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16 de Junho de 2024
  • 1º Grau
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TJPI • PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL • DIREITO DO CONSUMIDOR • XXXXX-67.2019.8.18.0117 • JECC Valença do Tribunal de Justiça do Piauí - Inteiro Teor

há 3 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

JECC Valença

Assuntos

DIREITO DO CONSUMIDOR, Contratos de Consumo, Bancários, Empréstimo consignado DIREITO DO CONSUMIDOR, Contratos de Consumo, Bancários, Tarifas

Partes

Documentos anexos

Inteiro TeorTJPI_20474917.pdf
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ

JECC DA COMARCA DE VALENçA DO PIAUÍ

Rua General Propécio de Castro, 394, Centro, VALENçA DO PIAUÍ - PI - CEP: 64300-000

PROCESSO Nº: XXXXX-67.2019.8.18.0117

CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436)

ASSUNTO (S): [Empréstimo consignado, Tarifas]

AUTOR: ANTONIA NUNES ARAUJO

REU: BANCO BRADESCO S.A.

SENTENÇA

I. RELATÓRIO

Trata-se de AÇÃO INDENIZATÓRIA formulada por ANTÔNIA NUNES ARAÚJO em face do BANCO BRADESCO S/A , ambos qualificados, sustentando, em síntese, que apesar de não ter contratado com a parte ré, fora surpreendida com descontos indevidos em sua conta bancária atinente a contratos de empréstimo, prêmio de seguro e título de capitalização, fato que lhe causou enormes transtornos e irreparável dano. Citada, a ré ofereceu contestação sustentando, preliminarmente, a ausência de condição da ação, incompetência do Juizado Especial e conexão. No mérito, pugnou pela improcedência do pedido aduzindo a regularidade das contratações de empréstimos e a inexistência de dano moral e material.

Em sede de Audiência de Conciliação, restando infrutífera a autocomposição, sobreveio Audiência de Instrução e Julgamento com alegações finais remissivas da parte autora e orais da parte requerida.

Brevemente relatado. Decido.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A) DAS QUESTÕES PRELIMINARES Inicialmente, conquanto concorde que o Poder Judiciário não deveria ser utilizado como

"balcão de reclamação", a preliminar de carência de ação por ausência de interesse processual não tem o menor cabimento diante da própria contestação apresentada, indicativa de pretensão resistida.

Aliás, pelo Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, inexiste obrigação de esgotamento da via administrativa.

Quanto a preliminar de conexão, hei por bem afastá-la, uma vez que não há o que se falar em risco de decisões conflitantes a ensejar a reunião dos feitos, posto que o processo indicado ( XXXXX-82.2019.8.18.0117) já fora julgado.

Por fim, quanto à preliminar de Incompetência do Juizado Especial, vislumbro que o pleito merece guarida quanto aos contratos nº 298747054, nº 304986562 e nº 349153882.

A jurisprudência farta dos tribunais há longas datas defende a incompetência dos Juizados Especiais sempre que a realização de perícia grafotécnica se tornar imprescindível para o deslinde das questões processuais postas sob apreciação.

Isto porque, segundo o entendimento majoritário, do qual comungo, a incompetência do Juizado Especial para causas de alta complexidade, conforme exegese do art. da Lei 9.099/95, é aferida pelo objeto da prova, e não em face do direito material invocado. Neste sentido:

DEMANDA INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. RELAÇÃO DE CONSUMO.

CONTRATO ASSINADO. ALEGAÇÃO DE FRAUDE.NECESSIDADE DE EXAME GRAFOTÉCNICO CONSTANTE NO CONTRATO DA DÍVIDA. NECESSIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA.COMPLEXIDADE PROBATÓRIA. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS RECONHECIDA. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. As causas em que se exige a necessidade de perícia complexa para o deslinde da questão ficam subtraídas do alcance dos Juizados Especiais. (TJ-MT - RI: XXXXX20188110015 MT, Relator: SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Data de Julgamento: 05/03/2020, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 06/03/2020).

