Possíveis riscos aos usuários do Sistema Bitcoin em caso de conteúdo pornográfico na Blockchain envolvendo crianças ou adolescentes
Dando continuidade ao tema Bitcoin, trato agora de alguns possíveis riscos decorrentes das nova tecnologia em caso de conteúdo ilícito.
Em relação ao conteúdo envolvendo fotos ou vídeos de crianças nuas e demais conteúdos que caracteriza pedofilia, teoricamente, todos os participantes de uma blockchain (rede que permite o funcionamento da bitcoin), podem ser enquadrados nas seguintes condutas: Enviar ou trocar fotos de crianças nuas (crime de pedofilia – artigo 247 da Lei nº 8.069/1990, Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (GIMENES, 2013).
As Infrações relacionadas com pornografia infantil nas quais os usuários de uma Rede Bitcoin poderiam ser enquadrados, em caso de conteúdo pedófilo, encontram-se previstas nos Arts. 241-A, 241-B e 241-C do ECA .
Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente […];
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente […];
Art. 241-C. Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, pública ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do caput deste artigo.
Considerando-se o conteúdo constante nos artigos supracitados, em um primeiro olhar, poder-se-ia dizer que todos que armazenaram ou participaram de transações envolvendo bitcoin, poderiam ser enquadrados nesses tipos penais em caso de existir essa espécie de conteúdo codificado na Blockchain. No entanto, em um olhar mais atento, pode-se considerar como não cabível essa imputação sem violar um princípio central do Direito Penal: o Princípio da Legalidade.
O Princípio da Legalidade está previsto no Art. 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal de 1988, cuja redação é, in verbis: “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Ainda, o Princípio da Legalidade é encontrado em legislação infraconstitucional, estando presente no Art. 1º, do Código Penal, que assim declara, in verbis: “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal” O termo “lei”, nessa hipótese, é reservado ao sentido estrito, ou seja, norma emanada do poder Legislativo, dentro de sua esfera de competência. A matéria penal (definição de crime e cominação de pena) é reserva de lei, não se podendo acolher qualquer outra fonte normativa para tanto, pois seria inconstitucional. Inclusive, remontaria à Magna Carta de 1215, editada na Inglaterra, a raiz histórica do princípio da legalidade.
Ainda, para ser possível a imputação de determinada conduta delituosa como crime a determinada pessoa, nos termos do Código Penal, é necessário que exista uma conduta, comissiva ou omissiva, que tenha concorrido para que tal resultado se tenha materializado, do contrário, a conduta torna-se atípica. Art. 13 do Código Penal, in verbis: “O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”. Ainda, diz o Art. 29: “Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas, a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”.
No entanto, apesar dessa realidade, a Bitcoin é uma tecnologia relativamente nova e ainda há um número relativamente pequeno de pesquisas dedicadas aos procedimentos, artefatos forenses específicos, sistemas afetados pelo uso dessa modalidade de contabilidade financeira, o que esses artefatos significam e como recuperá-los.
Dessa forma, em função de alguém receber, ao realizar uma transação envolvendo a criptomoeda bitcoin, e juntamente à Blockchain receber conteúdo pornográfico envolvendo crianças ou adolescentes, baixar, armazenar em dispositivo informático ou repassar esse mesmo conteúdo a alguém como parte de uma transação legítima envolvendo essa nova forma de moeda, essa pessoa não poderá ser responsabilizada penalmente quanto a esse conteúdo censurável, uma vez que esse não atuou no sentido de realizar ato ilícito, apenas participou de uma ou mais operações legítimas e legais envolvendo bitcoin. Tal entendimento decorre do fato de, por exigência da forma como funciona o Sistema Bitcoin, todas as informações acrescentadas à Blockchain serão copiadas sempre que ocorrer uma atividade envolvendo a criptomoeda, pois tais informações, juntamente aos autenticadores e as informações de tempo, que impedem o duplo gasto do bitcoin. Apenas quem tiver atuado dolosamente a fim de acrescentar esse conteúdo ilícitos à Blockchain poderá ser punido pelos crimes constantes dos Arts. do ECA.
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