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5 de Maio de 2024

Ação na Justiça Comum que visa restabelecer benefício previdenciário não impede trabalhador de receber créditos trabalhistas

Atuando como redatora de um processo analisado na Turma Recursal de Juiz de Fora, a desembargadora Juliana Vignoli Cordeiro se deparou com uma questão polêmica: um empregado pode se recusar a receber seus créditos trabalhistas por causa da existência de ação na Justiça Comum em que ele pede o restabelecimento do benefício previdenciário? Para a julgadora, a resposta é não, já que o trabalhador não provou que sua recusa tenha sido justa, nos termos do artigo 544, II, do novo CPC. Assim, ela entendeu que o trabalhador deve receber o crédito trabalhista.

Inicialmente, é importante entender a ação de consignação em pagamento: Quando o credor não puder receber o pagamento, ou se recusar a tanto, ou ainda não quiser dar o recibo de quitação da dívida, o devedor pode ajuizar uma ação de consignação em pagamento e fazer o depósito do valor devido em juízo, desonerando-se da obrigação. Isso pode ser feito também quando houver dúvida sobre quem tem legitimidade para receber o pagamento. De acordo com o artigo 335 do Código Civil, a ação de consignação em pagamento tem a finalidade de desonerar a parte autora de dívida que reconhece existir, entregando a quantia ou a coisa devida e evitando a mora ou a ineficácia no cumprimento da obrigação. O art. 544, II, do novo CPC, por sua vez, dispõe que "Na contestação, o réu poderá alegar que: foi injusta a recusa".

No caso, a loja de móveis recorreu ao TRT, alegando que não foi indicada, na sentença, a hipótese legal a prever que seria justa a recusa ao recebimento de verbas rescisórias em virtude da existência de ação cível em que o trabalhador pede o restabelecimento de benefício previdenciário. Argumentou que a ação ajuizada pelo trabalhador na Justiça Comum para prorrogação do benefício previdenciário não tem o condão de suspender o contrato de trabalho.

A empresa alegou que houve abandono de emprego porque, após a alta previdenciária, o reclamante não apresentou novo atestado ou se submeteu a exame pelo médico do trabalho, deixando de comparecer, simplesmente, para a prestação dos serviços, mesmo depois de convocado para tanto. Destacou que o ex-empregado não comprovou que está incapacitado para o trabalho, ou mesmo que tenha ajuizado ação na Justiça Comum para ver o benefício previdenciário estendido. Apontou, ademais, que a dispensa por justa causa não prejudicará os direitos previdenciários do réu, que estaria em período de graça, no qual será preservada a sua condição de segurado.

O trabalhador, por seu turno, não juntou documentos ao processo. Apresentou apenas defesa oral, na qual alegou que estava impossibilitado de trabalhar, devido a suas condições de saúde, tendo inclusive solicitado a prorrogação de benefício previdenciário perante o INSS, o que lhe foi negado, gerando o ajuizamento de ação judicial em face do órgão previdenciário. Por isso, não concordou com a rescisão contratual. A juíza sentenciante julgou improcedente a ação de consignação em pagamento e não recebeu os valores e documentos postos à disposição do trabalhador. No entendimento da juíza, a ação perante a Justiça Comum pedindo a prorrogação do benefício previdenciário suspende o contrato de trabalho e impede o seu fim.

Entretanto, a desembargadora discordou desse posicionamento. Na sua avaliação, a ação de consignação em pagamento não é a via adequada para a análise acerca da ocorrência ou não de justa causa apta a ensejar a dispensa. Seu objeto restringe-se às razões que levaram o consignatário a recusar o recebimento da quantia depositada em juízo. "Logo, ainda que se conclua pela inexistência de justo motivo para a recusa, não haverá julgamento de mérito, sujeito à coisa julgada, sobre a hipótese de dispensa por justa causa e sua validade", completou.

A desembargadora observou a incorreção do argumento de que a ação judicial em face da autarquia previdenciária suspenderia o contrato de trabalho, pois não existe previsão para tanto, à luz dos artigos 471 e seguintes da CLT. Ela salientou que, como sustentado pela empresa, a suspensão contratual, em se tratando de incapacidade para o trabalho, pressupõe o afastamento em virtude de atestado médico ou por força de benefício previdenciário. "Logo, se o benefício previdenciário teve fim e o trabalhador não apresenta atestado médico, de médico particular ou de médico do trabalho da empregadora, que revele sua incapacidade para o labor, nenhuma causa jurídica existe para a suspensão contratual", ponderou.

Sob essa ótica, a relatora acentuou que, para o único fim de apreciar as razões da recusa de recebimento das verbas rescisórias por parte do trabalhador, basta concluir que, uma vez não suspenso o contrato de trabalho, ele poderia ser dispensado até mesmo sem justa causa, em especial por não haver alegação, em defesa, de que o benefício previdenciário fruído fosse acidentário e resultasse em garantia de emprego.

Apesar da controvérsia sobre a espécie de dispensa, o que repercute nas parcelas e nos valores devidos, a desembargadora entende que o trabalhador não deveria ter recusado o recebimento da quantia oferecida pela empresa, porque poderia fazê-lo com ressalvas a fim de reclamar, futuramente, diferenças que entenderia devidas em virtude da modalidade de ruptura contratual. "Feita a consignação dos valores que a consignante entende devidos, ela se exonera de juros e correção monetária apenas com relação a eles, o que em nada prejudica o direito de ação do consignatário no tocante a eventuais diferenças", destacou no voto.

Ao finalizar, a julgadora invocou o conteúdo do item I da Súmula 330 do TST, registrando que: "A quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, consequentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que estas constem desse recibo". Assim, concluindo que o trabalhador não conseguiu provar que sua recusa tenha sido justa (artigo 544, II, do NCPC), a relatora deu provimento parcial ao recurso para condená-lo a receber o valor consignado.

PJe: Processo nº 0010987-57.2015.5.03.0068 (RO). Acórdão em: 27/05/2016

Para acessar a decisão, digite o número do processo neste link

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