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24 de Maio de 2024

Direito Processual Penal: entenda tudo sobre recurso em sentido estrito

Recurso em sentido estrito, de acordo com a legislação, doutrina e jurisprudência.

Publicado por Pierre Reis
há 4 meses

O art. 581 do Código de Processo Penal ( CPP) delineia minuciosamente as decisões suscetíveis de impugnação por meio do Recurso em Sentido Estrito (RESE). No entanto, a despeito dessa taxatividade, a compreensão integral desse dispositivo revela nuances desafiadoras, exigindo não apenas a leitura da letra da lei, mas também uma imersão na jurisprudência.

HIPÓTESES DE CABIMENTO DO RESE

Nesse diapasão e com fulcro no art. 581 do Código de Processo Penal, são as hipóteses de cabimento do Recurso em Sentido Estrito:

NÃO RECEBIMENTO DA PEÇA ACUSATÓRIA (INCISO I)

O Recurso em Sentido Estrito (RESE) é cabível quando o juiz não aceita a denúncia ou queixa, e também nos casos em que recusa o aditamento da peça acusatória. A jurisprudência aceita uma interpretação ampla, englobando situações em que o juiz rejeita o acréscimo à peça acusatória. No entanto, o RESE não é adequado para impugnar a decisão que aceita a denúncia ou queixa, uma vez que o legislador não pretendia incluir essa hipótese. A Súmula 709 do STF destaca que, exceto se a decisão de primeiro grau for nula, o acórdão que concede o recurso contra a rejeição da denúncia equivale imediatamente ao seu recebimento, inclusive interrompendo a prescrição. O Tribunal só recusará essa equiparação se considerar nula a decisão impugnada, caso em que o juízo a quo deverá proferir uma nova decisão.

INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO (INCISO II)

O RESE é adequado quando o juiz, de ofício, declina de sua competência, seja em casos de competência absoluta ou relativa. Ambas as partes têm legitimidade para recorrer caso a decisão de incompetência seja provocada por uma delas. A exceção ocorre quando a decisão deriva de provocação de uma das partes; nesse caso, apenas a parte contrária tem interesse em recorrer. O inciso também abrange a decisão de desclassificação feita pelo juiz sumariante na primeira fase do procedimento do Tribunal do Júri. Se o juiz declara não se tratar de um crime doloso contra a vida, indica sua incompetência para julgar o caso, remetendo-o ao juízo competente. Vale destacar que, se o juiz julgar procedente a exceção de incompetência, o RESE também é o recurso cabível, fundamentado no inciso seguinte.

PROCEDÊNCIA DAS EXCEÇÕES, SALVO A DE SUSPEIÇÃO (INCISO III)

O RESE é apropriado quando há decisão de procedência das exceções, excluindo a de suspeição. As exceções previstas no processo penal são: de suspeição, incompetência do juízo, litispendência, ilegitimidade da parte e coisa julgada. Importante notar que o recurso não se aplica à decisão que julga procedente a exceção de suspeição, pois esse julgamento é competência do tribunal. O RESE é destinado às decisões interlocutórias proferidas pelo juiz de primeiro grau.

PRONUNCIAR O RÉU (INCISO IV)

O RESE é o recurso cabível contra a decisão de pronúncia no Tribunal do Júri. É essencial destacar que o recurso não suspende a prisão preventiva eventualmente decretada nessa decisão. No entanto, ele suspende o julgamento em plenário, conforme o art. 421 do CPP. O assistente de acusação também possui legitimidade para interpor o RESE contra a decisão de pronúncia, buscando incluir uma qualificadora afastada pelo juiz, caso o órgão ministerial não recorra.

CONCEDER, NEGAR, ARBITRAR, CASSAR OU JULGAR INIDÔNEA A FIANÇA, INDEFERIR REQUERIMENTO DE PRISÃO PREVENTIVA OU REVOGÁ-LA, CONCEDER LIBERDADE PROVISÓRIA OU RELAXAR A PRISÃO EM FLAGRANTE (INCISO V)

O RESE é apropriado para impugnar decisões relacionadas à fiança e prisão, incluindo concessão, negativa, arbitramento, cassação ou declaração de inidoneidade da fiança, indeferimento de prisão preventiva ou revogação, concessão de liberdade provisória e relaxamento da prisão em flagrante. Cabe ressaltar que não se aplica ao indeferimento ou deferimento da prisão temporária, bem como a medidas cautelares diversas da prisão, embora a legislação não mencione explicitamente. A decisão que defere a prisão não é passível de RESE, sendo adequado o habeas corpus.