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. CONSUMIDOR. EMPRESTIMO MEDIANTE FRAUDE. NECESSIDADE DE PERÍCIA GRAFOTÉCNICA PARA AFERIR A AUTENTICIDADE DA ASSINATURA APOSTA NO CONTRATO. INCOMPETÊNCIA EM FACE DA COMPLEXIDADE DA MATÉRIA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. Havendo alegação de falsificação de assinatura do contrato que poderia por fimà presente ação de execução, somente podendo ser comprovada tal assinatura por conhecimentos técnicos, a realização da prova pericial mostra-se indeclinável à aferição da alegada falsidade, que por envolver matéria complexa afasta a competência dos Juizados Especiais Cíveis, impondo a extinção do processo sem exame do mérito na dicção dos artigos e 51, inciso II, da Lei 9.099/95. 2.Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida pelos seus próprios fundamentos. A Súmula de julgamento servirá de acórdão, na forma do artigo 46 da Lei 9.099/95. Condenado o recorrente vencido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez porcento) do valor da causa, os quais ficarão suspensos em virtude da gratuidade de justiça que lhe foi deferida. (TJ-DF - ACJ: XXXXX,Relator: FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA, Data de Julgamento: 17/05/2016, 3a Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Publicação: Publicado no DJE: 19/05/2016. Pág.:388).

Assim, o rito sumaríssimo previsto na Lei 9.099/95, norteado pelo princípio da simplicidade, não suporta demandas de maior complexidade probatória, a exemplo das que exigem pareceres técnicos e laudos periciais complexos.

Este, aliás, é o escólio sedimentado no Enunciado nº 54 do FONAJE, abaixo transcrito.

ENUNCIADO 54. A menor complexidade da causa para a fixação da competência é aferida pelo objeto da prova e não em face do direito material.

In casu, o Banco Bradesco S/A sustenta preliminar de incompetência do juizado especial indicando necessidade de prova complexa sob os contratos que junta como prova dos negócios jurídicos firmados e a parte autora, por sua vez, em audiência de instrução e julgamento, não reconhece como sua as assinaturas opostas.

Bem, vistos a olho nu, as assinaturas constantes dos documentos impugnados e dos documentos pessoais, procuração e demais documentos se mostram semelhantes, não sendo possível, contudo, precisar a autenticidade com grau de confiabilidade sem a realização de perícia grafotécnica.

Neste viés, não me parece justo furtar à parte ré este tipo de defesa, sobretudo quando se vê que o julgamento do processo depende irrefutavelmente da resolução desta celeuma de ordem técnica.

Portanto, diante da semelhança das assinaturas apostas, a realização da prova pericial mostra-se indeclinável à aferição da alegada falsidade, que por envolver matéria complexa afasta a competência dos juizados Especiais Cíveis, impondo o acolhimento da preliminar de incompetência e a extinção parcial do processo sem possibilidade de declinação, na dicção dos artigos e 51, II, da Lei 9.099/95.

B) DAS QUESTÕES DE MÉRITO - SEGURO E TITULO DE CAPITALIZAÇÃO Como dito linhas volvidas, alegando não ter firmado o negócio jurídico ou autorizado os

descontos efetivados em sua conta bancária a título de seguro e plano de capitalização, tenciona a requerente a declaração de inexistência, devolução dos prêmios pagos e indenização pelo abalo moral decorrente.

Pois bem.

Os fatos se inserem no âmbito do CDC, posicionando-se a parte passiva como fornecedora de produtos e serviços, e do diploma consumerista incide a regra de inversão do ônus da prova, consoante art. 6.º, VIII.

Neste eito, antevejo que a autora trouxe aos autos demonstrativo de pagamento de prêmios do seguro e titulo de capitalização, descontados diretamente de sua conta bancária, conforme extratos acostados aos autos, e o réu, por outro lado, não comprovou contratação apta a amparar a respectiva exigibilidade, limitando-se apenas a alegar regularidade dos contratos de empréstimos em sede de contestação.

Diante disso, conclui-se que o demandado não se desincumbiu do ônus probatório que lhe competia (art. 373, II, CPC), pois a ele cabia provar a contratação e demonstrar a autorização da parte autora para os débitos automáticos.

Ademais, vê-se que os extratos bancários colacionados aos autos são provas hábeis para demonstrar que as cobranças foram de fato realizadas, caracterizando, deste modo, conduta ilícita, haja vista a inexistência de relação jurídica regularmente comprovada.

A consequência lógica e natural do reconhecimento da inexistência do negócio jurídico é a determinação de devolução do montante efetivamente descontado da conta bancária da autora sem autorização.

