Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
20 de Junho de 2024

Pornografia Infantil:

A Violação dos Direitos da Criança e do Adolescente na Internet

Publicado por Giovanna de Alencar
há 5 anos


Co-autoras:

Emanuella Maria Alfonsetti Soares

Centro Universitário de Votuporanga/SP, Acadêmica de Direito.

Gabriela Nunes Pazoto

Centro Universitário de Votuporanga/SP, Acadêmica de Direito.

Giovanna de Alencar Lívero

Centro Universitário de Votuporanga/SP, Acadêmica de Direito.


PORNOGRAFIA INFANTIL: A Violação dos Direitos da Criança e do Adolescente na Internet.


INTRODUÇÃO


Mostra-se inegável que a sociedade, desde seus primórdios até o presente momento, evoluiu de forma imensurável, a ponto de talhar tecnologias que permitem o acesso a todas as informações existentes em um lapso de segundos. A rede mundial de computadores funciona de forma holística, englobando um “todo” e conectando-o a tudo, permitindo o acesso de toda a população.

Não obstante as inúmeras vantagens fornecidas pela Internet, esta mostra-se ainda um campo fértil para que a criminalidade se expanda, permitindo o anonimato do usuário que a utiliza para perpetrar condutas criminosas. Neste sentido, parafraseando Antoine de Saint-Exupéry, “a máquina não isola o homem dos grandes problemas da natureza, mas insere-o mais profundamente neles”.

O presente trabalho tem como escopo principal, através de pesquisa bibliográfica e do uso de dados levantados, a abordagem dos crimes cometidos contra crianças e adolescentes através da rede mundial de computadores, buscando elucidar não apenas quais condutas englobam-se nos crimes de pornografia infantil e derivados da pedofilia, mas ainda abordar a legislação regulamentadora de tais, traçando, por fim, uma relação com os direitos humanos e a violação do constitucionalmente garantido direito à dignidade da pessoa humana.


1. PEDOFILIA E PORNOGRAFIA INFANTIL NA SEARA VIRTUAL


É sabido que a rede mundial de computadores oferece infinitas possibilidades ao usuário, de forma que o conceito de espaço-tempo se expandiu ao nível de não mais existir. Não obstante as facilitações fornecidas pela rede, a seara de delitos virtuais encontrou um campo fértil para instalar-se, inclusive no que tangem os crimes de pedofilia e pornografia infantil.

Atualmente, as pessoas são inseridas no universo informático desde seu nascimento, tornando-se comum deparar-se com crianças e adolescentes fazendo o uso da internet, inclusive desacompanhadas dos pais. Por outro lado, indivíduos de maior idade, com sinistros desejos, valem-se da facilitação e anonimato fornecidos pela rede para concretizá-los, transformando a nova geração de usuários em alvo fácil, ao passo que o ciberespaço é considerado “terra sem lei”.

É a partir desta realidade que se torna necessária a análise dos crimes de pedofilia e pornografia infantil não apenas material, mas ainda os perpetrados através de ciberespaço.


1.1. Pedofilia


Da análise etimológica da palavra pedofilia, extrai-se que a mesma deriva de uma junção de origem grega entre “paidos” – criança ou infante – e “philia” – amizade, atração ou amor. Sendo assim, pedofilia tem o significado de “amor por crianças”. Destarte, conclui-se que a palavra pedofilia pode ser definida como a preferência sexual por crianças.

A partir de conceitos relacionados à psicologia, a pedofilia é um distúrbio de comportamento tipificado como uma espécie de parafilia, ou seja, de uma fantasia ou comportamento frequente, intenso e relacionado à sexualidade, envolvendo, no caso em questão, a figura de crianças e adolescentes, podendo ainda ser heterossexual ou homossexual. Segundo a Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10, a Pedofilia é considerada uma doença catalogada no item F65.4, como citado por Silva:


F65.4 Pedofilia. Uma preferência sexual por crianças, usualmente de idade prépuberal ou no início da puberdade. Alguns pedófilos são atraídos apenas por meninas, outros apenas por meninos e outros ainda estão interessados em ambos os sexos. A pedofilia raramente é identificada em mulheres. Contatos entre adultos e adolescentes sexualmente maduros são socialmente reprovados, sobretudo se os participantes são do mesmo sexo, mas não estão necessariamente associados à pedofilia. Um incidente isolado, especialmente se quem o comete é ele próprio um adolescente, não estabelece a presença da tendência persistente ou predominante requerida para o diagnóstico. Incluídos entre os pedófilos, entretanto, estão homens que mantêm uma preferência por parceiros sexuais adultos, mas que, por serem cronicamente frustrados em conseguir contatos apropriados, habitualmente voltam-se para crianças como substitutos. Homens que molestam sexualmente seus próprios filhos pré-puberes, ocasionalmente seduzem outras crianças também, mas em qualquer caso seu comportamento é indicativo de pedofilia. (SILVA et al, 2018, p. 88).


