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17 de Junho de 2024
  • 1º Grau
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TRF3 • PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL • Revogação • XXXXX-76.2019.4.03.6142 • Órgão julgador 1ª Vara Federal de Lins do Tribunal Regional Federal da 3ª Região - Inteiro Teor

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Órgão julgador 1ª Vara Federal de Lins

Assuntos

Revogação, Anulação de multa ambiental (10112)

Partes

Documentos anexos

Inteiro Teore2e3a875e78cdf4b3d74d6b286b1fb01e1a2c63d.pdf
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12/05/2022

Número: XXXXX-76.2019.4.03.6142

Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

Órgão julgador: 1a Vara Federal de Lins

Última distribuição : 25/04/2019

Valor da causa: R$ 29.940,00

Processo referência: XXXXX20184036324

Assuntos: Revogação/Anulação de multa ambiental

Segredo de justiça? NÃO

Justiça gratuita? SIM

Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM

Partes Procurador/Terceiro vinculado MARCIO ROGERIO ANTUNES (AUTOR) RICARDO ENEI VIDAL DE NEGREIROS (ADVOGADO) INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA (REU)

Documentos

Id. Data da Documento Tipo

Assinatura

25347 28/11/2019 18:10 Sentença Sentença

753

PROCEDIMENTO COMUM (7) Nº XXXXX-76.2019.4.03.6142 / 1a Vara Federal de Lins

AUTOR: MARCIO ROGERIO ANTUNES

Advogado do (a) AUTOR: RICARDO ENEI VIDAL DE NEGREIROS - SP171340

RÉU: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA

S E N T E N Ç A

S E N T E N Ç A

Trata-se de ação proposta por Márcio Rogério Antunes em face do IBAMA com os seguintes pedidos: suspensão, mediante antecipação de tutela, dos efeitos do Auto de Infração XXXXX; determinar, também como pleito de tutela antecipada, o desbloqueio de acesso do autor ao SISPASS; declarar a nulidade do Auto de Infração Ambiental XXXXX; pagamento de indenização por danos morais em valor não inferior a 30 salários mínimos.

Em resumo, alega o autor na petição inicial: foi autuado pelo IBAMA no dia 09/05/2017 por

supostamente ter em cativeiro 3 espécimes da fauna silvestre sem a devida autorização da autoridade ambiental competente; em razão deste mesmo fato houve transação penal, cujas penas já foram

cumpridas; é legalmente habilitado para a criação de passeriformes nativos; sempre participou de torneios de canto e fibra; todo o seu extenso plantel foi bloqueado (34 aves); a multa que lhe foi imposta, de R$ 33.500,00, foi excessiva; a legislação invocada para a aplicação da multa, qual seja, o art. 24, parágrafo 3º, inciso III do Decreto 6.514/08 não é lei em sentido formal e material, razão pela qual há violação aos princípios da legalidade e da tipicidade; acusa-se o autor de possuir pássaros sem documentação, mas ele está devidamente registrado junto ao IBAMA; a autoridade que lhe multou não demonstrou a origem das aves; não houve defesa no processo administrativo; houve afronta ao princípio da

proporcionalidade; caráter confiscatório da multa lavrada; o simples fato de o autor estar sendo punido administrativamente após cumprimento das penalidades impostas na seara criminal gera direito ao

ressarcimento de dano moral no montante de 30 salários mínimos.

Em suma, o IBAMA aduz, em contestação: inexistência do direito à gratuidade de justiça; falta de

interesse de agir pelo não esgotamento da via administrativa; o IBAMA constatou que algumas aves não estavam em sua relação no SISPASS e que algumas aves que constavam em sua relação no SISPASS estavam sendo mantidas no mesmo espaço que as aves de sua mãe, o que é irregularidade sanável, nos termos do art. 56, § 3º, da IN IBAMA nº 10/11, razão pela qual foi lavrada notificação para as adequações necessárias em 15 dias; o IBAMA constatou a mantença em cativeiro de 3 espécimes de pássaros sem a devida autorização ambiental, seno 1 sem anilha de identificação e 2 com anilhas adulteradas, fatos que configuram grave ilegalidade, o que gerou a autuação com base no art. 24 do Decreto 6.514/2008; por conta disso, o criador teve as atividades de todo o criadouro embargadas, com suspensão de todo o

sistema de controle e movimentação; a suspensão das atividades é sanção cautelar que objetiva prevenir a ocorrência de novas infrações e garantir o resultado prático do processo administrativo; há respeito aos princípios da prevenção e da precaução; é possível que a lei delegue a definição das hipóteses em que ocorrerá a infração; há previsão em lei das sanções administrativas; a CF impõe a defesa do meio

ambiente; há proporcionalidade da sanção porque a CF elege a proteção ao meio ambiente como princípio maior a ser tutelado; não se está a impedir que o autor crie pássaros, mas apenas que ele utilize o