Ademais, a repetição deverá recair somente sobre as parcelas efetivamente comprovadas, atinentes aos prêmios de seguro e título de capitalização discutidos nos autos, cujo ônus a parte autora competia, eis que os extratos são salvaguardados por sigilo bancário, inviabilizando a juntada pela parte contrária, e de forma simples, considerando que a devolução dobrada do contrato após a fruição do seu proveito configuraria enriquecimento ilícito mediante abuso de direito.

Quanto à Mora guerreada e o pedido contraposto requerido, vislumbro que não merecem acolhimento, uma vez que os contratos que os originaram foram julgados sem resolução do mérito, ante necessidade de perícia grafotécnica.

Por outro lado, não me parece viável o pleito de indenização por danos morais.

Consoante abalizada doutrina, a mera dedução indevida de valores em conta bancária não configura dano moral, salvo se da situação advém circunstância que atente contra a dignidade da parte. Vale dizer, para que haja indenização por danos morais a situação deve desbordar dos limites do mero dissabor decorrentes das vicissitudes da vida e afetar o ânimo psíquico da vítima, seja por ofensa à sua honra, privacidade, intimidade, imagem ou nome.

Na hipótese em debate, não houve inscrição indevida do nome da autora nos serviços de proteção ao crédito, tampouco cobrança vexatória ou mesmo violação de qualquer direito da personalidade, mas tão somente cobrança indevida.

Registre-se, por conveniente, que não se pretende banalizar os sentimentos humanos ao ponto de desconsiderar os aborrecimentos e frustrações vivenciados pela autora diante dos descontos indevidos. Contudo, considerando que a responsabilidade civil exige a ocorrência efetiva de dano, ressalvada algumas exceções de dano in re ipsa , é forçoso concluir que, no caso em tela, não merece reparação.

No mais, a jurisprudência vem se comportando pela obrigatoriedade de devolução em situações de descontos, mutatis mutandis , como tais, mas sem indenização por danos morais, convindo transcrição de alguns arestos a título de exemplificação:

RECURSO CÍVEL INOMINADO - DEMANDA INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS ? RELAÇÃO DE CONSUMO ? COBRANÇA INDEVIDA DE SEGURO NÃO CONTRATADO ? RESPONSABILIDADE CIVIL CONFIGURADA ? DANO MORAL ? INOCORRÊNCIA ? MERO ABORRECIMENTO ? PREQUESTIONAMENTO ? REJEIÇÃO ? SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA ? RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Transtornos e contratempos que o homem sofre no seu cotidiano, normais na vida de qualquer um, não são suscetíveis de reparação civil. (TJ-MT - RI: XXXXX20178110004 MT, Relator: SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Data de Julgamento: 10/12/2018, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 11/12/2018)

III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, pondo fim a fase cognitiva deste processo com resolução do mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS, relativos aos prêmios de seguro e título de capitalização, deduzidos na inicial para:

A) Declarar a INEXISTÊNCIA da relação jurídica entre o requerente ANTÔNIA NUNES ARAÚJO e o requerido BANCO BRADESCO S/A referente aos contratos de seguro e título de capitalização discutidos nos autos;

B) DETERMINAR, em sede de antecipação de tutela, a cessação imediata dos descontos identificados, referente aos contratos de seguro e título de capitalização declarados inexistente no item A.

C) CONDENAR o requerido a restituir de forma simples os valores referentes aos contratos de seguro e título de capitalização discutidos nos autos, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios da data desta sentença até o efetivo pagamento, bem como de eventuais descontos cobradas no curso do processo. Por fim, atinente aos contratos nº 298747054, nº 304986562 e nº 349153882 JULGO

EXTINTO O PROCESSO , sem resolução de mérito, nos termos do art. 51, II, c/c art. , caput, da Lei nº 9.099/95.

Sem condenação em honorários advocatícios, nem custas processuais, em conformidade com os arts. 54 e 55 da Lei 9.099/95.

Sobrevindo pagamento voluntário, fica desde logo autorizado à expedição de alvará. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se.

VALENÇA DO PIAUÍ-PI, 09 de novembro de 2021.

FRANCO MORETTE FELÍCIO DE AZEVEDO

Juiz de Direito titular do JECC de Valença do Piauí

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