Para que seja caracterizada tal doença, mostra-se necessário o cumprimento de três elementos fundamentais constados no DSM-IV (Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), dispostos de forma taxativa, de forma que sem a presença de um desses componentes, não há que se falar em pedofilia. De acordo com a AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (2000) citado por MORAIS (2018):

Para a Associação de Psiquiatras Americanos, uma pessoa será definida como pedófila caso cumpra três requisitos que consta no DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 4th edition). O primeiro requisito é que o indivíduo tenha por um período de ao menos seis meses intensa atração sexual, fantasias sexuais ou outros comportamentos de caráter sexual por crianças (menores de 13 anos de idade ou que não esteja na puberdade). O segundo requisito é o 22 indivíduo decide por realizar seus desejos, seu comportamento é afetado por seus desejos, e/ou tais desejos causam estresse ou dificuldades intra e/ou interpessoais. O terceiro requisito é o indivíduo possuir mais do que 16 anos de idade, e é ao menos cinco anos mais velha do que a (s) criança (s) citada (s) no critério. Este critério não se aplica exatamente a indivíduos com 12-13 anos de idade ou mais, envolvidos em um relacionamento amoroso (namoro) com um indivíduo ao final da adolescência - entre 17 e 20 anos de idade. Haja vista que nesta faixa etária geralmente acontecem diversos relacionamentos entre adolescentes de idades diferentes. (MORAIS, 2018).


A SAFERNET (2017) ressalta em seu glossário de direitos humanos que a pedofilia é um distúrbio de comportamento, termo independente da prática criminosa, demonstrando a linha tênue de tais distinções com a exposição de seus elementos:


A Pedofilia é a atração sexual compulsiva por crianças e adolescentes. É classificada no DSM IV, livro que define os critérios de diagnóstico, no item F65.4 - 302.2. Pedofilia em si não pode ser tida como crime, ela é um transtorno da personalidade. Abuso de crianças e adolescentes praticado por pedófilos é considerado a prática criminosa. Portanto, a prática criminosa é a passagem ao ato: dos desejos impulsivos ao abuso sexual. (SAFERNET, 2017).


Destarte, é possível concluir que o distúrbio comportamental por si só não enseja aplicação de sanção penal, sendo punível apenas aquele que, efetivamente, pratica o abuso contra crianças ou adolescentes. A conduta criminosa é tipificada tanto no Código Penal Brasileiro, encaixando-se no tipo penal que trata sobre o estupro de vulnerável, quanto nas diversas disposições presentes no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), no entanto, em momento algum encontra-se disposto “crime de pedofilia”, uma vez que o transtorno não pode ser confundido com a prática criminal. Segundo Emanuella Palhano da Cruz (2009)


Hélia Barbosa define abuso sexual como a utilização para fins sexuais do corpo de uma criança ou adolescente, por parte de um adulto, caracterizando-se pelo não consentimento da vítima, que é coagida física, emocional ou psicologicamente. É uma relação bilateral para satisfação unilateral do abusador, compreendendo desde atos libidinosos até o estupro. A autora define ainda exploração comercial da sexualidade infantil como a prática de sexo com criança ou adolescente, mediante o comércio de seus corpos através de meios coercitivos ou persuasivos, caracterizados como transgressão a seus direitos e à liberdade individual. A exploração comercial da sexualidade é praticada para oferecer satisfação e prazer unilateral ao cliente, assim como para proporcionar ganhos econômicos ao intermediador. É uma atividade sistêmica, triangular e criminosa. (CRUZ, 2009, pg. 40, apud BARBOSA, 1999).


Portanto, mostra-se indiscutível a necessidade de salientar a distinção entre o pedófilo e o criminoso.

