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6 de Maio de 2024

STJ Ago 22 - Revogação de Cautelar de Comparecimento Bimestral - Ausência de Contemporaneidade

há 2 anos

Ementa

Decisão

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 159988 - MG (2022/0029694-8) DECISÃO HUMBERTO ADOLFO GATTAS NASCIF FONSECA NASCIMENTO interpôs recurso ordinário contra acórdão da Terceira Turma do Tribunal Federal Regional da 1ª Região, proferido no HC 1020913-83.2021.4.01.0000, que concedeu parcialmente a ordem para converter a sua prisão preventiva, decretada no juízo de origem, pelas seguintes cautelares menos graves: 1) comparecimento bimestral à sede do Juízo; 2) recolhimento da fiança arbitrada em R$ 100.000,00 (e-STJ, fls. 480 e 481).

O recorrente alega que se não é cabível a prisão preventiva, como entendeu o órgão de 2º grau, também não é admissível a imposição de outra cautelar substitutiva, sob pena de serem mantidas as últimas como mero efeito automático do oferecimento ou recebimento da denúncia. Enfatizou que o motivo da substituição efetuada pelo acórdão recorrido foi baseado na ausência de contemporaneidade da prisão, o que se estende às demais cautelares.

Quanto à fiança, acrescentou que ela é ainda mais desnecessária, por visar assegurar o comparecimento aos atos do processo, embora essa obrigação também tenha sido incluída como cautelar a ser cumprida.

Requer a revogação das duas providências pendentes, bem como a determinação expressa de devolução dos valores recolhidos a título de fiança (e-STJ, fls. 509 a 518). Em contrarrazões, o Procurador Regional da República concordou com os argumentos da defesa, manifestando-se pelo provimento ao recurso ordinário (e-STJ, fls. 522 a 532).

O Subprocurador-Geral da República, por fim, opinou também pelo provimento ao recurso. Segundo ele, como a Corte de 2ª instância reconheceu a ausência de contemporaneidade da prisão preventiva, a sua substituição por cautelares menos gravosas configura constrangimento ilegal (e-STJ, fls. 539 a 543).

É o relatório.

Decido. Trata-se de recurso ordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que concedeu habeas corpus apenas parcialmente, substituindo a prisão preventiva por fiança de R$ 1000.000,00, além de obrigação de comparecimento bimestral em juízo. O acórdão recorrido foi assim ementado:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO FRATERNO. DESVIO DE VERBAS PÚBLICAS. CORRUPÇÃO PASSIVA. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIADE CONTEMPORANEIDADE. CRIME SEM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. DIREITODE IR E VIR. PROFISSIONAL DA ADVOCACIA. ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL. CONDIÇÕES SUBJETIVAS FAVORÁVEIS. MEDIDAS CAUTELARES. RECOLHIMENTO DE FIANÇA. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. O habeas corpus consubstancia alternativa constitucional que objetiva impedir o cerceamento de liberdade decretado injustamente. No caso, tem o objetivo de promover o relaxamento da prisão preventiva, com a decretação de medidas cautelares. 2. A privação da liberdade pessoal com finalidade processual deve alcançar o resultado com o menor dano possível aos direitos individuais, uma vez que existem outras medidas de natureza cautelar que podem ser decretadas pelo juízo da causa em proveito das investigações. 3. O paciente alvo de investigação policial pela possível prática de delitos cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa e sem carga lesiva ao meio social faz jus à substituição da medida constritiva pelas medidas cautelares previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, suficientes para impedir quaisquer das práticas vedadas pelo ordenamento jurídico pátrio. 4. No atual momento processual, ausentes as condições de manutenção da segregação cautelar combatida, notadamente em razão do quesito contemporaneidade, pois o delito em apuração, segundo noticiam os autos, foi cometido, possivelmente, há mais de 3 (três) anos. 5. Não se afigura razoável restringir a liberdade de ir e vir de um profissional da advocacia em órgãos públicos, em razão das atribuições inerentes ao cargo de advogado. 6. No caso, a prisão preventiva deve ser substituída pelas medidas cautelares de comparecimento bimestral à sede do Juízo e recolhimento da fiança arbitrada em R$ 100.000,00 (cem mil reais). 7. Ordem de habeas corpus parcialmente concedida, para substituir a custódia preventiva por medidas cautelares (e-STJ, fls. 487 e 488).

Ao contrário do que sugere a defesa, não é possível concordar que as cautelares do art. 319, do CPP, somente possam ser aplicadas se for igualmente cabível a prisão preventiva. Na verdade, a última, com restrição mais grave à liberdade do acusado, somente pode ser aplicada se não for suficiente alguma das medidas mais brandas.

Mas estas podem ser aplicadas, em caráter inicial ou substitutivo, ainda quando não cabível aquela, o que, porém, obviamente vai depender do preenchimento dos requisitos legais em cada caso concreto. É claro que nenhuma das providências pode ser aplicada como mera consequência do oferecimento ou recebimento da denúncia, mas elas podem ser fixadas se preenchidos todos os seus requisitos legais.

