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16 de Junho de 2024

CPC e suas fundamentações perante STJ

Publicado por Alm Li Diane
há 8 anos

O novo Código de Processo Civil traz à luz da jurisprudência dos tribunais, notadamente do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Toda quinta-feira estaremos aqui para debater e examinar os julgados dos Tribunais (STF e STJ) que interpretaram os dispositivos do novo CPC.

A dinâmica dos julgamentos e o volume de processos, aliados à competência do STJ para interpretar e uniformizar a lei federal, e do STF para aplicar o CPC naquilo que diz respeito as suas atribuições, levam à necessidade de uma atualização constante do entendimento firmado por aquela Corte, seja para os “operadores” aplicadores do direito (advogados, públicos e privados, juízes, membros do MP, defensores e demais), seja para quem estuda o direito processual com fins acadêmicos ou até mesmo para concursos públicos.

Por essa razão, é que se pretende com esta coluna semanal deixar os leitores sempre atualizados acerca dos principais julgados do STF, do STJ, e de outros Tribunais, que tratem do novo CPC, sobretudo porque, por ser recente e extenso, esse código demanda diversas interpretações e uniformizações.

A coluna trata, hoje, de julgado do Superior Tribunal de Justiça que interpretou o art. 489, § 1º, IV, do CPC, o qual regula a necessidade de fundamentação das decisões judiciais pelos juízes. Diz a norma:

Art. 489.

§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

(…)

IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

Pela dicção do dispositivo, a decisão judicial não estará devidamente fundamentada se o julgador não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo pelas partes e que sejam capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.

E, se não estiver devidamente fundamentada, cabem embargos de declaração contra a decisão judicial que incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º, conforme prescreve o art. 1022 do CPC, parágrafo único, II, do Código.

Portanto, num raciocínio silogístico, se a decisão não rebateu todos os argumentos capazes de infirmar a conclusão do julgador, e se isso, pelo CPC, é considerado como decisão “não fundamentada”, logo cabem embargos declaratórios por ausência de fundamentação da decisão (omissão).

Todavia, o Superior Tribunal de Justiça não pensou exatamente dessa forma, ou, de maneira mais direta, deu uma interpretação diferente ao cabimento dos embargos nesse caso.

Disse a Corte que, mesmo após a vigência do CPC/2015, não cabem embargos de declaração contra decisão que não se pronuncie sobre argumento incapaz de infirmar a conclusão adotada.

Afirmou, ainda, que “o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão”.

Vejamos a ementa do acórdão, no ponto que interessa:

“O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida.”

Percebe-se ainda, que o próprio julgado afirma taxativamente que art. 489, § 1º, do CPC/2015 veio confirmar o entendimento do STJ, consolidado há anos, de que o julgador precisa enfrentar apenas as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão.

Feita a exposição do caso, cabe uma análise mais detida.

Não nos parece que tenha andado bem o Superior Tribunal de Justiça.

A dicção do art. 489, § 1º, do CPC não foi editada com o objetivo de se manter o status quo relativo ao cabimento dos embargos declaratórios.

Isso parece claro quando se observa que o texto legal afirma expressamente que falta fundamentação à decisão que “não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador”.

O núcleo do problema começa por compreender o que se entende por “infirmar”. De acordo com a definição técnica, infirmar é diminuir ou cessar a força jurídica de uma ação.

Dessa forma, pode-se dizer que se o juiz pretende acolher os argumentos do autor da ação, ele não precisa “infirmar” todos esses argumentos. Todavia, por outro lado, se pretende rejeitar o pedido, ou, ainda, se pretende afastar argumentos do réu para acolher o pedido do autor, aí sim ele precisa “infirmar” todos os pontos, porque, nesse caso, tais argumentos são direcionados exatamente para embasar a tese a ser acolhida (em caso de rejeição pelo juiz) ou rechaçar a tese do autor (em caso de acolhimentos dos fundamentos do autor).

Não pode o juiz, nessas hipóteses, escolher um argumento e fazê-lo de “argumento-mãe” para todos os demais, porque isso contrariaria a lógica do regramento legal acima exposto.

Além disso, há outro elemento constante no referido dispositivo que impede a interpretação dada pelo STJ: a expressão “em tese”. O dispositivo estabelece que o juiz deve rebater todos os argumentos que possam, em tese, infirmar a decisão.

Não se trata de expressão inserida aleatoriamente no código. Há uma razão de ser para tal expressão.

Com efeito, o seu objetivo é deixar claro que, mesmo que o juiz não vá utilizar tal argumento para sua conclusão, esse argumento deverá ser rebatido, porque, em tese, ele poderia tornar a decisão diversa. Não tornou diversa porque, ou o juiz não o levou em consideração, ou porque entendeu que outras teses eram suficientes para embasar seu entendimento.

Todavia, repita-se: em tese (teoricamente) o argumento era passível de modificar a conclusão. Portanto, o fato de já ter encontrado motivo suficiente para fundamentar sua decisão não retira a obrigatoriedade de se rebater todos os argumentos que, em tese, pudessem levar a uma conclusão diversa.

Fosse a interpretação do STJ correta, teríamos que ler o art. 489, § 1º, IV, do CPC da seguinte forma: considera-se não fundamentada a decisão que não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de infirmar a conclusão adotada pelo julgador..

Destarte, contendo a expressão “em tese”, ela não pode ser substituída por “na prática” ou mesmo deixar de ser lida pelo julgador, na medida em que isso seria permitir uma leitura da norma de forma diversa daquela indicada pelo legislador, ou mesmo permitir que o magistrado dê como não escrita a lei, e aplique como entender adequada.

O sistema de motivação de decisões judiciais de “fundamentação suficiente” para “fundamentação exauriste”.

Por fim, é de se observar que a exegese aferida pelo STJ no citado acórdão viola o princípio do contraditório, no seu aspecto substancial (a parte tem o direito de ver todos os seus argumentos analisados pelo juiz), porquanto faz do contraditório um mero formalismo, sem observar que aquilo que foi deduzido pelo réu deve ser levado em conta em toda a sua extensão.

Feitas as considerações, deve-se ressalvar, contudo, a existência de dois enunciados da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), que, muito embora não sejam vinculantes, nem tenham força para firmar convicções judiciais, expressam exceções que devem ser levadas em conta na análise do art. 489, § 1º, IV, do CPC, e com as quais concordamos:

Enunciado 12 – Não ofende a norma extraível do inciso IV do § 1º do art. 489 do CPC/2015 a decisão que deixar de apreciar questões cujo exame tenha ficado prejudicado em razão da análise anterior de questão subordinante.

Enunciado 13 – O art. 489, § 1º, IV, do CPC/2015 não obriga o juiz a enfrentar os fundamentos jurídicos invocados pela parte, quando já́ tenham sido enfrentados na formação dos precedentes obrigatórios.

Dessa forma, o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, e que já vem sendo seguido por ministros em decisões monocráticas, é perigoso porque, além de expressar uma jurisprudência defensiva, ofende o objetivo do legislador que foi exatamente dar concretude ao princípio do livre convencimento motivado.

Pretendeu-se com o dispositivo obrigar a que os magistrados fundamentem adequadamente as decisões, observando todos os argumentos das partes, sobretudo para rechaçá-los, impedindo que se utilizem de fundamentações genéricas ou parciais, sob o pretexto de já terem encontrado fundamentação suficiente para decidir.

CPC e suas fundamentaes perante STJ

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