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3 de Maio de 2024

Análise mais apurada da Lei Anticorrupção revela elementos de ordem penal

Publicado por Consultor Jurídico
há 10 anos

Mais uma vez tratamos da Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupcao). Das muitas questões levantadas sobre ela, destacamos uma que tem merecido especial atenção: qual a real natureza desta norma? Trata-se de uma lei meramente administrativa ou há elementos de direito penal material em seus dispositivos? A indagação — longe de ser meramente acadêmica — tem aspectos práticos relevantes, como mostram as seguintes considerações.

A lei apresenta-se como norma administrativa. Talvez o legislador não tenha definido os comportamentos ali descritos como crimes, nem as sanções como penas, para afastar problemas de constitucionalidade. Isso porque a norma destina-se a pessoas jurídicas e, nesta seara, há quem refute a adequação constitucional da criminalização destes entes[1], ou que limite tal hipótese aos âmbitos expressamente previstos na Carta Maior: atos contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular (CF, artigo 173, § 5º) ou contra o meio ambiente (CF, artigo 225, § 3º).

Para além disso, a lei trabalha com a responsabilidade objetiva, forma de imputação inconcebível na seara penal, ao menos em um ordenamento jurídico no qual a pena se assenta na culpabilidade.

Por isso, e talvez para evitar tais questionamentos, o legislador classificou as normas previstas na lei em comento como administrativas, afastando-a do terreno penal e das polêmicas que sempre o rondam.

No entanto, uma análise mais apurada do texto legal revela que, seja qual for o escopo do legislador, os comportamentos descritos e as consequências a eles atreladas, embora formalmente intitulados como “administrativos”, têm substância penal, ou quase penal[2]. Não se quer — nos estreitos limites deste texto — discutir os limites quantitativos ou qualitativos que marcam a fronteira entre o Direito Penal e o Administrativo[3]. Porém, uma rápida e superficial análise revela o quanto do primeiro há nos atos ilícitos e nas sanções previstas na Lei 12.846/2013.

Quanto aos atos ilícitos, quase todos têm correspondente na seara criminal, com uma ou outra distinção peculiar. O artigo 5º da Lei, por exemplo, elenca a prática ou o financiamento da corrupção ativa, o uso de interposta pessoa para ocultar interesses ou beneficiários dos atos ilícitos e a fraude à licitação, cujos correspondentes penais são conhecidos.

Quanto às consequências/sanções, sua extensão e gravidade são equiparadas às penais. Uma breve passagem de olhos pelas sanções penais aplicáveis às pessoas jurídicas previstas na Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998) demonstra que estas são mais brandas do que as instituídas pela lei pretensamente administrativa de combate à corrupção. Na primeira, a consequência mais grave é a interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade, ou a proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações (art. 22). Na segunda, a infração aos seus preceitos pode ensejar, além das mesmas sanções, o perdimento de bens e da dissolução compulsória da pessoa jurídica.

Isso significa que, independente do nome dado pelo legislador, a gravidade ou extensão das sanções previstas na Lei 12.846/2013 corresponde ou ultrapassa aquelas previstas em normas expressamente incriminadoras. Há um caráter de lei penal encoberta na norma em discussão.

Não cabe aqui discutir quais as implicações disso para a sua constitucionalidade. O que importa é destacar que, quanto mais nítido o caráter sancionador da lei — que no caso concreto se equipara à sanção penal —, mais legítimo exigir que algumas garantias do direito penal e do processo penal sejam reconhecidas quando de sua aplicação[4].

Nessa linha, inúmeras questões concretas podem ser levantadas, a começar pelos parâmetros para a interpretação da Lei Anticorrupcao. Sua natureza penal, ou quase-penal, impede a analogia ou o recurso a fontes que extrapolem o teor literal dos dispositivos. Assim, por exemplo, quando a lei fixa como ilícito o “uso de interposta pessoa jurídica para dissimular reais interesses ou a identidade dos beneficiados dos atos praticados” (artigo 5º, inciso III), a sanção somente poderá recair sobre aquele que usa a pessoa jurídica interposta e não sobre a própria pessoa jurídica int...

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1 Comentário

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Talvez esta lei tenha um dispositivo para punir os corruptos e corruptores não aliados a este governo, a exemplo da comissão da verdade, que só apura os excessos cometidos pelos aliados dos governos militares. Já os corruptos aliados desde governo, o mesmo sabe quem são, é só punir. A presidentaA faz parte do COI (ou Conivente ou Omissa ou Incompetente).
Pais rico é pais sem analfabeto funcional.!! continuar lendo