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4 de Maio de 2024
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    Tutela provisória de urgência no NCPC: perplexidades em torno da unificação de seus pressupostos

    Publicado por Justificando
    há 8 anos

    A começar pela própria terminologia, o tema da tutela provisória sempre foi objeto de inúmeras polêmicas entre nós.

    À luz do CPC/1973, costumávamos colocar, de um lado, a “tutela antecipada”, destinada a permitir a imediata realização prática do direito, podendo fundamentar-se, para tanto, na urgência (ex: realização imediata de uma cirurgia) ou na evidência (ex: abuso do direito de defesa); de outro lado, a “tutela cautelar”, voltada a assegurar a efetividade de processo futuro, sempre baseada numa situação de perigo de dano, a exemplo de um arresto cautelar. Daí se popularizar a dicotomia “tutela antecipada (de urgência ou de evidência) versus tutela cautelar”.

    Bem ou mal, entre os artigos 294 e 311, o novo CPC promove sensível reformulação no sistema de tutelas jurisdicionais sumárias (aquelas fundadas em análise superficial da causa): passa a denominar de “tutela provisória” tudo aquilo que o CPC/1973 tratava como tutela antecipada e tutela cautelar, extinguindo, com isso, o livro próprio das cautelares. No CPC/2015, porém, estabelece-se como gênero a “tutela provisória”, tendo como espécies: (i) a tutela provisória de urgência, que pode ter natureza antecipada (satisfativa) ou cautelar; (ii) a tutela provisória de evidência, sempre de natureza satisfativa. Daí se enfatizar, agora, a distinção “tutela provisória de urgência (antecipada ou cautelar) versus tutela provisória de evidência”.

    Seja como for, as novidades e controvérsias a respeito do tema não se esgotam na questão classificatória. Interessa-nos, nesta sede, o problema da unificação dos pressupostos para concessão das tutelas provisórias de urgência.

    Como se sabe, a tutela provisória baseada na urgência pode ter natureza antecipada ou cautelar. Sempre se disse que, para concessão da tutela de urgência antecipada, deveriam estar presentes dois pressupostos básicos: a prova inequívoca que convencesse o juiz da verossimilhança das alegações e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Por outro lado, para concessão da tutela de urgência cautelar, diziam alguns, a exigência seria menos intensa, de modo que bastariam estar presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora.

    Firme na artificialidade deste pensamento (já que o juiz não dispõe de um termômetro para medir seu grau de convencimento), o novo CPC tenta superar a distinção entre os pressupostos para concessão da tutela antecipada e cautelar, dispondo, em seu art. 300, que “a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”. Como se vê, ambas as modalidades de tutela de urgência passam a ter como requisitos essenciais de concessão a probabilidade de existência do direito afirmado e o perigo de dano pela demora na concessão do provimento judicial.

    Embora esta unificação seja, sob certo aspecto, positiva, ela também gera algumas perplexidades.

    Primeira: poderia o juiz, por exemplo, conceder tutela provisória de urgência (no caso, antecipada) na hipótese de mero risco de ilícito, independentemente de perigo de dano? Suponha um pedido antecipatório consistente em impedir a veiculação de um comercial televisivo que viole a honra do requerente: poderia o juiz conceder a tutela de urgência independentemente da demonstração do “perigo de dano”? Parece-nos que sim.

    Embora o legislador tenha se esquecido da tutela inibitória (e da possibilidade de sua antecipação), é possível dizer que, nos casos em que o ilícito ainda não foi praticado, é irrelevante a demonstração de dano, razão pela qual o pressuposto “perigo de dano” deve ser lido, no caso, como “risco de ilícito”. Ao contrário do que a unificação sugere, pois, a tutela antecipada pode dispensar um dos pressupostos legais.

    Segunda: poderia o juiz, no CPC/2015, conceder tutela provisória de urgência de ofício? No CPC/1973, até mesmo por expressa disposição legal (art. 273, caput), doutrina e jurisprudência eram tranquilas em sustentar a necessidade de requerimento da parte, salvo raras exceções, para fins de concessão da tutela antecipada. Por outro lado, no campo das cautelares, costumava-se permitir com mais frequência sua concessão ex officio, especialmente por conta do poder geral de cautela do magistrado, previsto no art. 798 do CPC revogado.

    No CPC/2015, talvez para prestigiar a tentativa de unificação dos regimes, o legislador não repetiu a exigência de requerimento da parte nem mesmo para a tutela de urgência antecipada. E nem se diga que sua previsão está no art. 295 do NCPC, já que este dispositivo se vale da palavra “requerida” apenas para se referir a uma das formas procedimentais pelas quais a tutela antecipada pode ser concedida. Seja como for, até porque a efetivação da tutela provisória corre por conta e risco do seu beneficiário, estamos certos de que a regra geral, em quaisquer de suas modalidades, continua sendo a da necessidade de requerimento da parte, ainda que o NCPC tenha mantido o poder geral de cautela (art. 297, caput).

    Terceira: no CPC/2015, ainda há necessidade de distinguirmos a tutela de urgência antecipada da tutela de urgência cautelar ou houve unificação total de seus requisitos? Exatamente porque a unificação não foi completa, subsiste a utilidade da distinção. Aliás, a própria lei confere, em certo momento, tratamento diferenciado às tutelas provisórias de urgência. É o que se vê no art. 300, § 3º, do NCPC, segundo o qual “a tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão”.

    Como se percebe, o requisito da reversibilidade não se aplica à tutela de urgência de natureza cautelar. Logo, em se tratando de pedido de índole cautelar, não poderia o magistrado, por exemplo, indeferí-lo sob o argumento da irreversibilidade do provimento jurisdicional.

    Tudo isto sem falar no insolúvel problema gerado pelos artigos 303 e 304 do NCPC, que, limitando a técnica da estabilização à tutela de urgência antecipada (desde que requerida em caráter preparatório, diga-se de passagem), reacendem as disputas classificatórias entre as tutelas de urgência. Isto, porém, representa uma perplexidade tamanha que não cabe nos estreitos limites deste artigo.

    Daniel Colnago Rodrigues é Mestrando em Direito Processual Civil pela USP, Professor de Direito Processual Civil do Centro Universitário Toledo e em diversos Cursos de Pós-Graduação. Advogado.
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