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29 de Abril de 2024

STJ publica decisão que significa grande retrocesso para o Direito das Famílias no Brasil

Artigo elaborado pela Assessoria de Comunicação do IBDFAM

Publicado por Flávio Tartuce
há 7 anos

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) divulgou nesta quarta-feira (22) uma decisão que significa grande retrocesso para o Direito das Famílias no Brasil.

Em julgamento de recurso especial interposto por um casal que, em ação de separação, buscava a homologação pelo juízo das condições pactuadas, como recebimento de pensão, regulação de visitas ao filho, partilha de bens e alteração de sobrenome, a Quarta Turma entendeu que a entrada em vigor da Emenda Constitucional 66, que modificou o artigo 226 da Constituição Federal para deixar de condicionar o divórcio à prévia separação judicial ou de fato, não aboliu a figura da separação judicial do ordenamento jurídico brasileiro, mas apenas facilitou aos cônjuges o exercício pleno de sua autonomia privada.

Ou seja: quem quiser pode se divorciar diretamente; quem preferir pode apenas se separar.

A Emenda Constitucional 66 é uma proposição do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM e foi promulgada em 13 de julho de 2010. Apresentada pelo advogado e então deputado federal Sérgio Barradas Carneiro (BA), deu nova redação ao artigo 226, parágrafo 6º, da Constituição Federal (CF), o qual passou a vigorar com o seguinte texto: "O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio".

Assim, a EC66 instituiu o Divórcio Direito, eliminou a separação judicial, suprimindo prazos desnecessários e acabou com a discussão de culpa pelo fim do casamento.

“Lamentável a decisão do STJ, no que pese ser absolutamente inócua. O instituto da separação judicial não mais existe no ordenamento jurídico brasileiro. É fácil de entender. Imaginemos que, antes da Emenda 66/10, um parlamentar apresentasse um Projeto de Lei para suprimir o instituto da separação judicial do Código Civil. Um relator designado na CCJ - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, mesmo sendo a favor da matéria, seria obrigado a dar um parecer pela inconstitucionalidade do Projeto, vez que o instituto da separação judicial constava da nossa Constituição”, aponta Sérgio Barradas Carneiro.

Ainda conforme o advogado e membro do IBDFAM, uma vez suprimido o instituto da separação judicial da nossa Carta Magna, o texto do atual do Código Civil não mais é recepcionado pela CF/88. Estabeleceu-se uma omissão vedativa. O intuito do legislador foi de que não mais exista o instituto da separação judicial. Não cabe, pois, que, depois de quase sete anos de vigência da Emenda 66/10, se queira impor ao povo brasileiro tamanho retrocesso. Quando vigente, só se utilizavam do mesmo os casais que se separavam brigando. Aqueles que se separavam amigavelmente apresentavam duas testemunhas cada, afirmando para o juiz já ter os exigidos dois anos de separação de fato.

O advogado e presidente do IBDFAM, Rodrigo da Cunha Pereira, concorda que a decisão de hoje representa uma regressão ao direito das famílias. “O texto constitucional com a promulgação da EC nº 66/2010, acabou com todo e qualquer prazo para o divórcio, e tornou a separação judicial e as regras que a regiam incompatíveis com o sistema jurídico. Se o texto do § 6º do artigo 226 da CR/1988 retirou de seu corpo a expressão 'separação judicial', como mantê-la na legislação infraconstitucional ou na interpretação dada pelos tribunais? É necessário que se compreenda, de uma vez por todas, que a hermenêutica Constitucional deve ser colocada em prática, e isso compreende suas contextualizações política e histórica”, afirma.

Rodrigo da Cunha diz ainda que, conforme orientação emanada do próprio Supremo Tribunal Federal, a inconstitucionalidade, seja ela material, seja formal, deve ser averiguada frente à Constituição que estava em vigor no momento da elaboração e edição dessa norma jurídica. O argumento finalístico é que a Constituição da República extirpou totalmente de seu corpo normativo a única referência que se fazia à separação judicial. Portanto, ela não apenas retirou os prazos, mas também o requisito obrigatório ou voluntário da prévia separação judicial ao divórcio por conversão.

O divórcio surgiu no ordenamento jurídico brasileiro em 1977, com a promulgação da Lei nº 6.515/77 (Lei do Divórcio). Antes disso, a única solução era o desquite, que mantinha os cônjuges presos ao vínculo contratual, mas colocava fim ao regime matrimonial de bens e aos deveres de coabitação e fidelidade recíprocas. Porém, não disponibilizava aos desquitados a contratação de novo casamento, levando as uniões à margem da Lei.

Desta maneira, o Divórcio só era possível se atendesse a três requisitos básicos: separação de fato há mais de cinco anos, ter este prazo sido implementado antes da alteração constitucional, ser comprovada a causa da separação. Posteriormente, a Constituição Federal de 1988 reduziu os prazos: um ano de separação judicial para o Divórcio por Conversão, e dois anos da separação de fato para o Divórcio.

