Página 453 do Diário de Justiça do Estado do Pará (DJPA) de 27 de Julho de 2017

cautelar do réu.¿ Outrossim, avalio não existirem motivos que autorizem a manutenção da prisão preventiva do acusado porquanto o réu não possui nenhum outro antecedente criminal. Ademais não existe nos autos, a priori, nenhuma outra prova contundente que possa presumir que o réu faça da criminalidade seu meio de vida. Por fim, o modos operandi do suposto fato delituoso não é dos mais graves. Vide jurisprudência do STJ: ¿HABEAS CORPUS - ROUBO DUPLAMENTE QUALIFICADO - PRISÃO PREVENTIVA - AUSENCIA DOS REQUISITOS - LIBERDADE PROVISÓRIA - INTELIGÊNCIA DO ART. 316 DO CPP - LIMINAR DEFERIDA - DESNECESSIDADE DA PRISÃO CAUTELAR - RÉU PRIMÁRIO, COM BONS ANTECEDENTES, RESIDÊNCIA FIXA - INEXISTÊNCIA DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 312 DO CPP - CONCESSAO DA ORDEM - DECISAO UNÂNIME. O confinamento, mesmo provisório, é exceção, pois o regramento prevalente é o da liberdade. Por isso, imprescindível a demonstração quantum satis da colisão, in casu, do princípio da preservação da paz social com o da liberdade individual e, o eventual comprometimento daquela por esta. No caso concretizado neste julgamento não restou demonstrado tal comprometimento, prevalecendo a regra da liberdade. Writ concedido. Decisão unânime.(TJ-SE - HC: 2010303919 SE , Relator: DES. NETÔNIO BEZERRA MACHADO, Data de Julgamento: 25/10/2010, CÂMARA CRIMINAL)¿ ¿Sendo o paciente comprovadamente primário, possuidor de bons antecedentes, residência fixa e emprego lícito, mister se faz, para a manutenção da sua custódia cautelar, a referência expressa a motivos concretos quedesautorizem a concessão de sua liberdade provisória, não sendo suficiente, pois, mera alusão à regularidade do auto de prisão em flagrante. Ordem concedida para, reformando o acórdão impugnado e cassando o Decreto monocrático, deferir ao paciente a liberdade provisória nos termos do artigo 310, parágrafo único, do Código de Processo Penal, com o compromisso de estar presente a todos os atos e termos do processo, sob pena de revogação da medida¿. (STJ - HC 18965 - RJ - 6ª T. - Rel. Min. Hamilton Carvalhido - DJU 19.12.2002). ¿(...) II - Mesmo em sede de crimes hediondos, o indeferimento da liberdade provisória não pode ser genérico, calcado em mera repetição de texto legal ou, então, na gravidade do delito (Precedentes). Habeas corpus concedido. (...) (STJ - HC 15176 / RJ, HABEAS CORPUS 2000/0132709-7, Relator Ministro FELIX FISCHER, Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento 17/05/2001, Data da Publicação/Fonte DJ 13/08/2001 p. 185) Além disso, verifico que a decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva também fundamentou a custódia no fato do autuado não possuir identificação completa. Acerca da ausência de elementos de identificação do acusado, pensamos que o parágrafo único do art. 313 do CPP parece ter criado nova espécie de prisão preventiva, qual seja prisão para esclarecimento de dúvida quanto a identificação. Questiono a constitucionalidade desse dispositivo. O referido dispositivo traz a possibilidade de prisão preventiva em razão da dificuldade na identificação civil do acusado, sem mencionar em quais tipos de crimes tal medida poderá ser aplicada, nem se os requisitos do art. 312 devem estar presentes para tal decretação. Desse modo, profundamente preocupante, e necessário o alerta: ¿uma leitura isolada (que infelizmente será feita) permite prisão preventiva para averiguações, ainda que judicialmente autorizada, burlando as restrições existentes na prisão temporária, em que a jurisprudência consagrou a impossibilidade de prisão com base (isoladamente) no inciso II do artigo da Lei nº 7.960. Essa prisão será contrária a toda principiologia da prisão preventiva e constituirá fonte de graves abusos¿ [LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. Volume I. 5ª edição. 2ª Tiragem. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p.179]. Incontáveis vezes, principalmente nos crimes de médio potencial ofensivo, após condenado, o réu primário acabava por ficar submetido a regime de cumprimento da pena menos gravoso que aquele em que ele esteve provisoriamente, quando ainda pairava a dúvida sobre sua culpa. Assim sendo, a solução para evitar a desproporcionalidade da prisão preventiva será analisar o dispositivo do parágrafo único do art. 313 do CPP em conjunto e de forma harmônica com os demais dispositivos que tratam da prisão preventiva, inclusive com o disposto no art. 313, I, do CPP que só admite a prisão preventiva nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos, se houver prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria e também o periculum in mora. Se a preventiva é inadmissível, não há que se manter a prisão por qualquer outro motivo, nem mesmo por não possuir o indiciado ou réu documentos de identidade. Por outro lado, acreditamos que padece de inconstitucionalidade o dispositivo em questão ainda que a pena privativa de liberdade prevista para o crime seja superior a 4 anos. Ocorre que, verifico que o acusado possui identificação suficiente nos