Página 1117 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 7 de Fevereiro de 2017

complexo, uma simbiose orgânica dos dois conceitos de propriedade (Caio Mário da Silva Pereira). Decidido pelo incorporador a existência de um condomínio edilício, não poderá ser alterado, havendo proibitiva norma legal de natureza cogente (CC, artigo 1.339).Logo, em sendo a garagem parte acessória do apartamento, não há como afastar que é extensão da propriedade autônoma do condômino, podendo, livremente, realizar reformas, obras, coberturas, visto que o direito de propriedade inclui o poder de construir. Este é inato à propriedade, implicando que será, entendo, o proprietário quem realizará a obra em sua parte exclusiva, como ocorreria, por exemplo, no interior de seu apartamento.Neste cotejo entre direito de propriedade e direito complexo do condomínio edilício (outro modo de existência do direito de propriedade), há de entendermos, como adiantado, que o direito de construir é inerente ao direito de propriedade. Segundo dispõe o Artigo 1.299 do Código Civil: “O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos”. Construir no imóvel é modo de acrescer, de adquirir a propriedade (Art. 1.248, inciso V), estando todos amalgamados. Retirar do proprietário o direito de construir é retirar-lhe o conteúdo da propriedade (CC, artigo 1.228, caput). Nestes termos há de ser visto o direito do condômino de realizar obras, acessões ou não, naquilo que represente sua propriedade.Com efeito, o artigo 1.336, incisos II a IV, deve ser visto dentro duma análise constitucional, pois é a propriedade o direito que está protegido no artigo 5º. Se construir (trazido ao mundo concreto por meio de obras, quer gigantescas, grandes, médias, pequenas, minúsculas) é o mesmo de usar, gozar, etc., exercendo, em concreto, poderes sobre sua propriedade, certo que os deveres não podem ser constituídos, desproporcionalmente, a ponto de não haver ou impedir, retirar, extrair, todo o conteúdo da propriedade, deixando-a juridicamente oca.Se a obra é em unidade autônoma, certo pensar que algumas obras não podem ser obstadas, em respeito ao Direito Constitucional de propriedade, cabendo ao condômino a mera comunicação de sua ocorrência ao síndico. Não significa que as obras sejam livres. O mero padrão econômico escolhido estatutariamente não pode ser alterado, isoladamente, pelo condômino, ainda que seja em sua unidade autônoma, devendo o padrão externo, linhas exteriores, o conjunto arquitetônico, por exemplo, nunca serem alterados, até mesmo porque a fachada externa é bem comum.Nada é livre quando se fala em exercício dos poderes inerentes à propriedade, tendo em vista que fere sua função social a agressão ao próprio, ou seu uso abusivo, nocivo. Ora, do mesmo modo que o proprietário de uma casa não pode exercer seu direito de propriedade em detrimento dos bons costumes, da segurança, soego e saúde dos seus vizinhos, como previsto no artigo 1.277 e ssss., por óbvio, o condômino não poderá, sem lhe ser excluído o respeito de qualquer norma pertencente ao direito de vizinhança e de outras sobre direito de propriedade, às quais também deve obediência, deixar de respeitar a destinação da edificação, e sua unidade econômica, de executar obra interna se não prejudicar a segurança da edificação. Cabe ter como certo que a vizinhança é mais próxima nos condomínios edilícios, o que agrava os problemas identificáveis neste estudo particular do exercício dos direitos de vizinhança. Quem adere à propriedade de condomínio edilício deve saber que nem tudo poderá fazer, além de poder ser obrigado a condutas sem que as queira. Há vontade para integrar, mas o respeito é ex lege, estatutário. Como efeito disso, o inciso IV do artigo 1.336 do Código Civil pode restringir o uso das partes autônomas, sempre com a lembrança da proporcionalidade, para atender ao Direito Constitucional da propriedade.Passemos a verificar como estão dispostas as normas sobre obras no condomínio edilício.O artigo 1.341/CC regula a natureza das obras que não acrescem, enquanto o artigo 1.342 as que acrescem nas áreas comuns edificadas, para alteração modesta (sem ofender a destinação ou estrutura), a fim de trazer maior comodidade. Sua aplicação está circunscrita às áreas comuns; as obras, nas partes individuais, como já visto, não podem ser obstadas por ninguém, nem pela lei, tampouco pela Convenção.Neste viés, entendo que a cobertura para automóveis está no patamar de obras úteis aos condôminos: úteis são os acréscimos não apenas para conservação do prédio, e sim as que lhe aumentem o uso, ou o