No caso em tela, o juízo de primeiro grau, por entender que a Emenda Constitucional 66 aboliu a figura da separação, concedeu prazo de dez dias para adequação do pedido, e o Tribunal de Justiça manteve a decisão. No STJ, a relatora do recurso, Ministra Isabel Gallotti, entendeu pela reforma do acórdão. Segundo ela, a única alteração ocorrida com a emenda citada foi a supressão do requisito temporal e do sistema bifásico para que o casamento possa ser dissolvido pelo divórcio. “A Emenda 66/10 acabou com esta farsa, tornando-se um ótimo exemplo de que a boa lei é aquela que consagra uma prática social. Trata-se de um instituto ultrapassado, retrógrado e sem serventia prática, vez que o divorciado pode casar-se com qualquer pessoa, inclusive com aquela da qual se separou e se arrependeu, ao passo que o separado era impedido de se casar, indo engrossar as estatísticas da união estável”, esclarece Sérgio Barradas.

De acordo com o STJ, a Ministra Isabel Gallotti disse que a separação é uma modalidade de extinção da sociedade conjugal que põe fim aos deveres de coabitação, fidelidade e ao regime de bens. Já o divórcio extingue o casamento e reflete diretamente sobre o estado civil da pessoa. “A separação é uma medida temporária e de escolha pessoal dos envolvidos, que podem optar, a qualquer tempo, por restabelecer a sociedade conjugal ou pela sua conversão definitiva em divórcio para dissolução do casamento”, disse a relatora.

Em contrapartida, o presidente nacional do BDFAM levanta um questionamento sobre a decisão: “Qual seria o objetivo de se manter vigente a separação judicial se ela não pode mais ser convertida em divórcio? Não há nenhuma razão prática e lógica para sua manutenção. Se alguém insistir em se separar judicialmente, após a Emenda Constitucional n. 66/2010, não poderá transformar tal separação em divórcio, se o quiser, terá de propor o divórcio direto. Não podemos perder o contexto, a história e o fim social da anterior redação do § 6º do artigo 226: converter em divórcio a separação judicial. E, se não se pode mais convertê-la em divórcio, ela perde sua razão lógica de existência.”

Para Rodrigo da Cunha Pereira, “é preciso separar o 'joio do trigo', ou seja, é preciso separarmos as razões jurídicas das razões e motivações religiosas, para que possamos enxergar que não faz sentido a manutenção do instituto de separação judicial em nosso ordenamento jurídico. Ela significa mais gastos financeiros, mais desgastes emocionais e contribui para o emperramento do Judiciário, na medida em que significa mais processos desnecessários. Portanto, esta decisão é um verdadeiro retrocesso”.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)

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Há quem discorde frontalmente da tese de retrocesso, a despeito do elevado respeito pelo Digno Jurista! A decisão do C.STJ, a meu ver, tutelou perfeitamente a FAMÍLIA, cuja proteção advém da própria Constituição Federal. Resguardou, ainda, a liberdade do indivíduo que pode fazer tudo o que a Lei não proíbe! E retrocesso seria OBRIGAR um casal a se divorciar, quando apenas queriam uma separação, fase intermediária, própria daqueles que ainda têm muito a pensar e bem poderão se reconciliar. Essa é minha humilde opinião, congratulando o decidido pela Corte Superior. continuar lendo

Claríssimo Jackson. E, ademais, como disse o STJ, quem pode o mais (que é o divórcio) pode perfeitamente o menos (que é a simples separação). Se a lei não proíbe a separação, ela é lícita.
E a CF não diz que o divórcio seja condição para cônjuges se afastarem, e sim que o casal "pode" se divorciar. A interpretação do acórdão, com a devida licença do Douto Articulista, é ótima e protege a família, sim. continuar lendo

É isso aí Jackson! Possibilidade de reconciliação sem a necessidade de um novo casamento. continuar lendo

Parabéns pela resposta. E o que pude observar abaixo, a grande maioria dos colegas abaixo também concordam. Temos de abolir a industria de leis e assegurar o direito individual de cada um. É necessário simplificar a legislação. continuar lendo

A decisão não é retrocesso.........uma vez divorciados, caso pretendam reatar a união, terão que passar por todos os tramites e burocracias do casamento. Já a separação judicial, creio que é cabível nos casos em que naquele momento seja insuportável a vida conjugal, todavia, não é uma decisão definitiva e que posteriormente esse casal possa vir a reatar a união conjugal, basta propor uma ação de restabelecimento de união conjugal. O divórcio direto veio apenas para suprir o lapso temporal que era exigido, quando em verdade o casal não tinha mais a mínima chance de restabelecimento da união, ai sim não haveria o porque de separar para depois divorciar. Acertada a decisão do STJ, parabéns à Ministra Isabel Gallotti. continuar lendo

