Resumo do Informativo nº 942 do STF
Disponibilizo um resumo com o conteúdo pertinente às ciências criminais. Cadastre-se nos sites do STF e STJ para receber os Informativos de Jurisprudência. Manter-se atualizado é essencial ao operador do Direito.
Brasília, 27 a 31 de maio 2019
Data de divulgação: 5 de junho de 2019
Sumário
Plenário
CLT, art. 394-A: atividade insalubre e afastamento de gestante e de lactante
Venda de empresa estatal e autorização legislativa – 1
Repercussão Geral
Limitação de compensação de prejuízos fiscais
1ª Turma
CNJ: estatização de serventia judicial e provimento anterior à CF/1988 – 3
Competência dos municípios para legislar e tempo máximo de espera em fila
Decisões do CADE e atuação do Poder Judiciário
2ª Turma
CPI e comparecimento compulsório
Acordo de colaboração premiada e ausência de direito líquido e certo
Segunda Turma
DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
CPI e comparecimento compulsório
A Segunda Turma, diante de empate na votação, concedeu a ordem de habeas corpus para convolar a compulsoriedade de comparecimento em facultatividade e deixar a cargo do paciente a decisão de comparecer, ou não, à Câmara dos Deputados, perante comissão parlamentar de inquérito (CPI), para ser ouvido na condição de investigado.
Além disso, a Turma assegurou ao paciente, caso queira comparecer ao ato: a) o direito ao silêncio, ou seja, a não responder perguntas a ele direcionadas; b) o direito à assistência por advogado durante o ato; c) o direito de não ser submetido ao compromisso de dizer a verdade ou de subscrever termos com esse conteúdo; e d) o direito de não sofrer constrangimentos físicos ou morais decorrentes do exercício dos direitos anteriores.
No caso, o paciente foi convocado para comparecer à Câmara dos Deputados, perante CPI que está investigando as causas do rompimento de barragem da empresa de mineração da qual foi presidente.
O colegiado rememorou que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem entendido que, tal como ocorre em depoimentos prestados perante órgãos do Poder Judiciário, é assegurado o direito de o investigado não se incriminar perante CPI (HC 79.812).
O direito ao silêncio, que assegura a não produção de prova contra si mesmo, constitui pedra angular do sistema de proteção dos direitos individuais e materializa uma das expressões do princípio da dignidade da pessoa humana.
Esse princípio proíbe a utilização ou a transformação do homem em objeto dos processos e ações estatais. O Estado está vinculado ao dever de respeito e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas ou humilhações.
O direito à não autoincriminação tem fundamento mais amplo do que o expressamente previsto no art. 5º, LXIII, da Constituição Federal. Em verdade, ele é derivado da união de diversos enunciados constitucionais, entre os quais os dos arts. 1º, III (dignidade humana), e 5º, LIV (devido processo legal), LV (ampla defesa) e LVII (presunção de inocência).
Ademais, o direito ao silêncio foi consagrado em tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário, que enunciam o direito do acusado de não depor contra si mesmo (Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, art. 14, 3, g, em execução por força do Decreto 592/1992; e Pacto de São José da Costa Rica, art. 8.2, g, em execução por força do Decreto 678/1992).
O ministro Gilmar Mendes (relator) entendeu que, por sua qualidade de investigado, o paciente não pode ser convocado a comparecimento compulsório, menos ainda sob ameaça de responsabilização penal, no que foi acompanhado pelo ministro Celso de Mello.
Para o relator, se o paciente não é obrigado a falar, não faz qualquer sentido que seja obrigado a comparecer ao ato, a menos que a finalidade seja de registrar as perguntas que, de antemão, todos já sabem que não serão respondidas, apenas como instrumento de constrangimento e intimidação. O ministro Celso de Mello acompanhou o relator.
Os ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia deferiram o habeas corpus em menor extensão, pois tão somente não convolaram a compulsoriedade do comparecimento em faculdade. Desse modo, mantiveram a necessidade de comparecimento do paciente à CPI.
HC 171438/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento 28.5.2019. (HC-171438)
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – MANDADO DE SEGURANÇA
Acordo de colaboração premiada e ausência de direito líquido e certo
A Segunda Turma negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão que indeferiu mandado de segurança impetrado por condenado em duas ações penais contra ato da Procuradoria-Geral da República (PGR).
O colegiado entendeu inexistir direito líquido e certo a compelir o ministério público à celebração do acordo de delação premiada, diante das características do acordo de colaboração premiada e da necessidade de distanciamento do Estado-juiz do cenário investigativo.
Observou que, na linha do que decidido no HC 127.483, o acordo de colaboração premiada, além de meio de obtenção de prova, constitui negócio jurídico processual personalíssimo, cuja conveniência e oportunidade não se submetem ao escrutínio do Estado-juiz. Trata-se, portanto, de ato voluntário por essência, insuscetível de imposição judicial. Ademais, no âmbito da formação do acordo de colaboração premiada, o juiz não pode participar das negociações realizadas entre as partes, por expressa vedação legal (Lei 12.850/2013, art. 4º, § 6º) (1). Isso decorre do sistema acusatório, que desmembra os papéis de investigar e acusar e aqueles de defender e julgar e atribui missão própria a cada sujeito processual.
Aduziu ser possível cogitar que o acusado ostente direito subjetivo à colaboração (atividade, e não negócio jurídico), comportamento processual sujeito ao oportuno exame do Poder Judiciário, por ocasião da sentença. Essa compreensão, no entanto, não se estende, necessariamente, ao âmbito negocial.
