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28 de Maio de 2024
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    As mudanças na prova penal

    Publicado por Espaço Vital
    há 16 anos

    Por José Carlos Teixeira Giorgis,

    desembargador aposentado do TJRS e professor.

    Assim como o agricultor joga as sementes na terra em momentos sazonais, os legisladores se acham no dever de aprovar leis às instâncias da pressão midiática, do clamor contra a violência, ou retórica sobre a impunidade. Nem sempre são felizes contentando-se em colher preceitos de outras árvores, repetir verbetes sumulados ou colar normas perdidas; ainda atender algum interesse de jurista amigo.

    Uma reforma recente é a que produz breve maquiagem em alguns institutos da prova penal, sempre com os olhos postos em episódio reclamado pela imprensa.

    Sistema de avaliação. Afirma-se que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, mas poderá, por acaso, construí-la em outra sede que não o processo? Não pode decidir apenas com base em dados da investigação, ressalvadas as provas cautelares; ora, aluno de primeiro semestre sabe que o inquérito é peça informativa, sem valor probante, salvo reiteração em juízo. Acrescente-se que é da ciência jurídica o entendimento consagrado que as provas impossíveis de repetição podem sedimentar o veredicto (CPP , artigo 155).

    Ônus da prova. É da parte que alega, mas o juiz poderá de ofício, antes de receber a denúncia ordenar produção antecipada de matéria urgente e relevante, observadas a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; também no curso da instrução (CPP , artigo 156 , I e II).

    A inovação causará muitos arrepios aos que não aceitam a intervenção judicial sem que provocada, pois o magistrado deve manter-se em situação de eqüidistância e imparcialidade na condução da demanda; contudo, é de recordar-se que o bem da vida em debate é a liberdade do acusado, o que deve ensejar diligências para melhor persuasão do julgador, isso quando as partes abdiquem de fornecer ao contexto suficientes elementos de convicção.

    Provas ilícitas. O legislador importou para o código regra constitucional bem tratada pela Suprema Corte e com cuidadosa interpretação da doutrina mais respeitável, ambas abertas aos influxos de precedentes internacionais. Pode-se flagrar até alguma contradição na insistência dos conceitos postos da adição feita, já que, se a prova derivada não deriva da prova ilícita, seguramente não é prova derivada!

    E se a autoridade já estava desenvolvendo tratativas de investigação que lograram coincidir com as conseqüências de uma prova inadmissível, por óbvio que se cuida de uma prova originária, nunca derivada. Não há dúvida, no entanto, que o assunto se prestará na prática para justificar algumas irregularidades ou, até, para sacrificar uma boa pesquisa da verdade dos fatos, pois as fronteiras cravadas entre uma e outra concepção são tênues e permeáveis. O desentranhamento da prova de alegação preclusa é natural no processo; e a cerimônia de sua inutilização é tão redundante como a que se imagina no incidente de interceptação telefônica (CPP , artigo 157 e parágrafos).

    Perícias e peritos. Depois de consolidada a necessidade de dois peritos oficiais, retorna-se ao sistema de um só experto judicial, talvez pela carência de servidores concursados ou pela possibilidade de atuação de assistentes. Os especialistas não oficiais, embora qualificados, devem constituir dupla, embora prestem o compromisso da fé, o que indica menos valia perante o funcionário. Há muito se reclamava o contraditório nos exames de corpo de delito operados em fase de inquérito.

    Ali se constrói a base probatória, sabem os profissionais do direito. A modificação que admite a presença de assistentes técnicos e a formulação de quesitos nesta fase administrativa, além da simetria científica com o processo civil, oferece condições de melhor apuração da autoria e do fato; e o comparecimento dos entendidos perante o juiz fortalece o convencimento. Também é boa iniciativa a guarda do material periciado, salvo se impossível a conservação. Abre-se, ainda, a chance de uma pluralidade de peritos e assistentes, quando o esclarecimento da infração incida em vários campos do conhecimento. Resta aguardar como se fará a otimização da diligência nos cômodos públicos (CPP , artigo 159).

    Ofendido. Como sujeito passivo da infração e parte interessada, a vítima deve ser avisada dos atos processuais relativos ao ingresso e saída do agente da prisão onde se encontre recolhido, data das audiências, sentença e acórdãos que a mantenham ou mudem. As comunicações aceitam o correio eletrônico, se ele assim entender. O ofendido terá lugar cativo nas audiências. Em caso de abalo físico ou psíquico, a vítima receberá tratamento interdisciplinar, à custa do ofensor ou do Estado, inclusive apoio jurídico, sem ônus.

    Embora a sadia intenção de proteger a vítima, não se vislumbra fácil a implementação da novidade. A lei projeta a preservação da intimidade e da honra do ofendido e o segredo de justiça quanto a seus dados, restrição que alcança somente os agentes públicos envolvidos e não seu procurador. A cautela busca inibir os escândalos divulgados pela mídia e o fácil acesso às esferas da privacidade (CPP , artigo 201 e parágrafos).

    Testemunhas. Assim como acontecia com os acusados, as testemunhas devem ocupar salas diferentes antes do depoimento, para evitar a comunicação entre elas. Em sintonia com a coleta de declarações em outros países, as perguntas das partes são feitas diretamente às testemunhas, sem passar pelo juiz, o que representa ruptura do sistema presidencial; pode o juiz, contudo, intervir para evitar insinuações, repetição de respostas ou perguntas irrelevantes; também para completar a inquirição, quando obscuros alguns pontos do depoimento. Todas as incidências constarão do termo.

    A inquirição direta já se previa no júri, mas como letra morta (CPP , artigos 210 a 217).

    (*) E.mail: jgiorgis@terra.com.br

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