valor. Como se mostrou individualizável, claro que configuram em parte ou propriedade exclusiva. É nítida a distinção entre a cobertura para automóveis em estacionamento que não é originalmente coberto da comunhão formada, por exemplo, pelo portão de entrada, cercas.A lei (ex. Lei 4.591, de 1964, Artigo , § 2º; Código Civil, Artigo 1.331, § 1º, lei posterior) trata sobre a alienação das garagens. Independentemente dessa restrição, a área de garagem é individual, se estiver anexada ao apartamento, e sua cobertura pode ser, em alguns casos, de uso comum. Não há regra padrão para a garagem. Isto é, cada condomínio edilício pode identificar um meio diferente de sua estrutura vir ao mundo. No caso em liça, pelas fotografias, a cobertura não demanda necessidade de uso comum. Podem ser estruturadas como uso comum, como ocorreu no caso concreto. Explica-se.Por circunstâncias de fato, restritas à economia da obra, não realizou a engenharia contratada a perfeita individualização da cobertura. Convencionou-se, entre a ré PULINI e o condomínio, que seriam tais garagens para mais de um veículo.Assim, se se tornou, ao depois, inviável a construção, por razões econômicas ou estruturais, não há dúvida de que, no plano da gestão da atividade da ré PULINI, é plenamente aceitável que não execute, para cada um, isoladamente, aquilo que se obrigou a fazer para todos os outros em conjunto, pois isto significa que seria cumprimento da obrigação por outro modo.Em outras letras, se a ré contratou com o condomínio determinada obra, pelo princípio da pontualidade (CC, artigo 313), não pode ser obrigada a executar objeto diverso do combinado. Tudo que fosse executado ulterior e diversamente ao contrato celebrado entre as corrés (fls. 144/147), certamente estaria configurado dentro da dação em pagamento, nos termos do Art. 356/CC (‘O credor pode consentir em receber prestação diversa da que lhe é devida’). É um novo contrato em que se altera o objeto da obrigação.Ora, no caso concreto, longe de qualquer combinação posterior para a execução da obra por outro objeto. Incontroverso nos autos que não houve construção da garagem para a autora. Certo que esta não poderia obrigar a ré PULINI execução de sua parte ou cobertura, pois o combinado foi outro, e com o condomínio. Mas não é esse o pedido. Ela pretende restituição pela obra que pagou, e não recebeu, isto é, não houve realização da obrigação de fazer.O contrato em tela é de empreitada. O contrato de prestação de serviço diferencia-se pelo modo de execução, que é direcionada (fiscalizada e dirigida) pelo locador, o que impõe pensar que há subordinação; na empreitada, nada sai da direção do empreiteiro. Além disso, a empreitada visa um resultado final; na prestação de serviço, o objeto é o próprio serviço ou atividade humana. E isso impõe uma diferença da própria categoria, visto que a remuneração da empreitada pode assumir a possibilidade de retribuição proporcional, tendo como parâmetro a obra realizada, e não os dias laborados.No caso dos autos, certo que não houve execução do contrato por parte da PULINI. É risco de sua atividade a intercorrência de certos entraves causados pelo condomínio. É discutível a possibilidade de qualquer pessoa ou de ente despersonalizado, com contrato corretamente celebrado, válido, retirar sua voz (revogar), se tal exercício de direito potestativo não foi combinado.O condomínio não pode, como qualquer outra pessoa, resolver ulteriormente que não cumprirá mais o compromisso assumido, tendo em vista o ato jurídico perfeito já exarado ao tempo da primeira contratação. Decidido em sentido contrário à própria autorização inicial de contratar, qualquer pessoa, e o condomínio edilício não se faz diferente para as condutas que lhe são possíveis e próprias, será entendida tal ‘desistência’ nos lindes do inadimplemento absoluto.Esta discussão, no presente feito, apenas tem colocação a fim de constatar a inadimplência da ré PULINI. Como se quedou inerte para discutir os termos do contrato com o condomínio, ou ainda não se sacrificou para a construção em outros termos, como a individualização de cada garagem, e recebeu dos condôminos o dinheiro para a obra, deve, pois, responder, com a restituição.O que não se mostra lícito é aceitar que a autora desembolse quantia para a obra, e não receba sua execução nem o dinheiro de volta. Como esta quantia não é devida por quem não contratou, mas por quem se beneficiaria da obra, entendo que não há descumprimento de contrato entre a ré PULINI e o condômino que pagou, e sim direito

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