Testemunha de Jeová que teve cirurgia negada por não poder receber sangue será indenizado
Hospital deverá indenizar por danos morais e também pelos danos materiais causados ao homem, que realizou a cirurgia com médico particular.
Hospital terá de indenizar um homem da religião Testemunha de Jeová que teve cirurgia negada por médico do SUS. Devido à crença religiosa, o paciente não poderia receber transfusão de sangue caso houvesse complicações na cirurgia – fator que motivou a recusa por parte do corpo médico. Diante da recusa, o paciente teve de arcar com os custos da operação, realizada por médicos particulares, no mesmo hospital. A decisão é do juiz de Direito Ramiro Oliveira Cardoso, da 3ª vara Cível do Foro Central de Porto Alegre/RS.
Risco de complicação
A cirurgia foi negada ao paciente pelo SUS, primeiro pelo anestesista, depois pelos cirurgiões, ao argumento de que havia risco de sangramento, e consequente necessidade de transfusão de sangue. Após arcar com a cirurgia em médico particular, o autor ajuizou ação indenizatória contra o hospital. Afirmou que o procedimento cirúrgico em questão não envolvia cortes, e assim não haveria sangramento, mas os médicos consideraram o risco de complicações.
Nas alegações, o hospital afirmou que, se é dado ao paciente recusar-se a determinado tipo de tratamento, com hemocomponentes, ao médico também é dado o direito de recusa à realização do procedimento cirúrgico.
Mas o juiz não acolheu o argumento. Ele afirmou que descabe juízo de discricionariedade a profissional da saúde quando trabalha em função do Estado, sendo este obrigado a exercer seu mister conforme lhe impõe a função pública.
"O médico que ali atende, não está na condição de privado, mas na condição de homem público, de agente do Estado, portanto, de atuação vinculada e obrigatória."
O magistrado destacou ainda que "cumpre ao médico assim agir, realizando aquilo que lhe está ao alcance, sendo o risco do sangramento e da consequente morte não seu, profissional de medicina, mas do paciente que assim opta pela recusa do tratamento com homocomponentes".
Assim, julgou procedente o pedido do paciente para determinar, além do pagamento de danos materiais pelo valor despendido com a operação, a condenação pelos danos morais, no importe de R$ 20 mil.
Processo: 0300446-77.2014.8.21.0001
Fonte: Migalhas
12 Comentários
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Se o médico fizesse o procedimento, após a cirurgia, o paciente entraria com ação contra o médico e/ou hospital, por ter ferido sua crença... Pra mim, leiga, que nada sei da lei, mas conheço a desonestidade do brasileiro, acredito que foi mais um daqueles casos: "se aproveitar da desgraça vivida para ganhar dinheiro". Lamentável... continuar lendo
Bom dia Talessa, ainda bem que você afirma não conhecer a lei, tampouco as obrigações médicas e do paciente. Concordo que sua expressão merece atenção. continuar lendo
Se ele não aceita receber sangue em caso de necessidade, que a família assine um documento tirando a responsabilidade do médico em caso de óbito. continuar lendo
Ao mesmo tempo que a justiça em alguns casos determina que sejam ignorados os preceitos religiosos colocando a vida em primeiro lugar (e com isso formando juízo nos profissionais da medicina) por outro condena o médico que se nega a assumir uma responsabilidade que certamente não é sua.
Talvez seja conveniente formarmos um conselho nacional de interpretações legais, porque se depender da cabeça de cada juiz... continuar lendo
Verdade! Se há jurisprudência pra A, B e C, o médico não quis correr o risco de uma ação de indenização.
Se o tal paciente sabia dos riscos e da possível necessidade de receber sangue durante o procedimento, assinasse um termo de responsabilidade que aceitava livremente e independente de sua religião, caso isso fosse necessário durante o ato cirúrgico (e digo mais que reconhecesse em cartório!). Eu no lugar do médico faria o mesmo. Não colocaria minha mão, pra depois não ter que responder na justiça, ainda mais se desse alguma complicação na cirurgia. continuar lendo
Talessa, exatamente esse o ponto. Quem pode garantir que a justiça seria coerente com o hospital e com o médico se a situação fosse outra? Temos dois cenários possíveis; realizar o procedimento sem transfusão ou realizar e, se necessário, transfundir o sangue.
Muito embora saibamos que nenhum direito é absoluto no mundo dos fatos, com certeza o paciente, na posição de vítima e consequentemente autor da ação, alegaria se sua crença fora ferida.
Não há muita saída para o médico nesses casos mirabolantes. continuar lendo