Ao fazer a distinção entre a colaboração premiada e o acordo de colaboração premiada, frisou que a primeira é realidade jurídica em si mais ampla que o segundo. Explicou que uma coisa é o direito subjetivo à colaboração e, em contrapartida, a percepção de sanção premial correspondente a ser concedida pelo Poder Judiciário. Situação diversa é a afirmação de que a atividade colaborativa traduz a imposição do Poder Judiciário ao ministério público para fim de celebrar acordo de colaboração ainda que ausente voluntariedade ministerial. Citou, no ponto, o disposto no § 2º do art. 4º da Lei 12.850/2013 (2), que estabelece a possibilidade, em tese, até mesmo de perdão judicial, ainda que referida sanção premial não tenha sido prevista na proposta inicial. Registrou que, no mesmo sentido, diversos diplomas normativos antecedentes à Lei 12.850/2013 já previam essa possibilidade de concessão de sanção premial, sem a exigência da celebração de acordo de colaboração, o qual, embora confira maior segurança jurídica à esfera do colaborador, não se revela indispensável à mitigação da pretensão punitiva. Portanto, independentemente da formalização de ato negocial, persiste a possibilidade, em tese, de adoção de postura colaborativa e, ainda em tese, a concessão judicial de sanção premial condizente com esse comportamento.
Considerou, também, as razões explicitadas pelo ministério público, em sede de discricionariedade regrada, para afastar, no caso concreto, a celebração do acordo de colaboração. A PGR afirmou que os elementos de corroboração apresentados não se revestem da consistência necessária à elucidação do que relatado, nem são conclusivos quanto à certificação das irregularidades apontadas, para afastar, no caso concreto, a celebração do acordo de colaboração. Essa motivada valoração, sob o ponto de vista negocial, não se submete ao crivo do Poder Judiciário, sob pena de se afetar, diretamente, a própria formação da independente convicção ministerial. Por isso, com fundamento no princípio acusatório, cabe exclusivamente ao ministério público avaliar a conveniência e a oportunidade de celebração do ato negocial, resguardando-se os direitos do agente em caso de não formalização do acordo de efetiva colaboração ao exame dessa colaboração pelo Estado-juiz na fase de sentença.
Evidenciou que a ausência de acordo de colaboração, em tese, pode se submeter a eventual escrutínio implementado no seio do próprio ministério público, aplicando-se, por analogia, o art. 28 do Código de Processo Penal (CPP) (3). Essa realidade, no entanto, não se coloca no caso concreto, visto que o ato coator é atribuído à PGR, chefe do Ministério Público da União, o que atrai a incidência da regra que prescreve a inviabilidade de atuação das câmaras de coordenação e revisão nessa hipótese [Lei Complementar 75/1993 (LC), art. 25 c/c o art. 62, IV] (4).
Por fim, o colegiado atentou para o fato de que a autoridade apontada como coatora, ao rejeitar a proposta de formalização do acordo, determinou a devolução, ao impetrante, dos anexos e documentos de corroboração eventualmente fornecidos. Afirmou que esses documentos não consubstanciam elementos de prova, ou seja, não integram arcabouço apto a propiciar a demonstração de possíveis teses acusatórias vertidas pelo titular da ação penal.
O ministro Gilmar Mendes acompanhou o voto do relator, mas, à guisa de obiter dictum, assentou premissas ao modelo de colaboração premiada brasileiro diante de omissões relevantes na legislação pertinente. As premissas foram endossadas pelos ministros Celso de Mello e Ricardo Lewandowski.
Para o ministro Gilmar Mendes, a negativa de realização do acordo por parte do órgão acusador deve ser devidamente motivada e orientada pelos critérios definidos em lei. Essa recusa também pode ser objeto de controle por órgão superior no âmbito do ministério público, por aplicação analógica do art. 28 do CPP. Ademais, informações ou elementos produzidos por investigados em negociações de acordo de colaboração premiada não formalizado não podem ser utilizadas na persecução penal. Por fim, o juiz, na sentença, pode conceder benefício ao investigado mesmo sem prévia homologação de acordo de colaboração premiada.
O ministro Celso de Mello ressaltou a importância de se estabelecer esses parâmetros em ordem a evitar abusos por parte do Estado e frustração da confiança depositada nos seus agentes por potenciais agentes colaboradores.
(1) Lei 12.850/2013: “Art. 4º O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados: (...) § 6º O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor.”
(2) Lei 12.850/2013: “Art. 4º (...) § 2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).”
(3) CPP: “Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.”
(4) LC 75/1993: “Art. 25. O Procurador-Geral da República é o chefe do Ministério Público da União, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, permitida a recondução precedida de nova decisão do Senado Federal. (...) Art. 62. Compete às Câmaras de Coordenação e Revisão: (...) IV – manifestar-se sobre o arquivamento de inquérito policial, inquérito parlamentar ou peças de informação, exceto nos casos de competência originária do Procurador-Geral;”
MS 35693 AgR/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 28.5.2019. (MS-35693)
http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo.htm
Supremo Tribunal Federal - STF
Secretaria de Documentação – SDO
1 Comentário
Faça um comentário construtivo para esse documento.
matérias didático de suma importância para apresentar em petição recorrida contra vício de irregularidade em setores insalubres contra gestantes e de lactantes. muito importante e de grande relevância, muito obrigado por todas as informações. continuar lendo