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30 de Abril de 2024

Prisão civil não se justifica se for ineficaz para fazer devedor quitar dívida alimentar, diz STJ

Publicado por Wander Fernandes
há 7 meses

Como sabido, a prisão civil do devedor de pensão alimentícia não é uma punição (pena ou sanção), mas uma forma de persuadir o responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável a quitar a obrigação, conforme o artigo 528, § 3º, do CPC/ 2015, que confere efetividade a0 artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal.

Portanto, não é justificável sua decretação se for ineficaz para compelir o devedor ao pagamento da dívida, mesmo nos casos em que o débito se avolumou de forma significativa.

Seguindo esse norte, por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso em Habeas Corpus ( RHC nº 176091/ RJ) para um homem que deve R$ 42,8 mil de pensão alimentícia.

A filha, representada pela mãe, requereu a prisão civil do pai para obrigá-lo a quitar a dívida. No HC, o homem defendeu que passou por períodos de desemprego, nos quais fazia pagamentos parciais de acordo com suas possibilidades financeiras.

Em janeiro do ano passado, o homem conseguiu emprego com carteira assinada e uma decisão liminar para reduzir o valor da pensão. Ele passou a receber R$ 1,8 mil por mês e a pagar R$ 496,85, descontados direto da folha de pagamento.

O magistrado considerou que a obrigação vem sendo regularmente cumprida, e a manutenção da prisão civil, “além de não se mostrar legítima, também não parece ser o melhor caminho, inclusive para a própria alimentada, ante a possibilidade de nova interrupção do pagamento, comprometendo o equilíbrio finalmente alcançado entre as partes".

No entendimento do relator, ministro Raul Araujo, o calote não foi voluntário e inescusável, pois ficou comprovada a incapacidade financeira do pai de arcar com a pensão da filha em sua totalidade. Atualmente, a obrigação vem sendo regularmente cumprida. Também não foi identificado risco para a filha, nem urgência na percepção da dívida acumulada.

O ministro destacou, porém, que o valor ainda precisa ser pago." Pode a cobrança prosseguir por meio mais adequado, restrito à disponibilidade patrimonial do devedor ", ou seja, pelo rito da penhora.

Leia também nosso artigo " Justificativas que afastam a Prisão Civil do devedor de pensão alimentícia - Acolhidas pelos Tribunais"(clique aqui).

O julgado restou assim ementado:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. DECRETO DE PRISÃO. DÍVIDA PRETÉRITA ACUMULADA EM RAZÃO DE DESEMPREGO. PAGAMENTO PARCIAL DA PENSÃO DURANTE TODO O PERÍODO DE DESEMPREGO. ATUAL ADIMPLEMENTO DA PENSÃO REDUZIDA EM AÇÃO REVISIONAL. RECURSO PROVIDO. ORDEM CONCEDIDA. LIMINAR CONFIRMADA.
1. A prisão civil do devedor de alimentos, com fundamento no art. 528, § 3º, do CPC/2015 (art. 733, parágrafo único, do CPC/1973), não é pena ou sanção, mas técnica jurisdicional, de natureza excepcional, voltada ao cumprimento da obrigação pecuniária, não se justificando quando for ineficaz para compelir o devedor a satisfazer integralmente o débito que se avolumou de forma significativa.
2. Os autos comprovam que o paciente passou por longo período de desemprego, razão pela qual não teve como cumprir a obrigação nos termos em que avençada (90% do salário mínimo), realizando sempre pagamentos parciais, dentro de suas possibilidades. Não obstante empregado atualmente como operador de computador, o paciente recebe o equivalente a R$ 1.800,00 (valor bruto), não se encontrando em condições de quitar a dívida pretérita, acumulada desde 2018, de R$ 42.851,50 (atualizada em fevereiro de 2022).
3. Não se nota o risco para a alimentada, nem urgência na percepção da dívida pretérita acumulada, já que, além de receber atualmente a pensão alimentícia descontada em folha de pagamento, no montante de R$ 496,85, em virtude de decisão proferida em ação revisional, também recebe, desde 10/12/2020, alimentos do avô paterno no valor de 10% dos seus proventos de oficial de justiça aposentado.
4. Diante de tais circunstâncias, verifica-se que o inadimplemento não se apresenta inescusável e voluntário, assim como previsto na Constituição Federal, em seu art. 5º, LXVII, para admitir, excepcionalmente, a prisão civil do devedor de alimentos.
5. Recurso ordinário provido para conceder a ordem de habeas corpus.
Liminar confirmada.
( RHC n. 176.091/RJ, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 27/4/2023, DJe de 4/5/2023).

Frise-se que no caso analisado, a prisão foi afastada porque o STJ entendeu que o calote não foi voluntário e inescusável. Ao contrário, ficou comprovada a incapacidade financeira do pai de arcar com a pensão da filha em sua totalidade, havendo pagamento parcial em todo o período. Podendo a cobrança prosseguir por meio mais adequado, restrito à disponibilidade patrimonial do devedor (rito da penhora).

