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2 de Junho de 2024
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    A Zona Franca de Manaus como política extrafiscal necessária para o Brasil

    Aspectos Gerais sobre o modelo econômico

    há 2 anos

    Vale fazer uma linha do tempo histórica acerca da Zona Franca de Manaus, que sobreveio no ordenamento em 1957, por iniciativa do Pres. Juscelino Kubistchek, por meio do Decreto-lei 3.173/57, e era, aquela época, um porto franco para armazenamento ou depósito, guarda, conservação, beneficiamento e retirada de mercadorias provenientes do estrangeiro para consumo na Amazônia, como de países interessados limítrofes, banhados por águas tributárias do rio Amazonas.

    Uma década após, durante o Governo Militar, houve a revogação do Decreto-lei 3.173/57 pelo 288/67, transformando a ZFM em um complexo modelo para alavancar o fenômeno econômico no norte do país, sendo entendido atualmente como uma área de livre comércio de importação e exportação e de incentivos fiscais especiais, estabelecida com a finalidade de ciar no interior da Amazônia um centro industrial, comercial e agropecuário dotado de condições econômicas que permitam seu desenvolvimento, em face dos fatores locais e da grande distância, a que se encontram, os centros consumidores de seus produtos.

    Para tanto, o legislador criou o fenômeno da exportação ficta, visando conceituar a remessa de mercadorias à ZFM (Art. DL 288/67), e também como forma de desonerá-la da incidência de determinados tributos.

    Sabidamente a finalidade do Direito Financeiro esta diretamente ligada à persecução das finalidades do Direito Tributário; vez que a finalidade arrecadatória acaba por se tornar de pouca utilidade quando não utilizada para a atenção com os avanços sociais que a sociedade espera. E a ZFM tem a clara finalidade de impedir essa finalidade trivial, em nome de benesses sociais e econômicas para a Federação.

    Não há de se falar em tributação neutra no Brasil, a não ser que se pretenda construir um Sistema Tributário a margem do texto constitucional, vez que a finalidade ampliativa dos tributos é reconhecida em diversos momentos – e para o nosso recorte teórico, merece destaque o § 6º do Art. 165 da CF.

    Ao bem da verdade, é imperioso frisar acerca de algumas previsões constitucionais, como a redação do inciso III, [1] do art. º e inciso VI, [2] do art 170 70, d CF CF, nos quais encontramos o comando legal para reduzir as desigualdades regionais e sociais, inclusive enquanto objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil.

    Destaque-se que tal qual entendem Marco Aurélio Grecco e Luis Eduardo Schoueri, entendemos que a intervenção no domínio econômico só pode ocorrer de maneira positiva, sob pena de desvirtuamento do Art. 174 da CF; [3] concluindo-se, portanto, que é vedada a intervenção negativa que venha a inibir, restringir ou dificultar o exercício da atividade econômica.

    Neste cenário, como política extrafiscal, a ZFM tem finalidade nobre – que lhe confere considerável peculiaridade – vez que promove o desenvolvimento sustentável ao mesmo tempo que assegura a proteção do bioma Amazônico. Afinal, a condição de existência do modelo ZFM tem o papel de proteger a biodiversidade ambiental, pois ao gerar empregos e renda por meio dos empreendimentos ali instalados, atrai para si expressiva mão-de-obra, reduzindo as possibilidades que estas pessoas estejam a serviço da degradação ambiental. [4]

    A ZFM é nada mais que uma forma de integração econômica entre os brasileiros, pois em homenagem ao princípio da isonomia; de forma que os desiguais devem ser tratados de maneira desigual, daí a importância da política extrafiscal para o desenvolvimento e conservação da fauna e flora da região.

    Logo, precisamos destacar qual é a posição hierárquica do Decreto-Lei n. 288/67 pós Constituição Federal de 1988, vez que, embora as disposições contidas no mesmo não façam parte do texto constitucional, a ZFM teve suas características e incentivos fiscais assegurados, utilizando a Constituição Federal como veículo introdutor de enunciado recepcionando o ato normativo anterior, conforme o Art. 40 do ADCT.

