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16 de Junho de 2024
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    TJ-AC - Militar homossexual preso por deserção pede liberdade

    Publicado por JurisWay
    há 16 anos

    por Priscyla Costa

    A defesa do militar Laci Marinho de Araújo, preso sob a acusação de deserção dias depois de ter assumindo que é homossexual, entrou com pedido de Habeas Corpus, no Superior Tribunal Militar, para livrar o sargento da prisão provisória. O pedido é assinado pelos advogados Marcio Gesteira Palma, Beatriz Vargas e Fernando Goulart.

    Laci Marinho de Araújo foi preso na madrugada de 4 de junho. Três dias antes ele e seu companheiro foram capa da revista Época, na qual deram entrevista assumindo que eram gays. Eles foram ao programa Super Pop, da Rede TV!, pelo mesmo motivo. No final do programa, Araújo foi surpreendido com um decreto de prisão por ser considerado desertor.

    A acusação veio porque Araújo não compareceu ao trabalho, no Hospital Geral de Brasília, até o dia 3 de abril de 2008. Como não foi trabalhar por mais de oito dias, ficou configurada a deserção. Ele diz que não foi ao trabalho por ter doenças psiquiátricas.

    A defesa do sargento afirma que a prisão provisória é ilegal porque a Constituição Federal impede o cumprimento antecipado da pena. “A prisão, antes do trânsito em julgado de sentença condenatória, constitui-se medida excepcional. E justamente por conta disto, só pode ser mantida em hipóteses específicas, sempre para assegurar o processo de conhecimento e permitir sua efetividade. No presente caso, a prisão provisória é mantida por si só, prolongando-se no tempo, sem que se aponte sua necessidade para qualquer fim relativo ao processo”, argumentam os advogados.

    “Qualquer pena aplicada só poderá advir de sentença condenatória transitada em julgado. O encarceramento como punição, em qualquer momento distinto da sentença condenatória ainda pendente de recurso, constitui flagrante inconstitucionalidade”, alegam.

    Os advogados deixam claro que o pedido de Habeas Corpus não questiona a acusação de deserção, mas a “inconstitucionalidade da manutenção da constrição provisória sem que se aponte sua necessidade”. “Por conta de uma decisão inidônea, o paciente vem sofrendo os efeitos de uma punição antecipada, vez que sua manutenção no cárcere, fruto do que já se pode denominar de renitência judicial, tem-se revelado, há muito, completamente desnecessária”, defendem.

    Leia o pedido

    Excelentíssimo Ministro Presidente do Superior Tribunal Militar

    MARCIO GESTEIRA PALMA, BEATRIZ VARGAS e FERNANDO GOULART, brasileiros, advogados, inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Seccional do Distrito Federal, respectivamente, sob os números 21.878, 26.483 e 24.633, com escritório profissional em Brasília, DF, vêm a Vossa Excelência, com fundamento no inciso LXVIII , do artigo , da Constituição da Republica Federativa do Brasil e na conformidade dos artigos 466 e seguintes do Código de Processo Penal Militar , impetrar a presente ordem de

    HABEAS CORPUS,

    com requerimento de concessão de medida liminar,

    em favor de LACI MARINHO DE ARAÚJO, brasileiro, solteiro, 2º Sargento do Exército Brasileiro, RG nº xxxx-MD/EB, CPF nº xxxxxx, residente e domiciliado na SQN xxx, bloco x, aptº xxx, Asa Norte, Brasília, DF, hoje ilegalmente recolhido ao xadrez do Batalhão de Polícia do Exército de Brasília.

    Aponta-se como autoridade coatora o Conselho Permanente de Justiça para o Exército, Auditoria da 11ª Circunscrição Judiciária Militar que, por unanimidade, nos autos da ação penal nº 529/03-3, negou pedido de liberdade provisória e indeferiu pleito de concessão de menagem, chancelando indubitável constrangimento ilegal que o paciente está a suportar desde o dia 4 de junho passado, quando foi preso.

