja, há uma grande diferença entre Direitos Humanos enquanto ciência e as pessoas que usam isso para se promoverem, especialmente para se lançarem como advogados nas áreas criminais. continuar lendo

Os Direitos Humanos estão lá, sim, quando qualquer pessoa é morta.Um exemplo disso é justamente, a pena para quem mata - pena esta que se aplica a qualquer um. O "direito a vida" é DIREITOS HUMANOS.
Talvez não encontremos a proteção com a eficácia prática que queríamos ou precisaríamos em alguns âmbitos, mas é uma luta.
O que temos que lembrar é que direitos humanos não é um grupo de pessoas. Não é um grupo político. Não é GENTE. É direito, é um conjunto de princípios, regras e proteções e que - PASME - não se resume a "prender" as pessoas, envolve muito mais que isso.
O policial ou cidadão morto não é desamparado. O problema é que, infelizmente, não temos um sistema tão hábil quanto gostariamos, a investigação é fraca, o CP é defeituoso, e muitas vezes não é tão simples encontrar a pessoa para que ela possa ser devidamente processada ou punida, o que gera esse sentimento de impunidade. Essa falha do sistema, todavia, não é culpa dos Direitos Humanos em si e sim de toda a estrutura criminal do país. continuar lendo

Júlia, acho que você entendeu quando eu falei da diferença entre o estudo do Direitos Humanos (ciência) e a ausência de representantes das entidades dando amparo para as pessoa vítimas de bandidos.

Por sua vez, basta qualquer bandido ser preso ou morrer que a presença do tal representante se faz presente.

O que a sociedade critica é o oportunismo de pessoas que representam órgãos de defesa dos Direitos Humanos. É um peso que só está presente em um lado da balança ... o que será cliente amanhã. continuar lendo

Olá, Júlia. Entendo sua posição, mas discordo de diversos pontos. Não é o movimento de direitos humanos quem limitou a prática do homicídio ou as agressões físicas, por exemplo. Tais condutas são crimes em praticamente todas as sociedades antigas, pois são limitações essenciais à subsistência da vida coletiva.
A crítica aos direitos humanos não ataca o seu passado, seus benefícios históricos, mas a sua atual roupagem, o que é absolutamente diferente. Muitos movimentos personificam esses direitos que acabam sendo, com o passar dos anos, desvirtuados. Há, ademais, muitos interesses por trás de diversos pleitos encabeçados por ONGs e movimentos.
O recente escândalo de corrupção de SP reafirma isso: http://veja.abril.com.br/brasil/vice-dos-direitos-humanos-admite-que-recebia-mesada-do-pcc/

Abraço! continuar lendo

Oi Hyago. Entendo o que quis dizer, mas acredito que as pessoas, por conta de representantes corruptos (que encontramos em todas as áreas), estejam distorcendo o que são direitos humanos.

Os Direitos Humanos nada mais são que os Direitos Fundamentais, como o exemplo do Direito a Vida - e por isso, sim, é proteção deles.
Talvez não fosse assim chamado antigamente, mas não deixa de estar enquadrado neste ramo.
Assim como, apesar de não ser chamado assim quando aconteceu a revolução industral, os direitos trabalhistas são conquistas do Direito do Trabalho.

O que acontece é que as pessoas estão pensando em Direitos como organizações - e não é isso. continuar lendo

Por isso penso que você está falando de uma coisa (evolução histórica, reconhecimento de direitos inerentes ao ser humano), enquanto a opinião pública ataca outra coisa, embora com o mesmo nome. Abraço! continuar lendo

Mas é isso mesmo. Só quis esclarecer o que são Direitos Humanos, uma vez que o que está sendo atacado é justamente outra coisa.
Abraços e obrigada. continuar lendo

Hyago, falou tudo.

E nem todas as pessoas falam do Direito como organização. continuar lendo

Caro Hyago,Infelizmente, estamos vivenciando uma tragédia de grandes proporções e quando se refere ao aumento exponencial da criminalidade, não percebo nenhuma debate entre os articulistas tendo empatia compreendendo os familiares das vítimas.Gostaria que fizesse uma breve pesquisa e verificasse qual seria á reação e qual tipo de justiça merecia.Exemplos.Se um destes criminosos ceifasse á vida de pessoas que atuam na defesa dos direitos humanos qual seria a reação da opinião?Qual seria justa medida? e se houvesse outras causas que medida tomar?Diante do exposto, posso aguardar diversas manifestações contrárias, mas emito juízo de valor pelo que assisto todos os dias. OBS. Morei em comunidade e sei um pouco que ocorre principalmente com o mercado de pequenos varejistas drogas que deveria ser discutida no congresso. continuar lendo

Perfeito Hyago, concordo com vc. DH, no passado pode ter dado contribuições para delimitar condutas nas sociedades, mas atualmente presta um desserviço segregando classes, agindo em detrimento de interesses políticos e, para cair no chavão, ajudando bandidos a continuarem suas carreiras criminosas. continuar lendo

Primeiramente há que se ter conhecimento do que são os Direitos Humanos, como funcionam e a efetivação dos mesmos. Existem diversas instituição que tratam do assunto. Podemos elencar várias delas como, por exemplo, instituições que tratam do combate ao tráfico de mulheres.
É normal a pessoa comum ter o pensamento de que a efetivação dos Direitos Humanos não se alcança às vitimas. Ledo engano, pois os Direitos Humanos são inerentes a todos os cidadãos.

Existem vários equívocos do pensamento popular que direitos humanos são voltados a defender criminoso, pois os que cometem crimes também são humanos e merecem a nossa proteção, não importando sua condição, sendo assim, inclui-se a proteção até mesmo do agente que cometeu o crime.
O movimento de nós defensores dos direitos humanos jamais se coloca a favor do crime ou do criminoso, ao contrário, lutamos contra a impunidade sempre regulada em critérios jurídicos éticos e constitucionais.

Isto não significa que o movimento de direitos humanos tenha se colocado, a qualquer momento, a favor do crime; aliás a luta contra a impunidade tem sido uma das principais causas dos defensores dos direitos humanos. Estamos pautados em argumentação de que todos são iguais perante a Lei e que igualmente todos tem a proteção quando seu direito é violado, e é assim que vemos os Direitos Humanos. Essa história que é repassada às pessoas de que nós defensores dos Direitos Humanos só defendemos criminosos é uma falácia inventada por quem efetivamente não conhece nem mesmo os seus Direitos Constitucionais. continuar lendo

Com todo respeito ao comentário, mas parece que não tem noção de quantas vítimas tiveram seus entes querido pelos criminosos e alguns que ficaram paraplégicos ara sempre outros em profunda depressão... não sei o que pensar nesta "Reeducação".de criminosos reincidentes.Até mesmo uma civilização pré historia reconhecia os seus semelhantes., nas antigas religiões matavam pela fé, os Astecas, pelos deuses, e hoje se mata por um simples celular... continuar lendo

Um texto de alto nível e de grande reflexão . é muito bom lembrar as pessoas o papel importante dos DH , e suas atuações na sociedade . Parabéns pela reflexão . continuar lendo

Concordo com o Doutor e também parabenizo a Autora. Infelizmente ao querer a todo custo simplesmente condenar os criminosos, esquecemos que todos somos seres humanos, Pensar assim, nos torna animais com práticas idênticas as que tanto criticamos. continuar lendo