1.2. Pornografia Infantil



A Lei nº 11.829, de 2008, trouxe um complemento à Lei 8.069/1990, comumente conhecida como Estatuto da criança e adolescente, a fim de tipificar condutas das quais até então não possuía previsão legal. Iniciados a partir do artigo 240, as condutas que constituem crime de pornografia infantil inclui não apenas o registro de cenas de sexo envolvendo crianças e adolescentes, mas ainda sua comercialização.

Diferente da conduta criminosa anteriormente mencionada, a pornografia não necessariamente é praticada pelo portador do distúrbio comportamental conhecido como pedofilia, como também destinado a ele, no caso da venda de material pornográfico.

Tais crimes são comumente perpetrados através da rede mundial de computadores, dada a facilitação fornecida pela internet e sua rápida circulação, bem como o anonimato garantido ao usuário, motivo pelo qual o ciberespaço merece grande atenção quando se trata de erradicar a criminalidade cometida contra sujeitos de tenra idade.


1.3. Dos crimes perpetrados na Internet


A internet, como anteriormente mencionado, é um amplo campo de propagação da criminalidade. Isso se dá pelo anonimato fornecido pela rede mundial de computadores, não apenas garantido constitucionalmente, mas também pela Lei 12.965/2014, conhecida como Marco Civil da Internet, que assegura a privacidade e a liberdade na navegação.

Não bastante, existe ainda o que é conhecido como Deep Web, que pode ser conceituada em português como a “internet profunda”, caracterizada pelo volume de sites e conteúdos considerados invisíveis à Surface Web, a “internet superficial” da qual grande parte da população já está habituada. Tais páginas ocultas nada mais são do que aquelas propositalmente indisponíveis para os provedores de busca convencionais como, por exemplo, o Google. Nas palavras de Shimabukuro e Silva:

Deep Web nada mais é do que a parte da rede cujo conteúdo não está disponível ou indexado nos principais mecanismos de pesquisa (Google, Bing, Yahoo). Ela é formada por milhões de páginas, com dimensão inimaginável e com crescimento similar ao da Internet Visível. (SHIMABUKURO; SILVA, 2018, p. 255).

Ainda, conhecida como uma camada mais obscura da Deep Web, tem-se a Dark Web, acessível apenas através de um software e autenticação para o acesso a suas páginas não indexadas.

Estes ambientes, embora proporcionem materiais valiosos para o intelecto, são compostos em sua maior parte por fóruns criminosos que oferecem acesso ao tráfico de pessoas, venda ilegal e órgãos e à pedofilia. É onde se encontra o maior número de delinquentes que praticam e apreciam tais crimes. Segundo Bernardes (2006), ―um estudo realizado pelo ―Project Tor detalhou a revista americana Wired, que quatro a cada cinco visitas a sites escondidos na Darknet, hospedados na rede anônima Tor, buscam pornografia infantil.

O Ministério Público de Santa Catarina (2015), apontou que:

Segundo dados da associação italiana Telefono Arcobaleno, em 2008 foi identificado, por meio de denúncias, o surpreendente número de 42.396 sites de pedofilia em todo o mundo ¿ mais que o dobro do número registrado em 2003. A hospedagem desses sites concentrou-se na Alemanha, Holanda e Estados Unidos. Importante destacar que em 2003 o Brasil ocupou a 4ª posição neste ranking.

A organização Internet Watch Foundation (Reino Unido) recebeu cerca de 34 mil denúncias de pornografia infantil na internet em 2008. Dos casos confirmados, cerca de 74% são relativos a sites comerciais, ou seja, que vendem pornografia infantil. O mercado de compra e venda de pornografia infantil é suspeito de movimentar cifras milionárias em todo o mundo.

Em nosso país, a ONG SaferNet Brasil recebeu, de janeiro a setembro de 2009, 36.584 denúncias de pornografia na internet. Deste total, importa destacar que 72% referem-se a materiais divulgados no portal de relacionamentos Orkut, que possui milhares de álbuns de fotos privados em investigação pelas autoridades (Senado Federal, Polícia Federal e Ministério Público Federal). (MPSC, 2015).


A SaferNet (2018), pontua que:

Em 13 anos, a Central de Denúncias recebeu e processou 1.612.030 denúncias anônimas de Pornografia Infantil envolvendo 357.624 páginas (URLs) distintas, escritas em 10 idiomas e hospedadas em 48.541 domínios diferentes, de 231 diferentes TLD s e conectados à Internet através de 52.649 números IPs distintos, atribuídos para 100 países em 6 continentes. As denúncias foram registradas pela população através dos 3 hotlines brasileiros que integram a Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos (SaferNet, 2018).