Concordo plenamente! continuar lendo

Nobres Colegas, o STJ somente foi contaminado pelos vírus que há um bom tempo se alojou no organismo institucional do STF qual seja, legislar em flagrante contradição com a Constituição Federal, começou a fugir da sua verdadeira função que é o controle das normas infraconstitucionais, ultimamente até tentou revogar a norma do crime de desacato, contudo, não foi decisão advinda de recursos repetitivos e muito menos de uma súmula. Agora, profere uma decisão em flagrante contradição com o disposto da Emenda Constitucional nº 66 da CF/88. Esta decisão não é só um retrocesso, trata-se de uma afronta ao texto constitucional, não podemos viver mais no meio termo, esta dentro ou fora, casado ou divorciado. Encerro com um conhecido jargão popular que diz: " O problema do mundo de hoje é que as pessoas inteligentes estão cheias de dúvidas, e as pessoas idiotas estão cheias de certezas ". continuar lendo

Caro Joel,
Logicamente o texto constitucional traz a palavra "pode", e não "deve", pois imagine a bizarrice: você acabou de se casar, porém há uma norma Constitucional dizendo que "o casamento civil deve ser dissolvido pelo divórcio". Ninguém mais poderia se casar!
Imagine, por outro lado, se o texto fosse "o casamento civil pode ser dissolvido SOMENTE pelo divórcio". De igual maneira seria bizarro, pois sabemos que a morte também dissolve o casamento.
Portanto, acredito que a supressão expressa da parte do texto em que menciona a separação judicial deixa mais do que claro que essa deixou de ser recepcionada pelo ordenamento.
Na verdade, caso os caros colegas tenham lido o texto completo, puderam compreender também que o instituto se torna ilógico na pratica, pois, mesmo que a separação judicial exista, essa não pode mais ser convertida em divórcio, de modo que se torna ineficaz. continuar lendo

Trabalhei por mais de 20 vinte anos em Cartório de Registro Civil, e concordo plenamente com a opinião do Sr. Jackson, afinal em muitos casos o restabelecimento da sociedade conjugal, após a separação, para vários casais se torna a melhor saída depois de analisar as questões e implicações da obrigatoriedade imposta pelo divórcio direto. A meu ver, a extinção da exigência do decurso do prazo, que então era de dois anos pós separação para propor a conversão da separação em divórcio, esse sim foi o maior avanço da emenda 66/2010. continuar lendo

Concordo com o colega Jackson H M. O Superior Tribunal de Justiça consagrou o entendimento no sentido da facultatividade da Separação Judicial. Se, antes da Emenda Constitucional 66, a insatisfação era no sentido de que o Estado não deveria interferir na decisão privada das pessoas, após a mencionada Emenda não se deveria impedir a mesma decisão privada das pessoas optarem pela Separação Judicial em vez de pelo Divórcio. Por outras palavras: é deixar as pessoas livres para exercerem o seu auto-regramento. Nem obrigar a passar pela fase da Separação Judicial, como ocorria antes da Emenda, nem proibir a quem deseje passar por essa fase. A ideia é: Estado brasileiro, vai procurar o que fazer! Tu já tens muito a fazer Estado brasileiro e faz péssimo o que é próprio da tua alçada! continuar lendo

Gostei muito da tua humilde opinião. continuar lendo

Eu concordo, não acho que seja um retrocesso. Em verdade, trata-se de manter a possibilidade do livre arbítrio, ante a hipótese de arrependimento da separação e o retorno da relação ao status quo ante. Impor a um casal o divórcio, apenas porque esta permissão foi concedida constitucionalmente, isso, sim seria um retrocesso e um retorno à ditadura... Se as pessoas querem apenas se separar, então, que seja... Gostei da colocação... continuar lendo

Perfeito! Mas vejo que todos aqui estão se atentando apenas para o fato da reconciliação do casal, sendo que há outras implicações jurídicas. Por exemplo, o estatuto do servidor federal admite que a pensão por morte seja deixada ao ex-cônjuge separado judicialmente, mas não o permite para divorciados. Já recebi um pedido de pensão dessas onde trabalho. O servidor já era casado, mas quis deixar sua ex-cônjuge, mãe de seus filhos, como beneficiária e não sua atual esposa. continuar lendo

Concordo com a posição do Colega Jackson H M. Retrocesso seria obrigar um casal a se divorciar, quando apenas desejam a separação.

Recentemente atuei num caso, que meus clientes eram separados judicialmente e retornaram ao convívio marital. Assim, promovemos o restabelecimento da sociedade conjugal.

Acredito que este seja o propósito do direito de família. continuar lendo

É difícil aceitar que não se tem razão sempre. Nunca houve unanimidade a respeito dessa tese. continuar lendo

Que decisão brilhante! Há pessoas que passam por crises em seus casamentos e a chance é a separação para iniciar uma reestruturação familiar... Congratulo a corte que mais uma vez preza pelos interesses da família que é a"Celula Mater" da sociedade! continuar lendo

A meu ver não se trata de retrocesso mas sim de evolução, pois deixa às partes a opção para decidir sobre o divórcio, principalmente porque a relação marido-mulher é recheada de aspectos psicológicos diversos, que muitas vezes modificam a decisão de seguir cominho oposto ao do cônjuge. Outrossim, processualmente, com as regras do NCPC entendo que não há necessidade de abrir outro processo para conversão em divórcio, mas tão somente transformar o pedido de separação em divórcio direto ou litigioso conforme o caso. continuar lendo