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18 de Maio de 2024
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    Por Jonivaldo Santos: Resolução 88 do CNJ: seus defeitos

    Por Jonivaldo Santos (*)

    Recentemente, o CNJ editou um aditamento (o trocadilho não é proposital) à resolução888 de sua própria lavra. Por ele o horário de funcionamento dos judiciários do país todo devem ser o mesmo: das 09h às 18h.

    A intenção é boa, ampliar o atendimento ao jurisdicionado melhorando-o, porém o meio empregado esbarra em sérios problemas de ordem político-jurídica. Eles demonstram como a resolução 88 (e seu adendo), no seu mérito, enviesa por sérios erros de política pública e traz em si muito de atecnia jurídica reveladores de preocupação quanto aos atos desse órgão, cujas atribuições devem ser de natureza administrativa.

    Vamos aos problemas dessa resolução:

    1 – O funcionamento do judiciário e a jornada de trabalho dos seus servidores é matéria que tem de tratada por lei (lei formal) votada pelos legislativos da União (no caso das justiças federais) ou dos estados (caso das justiças estaduais). Existe inclusive lei estadual paraense regulamentando a matéria (Lei 5.810/94 – Regime Jurídico Único).

    Somente outra lei poderia modificar isso. A modificação desses itens, portanto, resta sujeita a reserva de lei; cabe ao legislativo, por iniciativa dos tribunais, cuidar da matéria (função legislativa). Logo, aqui, a resolução do CNJ esbarra no princípio da legalidade.

    O horário não pode ser modificado por resolução, e, por meio desta, não pode o CNJ ou qualquer outro órgão obrigar os estados a legislarem sobre o assunto, porque isso feriria o princípio constitucional da separação dos poderes. Esse é segundo problema;

    2 – A resolução do CNJ estabelece que os judiciários tenham de modificar seu horário de funcionamento e possivelmente alterar a jornada de trabalho dos seus servidores. Cria-se hipótese na qual um órgão administrativo obriga aos poderes judiciários dos estados e federais iniciarem processo legislativo e, pesme, garantir (obrigar) aos legisladores que aprovem tal modificação nos termos da resolução.

    O CNJ é órgão administrativo vinculado ao supremo tribunal federal. Um órgão do judiciário sem poder jurisdicional, strito sensu, não pode obrigar o legislativo a legislar sob pena de se estar ferindo a soberania do poder legislativo e se atacar o princípio da separação dos poderes previsto no art. da CF/88 C/C O art. 60, § 4, inciso I, da CF/88;

    3 – A resolução 88 do CNJ, ao ser taxativa em tentar obrigar os judiciários estaduais a modificarem seu horário de funcionamento e jornada dos seus servidores, fere também o princípio federativo de Estado previsto no art. 60, § 4, inciso I, da CF/88, pois tem a pretensão de obrigar aos estados a seguirem determinação em área afeta a reserva de lei sujeita a sua competência prevista constitucionalmente.

    Mais, ainda, a jornada de serviço dos servidores dos estados tem de ser regulada em regime jurídico único nos termos do art. 39 da CF/88, cabendo a iniciativa dessas leis ao chefe do poder executivos da União, dos estados e dos municípios, por simetria ao que ocorre na união em que o presidente da república tem a iniciativa do processo legislativo.

    Vale lembrar que o CNJ é órgão administrativo do poder judiciário da união e ele não pode obrigar aos estados onde a constituição lhes outorgou competência privativa (ou exclusiva);

    4 – Se aumentada jornada individual dos servidores do judiciário, como pretende o CNJ, sem a devida compensação financeira (na resolução não consta previsão de compensação) os servidores serão obrigados a trabalhar mais, ganhando a mesma coisa: haverá enriquecimento sem causa da administração pública em detrimento dos direitos sociais dos servidores, os quais tem os mesmo direitos dos demais trabalhadores: principalmente o de não serem explorados.

    5 – A resolução do CNJ, ao tentar ampliar e igualar as jornadas de serviço dos servidores e funcionamento dos judiciários do país, não previu que isso certamente implicará, pelo que visto acima, aumento de despesa para os judiciários o que não se coaduna com o disposto no art. 169, § 1º, inciso I, da CF/88, ou seja, há de haver dotação orçamentária para isso. E o orçamento desse ano já está em andamento. O do ano que vem ainda vai ser votado. Vale ressaltar quem o vota é o poder legislativo, que não está obrigado a incluir novas despesas; principalmente sem indicação de fonte de receita para custear. O CNJ não indica a fonte das receitas para cobrir essas despesas.

    6 – Essa resolução tem em si um mal terrível: iguala os desiguais e fere o princípio da isonomia. A função jurisdicional é una, porém a administração pública a qual vinculados estão os judiciários não é. É sabido que os judiciários federais pagam bem melhor, em média, os seus servidores e magistrados, que os judiciários estaduais. Isso porque contam com orçamentos diferentes, quanto à fonte de receitas, e desiguais em termos quantitativos. E porque constitucionalmente os estados possuem sua autonomia. Por isso o Estado brasileiro é organizado na forma de federação. O estado tem possuir autonomia. do contrário haveria estado unitário. Porque não se promover isonomia de vencimentos entre os servidores de judiciários diferentes, que exercem funções semelhantes?

    Igualando a jornada de trabalho o CNJ somente faz aprofundar mais a desigualdade. Os servidores que ganham menos (do judiciário estadual) correm o risco de ter de trabalhar mais ainda pelo mesmo ganho.

    Se atendida a resolução, corre-se o risco de se ferirem os princípios constitucionais, acima, e, ainda, ferir-se a responsabilidade fiscal por aumento de despesa sem indicação de fonte de receita para cobrir o gasto criado.

    Se aumentada jornada individual dos servidores do judiciário, como pretende o CNJ, sem a devida compensação financeira (na resolução não consta previsão de compensação) os servidores serão obrigados a trabalhar mais ganhando a mesma coisa: haverá enriquecimento sem causa da administração pública em detrimento dos direitos sociais dos servidores, os quais tem os mesmo direitos dos demais trabalhadores: principalmente o de não serem explorados. Toda trabalhada tem de ser paga. Isso se chama justiça social.

    Em suma, a resolução do CNJ é cheia de falhas que ferem a constituição, soa perigosa ao princípio federativo de estado, ao princípio da separação dos poderes (cláusulas pétreas), princípio da legalidade; todos albergados na constituição de 1988, e princípios basilares e básicos de orçamento público, os quais tocam diretamente a política pública. Esses últimos, muito provavelmente, matérias com as quais o CNJ tem dificuldade de lidar.

    * Jonivaldo Santos É cientista social e reside em Santarém.

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