Ainda segundo a Central Nacional de Denúncias, dos números mencionados, 193.411 (cento e noventa e três mil, quatrocentos e onze) de casos, equivalentes a 25.8% dos dados globais, foram em países fluentes em língua portuguesa.

As práticas de abuso infantil advêm de tempos remotos, no entanto, com o advento da internet, sua evolução e propagação, foram proporcionadas aos criminosos novos meios de perpetra-las, causando severos danos não apenas aos costumes, mas ainda e em especial à criança e ao adolescente, principal lesado.


2. DA LEGISLAÇÃO VIGENTE

Atualmente existem leis que buscam preservar os direitos de crianças e adolescentes contra os crimes possivelmente praticados no âmbito virtual, incluindo, especificamente para esse trabalho, todos os que envolvem a pornografia infantil.

Decerto que a lei visa garantia o direito à dignidade da pessoa humana, bem como a segurança, ao desenvolvimento sexual e moral de crianças e adolescentes, obedecendo ao disposto na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Convenção sobre o Direito da Criança.

É a partir destes dispostos que se torna necessária à análise dessas legislações em busca de compreender o que pode ser lesado com a consumação destes crimes e, principalmente, o que deve ser protegido legalmente nos dias atuais, considerando a rápida evolução e distribuição de dados na internet.


2.1. Estatuto da Criança e do Adolescente


A Lei nº 11.829/2008 incluiu no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) os artigos 240 a 241-E diretamente relacionados à pornografia infantil, com o objetivo de aprimorar o combate à produção, venda e distribuição de tal conteúdo ilícito, criminalizando a aquisição e a posse, bem como outras condutas com ligação a pedofilia de forma a preservar a dignidade sexual das crianças e seu desenvolvimento digno.

Destarte, torna-se necessária a elucidação sobre o conteúdo destes artigos para maior compreensão da lei e seu objetivo que conceitua em seu artigo 241-E que para efeitos dos crimes a serem tratados pelos dispositivos supramencionados, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfico” inclui qualquer situação que abrange criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, independentemente se esta é real ou simulada por qualquer meio, incluindo também, nesse contexto, a exposição de seus órgãos genitais para fins de satisfação de lascívia.

Tais crimes a serem tratados são de natureza comum ao que diz sobre; o sujeito ativo ser qualquer pessoa, porém o sujeito passivo sempre será a criança ou o adolescente e o objeto material poderá variar de acordo com cada delito.

Em vista disso, o artigo 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente criminaliza a utilização de criança ou adolescente em cena pornográfica ou de sexo explícito, seja na produção da pornografia infantil, seja na reprodução do conteúdo ilícito, dispondo os núcleos de tipo: produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar. O parágrafo primeiro dispõe sobre o delito equiparado com os núcleos: agenciar, facilitar, recrutar, coagir, intermediar e contracenar com a vítima. Já o parágrafo segundo prevê as causas de aumento de pena obrigatórias.

O artigo 241 da mesma lei criminaliza a venda de fotografia, vídeo ou outro registro que componha o conteúdo ilegal, não sendo necessária a efetiva produção de resultado para sua consumação.

O dispositivo seguinte, 241-A, trata da transação de fotografia, vídeo ou outro registro de cena de sexo explícito ou pornográfica, com os seguintes núcleos de tipo: oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio. Em seu parágrafo primeiro encontra-se a disponibilização de delitos equiparados, enquanto o parágrafo segundo preceitua a limitação de punibilidade dos mesmos.

Já o artigo 241-B refere-se especificamente sobre a aquisição, posse ou armazenamento do material ilícito, prevendo em seu parágrafo primeiro causa de diminuição de pena e em seu parágrafo segundo a atipicidade do crime quando praticado com finalidade de comunicar as autoridades competentes sobre a ocorrência dos delitos de todos os crimes dispostos no mesmo título.

Diferente dos dispositivos supramencionados, o artigo 241-C carrega somente o núcleo de tipo “simular”, criminalizando a conduta de simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por qualquer meio de adulteração de conteúdo. Em seu parágrafo único traz delitos equivalentes a estes, quais são o de: vender, expor a venda, disponibilizar, distribuir, publicar ou divulgar este conteúdo de simulação.