(INCISO VI) REVOGADO PELA LEI 11.689/2008

O inciso VI foi revogado pela lei 11.689/2008, e, portanto, não é mais válido.

JULGAR QUEBRADA A FIANÇA OU PERDIDO O SEU VALOR (INCISO VII)

O RESE é interponível contra a decisão que julga quebrada a fiança ou perdido o seu valor. No entanto, o efeito suspensivo do recurso se aplica apenas à perda da metade do valor, de acordo com o § 3º do art. 584. Este recurso pode ser interposto pelo terceiro que prestou a fiança em favor do réu. Se a decisão de quebra ocorrer no âmbito da sentença condenatória, o recurso adequado será a apelação. A decisão sobre o perdimento da fiança, por outro lado, é proferida pelo juízo da execução após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, sendo impugnável por meio de agravo em execução.

DECRETAR A PRESCRIÇÃO OU JULGAR, POR OUTRO MODO, EXTINTA A PUNIBILIDADE OU INDEFERIR ESSES PEDIDOS (INCISOS VIII E IX)

O RESE é cabível para impugnar decisões que decretam a prescrição, julgam extinta a punibilidade ou indeferem pedidos nesse sentido. Este inciso engloba situações em que a decisão envolve a extinção da punibilidade de alguma forma. Vale ressaltar que não há interesse recursal se o réu já possui uma decisão favorável declarando a extinção da punibilidade.

CONCEDER OU NEGAR ORDEM DE HABEAS CORPUS (INCISO X)

O RESE é aplicável quando há decisão de juiz de primeiro grau que concede ou nega ordem de habeas corpus. É importante notar que a decisão que concede habeas corpus está sujeita ao reexame necessário, e o RESE é o recurso específico para impugnar essa decisão.

CONCEDER, NEGAR OU REVOGAR A SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA (INCISO XI)

Este inciso foi considerado tacitamente revogado, pois as decisões sobre suspensão condicional da pena podem ocorrer na sentença (hipótese de apelação) ou no juízo da execução (cabível agravo em execução). No entanto, a jurisprudência admite interpretação extensiva para incluir a decisão que concede, nega ou revoga a suspensão condicional do processo, conforme previsto no art. 89 da Lei 9.099/95.

CONCEDER, NEGAR OU REVOGAR O LIVRAMENTO CONDICIONAL (INCISO XII)

Decisões relacionadas ao livramento condicional, proferidas pelo juízo da execução, são impugnáveis por meio de Agravo em Execução. Este inciso foi tacitamente revogado pela Lei de Execução Penal.

ANULAR O PROCESSO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL, NO TODO OU EM PARTE (INCISO XIII)

O RESE é cabível quando a decisão anula o processo da instrução criminal, total ou parcialmente, em situações que envolvem atos anteriores à instrução. Se a anulação decorrer de uma sentença, o recurso adequado será a Apelação. A jurisprudência aceita interpretação extensiva para incluir a decisão que reconhece a ilicitude da prova e determina seu desentranhamento, a menos que essa determinação conste da sentença.

INCLUIR JURADO NA LISTA GERAL OU DESTA O EXCLUIR (INCISO XIV)

Há divergência sobre a vigência deste inciso, mas alguns argumentam que foi tacitamente revogado pela Lei 11.689/08, que introduziu a impugnação à lista geral de jurados. Caso ainda esteja em vigor, a interposição do RESE é possível dentro do prazo de 20 dias e será julgado pelo Presidente do respectivo Tribunal. Pode ser interposto por qualquer pessoa, desde que representada por advogado.

DENEGAR A APELAÇÃO OU A JULGAR DESERTA (INCISO XV)

O RESE é apropriado quando a decisão impugnada denega a apelação ou a julga deserta. Essa situação é crucial para permitir que a apelação chegue ao tribunal, assegurando que seja apreciada, especialmente quando o juízo de primeiro grau nega o recurso ou o considera deserto.

Ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial (INCISO XVI)

Decisões que ordenam a suspensão do processo, seja por questão prejudicial obrigatória ou facultativa, são impugnáveis por RESE. Importante destacar que a decisão que indefere a suspensão é irrecorrível, conforme estabelecido no § 2º do art. 93 do CPP.

DECIDIR SOBRE A UNIFICAÇÃO DE PENAS (INCISO XVII)

O inciso XVII foi revogado tacitamente pela Lei de Execução Penal ( LEP). Atualmente, as decisões referentes à unificação de penas são impugnadas por meio de agravo em execução, não mais por RESE.

DECIDIR O INCIDENTE DE FALSIDADE (INCISO XVIII)

Este inciso trata de decisões relacionadas ao incidente de falsidade. Independentemente de a decisão ser de deferimento ou indeferimento, o RESE é cabível. Entretanto, os incisos XIX a XXIII, que versam sobre incidentes na execução penal, foram tacitamente revogados pela Lei de Execução Penal.

DOS INCISOS XIX AO XXIII

Os incisos XIX a XXIII abordam situações que configuram verdadeiros incidentes no âmbito da execução penal. Cada um desses incisos envolve decisões que, por sua natureza, são passíveis de impugnação por meio do agravo em execução, não mais pelo Recurso em Sentido Estrito (RESE). Essa alteração foi efetivada devido à revogação tácita imposta pelo art. 197 da Lei de Execução Penal.

DO INCISO XXIV

O inciso XXIV, que versa sobre a decisão de converter a multa em detenção ou prisão simples, encontra-se tacitamente revogado em virtude da inexistência da possibilidade de conversão da pena de multa para detenção ou prisão simples nos termos da legislação vigente.

DECISÃO QUE RECUSAR HOMOLOGAÇÃO À PROPOSTA DE ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (INCISO XXV)

O inciso XXV é uma inovação legislativa introduzida pela Lei 13.964/2019. Estabelece o cabimento do RESE contra a decisão que recusa homologar a proposta de acordo de não persecução penal. Dessa forma, caso o juiz recuse a homologação por não atender aos requisitos legais ou não ser realizada a adequação prevista no § 5º do art. 28-A, a parte insatisfeita pode impugnar a decisão por meio desse recurso.

PROCEDIMENTO DETALHADO DO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO

O procedimento do Recurso em Sentido Estrito (RESE) segue as seguintes etapas, de acordo com o Código de Processo Penal:

SUBIDA EM TRASLADO DO RECURSO DA PRONÚNCIA

De acordo com o parágrafo único do art. 583, o recurso da pronúncia será encaminhado em traslado quando, em casos nos quais haja dois ou mais réus, um deles concordar com a decisão (não recorrendo) ou quando todos ainda não tiverem sido intimados da pronúncia.

INDICAÇÃO DAS PEÇAS PARA TRASLADO

O art. 587, caput, do CPP estipula que, quando o recurso precisar subir por instrumento, a parte deverá indicar as peças dos autos que deseja incluir no traslado no termo ou em requerimento avulso. O parágrafo único do art. 587 determina que o traslado será elaborado, conferido e ajustado em cinco dias, contendo a decisão recorrida, a certidão de sua intimação (se não for possível verificar a oportunidade do recurso de outra forma) e o termo de interposição.

PRAZO E JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

O prazo para interposição do RESE é de 5 dias, exceto para a impugnação contra a lista geral de jurados, que possui prazo de 20 dias, caso seja admitida. Após a interposição, os autos são encaminhados para o juízo de admissibilidade.

DECISÃO DO JUIZ SOBRE A ADMISSIBILIDADE

Se o juiz verificar a ausência dos pressupostos de admissibilidade, ele não conhecerá do recurso. Nesse caso, é possível interpor carta testemunhável para impugnar essa decisão. Se os pressupostos forem considerados presentes, o juiz conhecerá do recurso e notificará as partes para apresentarem razões e contrarrazões em um prazo de 2 dias cada.

