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2 de Maio de 2024

É possível anular a paternidade quando não há vínculo biológico?

Publicado por Perfil Removido
há 7 anos

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso em ação negatória de paternidade na qual um homem alegou que registrou sua filha não biológica por suposta pressão familiar, entendeu que a existência de reconhecimento espontâneo da paternidade e de relação afetiva impede a anulação de registro buscada judicialmente pelo pai, ainda que comprovada a ausência de vínculo biológico entre as partes.

Segundo o STJ, após derrotas em primeira e segunda instâncias, o pai defendeu, no recurso especial, a existência de vício em seu consentimento, motivo pelo qual não deveria arcar com os encargos materiais da paternidade. Quando foi comprovada a ausência de vínculo biológico por meio de exame de DNA, o homem buscou judicialmente a anulação do registro de paternidade e o consequente cancelamento da obrigação de pagamento de pensão alimentícia.

De acordo com o diretor nacional do IBDFAM e mestre em Direito Civil, Ricardo Calderón, a multiplicidade de vínculos torna mais complexa a trama da parentalidade contemporânea. Para ele, ligações biológicas, socioafetivas, registrais, adotivas e presuntivas estão presentes no sistema jurídico brasileiro, todos a desfilar com o mesmo status hierárquico e com guarida na Constituição Federal.

“Em muitas situações existenciais, a dinâmica das relações sociais atuais acaba por exigir uma análise que encontre soluções a partir de uma metodologia civil-constitucional, muitas vezes a única a permitir ao julgador fazer justiça no caso concreto. O acórdão que ora foi apreciado parece ter percorrido esta trilha. Merece destaque a decisão do Superior Tribunal de Justiça que manteve a filiação lastreada no vínculo socioafetivo, mesmo sem a presença de descendência biológica, o que demonstra a consolidação dessa importante categoria. Os fundamentos do julgado e os temas que lhe são correlatos permitem, de certa forma, perceber o atual estágio do direito das famílias brasileiro”, afirma.

Ricardo Calderón lembra que a situação diz respeito a um pai que reconheceu espontaneamente a paternidade de uma menina, visto que estava em um relacionamento afetivo com a mãe da criança. Conforme os autos, no momento desse registro o referido pai já não tinha certeza da sua ascendência genética com essa filha, mas, mesmo assim, ele houve por bem em formalizar essa paternidade. Como a mãe era solteira à época do nascimento, inicialmente ela foi a única a figurar no registro civil.

Quando a criança estava com aproximadamente um ano de vida, o então companheiro da mãe foi espontaneamente até o ofício de registro civil e reconheceu a sua paternidade, estabelecendo o vínculo registral. No decorrer dos anos, a convivência dessa família firmou uma relação paterno-filial socioafetiva, visto que pai e filha viveram de forma harmoniosa por mais de uma década. Porém, ao término do relacionamento, o pai resolveu questionar a paternidade anteriormente reconhecida.

O Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator do recurso, lembrou que a paternidade socioafetiva consubstancia o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, pois permite que um indivíduo tenha reconhecido seu histórico de vida e a sua condição social, valorizando, além dos aspectos formais, a verdade real dos fatos. Disse ainda que as instâncias ordinárias concluíram que o pai registral esteve presente na vida da filha desde o nascimento dela, assim como em datas comemorativas e em outros momentos importantes por mais de dez anos, mesmo que ele pudesse, eventualmente, indagar a origem genética da filha, cuja paternidade assumiu voluntariamente.

Na Corte Especial, o Ministério Público proferiu parecer no sentido de que a paternidade em pauta só poderia ser desconstituída com a demonstração de ausência de vínculo biológico e também de ausência de vínculo socioafetivo, e, ainda, desde que aliada a alguma comprovação de vício de consentimento no momento do registro. Como na situação em apreço não houve prova de qualquer vício, bem como restou inconteste a presença do vínculo socioafetivo, o parquet opinou pelo improvimento do recurso paterno, com a confirmação das decisões anteriores (que mantinham a paternidade).

No STJ, o referido feito foi distribuído para a Terceira Turma, sob a relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que proferiu voto no sentido de manter a paternidade socioafetiva mesmo ausente o vínculo biológico. Com isso, negou provimento ao Recurso Especial do pai, em decisão acolhida de forma unânime (votaram com o I. Relator os Ministros Marco Aurélio Belizze, Moura Ribeiro, Nancy Andrigui e Paulo de Tarso Sanseverino).

“O STJ foi um dos precursores na edificação do sentido de socioafetividade para o Direito de Família brasileiro, visto que acolhe essa categoria há quase mais de duas décadas, mesmo quando inexistia qualquer lei expressa a respeito dessa temática. A manutenção da filiação socioafetiva, mesmo com a comprovação da ausência do vínculo biológico, está de acordo com o sentido civil-constitucional de filiação apurado pelo direito de família contemporâneo, que é uníssono em afirmar que a paternidade não decorre apenas da descendência genética”, finaliza Ricardo Calderón.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)

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28 Comentários

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Bom meu modo de pensar é um homem tem que pensar mil vezes antes de viver com uma mulher cujo a mesma tenho filho isso sem ter a certidão de nascimento, pois depois não poderá falar nada mas também existe mulheres que procuram apenas um pai para seu filho quando na verdade nem ela sabe quem é o pai, mas entra nessa quem quer continuar lendo

Pelos comentários, vejo o quão grande é a carga discriminatória sobre a mulher a respeito da maternidade. Com expressões do tipo: "Mãe Solteira". Ora! se há uma criança, é porque houve uma conjunção carnal entre um casal, não importando se eram casados ou solteiros. E a não ser que tenha sido uma fecundação artificial na chamada "produção independente", quando a responsabilidade e totalmente materna,há de haver alguém responsável por esta criança. E se uma das partes ainda que não tenha vínculo biológico com a criança, mas tenha assumido o papel sócio afetivo por livre e espontânea vontade, ela terá de arcar com as responsabilidades que tal ato carrega. O que não pode é depois de mais de dez anos, a pessoa dizer: "Cansei da brincadeira , não quero mais ser pai!". E o lado psicológico dessa criança como fica? Pode até ser legal o término do vinculo, mas não deixa de ser IMORAL!. continuar lendo

Quando falo em fecundação artificial, me refiro a chamada "produção independente", e não a fecundação assistida tradicional. continuar lendo

em fim um comentário que valha minha leitura. continuar lendo

Esse tema é de grande controversa na nossa sociedade, vez que a maioria das mães solteiras não sabem quem é o pai da criança, nesses casos acredito que poderia deixar o sobrenome para evitar o preconceito, mas a criança não teria direito a pensão alimentícia e nem a herança, essa deveria buscar o pai biológico para fazer jus. continuar lendo

Já ouviu falar em teste de DNA? continuar lendo

Concordo Cleonice continuar lendo

Tá aí, o típico direito injusto. continuar lendo

Por que? Ele registrou porque quis, criou por anos e agora quer virar as costas? continuar lendo

Pois é José, sempre os espertinhos no Brasil se dão bem, não deveria ser permitido reconhecimento sem teste de DNA anteriormente comprovando e pronto. continuar lendo

David Fontana, se, no seu entendimento, teve um "espertinho" para tirar proveito da situação, também teve um "burrinho" que reconheceu filho que não era dele, né? continuar lendo