Por fim, apesar de não tratar inicialmente de pornografia infantil, o artigo 241-D tem como disposição o aliciamento, assédio, instigação ou constrangimento de criança ou adolescente para a prática de ato libidinoso, incluindo o conteúdo ilícito somente em seus incisos que dispõe da facilitação ou indução do acesso deste material à criança e da pratica das condutas do caput com o fim de induzir a vítima a se exibir de forma pornográfica ou explícita.


2.1.1. Regulamentação da Infiltração de Agentes de Polícia


Concernente à investigação dos crimes tratados nos artigos 240 a 241-D a Lei nº 13.411/2017, incluiu no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) os artigos 190-A a 190-E referentes à infiltração de agentes de polícia para a investigação de crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes.

Primeiramente, o artigo 190-A tem como objetivo introduzir e regulamentar as normas de investigação, bem como as regras para que esta seja possível e eficaz. Em seu caput, incluí a possibilidade de investigação dos artigos 154-A, 217-A, 218, 218-A e 218-B do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940), quais não serão tratados neste trabalho por adequação de tema.

Tal dispositivo dispõe limitações para o início da infiltração de agentes policiais com prévia autorização judicial devidamente fundamentada, com requerimento do Ministério Público e com duração total de 720 dias. O parágrafo primeiro traz a regulamentação de controle externo da atividade policial; o segundo dispõe de conceitos de dados de conexão e dados cadastrais; e o terceiro dispõe da subsidiariedade da infiltração, devendo ocorrer somente se as provas não puderem ser obtidas por outro meio.

Já o artigo 190-B dispõe sobre a necessidade e importância do sigilo nestas investigações, resguardando tanto a eficácia desta, quanto os direitos e a dignidade moral e sexual da criança ou adolescente envolvido.

Por sua vez, o dispositivo 190-C isenta o policial que atua infiltrado na investigação do cometimento de crime de falsa identidade, não o resguardando, porém, de seus excessos praticados.

Nessa conformidade, salta aos olhos a inovação trazida pelo artigo 190-D, aprofundando a atividade investigativa de forma mais liberta e concreta na possibilidade de criação de identidade fictícia, possibilitando o registro da mesma em órgão competente.

Tal seção é findada com o artigo 190-E que se refere à conclusão da investigação, regulamentando os atos a serem realizados para a efetuação do devido processo criminal e finalização do inquérito policial por meio de relatórios circunstanciados e autos apartados.


2.2. Código Penal


A Lei nº 13.718/2018 incluiu no Código Penal o dispositivo 218-C, que dispõe sobre a divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia, trazendo em seu caput os núcleos de tipo: oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar.

O artigo tem como objetivo criminalizar condutas que exponham a risco a imagem e dignidade sexual de vulneráveis, incluindo crianças e adolescentes, por qualquer meio, como o de comunicação em massa, sistema informático ou telemático. Busca evitar o uso destes meios para finalidades de vingança ou até mesmo expor as vítimas a qualquer tipo de vexame contra sua imagem.

Trata-se de um artigo que esclarece sobre a urgência da criação e aplicação de normas na situação fática sobre o tema, considerando se tratar de matéria recorrente, ressaltando tal necessidade com a observância da essência do Direito em somente atuar após devidamente identificada à indispensabilidade de regulamentação, principalmente sobre a esfera penal, cujo caráter é subsidiário.

2.3. Garantias de Direitos de Crianças e Adolescentes Vítimas ou Testemunhas de Violência


A Lei nº 13.431/2017 estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, criando mecanismos para prevenir e reprimir a violência com base na Constituição Federal, na Convenção sobre os Direitos da Criança, entre outros.

Em seu artigo 4º, no inciso III, está incluída como forma de violência a definida como sexual, entendida como “qualquer conduta que constranja a criança ou o adolescente a praticar ou presenciar conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso, inclusive exposição do corpo em foto ou vídeo por meio eletrônico”, ou seja, podendo incluir os casos de produção de pornografia infantil.

Tal lei traz consigo garantia de acompanhamento por profissionais especializados para a proteção dos direitos das crianças e adolescentes, sendo de extrema importância à aplicação, considerando estar diretamente ligada a sujeitos que já foram vítimas destes crimes, prevendo tratamento digno e proteção.

Há ainda, a possibilidade de utilização dos depoimentos dessas vítimas para a prevenção da ocorrência de novos crimes, bem como a integração de políticas de atendimento em saúde, assistência social, garantindo a segurança pública e a justiça.


