Página 3023 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 24 de Novembro de 2017

pessoa com deficiência como aquela que tem “impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial” (artigo 2º) e advertindo que a curatela “constitui medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, e durará o menor tempo possível” (artigo 84, § 3.º).Assim, à luz do Estatuto, o deficiente desfruta plenamente dos direitos civis, patrimoniais e existenciais, até porque a capacidade civil é um direito fundamental do ser humano, corolário de sua dignidade e liberdade. Contudo, se a deficiência se qualifica pelo fato de a pessoa não conseguir se autodeterminar, o ordenamento lhe conferirá proteção maior do que aquela conferida a um deficiente capaz, demandando o devido processo legal de curatela.Todavia, mesmo no caso excepcional de curatela, não mais há se falar em incapacidade absoluta, mas apenas relativa. De fato, as pessoas deficientes submetidas à curatela não são absolutamente incapazes, mas relativamente incapazes. De acordo com o artigo 114 do Estatuto, o artigo do Código Civil passa a vigorar com as seguintes alterações: “São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos”. Com a revogação dos seus incisos, já não mais se consideram incapazes aqueles que “por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos” (inciso II da redação original). O artigo do Código Civil também é alterado: “São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: I Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II os ébrios habituais e os viciados em tóxico; III aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; IV os pródigos”. Excluem-se do rol dos relativamente incapazes as pessoas com deficiência mental e discernimento reduzido, além dos excepcionais, sem desenvolvimento mental completo (incisos II e III da redação original).A respeito do objetivo dessas normas, ensina Nelson Rosenvald:”O objetivo que se quer alcançar com a conjugação das duas normas é elogiável: suprimir a incapacidade absoluta do regramento jurídico da pessoa com deficiência psíquica ou intelectual. O critério médico até então utilizado era baseado na ausência de discernimento em caráter permanente seja ela resultante de enfermidade ou deficiência mental. A interdição do absolutamente incapaz decorria de um estado pessoal, patológico, “caracterizado por uma estabilidade que influi sobre a idoneidade para o cumprimento de uma série de atos, de atividades e, de toda sorte, sobre a possibilidade de desenvolver adequada e livremente, isto é, normalmente, a personalidade”. Contudo, diante da infinidade de hipóteses configuradoras de transtornos mentais ou déficits intelectuais seja pela origem, graduação do transtorno ou pela extensão dos efeitos é insustentável a tentativa do direito privado do século XXI de persistir na homogeneização da amplíssima gama de deficiências psíquicas, pelo recurso ao enredo abstratizante do binômio incapacidade absoluta ou relativa, conforme a pessoa se encontre em uma situação de ausência ou de redução de discernimento.(...) A aferição da efetiva existência de um transtorno mental é um dado que pertence aos saberes da Psiquiatria, sem necessária repercussão no campo da capacidade civil” (ROSENVALD, Nelson, “Curatela”, in “Tratado de Direito das Famílias”, Rodrigo da Cunha Pereira (organizador), Belo Horizonte: IBDFAM, 2015, p.741).Destarte, o Estatuto não mais rotula como incapaz aquele que ostenta uma insuficiência psíquica ou intelectual, optando por localizar a incapacidade no conjunto de circunstâncias que evidenciem a impossibilidade real e duradoura da pessoa querer e entender. Ou seja, o divisor de águas da capacidade para a incapacidade relativa não mais reside nas características da pessoa, mas no fato de se encontrar em uma situação que a impeça, por qualquer motivo, de conformar ou expressar a sua vontade (ROSENVALD, ob. cit., p. 744). Portanto, à luz do ordenamento jurídico atual, para que a pessoa com deficiência seja submetida à curatela, é necessário que esteja impossibilitada de exprimir a sua vontade. Prevalece, segundo ROSENVALD, “o critério da impossibilidade de o cidadão maior tomar decisões de forma esclarecida e autônoma sobre a sua pessoa ou bens ou de adequadamente as exprimir ou lhes dar execução” (ob. cit., p. 744). Por outro lado, como adverte o mesmo doutrinador, “a impossibilidade não é qualquer dificuldade ou