DEMAIS CONSEQUENCIAS DO INADIMPLENTO ALIMENTAR:

Criminal - Não pagar, sem justa causa, pensão alimentícia ou abandonar emprego com esse fim, caracteriza o crime de abandono material previsto no artigo artigo 244 do Código Penal, nos termos seguintes:

Art. 244 = Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: - Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País. - Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.

Portanto, além da PRISÃO CIVIL, que pode ser decretada pelo prazo de 01 (um) a 03 (três) meses nas hipóteses de, intimado, o devedor em 03 (três) dias, não pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade absoluta de efetuá-lo ( CPC art. 528, § 3º e § 7º e art. 911 e Súmula nº 309, do STJ) há, também, a previsão de punição na seara criminal.

O Código de Processo Civil de 2015, deu ainda mais efetividade à apuração e punição do CRIME DE ABANDONO MATERIAL, pois autorizou, no curso do processo de execução de alimentos, o credor requerer ao Juízo que oficie ao Ministério Público, no caso de conduta procrastinatória por parte do executado, para verificação de prática de abandono material, conforme autoriza o artigo 532, do CPC: “Verificada a conduta procrastinatória do executado, o juiz deverá, se for o caso, dar ciência ao Ministério Público dos indícios da prática do crime de abandono material”, crime previsto no artigo 244, do Código Penal.

Além do devedor direto dos alimentos, a legislação prevê punição a outras pessoas que ajudam a frustrar a implementação do pagamento da pensão alimentícia. Estamos falando do CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA, previsto no artigo 22, da Lei nº 5.478/ 68 ( Lei de Alimentos), que diz constituir crime deixar o empregador ou funcionário público de prestar ao Juízo informações necessárias à instrução de processo ou execução de sentença ou acordo que fixe pensão alimentícia. Também comete referido crime quem ajuda o devedor a eximir-se ao pagamento da pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada, ou se recusa, ou procrastina a executar ordem de desconto em folha de pagamento, expedida pelo juiz competente. Pena: Detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, sem prejuízo da pena acessória de suspensão do emprego de 30 (trinta) a 90 (noventa) dias.

Da retirada do sobrenome paterno ou materno por abandono afetivo e material - Os tribunais têm acolhido pedidos dos filhos para suprimirem os sobrenomes dos pais por abandono afetivo e material ( clique aqui para ler).

Indenização por abandono afetivo e material - Cabível ainda condenação dos genitores em reparação por danos morais. Tratamos de casos reais, com valores, neste artigo.

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25 Comentários

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Há dois meses, fui procurado para defender uma pessoa em situação parecida; ele ficou preso por dever saldos da pensão que vinha pagando mensalmente, e que já era indevida desde 2015, pois era ele, com seu pouco discernimento e sua simplicadade, que ficava com os dois e filhos e com os dois enteados, por opção dos próprios, que fugiam dos severos castigos que a mãe lhes impunha. Para ser solto, teve que assinar um acordo para pagamento do saldo em 50 meses. Esta parte (acordo indevido) está sendo contestada dentro da principal e a mudança de cláusula em uma açao por dependencia. Mas o que causa espécie, é que ao ser preso (Mandado expedido em 2018), nunca foi intimado a comparecer em juízo para as conformidades, e ademais, ao ponderar que fazia regularmente pagamentos, se houvesse a mínima atenção do M.P., apos colher as informações e fazer as diligências de estilo, deveria ter encaminhado todas as augumentações, provas e índicios de mérito, de volta à Vara de Família para nova avaliação e não à audiencia de custódia que não analisa estas questões e manteve a prisão até seu pleito de liberdade, após confirmado a acordo, ser aceito pela Vara de Família, a meu ver, primeiro, uma enorme deslealdade da autora que recebia pensão sem cuidar de seus filhos, e falhas recorrentes por ações e omissões desde a prisão até a soltura, "estrangulando" a dignidade do reu.
Antonio Sidney - OAB/RJ 110992 continuar lendo

Meu Deus... Inacreditável essa falha. continuar lendo

Excelente artigo! continuar lendo

Por mais que se argumente, ainda que baseando-se em leis, nunca fui a favor da pena de prisão do réu por falta de pagamento de dívida alimentar.
Primeiro porque, uma vez preso o réu jamais poderá pagar.
Segundo. Quem paga, são os familiares, ou seja, um terceiro que não faz parte do processo.
Terceiro. Por mais que seja previsto em lei atribuir aos avós a responsabilidade em pagar alimentos ao alimentando, particularmente não concordo porque entendo tratar-se de obrigação personalissima o que implica em não envolver um terceiro ainda que seja parente próximo.
Nesses casos, o melhor é a perda da guarda temporária, a um parente próximo até que o réu seja considerado capaz de sustentar o filho (a) ou definitiva no caso de comprovada a incapacidade de alimentar.
Reito: Réu preso nunca poderá pagar alimentos. continuar lendo

Cada dia mais difícil advogar no Brasil. Cada dia uma folha do CC /CPC é rasgada. continuar lendo

Espera até você ser alvo do Estado. continuar lendo