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29 de Maio de 2024

STJ Dez22 - Trancamento de Ação Penal - Atipicidade - Crime de Desobediência - Carteira de Motorista Suspensa Administrativamente

ano passado

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 174617 - ES (2022/0397568-0) DECISÃO

Cuida-se de recurso ordinário em habeas corpus, com pedido liminar, interposto por SAYMON DE OLIVEIRA CAVALCANTE contra acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO no julgamento do HC n. 5007903-36.2022.8.08.0000.


Extrai-se dos autos que o recorrente foi denunciado pela prática de crime de trânsito consistente em conduzir veículo automotor com a habilitação suspensa (art. 307, do Código de Trânsito - CTB).

Irresignada, a defesa impetrou habeas corpus perante o Tribunal de origem, o qual denegou a ordem nos termos do acórdão que restou assim ementado: "HABEAS CORPUS - CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO - TRANCAMENTO -ATIPICIDADE - VIA INADEQUADA - SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA - ORDEM DENEGADA. 1.É firme a jurisprudência da Corte Suprema no sentido de que"O trancamento da ação penal na via do habeas corpus só se mostra cabível em casos excepcionalíssimos de manifestas (i) atipicidade da conduta, (ii) presença de causa extintiva de punibilidade ou (iii) ausência de suporte probatório mínimo de autoria e materialidade delitivas, o que não ocorre no presente caso"( HC 146956 AgR, Relator (a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 24/11/2017, DJe 07-12-2017). 2. O fundamento apontado pelos impetrantes quanto a atipicidade da conduta envolvem a interpretação da norma e a incidência de julgados não pacíficos ou vinculantes. Além disso, os documentos apresentados e os argumentos apontados pelos impetrantes não são suficientes à verificação inequívoca quanto a atipicidade da conduta, nos termos das alegações defensivas, o que demandaria exame aprofundado de fatos e provas, impróprio para a via estreita do habeas corpus. 3. A questão não foi apresentada e examinada pelo juízo a quo, o que poderia configurar indevida supressão de instância. A jurisprudência da Corte Superior de Justiça e deste Tribunal Estadual têm entendido pela inviabilidade do trancamento da ação penal pela via do habeas corpus quando suscitada tese de atipicidade sem a devida apreciação pela autoridade apontada como coatora. Ordem denegada" (fl. 155).

No presente recurso, a defesa sustenta a inocorrência da supressão de instância, tendo em vista que o suposto constrangimento ilegal decorre do fato de ter sido recebida a denúncia por fato atípico pelo Juízo de primeiro grau.

Argumenta que o crime previsto no art. 307, do CTB, somente se consuma quando a suspensão da habilitação decorre de decisão de Juízo criminal, enquanto o paciente apenas violou decisão em processo administrativo. Requer, em liminar e no mérito, o trancamento da ação penal.

É o relatório. Decido.

Inicialmente, verifico que, em que pese o Tribunal de origem tenha feito referência à ausência de manifestação da primeira instância sobre a tese defensiva, o alegado constrangimento ilegal decorre justamente de ato praticado pelo Juízo primevo ao receber a denúncia.

Portanto, não há falar em supressão de instância.

A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que somente é possível o trancamento de inquérito policial ou de ação penal por meio de habeas corpus de maneira excepcional, quando de plano, sem a necessidade de análise fático-probatória, se verifique a atipicidade da conduta, a absoluta falta de provas da materialidade ou de indícios da autoria ou, ainda, a ocorrência de alguma causa extintiva da punibilidade.

A denúncia (fls. 119/120) imputou ao paciente a conduta de conduzir veículo com a habilitação suspensa, em tese previsto no art. 307, do CTB. O relatório policial que acompanha a inicial é claro ao apontar que a suspensão da habilitação do paciente decorreu de sanção administrativa (fls. 33 e 36).

Na lição da doutrina, "o crime do art. 307, caput, do CTB consiste, a grosso modo, numa modalidade especial de desobediência à determinação judicial tipificada no art. 359 do Código Penal, com aplicação restrita, todavia, à violação da suspensão ou da proibição de obter a permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor imposta com fundamento no Código de Trânsito Brasileiro" (LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial comentada: volume único. 8. ed. rev., atual. e ampl. - Salvador: JusPODIVM, 2020. p. 1232).

Nos termos da jurisprudência dominante nesta Corte Superior, o bem jurídico tutelado pela referida norma é a administração da justiça e somente se caracteriza quando a desobediência recai sobre ordem judicial criminal, sendo penalmente atípica a desobediência à decisão administrativa de suspensão da habilitação.


Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DA SUSPENSÃO DO DIREITO DE CONDUZIR VEÍCULO AUTOMOTOR (ART. 307 DO CTB). ATÍPICA A CONDUTA QUANDO A SUSPENSÃO ADVÉM DE DECISÃO ADMINISTRATIVA. PRECEDENTES. 1. É atípica a conduta contida no art. 307 do CTB quando a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor advém de restrição administrativa ( HC n. 427.472/SP, Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 12/12/2018). 2. Agravo regimental improvido. ( AgRg no RHC n. 110.158/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 25/6/2019, DJe de 2/8/2019.)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ART. 307 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. SANÇÃO DE NATUREZA PENAL. SÚMULA 568/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Dada a natureza penal da sanção, somente a decisão lavrada por juízo penal pode ser objeto do descumprimento previsto no tipo do art. 307, caput, do CTB, não estando ali abrangida a hipótese de descumprimento de decisão administrativa, que, por natureza, não tem o efeito de coisa julgada e, por isso, está sujeita à revisão da via judicial (ut, HC 427.472/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe 12/12/2018) 2. In casu, o agravado, no momento do acidente, se encontrava com a Carteira Nacional de Habilitação suspensa administrativamente, hipótese que não configura o delito do art. 307 do CTB 3. Agravo regimental desprovido. ( AgRg no REsp n. 1.798.124/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 2/4/2019, DJe de 16/4/2019.)

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DA SUSPENSÃO DO DIREITO DE CONDUZIR VEÍCULO AUTOMOTOR. NORMA PENAL INCRIMINADORA QUE TEM COMO OBJETO JURÍDICO A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE DE CONFIGURAÇÃO DO DELITO QUANDO O ACUSADO TEM A HABILITAÇÃO SUSPENSA POR DECISÃO ADMINISTRATIVA. CONDUTA ATÍPICA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PROVIMENTO DO RECLAMO. 1. Da leitura do artigo 307 do Código de Trânsito Brasileiro, verifica-se que o objeto jurídico tutelado pela norma incriminadora é a administração da justiça, vale dizer, trata-se de infração penal que busca dar efetividade e real cumprimento a sanção cominada em outro delito de trânsito. Doutrina. 2. A mera suspensão administrativa do direito de dirigir não configura o crime em questão, notadamente porque no Direito Penal não se admite o emprego da analogia de modo a prejudicar o réu. Precedente. 3. Na espécie, tem-se que o recorrente estava impedido de conduzir veículos automotores em razão de decisão administrativa, conduta que, como visto, não viola o bem jurídico tutelado pela norma prevista no artigo 307 do Código de Trânsito Brasileiro, o que revela a sua atipicidade e impõe o trancamento do processo, no ponto. 4. Recurso provido para determinar o trancamento da ação penal instaurada contra o recorrente no tocante ao crime de trânsito. ( RHC n. 99.585/PR, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 19/3/2019, DJe de 26/3/2019.)

HABEAS CORPUS. ART. 307 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. VIOLAR A SUSPENSÃO OU A PROIBIÇÃO DE SE OBTER A PERMISSÃO OU A HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULO AUTOMOTOR. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO DE NATUREZA PENAL. 1. Com o desenvolvimento da legislação de trânsito, buscando resguardar a segurança viária, conter o crescimento no número de acidentes e retirar de circulação motoristas que punham e risco a vida integridade física das demais pessoais, a suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor, antes restrita a mera penalidade de cunho administrativo, passou a ser disciplinada como sanção criminal autônoma, tanto pelo Código Penal - CP, ao defini-la como modalidade de pena restritiva de direitos, como pelo Código de Trânsito Brasileiro - CTB, ao definir penas para o denominados "crimes de trânsito". 2. Assim, nos termos do art. 292 do CTB, a suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor pode ser imputada como espécie de sanção penal, aplicada isolada ou cumulativamente com outras penas. 3. Dada a natureza penal da sanção, somente a decisão lavrada por juízo penal pode ser objeto do descumprimento previsto no tipo do art. 307, caput, do CTB, não estando ali abrangida a hipótese de descumprimento de decisão administrativa, que, por natureza, não tem o efeito de coisa julgada e, por isso, está sujeita à revisão da via judicial. 4. In casu, a conduta de violar decisão administrativa que suspendeu a habilitação para dirigir veículo automotor não configura o crime do artigo 307, caput, do CTB, embora possa constituir outra espécie de infração administrativa, segundo as normas correlatas. 5. Ordem concedida para anular a condenação do paciente e determinar o trancamento do procedimento penal que já se encontra em fase de execução. ( HC n. 427.472/SP, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 23/8/2018, DJe de 12/12/2018.)

Evidenciado o constrangimento ilegal, de rigor o trancamento da ação penal em comento. Ante o exposto, com fundamento no art. 34, inciso XVIII, alínea b, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, dou provimento, liminarmente, ao presente recurso em habeas corpus, para determinar o trancamento da ação penal n. 0011843-43.2018.8.08.0030, em trâmite perante a 1ª Vara Criminal de Linhares/ES. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 14 de dezembro de 2022. JOEL ILAN PACIORNIK Relator

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(STJ - RHC: 174617 ES 2022/0397568-0, Relator: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Publicação: DJ 15/12/2022)

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