3. DA RELAÇÃO COM OS DIREITOS HUMANOS


São variadas e múltiplas as discussões acerca do avanço da Internet e o fato de que a legislação vigente no país não se adequar de maneira suficiente ao tempo desta evolução.

Apesar de haver uma comunicação célere e difusa em relação às informações pelo mundo todo através de milésimos de segundos, sucedeu a facilidade do cometimento de crimes virtuais já existentes e expressos na legislação, como os anteriormente tratados.

É inegável que a prática de tais delitos ofende os direitos humanos. A preocupação destacada é a violação dos direitos das crianças e dos adolescentes no âmbito da internet pelo uso da pornografia infantil, atentando diretamente contra o princípio da dignidade da pessoa humana que vem expresso como fundamental no artigo , inciso III da Constituição Federal.

Destarte, as condutas expressas como crimes na internet contra crianças e adolescentes alcançam o âmbito internacional com a direta violação do disposto no artigo 5º da Convenção Americana de Direitos Humanos, Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992, dispositivo que visa proteger a integridade pessoal ao que concerne sobre sua integridade física, psíquica e moral.

Pode-se afirmar que a internet é um âmbito de ampla exposição sobre os cidadãos e suas vidas, possibilitando a existência de consequências jurídicas em relação aos seus valores materiais e morais com as suas vidas assistidas e observadas por sujeitos que utilizam a rede informática.

Vale ressaltar, que a partir da necessidade específica de proteção de crianças e adolescentes, foi Promulgada a Convenção sobre os Direitos da Criança por meio do Decreto nº 99.710, de 21 de novembro 1990, com o objetivo de resguardar as crianças e adolescentes ao que se refere ao seu desenvolvimento, sua dignidade e segurança, principalmente contra abusos sexuais relacionados à pornografia infantil sob qualquer meio, incluindo a rede mundial de computadores.

Em face da mesma preocupação, houve a preocupação mais específica em relação à positivação, visto matéria genérica do Decreto citado anteriormente. No Brasil foi promulgado em 2004 o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança referente à venda de crianças, à prostituição infantil e à pornografia infantil, por meio do Decreto nº 5.007, de 8 de março de 2004.

Em seu artigo 2º, o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança conceitua:

Pornografia infantil significa qualquer representação, por qualquer meio, de uma criança envolvida em atividades sexuais explícitas reais ou simuladas, ou qualquer representação dos órgãos sexuais de uma criança para fins primordialmente sexuais.

Sendo assim, além da conceituação, há a preocupação expressa da proibição da pornografia infantil, visto o crescente número de casos ocorrendo internacionalmente e a normatização em todos os Estados-Partes, evidenciando que os delitos que envolvem tal conteúdo ilícito, principalmente os de grande alcance pela utilização do âmbito virtual, se tornaram de inquietação e problematização mundial.


CONCLUSÃO

Conclui-se que os crimes relacionados à pornografia infantil e a violação dos direitos de crianças e adolescentes são de preocupação mundial, principalmente pela constante normatização em busca incessante pela proteção e observância na situação fática, a fim de satisfazer princípios fundamentais como, por exemplo, o da dignidade da pessoa humana.

Resta comprovado que o âmbito virtual se tornou preocupante pela sua constante evolução e rápida distribuição de dados, ambiente propício para o cometimento de crimes, a propagação e o consumo de materiais ilícitos como os de pornografia infantil.

A problemática encontrada em muitos destes casos está relacionada à lenta evolução do Direito em relação a desenfreada evolução da internet, ocasionando que a criação de leis não é suficientemente eficaz, visto sua ineficiência de aplicabilidade.

Destarte, é evidente que a atuação das autoridades nacionais ou internacionais, não é a mais adequada, pois o foco deveria ser alterado para a situação prática de aplicação da lei, seja com a criação de softwares específicos para evitar que este tipo de conteúdo ilícito circule por toda a internet, seja por investimentos tecnológicos para facilitar a investigação e punição de sujeitos que cometem tais crimes.

Apesar de tais crimes estarem tomando grandes proporções no mundo inteiro, aumentando a estatística da prática destes delitos, principalmente por meio da rede mundial de computadores, o assunto é pouco tratado por meio de mídias. Dessa forma, seria de grande importância a prática de informar a população, feito por Órgãos Governamentais com a utilização das mídias sociais.

A informação é de extrema importância para que os sujeitos que utilizam a internet, corriqueiramente ou não, se atentem para os perigos dispostos na mesma, principalmente alertando para que a população se mantenha atenta e denuncie quando se deparar com algum tipo ilícito durante sua navegação, cooperando com as autoridades no combate a estes delitos.