    Assim, o constituinte entendeu por manter o regime jurídico dos incentivos da ZFM e a própria Constituição Federal, nos termos do art. 60 [5], elencou as hipóteses e limites da competência do constituinte derivado para alterá-la; e vejamos que, com bom fundo de Direito Constitucional, o parágrafo 4º, do art. 60, a Constituição Federal é expressa ao dispor que não será objeto de deliberação, entre outros, a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais.

    Neste mesmo sentido, é preciso considerar que não há como ser válida a retirada de direitos conferidos a um sistema individualmente àqueles que integram este. Por consequência, não há como retirar garantias anteriormente previstas à Zona Franca de Manaus e aqueles que a integram.

    Escalarecendo, em nossa interpretação, entendemos que embora o Decreto-Lei n. 288/67 seja anterior a Constituição Federal de 1988, é nela que ele encontra fundamento de validade por força do art. 40 do ADCT; de maneira que os dois textos normativos acabam necessariamente vinculados, embora estejam em posições hierarquicamente diferentes.

    Ante todo exposto, nota-se o dever principiológico do intérprete de considerar o arcabouço legal protegido pelo Art. 40 do ADCT como feixe de normas imunizantes que devem ser preservados, a um, por serem juridicamente atrelados ao texto constitucional e ser vedado qualquer tipo de supressão; e a dois, quando considerarmos os benefícios trazidos por tais normas, ante a clara utilidade extrafiscal.

    Não se faz nação focada em mero custeio do Estado, devendo políticas públicas garantirem um bem-estar que possa horizontalizar a paz social a todos os entes da federação e consequentemente as pessoas ali contidas; de forma que a região amazônica, pelas razões já delineadas, faz jus as imunidades em questão, como forma de garantir, atualmente, a própria subsistência de seu povo.

    Desta forma, é preciso lutar para que, independente de qualquer mudança sistêmica no regime dos incentivos fiscais, nunca haja substituição da sistemática que acabe por atrofiar o cenário macroeconômico da região, mas sim para levar o desenvolvimento sustentável e consequentemente promover a justiça social à região.


    [5] Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

    I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;

    II - do Presidente da República;

    III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.

    § 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.

    § 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.

    § 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem.

    § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

    I - a forma federativa de Estado:

    II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

    III - a separação dos Poderes;

    IV - os direitos e garantias individuais.

    § 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.


    [4] Neste sentido: GUSMAO, Omara Oliveira. Zona Franca de Manaus: extrafiscalidade, desenvolvimento regional e preservação ambiental. TRIBUTAÇÃO NA ZONA FRANCA DE MANAUS: (comemoração aos 40 anos da ZFM) / coordenadores Ives Gandra da Silva Martins, Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho. Marcelo Magalhães Peixoto. São Paulo: MP Editora, 2008, p. 160.


    [3] Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.


    [1] Art. 3º Constituem objetivos fundamentas da República Federativa do Brasil:

    (...)

    III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

    [2] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

    (...)

    VII – redução das desigualdades regionais e sociais;

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    9 Comentários

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    Abordagem muito assertiva para o momento que estamos enfrentando. Precisamos defender a ZFM! Parabéns pelo trabalho. continuar lendo

    Obrigado! Precisamos, bem como a demarcação de terras! continuar lendo

    Ótimo artigo, elucidando a importância da ZFM nestes tempos sombrios pelos quais estamos passando. Estudantes/autores locais como o colega são de grande valia para demonstrar para o público jurídico e geral aspectos importantes e pq nosso Polo de Manaus deve ser preservado. Parabéns ao autor! continuar lendo

    Denota-se o grande conhecimento técnico do Autor pelo texto. Grande trabalho. continuar lendo

    Texto excelente e cirúrgico! continuar lendo