    1 — FATOS

    1. O paciente, portador de enfermidades psíquicas diagnosticadas desde o ano de 2003 (doc. 1), vem sofrendo graves crises de saúde que redundaram em seu afastamento das funções desenvolvidas no Exército Brasileiro, a partir do ano 2006 – tudo com lastro em exames médicos produzidos e renovados, de tempos em tempos, por junta médica militar

    2. Apesar de possuir um longo histórico médico atestado por laudos oficiais, como também laudo psiquiátrico elaborado por médica particular especialista (doc. 2) – que, no dia 21 de março passado, concluiu pela incapacidade para o serviço militar pelo prazo de trinta (30) dias ― o paciente foi novamente avaliado, em 28 de março de 2008, por junta médica do Exército que, nesta oportunidade, o declarou apto para o serviço militar, com restrições, conforme documento assinado pela junta médica presidida pelo Major Américo Birajara (doc.3).

    3. No dia 4 de abril do corrente ano, por intermédio de seu procurador, Fernando Alcântara ― meio de notificação não previsto na legislação que deveria reger o procedimento, mas que, neste momento, não se questionará ― “recebeu” comunicado do Comandante do Contingente, convocando-o para se apresentar ao exercício do seu mister, a partir do dia 3 de abril de 2008 (doc.4).

    4. Irresignado com a conclusão médica e impossibilitado de atender ao chamamento de seu superior, uma vez que se encontrava acamado, requereu, tempestivamente, a anulação do laudo proferido pela junta. (doc.5).

    5. Antes de se processar o pedido de anulação do laudo – que, convém registrar desde logo, surtiu efeito, vez que nova junta foi formada e marcada outra visita médica ao paciente[1]― o diretor do Hospital Geral de Brasília, Cel . Antônio André Cortes Marques, no dia 4 de abril de 2008, ofereceu Parte de Ausência nº 54 – Contg, reclamando providências, visto que o paciente estaria faltando à Organização Militar de Saúde (doc. 6).

    6. Concluindo pela deserção do paciente, o diretor do Hospital Geral de Brasília, no dia 15 de abril passado, remeteu à Juíza-Auditora da 11º Circunscrição Judiciária Militar Instrução Provisória de Deserção, a qual, por determinação do Juízo, foi encaminhada ao Ministério Público Militar.

    7. Acreditando, ao menos em tese, estar configurado o crime de deserção, o Parquet das armas requereu a expedição de Ordem de Busca e Apreensão em desfavor do paciente, o que restou deferido, nos seguintes termos:

    (...)

    DEFIRO o requerimento feito e, nos termos legais, DETERMINO a realização, com as cautelas legais, de BUSCA DOMICILIAR na SQN 306, Bloco “J”, Apt 101, Asa Norte, Brasília/DF, a ser realizada pelo Diretor Hospital-Geral de Brasília, ou quem suas vezes fizer, e os militares por ele designados para tal fim, com CAPTURA, na forma da lei, do desertor 2º Sargento Exército Brasileiro LACI MARINHO DE ARAÚJO, já identificado nos autos (...) Brasília – DF, 20 de maio de 2008. (doc.7)

    8. Após incursões realizadas para dar cumprimento ao mandado de busca domiciliar e prisão expedido por aquele Juízo, por volta das 3 horas, do dia 4 de junho de 2008, o paciente foi preso na cidade de São Paulo/SP – onde havia participado de programa televisivo.

    9. Efetivadas a prisão e a transferência do preso para Brasília/DF, no dia 12 de junho passado, o Ministério Público Militar ofereceu denúncia, imputando ao paciente a prática do crime definido no tipo penal do artigo 187 (deserção), do Código Penal Militar , in verbis:

    (...) oferece DENÚNCIA contra LACI MARINHO DE ARAÚJO (...) em razão de ter deixado de comparecer para o expediente em sua Unidade, no dia 03 de abril de 2008, embora tenha sido considerado “apto” para o serviço pela junta Médica que o examinou (fls. 111) e tenha sido expressamente notificado para tanto (fls. 112), tendo completado à 00:00 (zero) hora do dia 12 subseqüente, os dias preconizados em lei, para que se consumasse o crime de Deserção, conforme narrado no respectivo Termo de fls. 28.

    (...)