Sua natureza cautelar afasta o caráter de antecipação da pena. Porém, no presente caso, como já se manifestou em mais de uma ocasião o Ministério Público, realmente não há mais como manter as duas medidas questionadas, ao menos no estado atual da ação penal. O juízo de primeiro grau, de maneira bem fundamentada, apontou a contemporaneidade da cautela na suposta continuidade da atividade criminosa da qual aparentemente faz parte o recorrente (e-STJ, fls. 272 a 275), mas o fato é que órgão de 2º grau, no exercício da sua competência revisora, não entendeu da mesma forma, decidindo da seguinte maneira:

No caso vertente, verifico que inexistem, nesse momento processual, as condições de manutenção da combatida segregação cautelar, notadamente, em face da ausência de contemporaneidade, pois o delito em apuração, segundo noticiam os autos, foi possivelmente cometido há mais de 3 (três) anos. Confira-se o seguinte excerto contido no pedido de prisão preventiva apresentado pelo MPF, às fls. 31/32 - doc. n. 124977529: "os acusados (...), e outras dezenas de coautores e partícipes associaram-se no período de 2009 a 2017, de maneira estável e permanente, para a prática de crimes de desvio de rendas públicas de origem federal, estadual e municipal, corrupção passiva e de lavagem de capitais (...)" (e-STJ, fls. 482; grifou-se).

Embora em algumas ocasiões eu tenha manifestado posição de que a contemporaneidade é requisito legal mais rigoroso em relação à prisão, providência extrema e mais grave, tenho igualmente ressaltado que para as demais cautelares a questão temporal decorre também da sua necessidade atual, a qual só deixa de existir se transcorrido um longo decurso de tempo desde o fato objeto da acusação, e sem indicação de fato novo superveniente que atualize a situação.

Na situação em exame, como bem coloca a defesa, realmente não há mais que se falar em contemporaneidade nem mesmo para as cautelares mais brandas. Foi o próprio acórdão que mencionou que os fatos em apuração teriam supostamente sido praticados entre 2009 e 2017, não mais depois disso, passados atualmente cinco anos desde então.

Ainda que o juízo de 1º grau tenha apontado fato novo que poderia justificar a contemporaneidade, ele não foi corroborado pelo colegiado de 2ª instância, o que realmente termina afastando a presença da exigência questionada pelo recorrente. Daí a necessidade de revogação das medidas, na linha da jurisprudência desta Casa:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. LAVAGEM DE DINHEIRO E OCULTAÇÃO DE VALORES. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. MEDIDAS CAUTELARES DE PROIBIÇÃO DE SE AUSENTAR DO PAÍS E DETERMINAÇÃO DE ENTREGA DO PASSAPORTE. CONDIÇÕES. CONTEMPORANEIDADE. AUSÊNCIA. [...] 2. O acórdão a quo merece reforma, pois ausente contemporaneidade, porquanto, decorrido mais de 1 ano de investigações - sem oferecimento de acusação formal -, denota-se que inexistem informações de tentativa do recorrente de evadir-se do distrito da culpa. Nesse sentido, este Superior Tribunal é firme em assinalar que a urgência intrínseca às cautelares exige a contemporaneidade dos fatos justificadores dos riscos que se pretende evitar ( RHC 139.786/RS, Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 2/3/2021, DJe 9/3/2021). [...] ( AgRg no RHC n. 139.996/RS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 27/4/2021, DJe de 3/5/2021; grifou-se).
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CONCUSSÃO. MEDIDA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO PÚBLICA. SUPOSTOS FATOS DELITUOSOS PRATICADOS NOS ANOS DE 2013 E 2014. AFASTAMENTO PROVISÓRIO DA FUNÇÃO PÚBLICA EM 2019. FALTA DE CONTEMPORANEIDADE. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA IDÔNEA E CONCRETA. ART. 315, § 1.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRECEDENTES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA. LIMINAR RATIFICADA. 1. A ofensa ao princípio da contemporaneidade ficou evidenciada na presente hipótese, em razão do decurso de longo período de tempo entre os supostos fatos delituosos e a determinação de afastamento da Paciente do cargo de Vereadora. 2. Com efeito, a Paciente foi denunciada, em 30/04/2019, pela suposta prática do crime de concussão, pois, entre o início de 2013 e meados de 2014, em razão do exercício do mandado de Vereadora, teria exigido de servidores comissionados parte de seus vencimentos mensais, como condição para a manutenção de seus cargos. 3. Em 12/11/2019, por ocasião do recebimento da denúncia, a Juíza processante acolheu o requerimento apresentado pelo Parquet de suspensão do exercício da função pública exercida pela Acusada (art. 319, inciso VI, do CPP), ou seja, após mais de 5 (cinco) anos da ocorrência, em tese, do último fato delituoso (meados de 2014), não tendo, nesse período, ocorrido qualquer situação nova ou fundamento idôneo, amparado em dados concretos e recentes, que evidenciassem a necessidade da aplicação da referida medida cautelar. 4. Assim, em que pese, de fato, a gravidade e a reprovabilidade das condutas imputadas à Paciente, não foi demonstrada a indispensabilidade atual da restrição nos termos da jurisprudência desta Corte e do art. 315, § 1.º, do CPP, incluído pela Lei n. 13.964/2019. Precedentes. [...] ( HC n. 553.310/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 17/11/2020, DJe de 27/11/2020; grifou-se).

Portanto, ausente justificativa para imposição de medidas cautelares alternativas ao cárcere, bem como para sua manutenção, impõe-se o provimento do recurso a fim de que o recorrente seja mantido em liberdade sem restrições. Ante o exposto, dou provimento ao recurso (art. 34, XVIII, c, do RISTJ), reformando o acórdão impugnado na parte em que aplicou, de forma substitutiva, a obrigação de comparecimento bimestral em juízo, bem a fiança, devendo o respectivo valor ser devidamente devolvido. Tudo sem prejuízo de eventual nova decretação de providências cautelares em caso de motivo superveniente, devidamente demonstrado. Publique-se. Intimem-se Brasília, 05 de agosto de 2022. Ministro Ribeiro Dantas Relator

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(STJ - RHC: 159988 MG 2022/0029694-8, Relator: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Publicação: DJ 10/08/2022)

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