complexidade, mas um impedimento de caráter absoluto. Não poder exprimir a sua vontade, importa em situação de ausência de consciência de si e do entorno, para a qual todo um sistema de tomada de decisão apoiada seja insuficiente, sendo necessária a escolha de um curador para exercer a assistência” (ob. cit., p. 744).No caso vertente, a prova coligida aos autos revela que o requerido não tem condições de exprimir sua vontade de forma esclarecida e autônoma, dada a deficiência que possui.O laudo psiquiátrico revela que o requerido é portador de Demência na doença de Alzheimer e de Demência por Doenças Cardiovasculares, apresentando “Quadro de sintomas demencial progressivo e irreversível já em alienação mental e incapaz para atos da vida civil. Apresenta alterações que prejudicam seu discernimento. Está no momento totalmente incapaz de cuidar de si e de seus interesses. Mostrando-se inteiramente dependente de terceiros no que tange às diversas responsabilidades exigidas pelo convívio em sociedade. Hoje já não consegue mais assinar seu nome, vê escuta televisão, mas não compreende o que está assistindo. Não soube responder quem é o presidente do Brasil” (fls. 94).No mesmo sentido versam as impressões colhidas por ocasião da entrevista do requerido (fls. 60).Destarte, o requerido deve ser submetido à curatela e ter sua incapacidade parcial reconhecida por este Juízo.Porém, é importante esclarecer que a curatela será limitada à restrição da prática de atos patrimoniais, preservando-se, na medida do possível a autodeterminação para a condução das situações existenciais, conforme dispõe o artigo 85 da Lei nº 13.146/15: “A curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial. § 1º. A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto.”Sendo assim, como adverte ROSENVALD, “a excepcional submissão à curatela será conformada com a preservação do status personae, limitando-se a atuação do curador ao suporte da vontade nos aspectos puramente econômicos. Em regra, as manifestações que concernem à vida familiar, sexual e ao espaço da intimidade do ser humano não se submeterão a decisões heterônomas. Nessas decisões, prevalecem as crenças e sentimentos que animam a pessoa, reservada a atuação do curador à esfera patrimonial” (ob. cit., p. 746). Ou, ainda, “apesar de todas as limitações, o incapaz não abdica de ser gente, pois o peso da condição humana lhe é inerente. O ser humano é um valor unitário, insuscetível de fragmentação naquilo que lhe suprima a individualidade” (ob. cit., pg. 763). Por isso mesmo, a Lei nº 13.146/15 alterou a redação do artigo 1.772 do Código Civil, que passou a apresentar a seguinte redação: “O juiz determinará, segundo as potencialidades da pessoa, os limites da curatela, circunscritos às restrições constantes do art. 1.782, e indicará curador”.O 1.782 do Código Civil, por sua vez, estabelece que “A interdição do pródigo só o privará de, sem curador, emprestar, transigir, dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, em geral, os atos que não sejam de mera administração.”Destarte, e considerando o teor do laudo psiquiátrico, no caso vertente, a curatela do requerido limitar-se-á aos atos de emprestar, transigir, dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandada e aos atos que não sejam de mera administração. Os demais atos poderão ser praticados livremente pelo requerido, sem participação do curador.O requerente deve ser nomeado curador do requerido, dado o vínculo biológico existente entre eles, como revela a prova documental carreada aos autos, devendo prestar contas anualmente. Ante o exposto, extinguindo o feito, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para: a) declarar Antonio Firmino da Silva parcialmente incapaz de exercer pessoalmente os atos da vida civil, consistentes em emprestar, transigir, dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado e naqueles que não sejam de mera administração; b) nomear Curador do requerido Weslley Antonio Firmino da Silva, o qual deverá representa-lo naqueles atos.Em obediência ao disposto no artigo 755, parágrafo 3o, do Código de Processo Civil e no artigo , inciso III, do Código Civil, inscreva-se a presente no Registro Civil e publique-se na imprensa local e no Órgão Oficial, três vezes, com intervalo de dez dias.O Curador deverá prestar contas, nos termos do artigo 84, § 4.º do Estatuto,

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