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18 de Maio de 2024
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    Para punir índio, ele deve saber que cometeu ato ilícito

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 18 anos

    Imputabilidade é definida como a aptidão de o ser humano compreender que determinado fato não é lícito e de agir em conformidade com esse entendimento. É imputável a pessoa capaz de entender o caráter ilícito de um fato e determinar-se de acordo com tal entendimento[1]. Segundo Damásio Evangelista de Jesus[2], imputável “é o sujeito mentalmente são e desenvolvido, capaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento”.

    Dita o artigo 26 do Código Penal brasileiro ser isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

    O parágrafo único do artigo 26 do Código Penal prevê a possibilidade de redução da pena, de um a dois terços, se o agente não era capaz de entender o caráter ilícito do fato, ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

    Na lição de Francisco de Assis Toledo[3]: “Para que o agente de um crime seja, pois, dotado de imputabilidade, além da idade de 18 anos, deverá à época do fato estar no gozo de certas faculdades intelectivas e de determinado grau de saúde mental. A lei penal exprime essas exigências, de modo negativo, ao estabelecer as hipóteses de inimputabilidade ou de redução da responsabilidade (arts. 26 e parágrafo único e 28, §§ 1º e 2º).

    (...)

    As primeiras hipóteses de inimputabilidade estão previstas no artigo 26: tendo o legislador usado termos bastante genéricos, como facilmente se percebe, a exata extensão e compreensão das expressões ‘doença mental’ e ‘desenvolvimento mental incompleto ou retardado’ fica deferida ao prudente arbítrio do juiz que, em cada caso, se valerá do indispensável auxílio de perícias especializadas.

    O que importa ter em mente é a parte final do preceito, que traça os limites normativos extremos desse poder discricionário: doença ou qualquer anomalia que torne o agente, à época do fato, incapaz de ter a compreensão do injusto que realiza ou de orientar-se finalisticamente em função dessa compreensão.”

    Questão que inquieta os operadores do direito é a relacionada com a imputabilidade penal dos índios. No sítio eletrônico da Funai[4], consta estimativa de existirem no Brasil entre 100 e 190 mil índios vivendo fora das terras indígenas, inclusive em áreas urbanas. Não é rara na rotina forense, pois, a ocorrência de ações penais relacionadas com crimes praticados por índios em suas relações com a sociedade não índia envolvente, ou em suas próprias comunidades.

    Antes do advento da Constituição de 1988 e do novo Código Civil (Lei 10.406/02), a doutrina e a jurisprudência interpretavam a imputabilidade penal dos índios à luz do artigo 26 do Código Penal, e do artigo do Estatuto do Índio (Lei 6.001/1973), segundo o qual os índios são considerados isolados, em vias de integração, e integrados[5]. O entendimento predominante, em síntese, era no sentido da inimputabilidade dos índios isolados, da imputabilidade dos integrados e da necessidade de exame pericial para aferição da responsabilidade penal dos índios em vias de integração.

    Esse tratamento era forjado, sobretudo, na regra constante do artigo , inciso III, do Código Civil revogado (Lei 3.071/16), que elencava os índios entre os relativamente incapazes de praticar atos da vida civil, e pela ultrapassada visão integracionista que envolve o Estatuto do Índio, como se o ideal, o correto e inexorável fosse os índios deixarem de ser índios e, de forma paulatina, passassem a viver de acordo com a “doce, humana e pacífica” cultura dos não índios.

    A Constituição de 1988 reconhece a pluralidade étnica e cultural do país. Assegura aos índios o direito à alteridade, é dizer, o direito de serem diferentes e tratados como tais, direito esse reforçado pela Convenção 169 da OIT, ratificada pelo Brasil em 19.04.2004[6]. O Código Civil em vigor[7] dispõe que a capacidade dos índios será regulada por lei especial. Assim, emerge ultrapassada e incorreta qualquer interpretação que trate os índios como inimputáveis ou semi-imputáveis em virtude da diferença étnica.

    Como registrou Solange Rita Marczynsky[8], em debate promovido em abril de 1990 pela Comissão Pró-Índio de São Paulo em conjunto com a Procuradoria da República em São Paulo e a Faculdade de Direito da USP, Dalmo de Abreu Dallari assim se manifestou sobre o assunto:

    “Os índios brasileiros estão em diferentes estágios em relação ao conhecimento dos hábitos da sociedade nacional. Como exemplo, há índios com cursos universitários e índios que sequer falam o português. Existem índios que estão no meio do caminho. São situações diferenciadas e que merecem ser consideradas distintamente...o índio é mentalmente normal, o que ele tem é cultura diferente, e por ve...

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