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    Fim dos paraísos bancários-fiscais (?)

    há 15 anos

    Como citar este artigo: GOMES, Luiz Flávio. Fim dos paraísos bancários-fiscais (?) . Disponível em http://www.lfg.com.br. 17 de março de 2009.

    O sigilo bancário (e financeiro) é a regra geral nos modernos Estados de Direito. Mas, quase que diariamente, vem sendo (no mundo todo) cada vez mais flexibilizado.

    Tendência mundial: a crise econômica mundial está repercutindo intensamente também no Direito penal. Práticas clássicas (como a proteção férrea do sigilo bancário em países como Suíça, Luxemburgo etc.) estão se alterando rapidamente. O G-20 vai divulgar uma lista dos países que não colaboram com investigações criminais por fraude ou evasão fiscal. A partir dessa ameaça vários países estão flexibilizando seu sigilo bancário: Suíça, Bélgica, Luxemburgo, Andorra, Áustria etc.

    O sigilo bancário no Brasil: no Brasil o sigilo bancário decorre da inviolabilidade da vida privada (CF , art. , X). A preservação do sigilo dos dados (incluindo aí os bancários)é o ponto de partida que deve ser respeitado (CF , art. , XII). Claro que não se trata de um direito absoluto. Logo, por ordem judicial (que deve seguir o devido processo legal com todas as suas garantias) não há nenhuma dúvida que esse sigilo pode ser quebrado.

    A possibilidade dessa intervenção judicial (na vida privada financeira das pessoas) vem prevista na Lei Complementar 105 /2001 (art. 3º), que é a lei regente do sigilo bancário no nosso país. As Comissões Parlamentares de Inquérito (na medida em que possuem os mesmos poderes investigatórios dos juízes), por seu turno, também contam com amplo e direto acesso a esses dados bancários (art. 4º da mencionada lei). As Comissões Parlamentares estaduais gozam do mesmo direito (STF - ACO 730/RJ - Pleno - Rel. Min. Joaquim Barbosa - DJ 11/11/2005 p. 5).

    O Ministério Público, na atualidade, já não conta com esse poder (de quebra de sigilo bancário). Há um acórdão antigo do STF (de 1995) que lhe conferia essa possibilidade, desde que se tratasse de verbas públicas (STF - MS 21.729/DF - Tribunal Pleno - Rel. Min. Março Aurélio - Julgamento: 05/10/1995 - Publicação: DJ 19/10/2001). Em contrapartida há um outro acórdão também do STF negando essa autorização (de forma peremptória), por força do caráter constitucional do sigilo (STF - RE 215.301/CE - 2ª Turma - Rel. Min. Carlos Velloso - DJ 28/05/1999 p. 24).

    Após a edição da LC 105 /2001 (que não fez nenhuma referência ao MP) parece que se tornou indiscutível a impossibilidade de quebra do sigilo bancário diretamente pelo MP. Teria a lei complementar revogado (revogação tácita) o disposto no art. 29 , parágrafo único , da Lei 7.492 /1986 (que lhe dava tal autonomia). De outro lado, o poder de requisição (genérico) do art. 129 , VIII , da CF não chegaria ao extremo de suprimir a necessidade de ordem judicial (em virtude da sua imparcialidade).

    Seguindo a tendência mundial, nos últimos anos, também no Brasil nota-se uma nítida tendência de flexibilização do sigilo bancário. A citada LC 105 /2001 possibilita o acesso de praticamente toda administração pública aos dados bancários. Ninguém pode invocar o sigilo frente ao Banco Central do Brasil, Comissões de inquérito e Comissão de Valores Mobiliários. Esses órgãos e os demais órgãos de fiscalização, nas áreas de suas atribuições, fornecerão ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, de que trata o art. 14 da Lei n. 9.613 /98, as informações cadastrais e de movimento de valores relativos às operações previstas no inciso I do art. 11 da referida lei (art. , § 6º , da LC n. 105 /01). O art. 11 , II , alíneas a e b , confirma essa transferência de informações (ao COAF), que também está prevista em favor da Advogacia-Geral da União (art. , § 3º , da LC 105 /2001).

    As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios também poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente (art. 6º, caput , da LC n. 105/01).

    Como bem sublinhou Renato Brasileiro: "todos esses dispositivos legais estabelecem uma forma automática e contínua de monitoramento, não só da movimentação bancária propriamente dita, mas de toda a vida financeira de qualquer indivíduo, seja ele suspeito da prática de atos atentatórios ao interesse público ou não, deixando à análise da Administração a fixação de todos os critérios para ter acesso às informações, o que, para alguns, poderia transformar o afastamento de uma garantia constitucional - inviolabilidade da intimidade e da vida privada - em mero ato administrativo, auto-executável, cujo controle judicial da legalidade somente poderá ser feito a posteriori. "

    No Supremo Tribunal Federal, não por acaso, tramitam 07 (sete) ações diretas de inconstitucionalidade questionando a possibilidade de quebra do sigilo bancário sem autorização judicial: a) ADI 2.386 -1, de iniciativa da Confederação Nacional do Comércio; b) ADI 2.389 -6, ajuizada pelo Partido Social Liberal; c) ADI 2.390 -0, proposta pelo Partido Social Liberal; d) ADI 2.397 -7, cujo requerente é a Confederação Nacional da Indústria; e) ADI 2.406 -0, de iniciativa da Confederação Nacional da Indústria; f) ADI 2.859 -6, ajuizada pelo Partido Trabalhista Brasileiro; g) ADI 4.010 -3, cujo requerente é o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

    Até hoje não contamos com um posicionamento definitivo do STF sobre o assunto. A tendência (provavelmente), que já se nota em alguns julgados (v.g.: STF - RE n. 461.366/DF - 1ª Turma - Rel. Min. Março Aurélio - DJ 05/10/2007 p. 25), consiste em não transigir excessivamente com a necessidade de ordem judicial para a quebra do sigilo bancário. De outro lado, o STF deixou certo que a quebra de sigilo bancário não é devassa (Inq 2245 AgR/MG , rel. Min. Joaquim Barbosa, rel. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 29.11.2006).

    É difícil prognosticar a decisão final do STF. É bem provável, entretanto, que ele venha a seguir a linha (mundial) flexibilizante, porém, não tanto. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. A troca de informações entre instituições financeiras ou entre elas e o COAF, tal como previstas no art. , § 3º , da LC 105 /2001, muito possivelmente não serão glosadas pelo STF (porque, nesse caso, a informação não chega ao conhecimento público). E cada órgão que recebe a informação continua com o dever de sigilo bancário (frente ao público em geral). No mais, a tendência do STF é não permitir abusos nem intervenções não justificadas pela absoluta necessidade. A regra (geral) da quebra do sigilo deve manter nas mãos do Poder Judiciário o poder de quebra e o juiz (para tanto) está obrigado a seguir e respeitar todas as garantias do devido processo legal. Assim é a vida dos direitos no Estado democrático de Direito. Toda flexibilização excessiva das garantias conduzem inexoravelmente ao Direito penal e processual do inimigo.

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