SISPASS; a multa pode atingir o valor da R$ 227.000,00 mas ainda não está homologada; a autuação que deu origem à multa tem fundamento no art. 70 da Lei 9.605/98, e multa e seu cálculo estão previstos na mesma Lei, nos artigos 72 e 74; segundo art. 24 do Decreto 9.514/2008, a multa cabível será de R$

500,00 por indivíduo de espécie não constante de listas oficiais de risco ou ameaça de extinção, e de R$ 5.000,00 caso o indivíduo conste de tais listas; a multa deve ser aumentada para abranger a totalidade do objeto de fiscalização caso a quantidade ou espécie constatada no ato fiscalizatório esteja em desacordo com o autorizado pela autoridade ambiental competente, de acordo com o art. 24, § 6º, do Decreto

9514/08; a legislação aponta para os limites da R$ 50,00 e R$ 50.000.000,00, de modo que a multa está dentro dos parâmetros legais; o princípio do não-confisco se aplica apenas aos tributos; não houve dano moral.

Em réplica, o autor assim se manifestou, sinteticamente: a gratuidade da justiça já foi deferida e objeto de preclusão; o STF já decidiu pela desnecessidade de esgotamento da via administrativa; não se pode criar pássaros sem ter acesso ao SISPASS; a majoração pretendida da multa torna esta impagável; o valor correto da multa seria de R$ 10.500,00, pois 2 espécimes de Sporophila angolensis estão em lista de risco de extinção, a gerar multa de R$ 5.000,00 cada, e o espécime Turdus Fumigatus não está, a gerar multa de R$ 500,00; há dano moral porque o autor está sendo penalizado administrativamente mesmo após sofrer consequências penais e porque está desesperado diante da situação; o pedido deve ser julgado procedente.

Houve audiência e as partes apresentaram alegações finais (o IBAMA apresentou alegações remissivas).

Vieram os autos conclusos. É o relatório.

Passo a fundamentar e decidir.

Considerando a falta de prova de pujança econômica e o alto valor sub judice , entendo que o autor faz jus ao benefício da gratuidade para litigar.

Afasto a alegação de falta de interesse processual porque o esgotamento da via administrativa não é

necessário segundo o STF, e apenas em alguns casos, notadamente em matéria previdenciária, é

necessário o indeferimento administrativo, cujo similar no caso concreto (a imposição da multa) já existe.

A autuação tem embasamento legal na CF, que prevê lugar entre os bens jurídicos dignos de tutela na Lei Maior, bem como no art. 70 da Lei 9.605/98. A suspensão e o cancelamento de registro, licença ou

autorização estão previstos no art. 72, § 8º, da mesma Lei. O valor da multa está previsto no art. 75 da Lei citada, a qual remete a regulamento. Ou seja, em princípio decreto pode esmiuçar a pena de multa, sem ultrapassar os quadrantes legais, o que ocorre no caso concreto pois o Decreto 9.514/2008 observa as lindes legais. Logo, numa primeira análise há legalidade da autuação porque houve apreensão de 2

espécimes de Sporophila angolensis e 1 espécime Turdus Fumigatus com irregularidades incontroversas.

Não há nos autos prova inconcussa de ausência de possibilidade de defesa no âmbito administrativo, mesmo porque, ao revés, o trâmite ainda corre, com notícia de possibilidade de recurso na via

administrativa. Ademais, vigora a presunção de legitimidade do ato administrativo a lhe conferir validade, à míngua de prova robusta contrária.

O art. 24, § 6º, do Decreto 9514/08, todavia, que gerou o aumento da multa para a totalidade do objeto da apreensão causa manifesta desproporcionalidade e finda por criar hipótese de infração administrativa sem previsão legal, e desta forma deve ter sua aplicação afastada também por ofensa ao princípio da

legalidade.

Explico melhor. o citado parágrafo estabelece que "Caso a quantidade ou espécie constatada no ato fiscalizatório esteja em desacordo com o autorizado pela autoridade ambiental competente, o agente autuante promoverá a autuação considerando a totalidade do objeto da fiscalização". Assim, verificada a irregularidade com relação a uma espécie ou a quantidade, haverá multa com relação a todos os demais espécimes, mesmo que a situação deles seja regular.

