Página 1900 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 1 de Setembro de 2015

Santos Batista - Condomínio Altos do Sabiá, na pessoa da síndica e outro - Vistos. Dispensado o relatório, artigo 38, Lei nº 9.099/95. Acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da requerida Impacta, mera prestadora de serviços que age à ordem e em nome do condomínio contratante, este sim o responsável pelos fatos narrados em inicial. A ação é improcedente. Discute-se, basicamente, se ao condomínio, respaldado por deliberação assemblear específica, é dado promover a supressão no fornecimento de água a moradores em situação de inadimplência com o pagamento da taxa condominial. A resposta, a toda evidência, é negativa. De início, anoto ser direito fundamental do cidadão a prestação de serviços públicos adequados, universais, eficientes e, quanto aos essenciais, contínuos, nos termos dos artigos 175, II e IV, da Constituição Federal, , da Lei nº 8.987/95 e 22, do Código de Defesa do Consumidor, todas normas, é escusado salientar o óbvio, de ordem pública e portanto inderrogáveis pela manifestação de vontade de particulares. Os serviços públicos, de acordo com o que preconiza a Lei Maior, devem ser prestados exclusivamente pelo Poder Público, diretamente ou por meio de concessão ou permissão, sempre precedidas de licitação, nos termos do artigo 175, caput, da CF. Estes concessionários, permissionários ou a própria Administração, quando atua diretamente, submetem-se a um regime próprio e específico, ditado, repita-se, por normas de natureza cogente, a estabelecer uma série de direitos e obrigações compatíveis com a natureza essencial do direito em questão. Assim vai que é exigido, de tais prestadores, a observância a condições de “regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade nas tarifas”, tal como estabelecido pelo artigo , § 1º, da Lei nº 8.987/95, obrigações replicadas pelo artigo 21, caput, do CDC. Neste contexto, é evidente que qualquer limitação ao exercício deste direito constitucionalmente garantido somente possa ser criado por meio de lei própria, obedecendo-se aos limites impostos pelo artigo 175, da Lei Maior, e nisto se abrange a possibilidade de supressão dos serviços pela inadimplência, prerrogativa excepcional que é confiada por lei, em casos específicos, apenas e tão-somente aos responsáveis pela prestação dos serviços públicos (artigo , § 3º, II, da Lei nº 8.987/95) que são aqueles que se submetem ao regime de responsabilização diferenciado (responsabilidade objetiva), previsto pelo artigo 37, § 6º, da Constituição Federal e 14, 20 e 22, do CDC. Não há cabida, portanto, para que medida drástica, excepcional e que relativiza o princípio da continuidade dos serviços públicos essenciais seja estabelecida, em evidente usurpação de competência constitucionalmente delimitada, por deliberação em assembleia condominial, que, em última análise, acomete a associação e empresa privadas poderes que são reservados apenas ao Poder Público, nos termos do artigo 175, da CF. Neste sentido: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. Condômino confessadamente inadimplente. Corte no fornecimento de água pelo condomínio. Providência prevista em assembleia geral extraordinária. Tarifa embutida no valor da taxa condominial. Medida adotada que, em sede de cognição sumária, não encontra amparo legal. Prerrogativa concedida pela lei somente à concessionária do serviço público. Consequência do inadimplemento prevista no art. 1.336, §§ 1º e , CC. Entendimento majoritário deste E. Tribunal. Verificada a presença dos requisitos ensejadores da medida de urgência. Decisão reformada. Agravo provido.” (TJ/SP 4ª Câmara de Direito Privado Agravo de Instrumento nº 219XXXX-20.2014.8.26.0000 Relator o Desembargador Milton Carvalho julgado em 29 de janeiro de 2.015). Veja-se que o requerido já dispõe de meios legais, previstos pelo artigo 1.336, § 1º e , do Código Civil, para cobrar-se de dívidas e prevenir o inadimplemento, álea que, de resto, paira sobre todo aquele que se disponha a viver em condomínio. E verifica-se que todas as sanções acima previstas pelo artigo supracitado revestem-se de natureza estritamente pecuniária, não sendo dado ao condomínio, arrogando-se indevidamente poderes de Administrador Público, prever a supressão de serviços fundamentais como forma de impelir o pagamento de referidas taxas. Cito, neste sentido, trecho de voto proferido pelo Desembargador Francisco Loureiro, em caso análogo: “O uso das áreas e serviços comuns engloba o fornecimento de água, nos edifícios e condomínios em que inexiste conta individual perante a concessionária. Disso