Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
15 de Junho de 2024
    Adicione tópicos

    Continuidade delitiva não pode ser reconhecida por meio de habeas corpus (Informativo 520)

    há 16 anos

    Brasília, 15 a 19 de setembro de 2008 Nº. 520

    Data: 24 de setembro de 2008

    Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça. PRIMEIRA TURMA

    Reconhecimento da Continuidade Delitiva e Fase de Execução - 3

    A Turma concluiu julgamento de habeas corpus em que se pretendia o reconhecimento da continuidade delitiva entre os diversos crimes de estupro, atentado violento ao pudor e roubo praticados pelo paciente ? v. Informativo 514. Inicialmente, em questão de ordem, o Min. Carlos Britto, relator, apreciou matéria nova suscitada, na assentada anterior, pelo Min. Março Aurélio, relativa à possibilidade ou não de o juízo da execução criminal alterar o título condenatório definitivo para reconhecer a continuidade delitiva. Manifestou-se afirmativamente, realçando que ao juiz da execução compete decidir sobre soma ou unificação de penas; progressão ou regressão de regimes; detração e remição da pena e suspensão condicional da pena (LEP , art. 66 , III). Asseverou que o voto que proferira, no sentido do indeferimento do habeas corpus, não prejudicaria o manejo de eventual ação de revisão criminal (CPP , art. 621), uma vez que não avançou no exame da existência ou não dos requisitos da continuidade delitiva. Reiterou, dessa forma, o entendimento de que a análise da impetração exigiria o revolvimento de todo o quadro empírico dos delitos praticados, incabível na via eleita, no que foi acompanhado pelos Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski. Vencido, no ponto, o Min. Março Aurélio que julgava cabível a concessão, de ofício, do writ para assentar a impropriedade do exame procedido em execução de títulos condenatórios, como se pudessem ser modificados em tal via, abrindo-se margem, com isso, a que as matérias versadas pudessem ser apreciadas mediante o instrumental próprio. Em seguida, tendo em conta que as condenações estabeleceram a obrigatoriedade do regime integralmente fechado para o cumprimento das penas, a Turma, por unanimidade, deferiu a ordem, de ofício, para viabilizar a progressão no regime de cumprimento de pena. HC 93536/SP , rel. Min. Carlos Britto, 16.9.2008. (HC-93536) .

    NOTAS DA REDAÇÃO

    Pontos importantes foram tratados no presente Informativo: a (im) possibilidade de reconhecimento da continuidade delitiva em sede de habeas corpus; a possibilidade de o juiz da execução reconhecer a ocorrência de crime continuado, e, por fim, o tratamento da doutrina em relação à caracterização do crime continuado entre os crimes de estupro e atentado violento ao pudor.

    Comecemos pelo último item. Muito se discute na doutrina e jurisprudência pátria a plausibilidade de se reconhecer a continuidade delitiva entre o estupro e o atentado violento ao pudor.

    O crime continuado é definido pelo art. 71 do Código Penal :

    Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços .

    Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código.

    Assim, de acordo com o caput do dispositivo supracitado, para a configuração da continuidade impõe-se o preenchimento de determinados requisitos. São eles:

    a) pluralidade de ação ou omissão;

    b) crimes da mesma espécie;

    c) vínculo de continuidade entre os delitos praticados, o que se revela pelas circunstâncias de tempo, de lugar e de modo de execução.

    Para a configuração do crime continuado impõe-se a prática de mais de uma ação ou omissão. Em se tratando de uma única conduta, com pluralidade de resultados, estaríamos diante de concuso formal de crimes.

    Um dos principais requisitos da continuidade delitivaé anecessidade de se tratarem de crime da mesma espécie.

    Mas, o que seriam crimes da mesma espécie? Não há consenso sobre o tema. Há de se notar que o Código Penal brasileiro não prevê expressamente esse conceito, deixando-o a cargo da doutrina e da jurisprudência. Atualmente, contamos com duas teorias.

    Para alguns são crimes da mesma espécie os que ofendem o mesmo bem jurídico, ainda que previstos em tipos legais distintos. Seria o caso, por exemplo, do roubo (art. 157 do CP) e da extorsão (art. 158 do CP), que, embora em tipos legais diferentes, buscam proteger os mesmos bens jurídicos (integridade física e patrimônio). O que se considera, nesse caso, é a objetividade jurídica.