JUÍZO DE RETRATAÇÃO

O art. 589 do CPP estabelece que, após as razões e contrarrazões, o juiz analisará o recurso e, dentro de dois dias, reformará ou sustentará seu despacho, instruindo o recurso com os traslados que considerar necessários.

RECURSO INVERTIDO

O parágrafo único do art. 589 prevê a possibilidade de recurso invertido, permitindo que a parte contrária, por simples petição, recorra da nova decisão proferida pelo juiz após o juízo de retratação. Isso ocorre caso essa nova decisão também seja passível de recurso. Se o juiz reformar o despacho recorrido, a parte contrária pode recorrer da nova decisão, não sendo mais lícito ao juiz modificá-la. Nesse caso, o recurso sobe nos próprios autos ou em traslado. O juiz, após o recurso invertido, encaminha os autos para o Tribunal decidir sobre o recurso. Esse cenário é conhecido como "recurso invertido" e permite que a parte recorrida utilize o mesmo recurso, incluindo as contrarrazões já apresentadas, para pleitear o retorno à decisão anteriormente proferida.

EFEITOS DO RESE

EFEITO DEVOLUTIVO

Restitui ao Tribunal a cognição da matéria impugnada.

EFEITO REGRESSIVO

Possibilita o juízo de retratação, onde o juiz pode modificar sua decisão inicial com base nas razões apresentadas no recurso.

EFEITO EXTENSIVO

A decisão do RESE interposto por um agente beneficia aos demais, salvo se fundada em circunstâncias de caráter pessoal.

HIPÓTESES DE EFEITO SUSPENSIVO NO RESE

CONTRA DECISÃO DE PERDA DA FIANÇA

Apesar da previsão legal, observamos que esta decisão é atualmente impugnável mediante agravo em execução;

CONTRA DECISÃO QUE DENEGAR A APELAÇÃO OU A JULGAR DESERTA

Nessas situações, o recurso em sentido estrito apresenta efeito suspensivo;

CONTRA A DECISÃO DE PRONÚNCIA

O recurso em sentido estrito suspende a realização do julgamento, conforme estabelecido legalmente. Vale ressaltar que, na realidade, os autos não serão encaminhados para a preparação do processo para julgamento em plenário, pois, nos termos do art. 421 do CPP, essa fase só ocorrerá quando a decisão de pronúncia estiver preclusa. No entanto, se na pronúncia o juiz decretou a prisão do réu, a interposição de RESE não tem efeito suspensivo nesse ponto; e

DECISÃO QUE JULGAR QUEBRADA A FIANÇA

O efeito suspensivo, neste caso, restringe-se à perda da metade do valor prestado a título de fiança.

CONCLUSÃO

No contexto deste artigo sobre o Recurso em Sentido Estrito (RESE), observamos a importância desse instrumento no âmbito do processo penal brasileiro. O RESE se revela como um meio significativo para impugnar decisões interlocutórias proferidas pelo juízo de primeiro grau, abrangendo diversas hipóteses elencadas nos incisos do art. 581 do Código de Processo Penal.

Ao analisarmos as diversas situações em que o RESE é cabível, compreendemos sua relevância na salvaguarda dos direitos das partes envolvidas no processo penal. Seja diante do não recebimento da peça acusatória, da incompetência do juízo, da pronúncia do réu, entre outras circunstâncias, o recurso desempenha um papel crucial na busca pela justiça e na manutenção do devido processo legal.

É fundamental destacar que, ao longo do tempo, algumas alterações legislativas impactaram o escopo do RESE, revogando tacitamente certos dispositivos e introduzindo novas possibilidades, como a recusa à homologação do acordo de não persecução penal, conforme estabelecido pela Lei 13.964/2019.

Em síntese, o estudo aprofundado do RESE revela não apenas sua aplicação técnica no universo jurídico, mas também sua influência na dinâmica do sistema de justiça penal. Entender suas nuances e possibilidades é essencial para advogados, magistrados e demais profissionais envolvidos no campo do direito penal, contribuindo para a efetividade e aprimoramento do processo penal no Brasil.

Referência: Código de Processo Penal; Lei de Execução Penal; e Súmula 709 do STF.

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