Por fim, resta claro que para que a lei seja eficientemente aplicada, é necessária a atenção das autoridades mundiais e nacionais, colaborando para a divulgação de informações e investimento em recursos tecnológicos para o combate à estes crimes, observando a necessária utilização da mídia e outros meios com o fim de educar e alertar a sociedade para maior colaboração e efetividade fática.


REFERÊNCIAS


BERNARDES, Vitor de Freitas. Dos crimes virtuais cometidos se utilizando do anonimato da Deep Web. Disponível em: <https://repositorio.ucb.br/jspui/bitstream/123456789/9433/1/VictordeFreitasBernardesTCCGraduacao2016.... Acesso em 22 mai. 2019

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Vade mecum. São Paulo: Saraiva, 2018.

BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988. Vade mecum. São Paulo: Saraiva, 2018.

BRASIL. Decreto-lei no 5.007, de 8 de março de 2004. Promulga o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança referente à venda de crianças, à prostituição infantil e à pornografia infantil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5007.htm>. Acesso em: 26 mai. 2019.

BRASIL. Decreto-lei no 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969.. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5007.htm>. Acesso em: 26 mai. 2019.

BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente: Lei federal nº 8069, de 13 de julho de 1990. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 2018.

BRASIL. Lei nº 13.718, de 4 de abril de 2017. Estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência e altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13431.htm >. Acesso em: 20 mai. 2019.

CRUZ, Emanuella Palhano da. A Pedofilia na internet. Disponível em: <https://repositorio.ucb.br/jspui/bitstream/10869/2544/2/Emanuella%20Palhano%20da%20Cruz.pdf>. Acesso em 20 mai. 2019

Ministério Público de Santa Catarina. Sobre a pedofilia na Internet. Disponível em: <https://www.mpsc.mp.br/campanhas/sobreapedofilia-na-internet>. Acesso em 20 mai. 2019

MORAIS, Lucas Andrade de. Ciberpedofilia: os crimes de pedofilia praticados através da internet. 2018. Conteúdo Jurídico. Disponível em:<http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,ciberpedofilia-os-crimes-de-pedofilia-praticados-atraves-d...; . Acesso em: 21 mai. 2019.

SAFERNET. Delegacias Cibercrimes. 2019. Disponível em: <https://new.safernet.org.br/content/delegacias-cibercrimes>. Acesso em: 20 mai. 2019.

SAFERNET. Indicadores da Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos. 2017. Disponível em: <http://indicadores.safernet.org.br/>. Acesso em: 22 mai. 2019.

SHIMABUKURO, Adriana; SILVA, Melissa Garcia Blagitz de Abreu e. Internet, Deep Web e Dark Web. In: SILVA, Ângelo Roberto Ilha da et al. Crimes Cibernéticos. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2018.

SILVA, Ângelo Roberto Ilha da. Pedofilia, pornografia infantojuvenil e os tipos penais previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. In: SILVA, Ângelo Roberto Ilha da et al. Crimes Cibernéticos. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2018.

  • Publicações1
  • Seguidores2
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoArtigo
  • Visualizações729
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/pornografia-infantil/779857361

Informações relacionadas

Rogério Tadeu Romano, Advogado
Artigoshá 2 anos

Os delitos de pornografia infantil

National Center for Missing and Exploited Children: Combate à Pedofilia e Defesa em Casos de Acusação sob o Artigo 241-B do ECA

Cleber Couto, Promotor de Justiça
Artigoshá 9 anos

Pedofilia no Estatuto da Criança e Adolescente: art. 241-E e sua interpretação constitucional

Francesco Vianna Colacino, Advogado
Artigoshá 4 meses

A Proteção da Criança e do Adolescente nos Meios Virtuais e os Novos Tipos Penais Trazidos pela Lei nº 14.811/24.

Paulo André, Bacharel em Direito
Artigoshá 28 dias

Cyberbullying no Brasil: O Impacto das Ameaças Digitais nas Vidas Reais

1 Comentário

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)
Perfil Removido
4 anos atrás

Artigo muito bem escrito e floreado. Só deveria ser citada a trajetória de Haroldo Galves, pedófilo condenado com mais de 65 mil imagens e vídeos de pornografia infantil, o que faz dele o recordista pan-americano. continuar lendo