Página 2440 do Diário de Justiça do Distrito Federal (DJDF) de 4 de Maio de 2021

ofendida determinou que o denunciado deixasse o local, ocasião em que Jefferson de Souza retrucou: ?eu volto aqui e roubo na hora que eu quiser!?. Relatou que, nesse momento, o denunciado ameaçou a depoente, que estava grávida, dizendo que seu filho nem iria chegar a nascer. Ressaltou, contudo, que conseguiram colocar o denunciado para fora da casa, sem que conseguisse levar nenhum bem. Esclareceu que o réu já havia conseguido juntar um notebook, um botijão de gás, um perfume e uma caixa de som da casa do irmão da vítima, que fica dentro do mesmo lote. No entanto, declarou que tais bens foram colocados pelo réu no portão da casa e, ao sair, o acusado não os levou. Afirmou ter percebido que o denunciado conseguiu adentrar no imóvel por meio de arrombamento do portão dos fundos. Contou que, pouco tempo depois, o réu retornou à frente do imóvel e batia forte no portão e ameaçava a depoente de morte. Disse recordar-se de que o réu, antes de deixar o imóvel, pegou uma faca da cozinha e colocou em sua cintura, mas negou que Jefferson tenha utilizado o artefato para proferir ameaças contra as vítimas. Alegou que, passados alguns minutos, policiais foram ao local e prenderam o réu. No mais, informou que o acusado aparentava estar sob efeito de substância psicotrópica (ID 84356812 e 89565441). Versão semelhante foi relatada em Juízo pela vítima Aline da Silva Batista, a qual afirmou conhecer o réu, pois era amigo de seu irmão. Narrou que, no dia dos fatos, estava na varanda de sua casa com Thaís Natália e Valdimiro Batista, quando escutaram um barulho vindo da cozinha e foram até o cômodo para ver o que ocorria. Relatou ter visto o réu, Jefferson de Souza, tentar desconectar seu botijão de gás para subtraí-lo. Esclareceu que o expulsou da casa, mas, inicialmente, o réu não quis deixar o local, razão pela qual a declarante deixou o imóvel para procurar algum conhecido do denunciado, a fim de ajudá-la a retirar o réu de sua casa. Declarou que, em razão de sua ausência, não presenciou, mas soube que o réu ameaçou Thaís Natália e Valdimiro Batista. Afirmou que o denunciado havia carregado um notebook que estava dentro da casa de seu irmão, mas informou que não houve subtração, porque o bem foi deixado do lado de dentro do portão do imóvel. Contou que o réu deixou o imóvel sem conseguir levar nada. Por fim, disse ter percebido que o denunciado estava transtornado e fora de si, possivelmente em razão do consumo de drogas (ID 89568345). Por sua vez, a vítima Valdimiro Batista de Souza Júnior também contribuiu para o esclarecimento da autoria delitiva imputada ao réu. Em juízo, disse que estava com sua esposa, Thaís, e com Aline da Silva na área da casa da vítima, quando ouviram um barulho de botijão de gás sendo arrastado. Alegou que foram ver o que ocorria e encontraram o denunciado, no interior da cozinha, tentando desinstalar o botijão de gás. Informou que a ofendida mandou o réu deixar o local. Narrou que o denunciado saiu, mas logo voltou e começou a separar alguns bens. Disse ter visto que o réu levou um notebook, um secador, um botijão de gás para perto do portão. Esclareceu que esses bens foram deixados perto do portão dos fundos, que o denunciado tinha arrombado para adentrar o imóvel. Relatou que o acusado ameaçou sua esposa, grávida, ao dizer que seu filho não iria nascer. Ressaltou que o réu proferiu a ameaça apenas com palavras, sem o uso de faca (ID 89568351). Por derradeiro, as testemunhas Rogério Nascimento da Cunha (ID 79460742) e Matheus Rodrigues dos Santos (ID 79463048) confirmaram ter realizado a prisão em flagrante do acusado, pouco depois da prática do delito. Afirmaram terem sido acionados pelo 190 para atender uma ocorrência de furto. Contaram que lhes foi passado que um indivíduo havia arrombado o portão de uma casa, separado objetos para subtrair, mas teria sido surpreendido pelos moradores, ocasião em que houve uma discussão e o réu deixou o local. Alegaram, ainda, que foram informados que o mesmo agente teria retornado a casa e ameaçado as vítimas para conseguir levar os bens. Disseram que, ao chegar ao imóvel, não encontraram o autor dos fatos, razão pela qual colheram informação sobre suas características e saíram em buscas. Alegaram que, pouco tempo depois, encontraram o agente e levaram-no até a vítima Aline, que prontamente o reconheceu como o autor dos fatos. Informou que o indivíduo havia separado dois botijões de gás, um notebook e outros utensílios domésticos. No entanto, Rogério Nascimento garantiu que o denunciado não conseguiu tirar os bens de dentro da casa. No mais, esclareceram que o facão indicado na denúncia não foi encontrado com o réu, indivíduo que aparentava embriagado. Portanto, finda a instrução processual, sobeja certeza acerca da autoria delitiva atribuída ao acusado, Jefferson de Souza. Por outro lado, em relação à subsunção da conduta ao tipo legal, entendo necessário realizar nova classificação jurídica aos fatos praticados pelo réu, diferente daquela construída pelo Ministério Público na exordial acusatória. Com efeito, o Ministério Público imputou ao réu a prática de crime de roubo impróprio. Narrou que: ?logo após subtrair um notebook e um botijão de gás, [o réu] empregou grave ameaça, exercida com o emprego de um facão, contra as vítimas...? (ID 76844557). Portanto, conforme destacado, a denúncia narrou que as graves ameaças