A coisa julgada tributária passa por uma crise
A coisa julgada, como diziam os antigos, faz do branco preto e do quadrado redondo.
Intuitivo que, para revestir-se de tamanha força, a sentença deve ser produzida no âmbito de um processo contraditório, onde se faculte às partes apresentar as suas razões e tê-las consideradas por todas as instâncias judiciais.
Com efeito, a coisa julgada é o divisor de águas entre a disputa de teses e a execução do direito do vencedor, se necessário com o emprego da força, e não é aceitável que esta seja utilizada precipitadamente.
É fato que a legislação admite a execução provisória das decisões atacadas por recursos desprovidos de efeito suspensivo, como são os dirigidos aos Tribunais Superiores. Mas esta exige o oferecimento de caução pelo interessado (CPC, art. 475-O, § 2º, II), de forma a garantir a eficácia do acórdão superior que acaso reverta a decisão exequenda.
Ultimamente, contudo, vozes importantes têm-se levantado pela execução definitiva dos julgados de segunda instância.
Tal execução definitiva de julgado não-definitivo é o cerne da PEC 15/2011, conhecida como PEC do Peluso, a nosso ver ofensiva a diversas cláusulas pétreas.
De saída, o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV), que em sua vertente substantiva exige mais do que o simples cumprimento das disposições legais, mirando também o seu conteúdo.
Deveras, a ser aprovada a emenda, a pessoa ver-se-á privada de seus bens ou de sua liberdade antes do pronunciamento dos órgãos de cúpula da estrutura judicial, a quem incumbe dar a última palavra sobre a interpretação da lei e da Constituição.
Ademais, os efeitos da decisão antecipadamente executada podem tornar-se na prática irreversíveis, pois não se cogita de devolução dos dias de liberdade suprimidos ao preso, e a restituição do tributo já pago far-se-á pela cada vez mais ineficaz via dos precatórios, para ficarmos nesses exemplos.
Por essas mesmas razões, são também violados o contraditório e a ampla defesa (CF, art. 5º, LV), que devem poder ser exercidos ex ante .
Arranhada será também a isonomia (CF, art. 5º, caput ), visto que decisões opostas sobre o mesmo tema serão passíveis de execução definitiva, o que anula o esforço de uniformização de mecanismos como a repercussão geral, a súmula vinculante e os recursos especiais repetitivos.
Isso para não falar na presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII), pois o confinamento na pendência de recursos para as Cortes Superiores que hoje é possível, ao contrário do que se alardeia, mas em regime de exceção (prisão cautelar) passará a ser a regra.
Embora o cenário anunciado pela PEC seja aterrador, a verdade é que ofensas mais graves aos direitos fundamentais escondem-se por trás da repercussão geral, introduzida pela EC 45/2004 e ora em plena aplicação, apesar da pendência da ADI 4.371/DF.
Consideramos positiva a racionalização do sistema de controle difuso de constitucionalidade, com seleção de caso líder, sobrestamento dos demais na origem e extensão automática a estes da decisão de mérito tomada pelo STF.
Inconstitucionalidade há apenas, a nosso ver, na faculdade conferida ao STF de escolher os recursos que vai julgar, o que equivale a reconhecer a existência de ofensas constitucionais de primeira e de segunda categoria.
De fato, o contraditório e a ampla defesa com todos os meios e recursos a ela inerentes (inclusive o recurso extraordinário) são garantias individuais, cujo exercício não pode ser submetido, nem mesmo por meio de emenda (CF, art. 60, § 4º, IV), à condição de transcendência social ou econômica da discussão.
Não bastasse isso, tem-se que o Supremo, ao negar a existência de repercussão geral a uma controvérsia, se demite de sua função de guardião da Carta Magna, compactuando com o risco de manutenção de uma inconstitucionalidade cuja existência só seria aferida após o julgamento de mérito do recurso prematuramente rechaçado.
A hipótese é novamente de execução definitiva de julgados conflitantes, com a diferença de que a virtual irreversibilidade de facto dos efeitos j...
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