    Em contrapartida, parcela majoritária da doutrina nacional define como crimes da mesma espécie aqueles previstos no mesmo tipo penal, pouco importando se na figura simples ou qualificada, consumada ou tentada, culposa ou dolosa. O que realmente vale para os adeptos dessa corrente é que se trate de infração penal prevista no mesmo tipo legal. Nessa linha de raciocínio, são crimes da mesma espécie o furto simples, qualificado.

    No tocante às condições de tempo, de acordo com a jurisprudência, o lapso máximo permitido entre uma conduta e outra é de 30 dias. Entende-se que somente nesse período é possível reconhecer algum vínculo entre as infrações praticadas. Quanto às condições de lugar, é firme o entendimento de que os crimes devem ser praticados na mesma Comarca ou, pelo menos, em Comarcas vizinhas. Por fim, a unicidade no modo de execução se revela com a adoção, pelo agente criminoso, do mesmo modus operandi.

    A pergunta que não quer calar: é possível cogitar da existência da continuidade delitiva entre o crime de estupro e o de atentado violento ao pudor? Exemplificando: se o agente, no mesmo contexto fático pratica conjunção carnal com a vítima, e, em seguida , nela pratica outros atos libidinosos ou a obriga a nele praticá-los, ficaria caracterizado o crime continuado?

    Em razão da opção feita pela doutrina majoritária, em relação ao conceito de crimes da mesma espécie, a resposta para tal indagação é NÃO! Em se considerando crimes da mesma espécie somente aqueles previstos no mesmo tipo penal é impossíveldar espaço àconfiguração do crime continuado entre o delito de estupro, tipificado no artigo 213 do CP e atentado violento ao pudor, previsto no artigo 214 do CP, falando-se, apenas, em concurso material de crimes.

    Note-se que, para o reconhecimento da continuidade delitiva nesses casos seria indispensável a adoção do segundo conceito de crimes da mesma espécie, pois, somente os considerando como crimes que atentem contra o mesmo bem jurídico - liberdade sexual - restaria preenchido tal requisito.

    Sobre o tema, uma última observação se impõe: quando o ato libidinoso (distinto da conjunção carnal), for praticado antes do ato sexual em si, pode restar absorvido por esse, caracterizando-se somente o crime de estupro. Nesse caso, entende-se que tais atos são preparatórios do estupro, reconhecendo-se o chamado crime progressivo.

    Analisemos, agora, a possibilidade do manuseio do habeas corpus para o reconhecimento da continuidade delitiva.

    Nos termos do artigo , LXVIII , da Constituição Brasileira "conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder".

    É pacífico que o procedimento da habeas corpus não dá ensejo à produção de prova e à reanálise dos fatos, sendo indispensável para a sua admissibilidade, que esses já estejam devidamente esclarecidos nos autos.

    Exatamente por esse motivo que não se pode valer desse remédio constitucional para o reconhecimento do crime continuado, o que impõe, necessariamente, nova análise ao conjunto probatório.

    Por derradeiro, cumpre-nos analisar se o juízo da execução possui competência para reconhecer a continuidade delitiva. De acordo com o entendimento firmado pela nossa Suprema Corte, sim.

    Tratar-se-ia de hipótese trazida no artigo 66 , III da LEP (Lei de Execução Penal), já que, ao reconhecer o crime continuado, o magistrado determina a unificação das penas, nos termos do já analisado artigo 71 do CP .

    Nesses termos, é o que se extrai do artigo 66 da LEP , in verbis:

    Art. 66 - Compete ao Juiz da execução:

    III - decidir sobre:

    a) soma ou unificação de penas

    • Sobre o autorTradição em cursos para OAB, concursos e atualização e prática profissional
    • Publicações15363
    • Seguidores876050
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações972
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/continuidade-delitiva-nao-pode-ser-reconhecida-por-meio-de-habeas-corpus-informativo-520/114731

    Informações relacionadas

    Petição Inicial - TJMS - Ação Revisional, para que Reconheça o Crime Continuado - Revisão Criminal

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)