    Ante o exposto, REQUER o Órgão Ministerial seja recebida a presente Denúncia, com a citação do 2º Sargento do Exército LACI MARINHO DE ARAÚJO, para se ver processar e julgar perante esse Juízo, como incurso no ar1878787 , da Lei Substantiva Castrense. (doc. 8)

    10. Antes de lhe haver sido facultada vista dos autos, a defesa técnica requereu, no dia 13 de junho passado, ao Juízo da 11ª CJM , a concessão do benefício da menagem e, alternativamente, a transferência do paciente para um hospital, local adequado aos fins de atendimento médico que o quadro de saúde do paciente está a reclamar (doc. 9).

    11. Na data aprazada para a qualificação e o interrogatório, e ainda em momento anterior à audiência, a defesa protocolizou pedido de concessão de liberdade provisória ao paciente ou, alternativamente, concessão da menagem domiciliar, reiterando os demais termos do requerimento anterior (doc. 10).

    12. Apreciando o pleito de concessão de liberdade provisória, o Conselho Permanente da 11ª Circunscrição Judiciária Militar, à unanimidade, decidiu o seguinte:

    (...)

    É O RELATÓRIO

    (...)

    Verifica-se que legalmente está prevista e autorizada a prisão do desertor, até sessenta dias antes de seu julgamento. O prazo legalmente fixado e o momento de sua realização evidenciam a natureza provisória daquela prisão. Considerando que o Código de Processo Penal Militar iniciou sua vigência em 1969, e que a constituição Federal atual é de 1988, indaga-se acerca da possibilidade daquela prisão e de sua manutenção violar normas constitucionais que reconhecem e protegem a liberdade individual, além da consagração do princípio da presunção de inocência do réu antes do trânsito em julgado de sentença condenatória. Examinando-se a Constituição Federal vigente, verifica-se que o inciso LXI , de seu artigo , estabelece que (...)

    Sendo a deserção um crime propriamente militar, verifica-se que a Constituição recepcionou a norma legal que sujeita o desertor à prisão provisória, autorizando, numa exceção especialíssima, que seja ele preso independente de ordem judicial. Ser o desertor levado à prisão é, portanto, legal e constitucional. E afirma a norma constitucional que o preso não deverá ser mantido nessa condição se a lei admitir a liberdade provisória, e a lei aplicável ao desertor é uma lei especial – que pela sua natureza derroga a lei geral –, consubstanciada no Diploma Processual já referido, o qual veda a concessão de liberdade provisória em seu artigo 270 , Parágrafo único , alínea b, in fine. Assim, se o Constituinte faz remissão à lei, como norma infraconstitucional, e esta não só não admite a liberdade provisória como também expressamente a veda, não há fundamento legal para atendimento do pleito da Defesa (...) (grifou-se) (doc. 11)

    13. O ato decisório proferido pelo Conselho Permanente carece de fundamentação idônea para justificar a manutenção da medida de exceção, uma vez que a decisão se escora, exclusivamente, no dispositivo legal que determina a prisão automática do acusado de deserção.

    14. Tal determinação normativa, que serve para que se prenda, mas não é suficiente para a mantença da prisão ― que antes do trânsito em julgado de uma condenação, deve possuir índole processual, sob pena de se travestir em punição antecipada ― configura-se inegável coação contra o direito de ir e vir do paciente, a qual deve ser sanada pela via do habeas corpus.

    2- DIREITO

    15. A Constituição da República, com extrema clareza, faz valer, em seu artigo , inciso LVII , o princípio cogente da presunção de inocência — ou, como preferem alguns, princípio da presunção de não-culpabilidade — que está a exigir o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, para que, a partir daí, o acusado venha a merecer tratamento penal decorrente da condição de culpado, incidindo, por conseguinte, os efeitos da condenação.

    16. Sabe-se que o princípio da presunção de inocência não possui caráter absoluto. Não é menos sabido, contudo, que o sacrifício da liberdade, como medida processual, somente é tolerado como decorrência da demonstração – sob forte fundamentação – quanto à imprescindível necessidade da custódia provisória, o que – pode-se afirmar, sem chance de erro – não se faz presente neste caso.

    17. A decisão, de forma equivocada, parte da premissa de que o simples procedimento que antecede a propositura da ação penal – Instrução Provisória de Deserção – é suficiente para gerar a privação da liberdade de maneira imediata e automática e, depois, para mantê-la, dispensando-se qualquer justificação ou demonstração da necessidade da medida para que ela se estenda no tempo.