decorre que as limitações ao exercício do direito estão contidas no próprio preceito: o desvio de finalidade e a exclusão de iguais direitos dos demais condôminos. Não há previsão legal e nem se admite como sanção lateral ao inadimplemento das despesas condominiais a vedação ou restrição ao uso do imóvel ou das partes ou serviços comuns da edificação, ainda que previstas na convenção ou regulamento interno, ou aprovadas por assembléia, que não podem afastar a norma de ordem pública. O § 1º do art. 1.336 do Código Civil disciplina as sanções aplicáveis ao condômino inadimplente no pagamento das despesas condominiais. É um dos preceitos mais polêmicos do Código Civil, introduzindo profundas alterações em relação ao que determinava o art. 12, § 3º, da Lei n. 4.591/64. Traça as regras sobre a cobrança dos juros moratórios e da multa moratória. As sanções ao condômino inadimplente no pagamento da contribuição condominial são as previstas em lei, de natureza estritamente pecuniária. Diversamente do que constou na sentença recorrida, fere os direitos fundamentais dos condôminos a aplicação de sanções diversas, ainda que previstas na convenção ou em assembléia, especialmente aquelas que vedam a utilização do imóvel e de áreas e equipamentos comuns. Isso porque os direitos fundamentais do condômino, garantidos no art. 1.335 do Código Civil, são de ordem pública e incidência imediata, derrubando preceitos em contrário de convenções e regimentos internos.” (TJ/SP 4ª Câmara de Direito Privado Apelação nº 906XXXX-82.2005.8.26.0000 julgado em 14 de maio de 2.009). E, ainda: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. Condomínio. Decisão que afastou a administradora do condomínio do polo passivo e negou a antecipação de tutela para o restabelecimento do fornecimento de água na unidade do agravante. Inconformismo. Descabimento quanto à legitimidade da administradora. Individualização da cobrança de água. Despesa única do condomínio frente à SABESP que deve ser rateada pelos condôminos na proporção da utilização. Interrupção do fornecimento em caso de inadimplemento. Inviabilidade. Conduta abusiva, de acordo com o artigo 1.336 do CC. Efeito ativo parcial confirmado. Recurso provido em parte.” (AI 020XXXX-70.2012.8.26.0000, Rel. Des. WALTER BARONE, 7ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 14/08/2013, Registro: 2013.0000473183). “CONDOMÍNIO EDILÍCIO - Condômino em atraso - Corte de fornecimento de água pela administradora do condomínio, fundada em deliberação da assembleia geral - Morador de unidade condominial, aparentemente cessionário dos direitos de promissário comprador, que tem legitimidade para propor ação, por estar na posse do imóvel - Sistema de lançamentos individuais de água - Conta paga de modo global pelo condomínio à SABESP - Impossibilidade do condomínio cortar fornecimento de água a condômino -Inadimplemento gerador das sanções pecuniárias previstas no art. 1.336, par.2º do Código Civil - Afastamento da pretensão de indenização por danos morais - Recurso provido, para julgar parcialmente procedente a ação.” (AC 906XXXX-82.2005.8.26.0000, Rel. Des. FRANCISCO LOUREIRO, 4ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 14/05/2009). “AGRAVO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONDOMÍNIO. FORNECIMENTO DE ÁGUA. INADIMPLÊNCIA. Decisão agravada que indeferiu a tutela antecipada de restabelecimento do fornecimento de água à unidade da autora inadimplente. Inconformismo. Acolhimento. Presença dos requisitos do art. 273 do CPC. Fornecimento de água que é serviço essencial. Condomínio credor que pode adotar outras medidas coercitivas visando à satisfação do débito condominial. Perigo de dano de difícil reparação caso somente ao final a tutela seja deferida. Precedentes desta Câmara e Tribunal. Decisão reformada. Recurso provido.” (3ª Câmara de Direito Privado, AI nº 210231-94.2014.8.26.0000 -Relator Desembargador VIVIANI NICOLAU, julgamento realizado no dia 11/02/2015, com a participação dos Desembargadores DONEGÁ MORANDINI e CARLOS ALBERTO DE SALLES). Conclui-se, pois, que não é dado ao condomínio, por si ou por interposta pessoa, ainda que respaldado por decisão assemblear neste sentido (que, no caso, afigura-se inconstitucional e ilegal), suprimir o fornecimento de água a unidade residencial em inadimplência com as taxas condominiais, ainda que nestas taxas esteja incluída a tarifa correspondente ao referido serviço público. Não há, entretanto,

Figura representando 3 páginas da internet, com a principal contendo o logo do Jusbrasil

Crie uma conta para visualizar informações de diários oficiais

Criar conta

Já tem conta? Entrar