exercidas pelo denunciado, logo após subtrair os bens, teriam sido exercidas com o emprego de um facão. No entanto, Thaís Natália e Valdimiro Batista asseguraram em Juízo que as ameaças proferidas pelo réu foram apenas verbais, e não mediante o uso de um facão. A par disso, segundo o informado por Aline da Silva, a ofendida não presenciou qualquer ameaça proferida pelo réu, pois deixou o imóvel para encontrar familiares ou conhecidos do denunciado e retirá-lo de sua casa. No caso dos autos, portanto, as provas produzidas não lograram confirmar a narrativa da denúncia, no sentido de que as ameaças teriam sido proferidas com o emprego de um facão. Nesse ponto, embora Thaís Natália e Valdimiro Batista tenham afirmado que o réu lhes ameaçou verbalmente, essa circunstância não foi narrada na denúncia, tampouco houve seu aditamento, de modo a tornar inviável a condenação nesses termos, ao menos não sem tergiversação ao princípio da adstrição e, por consequência, aos princípios do contraditório e da ampla defesa, garantias constitucionais básicas a serem asseguradas em uma ação penal. De toda forma, acrescento que o órgão do Ministério Público não logrou êxito em demonstrar que as graves ameaças teriam sido empregadas pelo réu depois de subtraídos os bens, como exigido pelo artigo 157, § 1º, do Código Penal. Ao revés, conforme evidenciado acima, a prova oral é uníssona ao afirmar que o denunciado deixou o imóvel sem levar nenhum bem. De fato, Valdimiro Batista, Aline da Silva e Rogério Nascimento afirmaram que o réu deixou o imóvel sem subtrair os bens que havia separado e deixado ao lado do portão, do lado de dentro do imóvel. Nesse contexto, não se pode dizer que o denunciado tenha subtraído os bens das vítimas, porquanto não houve inversão da posse. Há de incidir, portanto, o preceito normativo disposto no artigo 14, inciso II, do Código Penal, pois o réu iniciou a execução da subtração dos bens das vítimas, mas o crime não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do agente, uma vez que foi surpreendido pelas vítimas enquanto arrastava o botijão de gás no interior da residência de Aline. De outro modo, observo que o réu confessou ter arrombado o portão da casa para poder ingressar no imóvel, circunstância essa confirmada por Thaís Natália de Sousa e Valdimiro Batista e, ainda, evidenciada pela fotografia de ID 76844559 - Pág. 25. Reconheço, ainda, a causa de aumento de pena prevista no § 1º do artigo 155 do Código Penal, porquanto a tentativa de furto foi perpetrada durante o repouso noturno. Após praticar o fato por volta das 00h10, a polícia empreendeu buscas e logrou captura-lo pouco tempo depois, tanto que o auto de prisão em flagrante foi lavrado às 2h36 do dia 31/10/2020. Assim, acerca da tipicidade das condutas praticadas pelo réu, ressalto que o Código de Processo Penal, em seu artigo 383, autoriza que o Magistrado confira nova classificação jurídica aos fatos narrados na denúncia. É a denominada emendatio libelli. Isso porque todas as elementares típicas do delito de furto qualificado pelo arrombamento de obstáculo foram descritas na peça acusatória, ao passo que o acusado não se defende da capitulação jurídica dada na denúncia, mas da narrativa fática. Dessa forma, resta evidenciado que o denunciado, Jefferson de Souza da Silva, praticou a conduta descrita no artigo 155, § 1º e § 4º, inciso I, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal. Ressalto, por fim, que não militam em favor do réu causas excludentes de ilicitude ou culpabilidade, uma vez que é imputável, detinha pleno conhecimento do caráter ilícito de suas condutas e não empreendeu esforços para agir conforme o direito. De fato, embora a prova oral seja assente no sentido de que o denunciado estava embriagado no momento da prática da tentativa de subtração, essa circunstância não autoriza o reconhecimento da excludente de culpabilidade. Isso porque a embriaguez voluntária não exclui a imputabilidade penal, nos termos do artigo 28, inciso II, do Código Penal. Aplica-se, isso sim, a teoria da actio libera in causa. III ? DISPOSITIVO: Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para, na forma do artigo 383 do Código de Processo Penal, CONDENAR o réu, JEFFERSON DE SOUZA DA SILVA, devidamente qualificado nos autos, como incurso nas sanções do artigo 155, § 1º e § 4º, inciso I, c/c artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal. Passo à individualização da pena (art. 93, inciso IX, da Constituição Federal e art. 68 do Código Penal). Em atenção às circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, assinalo, quanto à culpabilidade, que o réu não agiu com dolo que ultrapassou os limites da norma penal; quanto aos antecedentes, verifico que o acusado possuía outra condenação criminal transitada em julgado à época dos fatos (ID 76004043 - Pág. 10), de modo a ser valorada apenas na segunda fase, a título de reincidência; não foram colhidos elementos a respeito de sua conduta social e da personalidade; o motivo do crime contra o patrimônio consiste no desejo de lucro fácil em detrimento do patrimônio alheio, o que não autoriza a exasperação nesta fase; as circunstâncias do crime extrapolam as exigidas pelo tipo penal, pois o denunciado ameaçou outras pessoas que se encontravam no interior do imóvel, inclusive uma gestante; as consequências foram as normais para a espécie; o comportamento da vítima

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