Dito de outra forma, o dispositivo citado enseja aplicação de multa aos casos de guarda lícita de

espécimes, o que acaba por violar o art. 70 da Lei 9.605/98, que prevê que haverá infração administrativa se houver violação de norma ambiental. Na verdade ele cria uma hipótese de infração administrativa por extensão. Se num local há apenas um erro, tal norma estende o erro para todos os demais pássaros

apreendidos; assim, acaba-se por criar por meio de decreto uma infração, o que fere o princípio da

legalidade e também fere a proporcionalidade, pois torna erroneamente ilícito o que é lícito.

Se o cidadão possui 3 espécimes em desacordo com a Lei, deve responder apenas por estes 3, e não por todos os demais passeriformes em situação regular, Isso parece-me evidente. Aliás, o Decreto

mencionado prevê valores exatos da multa, de modo que não há dificuldade em se chegar ao montante constitucional, legal e proporcional, que é de R$ 10.500,00 porque 2 espécimes de Sporophila angolensis estão em lista de risco de extinção, a gerar multa de R$ 5.000,00 cada, e o espécime Turdus Fumigatus não está. Trata-se de simples aplicação dos incisos I e II do art. 24 do Decreto 9514/08, sem a extensão ilegal e desproporcional do seu parágrafo 6º. Assim, como o autor alegou a desproporcionalidade da multa, embora tenha pedido a nulidade do Auto de Infração, penso que o pedido também abrange a

redução da multa. Ademais, se pede a nulidade, que é o mais, pede também a redução da multa, que é o menos.

No que toca ao bloqueio de acesso ao SISPASS, a Lei 9.605/98 prevê a possibilidade de suspensão ou cancelamento (o qual possui carga de definitividade). Aqui existe certa discricionariedade administrativa, sendo defeso ao juiz ingressar nesta seara, via de regra, a não ser em casos de certeza ou teratologia. Aqui tenho a firme convicção de que o cancelamento somente seria aceitável caso a ofensa fosse única e muito intensa (não é o caso) ou houvesse reiteração infracional (não há notícia nos autos). Ou seja, como

aparentemente foi a primeira infração do autor e não foi de tão grande monta, o cancelamento, de caráter perpétuo, afigura-se-me com certeza positiva uma teratologia. Assim, e como o autor já está privado do acesso há muito tempo, a restrição deve cessar.

Não há dano moral por conta da imposição de sanção administrativa além da criminal porque há

independência de instâncias. Não há impedimento legal a que isso ocorra. A situação de angústia e de desespero em razão do processo administrativo também não autoriza condenação por dano moral porque a existência de processo, por si só, não gera transtorno psíquico invulgar, mas sim aborrecimento inerente ao cotidiano. Se assim não fosse todo e qualquer cidadão que sofresse algum revés na seara administrativa teria direito a reparação de monta, o que me parece irrazoável e levaria o Estado à falência.

Em face do exposto, julgo parcialmente procedente o pedido e condeno o IBAMA a reduzir a multa imposta no Auto de Infração Ambiental XXXXX para o total de R$ 10.500,00 (evidente que o autor não deve pagar juros de mora e correção monetária desde a notificação do Auto de Infração porque não deu causa à demora) e a promover o desbloqueio do acesso do autor ao SISPASS relativamente ao Auto de Infração Ambiental XXXXX.

Julgo improcedente o pedido de reparação de danos morais.

Concedo a antecipação de tutela para que o autor tenha acesso imediato ao SISPASS ante o exposto, o longo período de suspensão e o perigo na demora decorrente da impossibilidade, em caso contrário, de realizar atividade lícita.

Sem custas ou honorários em favor do IBAMA porque o autor tem gratuidade para litigar. Sem custas em favor do autor porque o IBAMA goza de isenção (art. 46 da Lei 5.010/66) e não houve adiantamento delas.

Condeno o IBAMA a pagar 10% de honorários advocatícios incidentes sobre a diferença entre o valor inicial da multa (R$ 33.500,00) e a aqui imposta (R$ 10.500,00), ou seja, 10% sobre R$ 23.000,00. Sem reexame necessário porque a condenação do ente público não ultrapassa mil salários mínimos (art. 496, § 3º, I, CPC).

Érico Antonini

Juiz Federal Substituto

LINS, 28 de novembro de 2019.

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