Página 1483 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 30 de Agosto de 2016

lhe cabem para assegurar à criança seus direitos à educação, lazer, cultura, colocando-a a salvo de negligência. Logo, deve o Estado (latu sensu) fornecer os meios necessários para tal.A Constituição Federal, no artigo 208, inciso IV, prevê que o dever do Estado com a educação será efetivado mediante garantia de atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 5 anos de idade, texto este repetido no artigo 54, inciso IV, do ECA. Nos artigos 211, parágrafo 2º, e , inciso XXV, ambos da CF, há previsão aos Municípios da atuação prioritária no ensino fundamental e da educação infantil.O artigo 53, inciso V, da Lei nº 8069/90 (ECA), por fim, assegura à criança acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.Na contextualização constitucional o direito à creche não se restringe à área educacional, envolvendo, também, um caráter assistencial (art. , XXV, CF e art. 208, IV, c/c art. 29 e 30 da Lei 9.394/96 e art. 54, IV, do ECA e art. , da Lei 9.394/96.É irrelevante para os fins educacionais e assistenciais buscados pelos preceitos constitucionais se os responsáveis pela criança recebem ou não, de seus empregadores, auxílio creche, já que a responsabilidade em caráter completo e não apenas auxiliador é do Poder Público operante do sistema, ou seja, do município, como está assentado na Súmula 63, do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo “É indeclinável a obrigação do Município de providenciar imediata vaga em unidade educacional a criança ou adolescente que resida em seu território”, e a tutela desse direito pode se dar em sede mandamental (Súmula 64, do Eg. TJSP), para fins de cumprimento dos preceitos constitucionais e legais, sem qualquer ofensa ao princípio da tripartição dos Poderes (Súmula 65, do Egrégio TJSP). Como se sabe, a educação escolar, como processo de formação integral do cidadão, compõe-se de educação básica - formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio - e de educação superior, de acordo com o art. 21 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Cada ramo da educação básica, por sua vez, tem seus objetivos próprios, assim definidos: a) a educação infantil tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até cinco anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológicos, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade; b) o ensino fundamental terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; II a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores e que se fundamenta a sociedade; III o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social; c) o ensino médio terá como finalidade: I a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação crítica e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.Da mesma forma que o ensino fundamental e o ensino médio, o ensino infantil encontra-se em posição privilegiada no rol de deveres do Estado. E, tal privilégio, encontra respaldo não somente na esfera jurídica como, e principalmente, no campo da pedagogia e da psicologia. Qualquer profissional da área ao ser inquirido a respeito fornecerá resposta sempre no mesmo sentido: a imprescindibilidade do ensino infantil, ministrado em creches e pré-escolas, desde estudos realizados, livros, artigos e outras publicações, até os índices estatísticos, indicam que as crianças que frequentam creches e pré-escolas apresentam condições infinitamente superiores de ingressarem na lá. Série do primeiro grau do que aqueles que não cursaram.A obrigatoriedade do ensino fundamental caracteriza-se como um dever de duas vias, ou seja, o dever do Estado em propiciar e o dever dos pais em garantir a matrícula do filho menor. No entanto, a obrigatoriedade do ensino infantil caracteriza-se somente pelo dever do Estado em propiciá-la. Nesse segundo caso, esse caráter obrigatório não se encontra expresso na lei, como no caso da educação fundamental, mas implícito no caput e inciso IV, do art. 208 da Constituição Federal. Trata-se, portanto, de direito público subjetivo, que hoje é considerado fundamental e de aplicabilidade imediata.Assim sendo, fica evidenciado que o descumprimento de normas constitucionais pelo Estado nas situações em que não há um atendimento proporcional à demanda nas creches e pré-escolas municipais, implicará em violação a este direito fundamental, sendo que inexiste discricionariedade administrativa do Poder Público no sentido de promover ou não a educação infantil.E, sobre a ausência de violação da discricionariedade administrativa pelo Poder Judiciário e entendendo pela vinculação da atuação da Administração em se conceder vagas para todas as creches, já se pronunciou o nobre magistrado Flávio Cunha da Silva, na sentença proferida nos autos do Processo no. 006.0.900669-4, em ação civil pública promovida contra o Município de São Paulo, perante o Foro Regional da Penha, datada de 11.10.00, que ora se transcreve pela forma contundente com que foi elaborada, e fundada em adequados argumentos sustentados pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, que são aplicáveis ao presente caso, motivo pelo qual também são usados, outrossim, como fundamento de decidir:”De fato, o dever de agir é um dos princípios da Administração, para quem a execução, a continuidade e a eficácia dos serviços públicos constituem imperativos absolutos. Por isso se diz que, sendo outorgado para satisfazer interesses indisponíveis, todo poder administrativo tem para a autoridade um caráter impositivo, convertendo-se, assim, em verdadeiro dever de agir. O professor Celso António Bandeira de Melo que ao permitir alternativa de conduta, a lei não autoriza o administrador a fazer o que bem entenda, antes o encarrega ‘de adotar comportamento ideal: aquele que seja apto, no caso concreto, a tender com perfeição a finalidade da norma. O mestre citado tem razão quando desloca o eixo metodológico do conceito de discricionariedade da noção de poder para a de DEVER, noção essa muito mais afinada ao direito público e à situação jurídica de função’. O autor transcreve o art. da Carta Magna, especifica os remédios processuais previstos na Constituição Federal e tece considerações sobre a repartição tricotômica do poder. Menciona a lição de José Afonso da Silva sobre harmonia entre os poderes e o entendimento do professor Mauro Cappelletti sobre a identificação do interesse público pelo Judiciário. Cita decisão do Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás sobre o poder discricionário, além de decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acerca do princípio constitucional que gere obrigação ao executivo Estadual. Nos termos do art. 227 da Constituição Federal, firmou-se o princípio da prioridade absoluta à criança e ao adolescente. Igualmente o art. da Lei 8069/90, bem assim o art. do ECA que traça os rumos da hermenêutica. Transcreve trecho do acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal sobre a prioridade absoluta prevista no art. 227 da Lei Maior, com determinação de inclusão de recursos no orçamento para construção de estabelecimentos aludidos. Refuta o entendimento de que os princípios constitucionais seriam meramente programáticos e critica decisão do Colendo Superior Tribunal de Justiça baseada nestes fundamentos. Observa sobre o perigo de converter-se a Constituição em mera carta de intenções, apontado pelo Professor Konrad Hesse em sua monografia ‘A força normativa da Constituição’. Oprimir a eficácia do princípio da prioridade absoluta é condenar seus destinatários à marginalidade, à opressão, ao descaso”. (...)”Cabe ao Município oferecer vagas suficientes para os alunos que necessitem frequentar a creche e a préescola. A existência do prazo de 3 anos para a integração das creches e pré-escolas ao sistema de ensino, previsto no art. 89 da Lei de Diretrizes e Bases da educação, não autoriza a desatenção aos direitos dos alunos aptos a frequentarem a préescola” (mesmo porque já se expirou o prazo concedido pela lei).(...)”Assim, diante do sistema de direitos e garantias preconizado pela Constituição Federal e pela Lei 9394/96, somo inclinados a registrar a opinião no sentido de que, mesmo sem o caráter obrigatório para os pais ou responsáveis, a creche e a pré-escola, correspondendo a deveres do Estado para com a educação,

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