    18. O entendimento que ali se manifesta é de que a custódia deve perdurar, no mínimo, por 60 dias, com exclusivo fundamento na regra processual militar, independentemente da demonstração de sua necessidade.

    19. O ato coator parte do pressuposto de que o art. 453 do Código de Processo Penal Militar se sobrepõe à garantia constitucional da presunção de inocência, entendendo que o princípio cogente não se aplica àquele que responde a ação penal militar por crime de deserção.

    20. Contudo, não é esta a posição do Supremo Tribunal Federal , conforme se pode auferir de seus recentes julgados.

    21. A Suprema Corte, sob a lente da interpretação constitucional, tem decidido pela prevalência da garantia também para o acusado da prática de crime propriamente militar, afirmando que “a decretação judicial da custódia cautelar deve atender, mesmo na Justiça castrense, aos requisitos previstos para a prisão preventiva nos termos do art. 312 do CPP”. Veja-se:

    EMENTA: Habeas Corpus. 1. No caso concreto, alega-se falta de fundamentação de acórdão do Superior Tribunal Militar (STM) que revogou a liberdade provisória do paciente por ausência de indicação de elementos concretos aptos a lastrear a custódia cautelar. 2. Crime militar de deserção (CPM , art. 187). 3. Interpretação do STM quanto ao art. 453 do CPPM ("Art. 453. O desertor que não for julgado dentro de sessenta dias, a contar do dia de sua apresentação voluntária ou captura, será posto em liberdade, salvo se tiver dado causa ao retardamento do processo"). O acórdão impugnado aplicou a tese de que o art. 453 do CPPM estabelece o prazo de 60 (sessenta) dias como obrigatório para a custódia cautelar nos crimes de deserção. 4. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), a concessão da liberdade provisória, antes de ultimados os 60 (sessenta) dias, previstos no art. 453 do CPPM, não implica qualquer violação legal. O Parquet ressalta, também, que o decreto condenatório superveniente, proferido pela Auditoria da 8ª CJM , concedeu ao paciente o direito de apelar em liberdade, por ser primário e de bons antecedentes, não havendo qualquer razão para que o mesmo seja submetido a nova prisão. 5. Para que a liberdade dos cidadãos seja legitimamente restringida, é necessário que o órgão judicial competente se pronuncie de modo expresso, fundamentado e, na linha da jurisprudência deste STF, com relação às prisões preventivas em geral, deve indicar elementos concretos aptos a justificar a constrição cautelar desse direito fundamental (CF , art. , XV - HC nº 84.662/BA , Rel. Min. Eros Grau, 1ª Turma, unânime, DJ 22.10.2004; HC nº 86.175/SP , Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, unânime, DJ 10.11.2006; HC nº 87.041/PA , Rel. Min. Cezar Peluso, 1ª Turma, maioria, DJ 24.11.2006; e HC nº 88.129/SP , Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, unânime, DJ 17.8.2007). 6. O acórdão impugnado, entretanto, partiu da premissa de que a prisão preventiva, nos casos em que se apure suposta prática do crime de deserção (CPM , art. 187), deve ter duração automática de 60 (sessenta) dias. A decretação judicial da custódia cautelar deve atender, mesmo na Justiça castrense, aos requisitos previstos para a prisão preventiva nos termos do art. 312 do CPP . Precedente citado: HC nº 84.983/SP , Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, unânime, DJ 11.3.2005. Ao reformar a decisão do Conselho Permanente de Justiça do Exército, o STM não indicou quaisquer elementos fático-jurídicos. Isto é, o acórdão impugnado limitou-se a fixar, in abstracto, a tese de que "é incabível a concessão de liberdade ao réu, em processo de deserção, antes de exaurido o prazo previsto no art. 453 do CPPM". É dizer, o acórdão impugnado não conferiu base empírica idônea apta a fundamentar, de modo concreto, a constrição provisória da liberdade do ora paciente (CF , art. 93 , IX). Precedente citado: HC nº 65.111/RJ , julgado em 29.5.1987, Rel. Min. Célio Borja, Segunda Turma, unânime, DJ 21.8.1987). 7. Ordem deferida para que seja expedido alvará de soltura em favor do ora paciente. (HC 89.645 ; relator: Min. Gilmar Medes, 2º Turma, DJ de 28.9.2007).

    Revista Consultor Jurídico, 17 de julho de 2008

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