autos. Às fls. 52 e 58 do IPL, respectivamente, constam a ficha de identificação criminal e o cadastro no Infopen, sem divergências quanto aos dados de qualificação. Ainda que esses cadastros não fossem suficientes, estando o flagranteado preso, ele não tem como diligenciar para providenciar sua identidade civil. Em consequência da exigência impossível de ser atendida pelo próprio flagranteado, o Estado o pune com mais prisão. Poder-se-ia dizer que o flagranteado poderia pedir a um familiar para trazer seus documentos a juízo. No entanto, a família do flagranteado não tem esta obrigação,nem pode justificar a manutenção da prisão de uma pessoa a leniência ou inimizade de outra. Por outro lado, o flagranteado não pode ser punido, segundo entendemos, nem mesmo se ele efetivamente não quiser entregar seus documentos. É que ele não pode ser coagido a contribuir, de nenhuma forma, nem mesmo se identificando corretamente, com a sua punição. Beccaria já alertava para este absurdo: ¿Outra contradição entre as leis e os sentimentos naturais é exigir de um acusado o juramento de dizer a verdade, quando ele tem o maior interesse em calá-la. Como se o homem pudesse jurar de boa fé que vai contribuir para sua própria destruição!¿ Mas, à parte de todos os argumentos acima, o fato é que a correta identificação do suspeito é obrigação do Estado, mas especificamente da Polícia durante o Inquérito Policial. Neste sentido, diz o CPP (art. 6º, VIII) que, logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes. Haja vista o que determina a Constituição Federal (art. LVII, CF), deve-se evitar a identificação criminal (fotográfica e datiloscópica) sempre que possível a civil. Assim, deve a autoridade policial diligenciar em busca de cumprir sua obrigação legal. E deve fazer isso assim que tiver conhecimento da infração penal. Trata-se de providência primeira, inicial. Se a identificação civil se mostrar impossível ou insuficiente para sanar as dúvidas, deve o flagranteado ser encaminhado à identificação criminal, que é regulada pela Lei 12.037/2009, que dispõe: ¿Art. A identificação criminal incluirá o processo datiloscópico e o fotográfico, que serão juntados aos autos da comunicação da prisão em flagrante, ou do inquérito policial ou outra forma de investigação¿. A norma não estabelece prazo para a realização da identificação criminal. No entanto, como o CPP diz se tratar de providência primeira, presume-se que o suspeito deve estar apropriadamente identificado antes do envio do Inquérito Policial ao Poder Judiciário, ou, caso haja justificativa plausível para a não realização da diligência, em prazo razoável. Se não identificado pela autoridade policial, estamos diante de hipótese de relaxamento de prisão. Assim, como justificar a conversão do flagrante em preventiva? Inadmissível, ilegal, inconstitucional. Entendemos essa modalidade de prisão completamente inconstitucional, posto que a falta de nome ou identidade do réu não impede o oferecimento da denúncia (CPP art. 41: ¿A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas¿), bem como o procedimento menos gravoso será a identificação criminal (Lei 12.037/2009). Desse modo, a decretação de prisão preventiva para suprir eventual deficiência de identificação civil é abusiva, pois sempre haverá possibilidade da utilização da identificação criminal, que inclusive foi realizada, (na deficiência da identificação civil). Somente após a identificação criminal ter sido realizada, e comprovada a necessidade de custodia cautelar (por exemplo, o agente que tem um mandado de prisão em aberto) poderá ser decretada a preventiva. Outra desproporção que se verifica é que tal dispositivo é bastante similar à hipótese de prisão temporária, prevista no art. 1, II, da Lei nº 7.960/89. Todavia, esta se refere a prisão do indiciado para a investigação. Esta nova modalidade de prisão preventiva, que não é um pressuposto simples como os demais, mas sim uma nova modalidade de prisão, é pura e simplesmente para esclarecer a identidade, seja a pessoa indiciada, seja acusada, prescindindo-se da necessidade de imprescindibilidade para a investigação. Isto é, a prisão da pessoa que não forneça elementos para sua identificação pode até ser totalmente desnecessária para a investigação, mas será feita simplesmente porque não há prova desta identificação pessoal. Ante o exposto,concedo a liberdade provisória para CARLOS HENRIQUE PEREIRA SOUZA com base no art. 321 do CPP, impondo-lhe as seguintes medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP: I - comparecimento periódico em juízo, de quatro em quatro meses, para informar e justificar atividades; II - proibição de ausentar-se da Comarca por mais de 08 (oito) dias sem autorização do juízo já que sua permanência é conveniente e necessária para a investigação e instrução; III - proibição de aproximar-se da vítima e de seus familiares a uma distância mínima de 100 metros. Expeça-se o competente alvará de soltura e dê-se ciência ao réu das condições impostas. Cumpra-se. Belém, 20 de julho de 2017. Flávio Sánchez Leão Juiz de Direito

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