Página 39 da Caderno Judicial da Comarca da Capital do Diário de Justiça do Estado do Mato Grosso (DJMT) de 14 de Setembro de 2020

legais específicos. Ora, não há falar em coisa julgada com assento em causa anterior que não teve o mérito examinado e julgado, na medida em que, nos termos do art. 502 do Código de Processo Civil, “denomina­se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”. Com efeito, a coisa julgada formal, invocada fora do ambiente processual onde teria ocorrido a sentença de mérito e a coisa julgada material, sofre os mesmos efeitos, pois a intenção do legislador é a de evitar a reprodução de ação anteriormente ajuizada e julgada, nos termos do art. 337, VII e § 1º, do CPC. Assim, não é o caso de coisa julgada, impondo­ se sua rejeição. Também não é o caso de inexistência de interesse processual, na medida em que fundada na alegação de que o contrato de honorários advocatícios é nulo e de que está condicionado ao resultado da liquidação dos créditos devidos à empresa ré, o que carece de exame de mérito. Do mérito – Conforme se extrai do relatório e dos muitos documentos juntados, assim como das narrativas dos fatos, cuida­se aqui de ação de cobrança judicial de honorários advocatícios, fundada, confusamente, ora na contratação verbal tida como celebrada entre as partes, ora no contrato escrito firmado entre os autores e a Senhora Tereza Germano Arruda, na condição de representante legal da empresa ré, logo após o falecimento do Senhor Edu Arruda Junior, que era o sócio gerente da ré. Frise­se que, a despeito dessa indefinição na fundamentação do pedido, a pretensão final dos autores não é a de arbitramento dos honorários advocatícios, como também se depreende do nome dado à ação, mas de condenação ao pagamento na forma em que contratados, o que pressupõe a prova cabal de uma avença, escrita ou não, acerca dos serviços profissionais e que, diante da divergência entre as partes e da ausência de prova oral, torna vital para o desenlace do feito a análise do contrato escrito supostamente pactuado entre os litigantes. A respeito do famigerado contrato escrito, abre­se aqui um parêntese para destacar a já hercúlea missão do julgador em identificar, em tempos de PJE, de forma rápida e objetiva, as peças processuais relevantes para o julgamento dos feitos, quase sempre agravada, como se nota no caso em comento, pela pouca, ou nenhuma, habilidade ou interesse das partes em auxiliar nessa árdua tarefa, não se dedicando, minimamente, a apontar onde podem ser encontradas as provas de suas alegações. Procurar o questionado contrato escrito não é providência simples e só se mostra possível depois de analisar peça por peça no mar de reproduções desnecessárias e inúteis de páginas de outros processos, especialmente por terem, os autores, indicado, erroneamente, as folhas 1.649 a 1.655 como sendo as de sua localização, quando o correto são as folhas 1.668­1.660 (ID 6832575, p. 45­47). A parte ré, por sua vez, ao impugnar o valor da causa e sugerir seu arbitramento com base no valor das causas tidas como defendidas pelos autores não revela o menor esforço em dizer e apontar quais são esses valores. Deixa isso para o juiz, imaginando não lhe faltar tempo para tanto. Retomando a análise do caso submetido a julgamento, verifica­se que o comentado documento, denominado “Contrato de Prestação de Serviços Jurídicos e Advocatícios”, foi assinado em 23 de julho de 2013 pelos autores, na condição de contratados, e pela empresa ré, como contratante, representada no ato pela Senhora Tereza Germano Arruda, já na qualidade de inventariante do de cujus. Chama atenção, assim, logo de início, que o contrato de prestação de serviços advocatícios tenha sido supostamente firmado apenas após o falecimento do Senhor Edu Arruda Junior, apontado como sócio administrador da ré à época, o que se confirma na “alteração do contrato social” de 2 de junho de 2003 (ID 6832618, p. 16­19) . Infere­se da cláusula décima­primeira da referida alteração contratual que “O falecimento ou extinção de qualquer dos sócios não será motivo para liquidação da empresa, ficando os herdeiros ou sucessores sub­rogados nos direitos e obrigações da falecida ou extinta”, residindo no alcance desses direitos sucessórios todo o impasse a ser solucionado neste feito, pois aqui se discute se a viúva, a Senhora Tereza Germano Arruda, na condição de inventariante, ou seja, de representante legal do espólio de Edu Arruda Junior, poderia ter agido em nome da empresa ré e, nessa condição, ter firmado o contrato objeto da lide. A resposta para tal inquietação nos autos é dada pelo próprio Código Civil, que, ao dispor sobre os efeitos da morte de sócio, faz clara alusão à possibilidade de se dar fim, não à sociedade, mas à “quota” do falecido, numa óbvia menção aos efeitos sucessórios sobre direitos e obrigações decorrentes da quota social e não sobre a condução dos rumos administrativos da sociedade, conforme se confere no abaixo reproduzido artigo 1.028: “Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar­se­á sua quota, salvo: I ­ se o contrato dispuser diferentemente; II ­ se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; III ­ se, por acordo com os herdeiros, regular­se a substituição do sócio falecido.” (destaquei) Como efeito, ainda que prevista contratualmente a sub­rogação dos herdeiros ou sucessores nos direitos e obrigações da sociedade a partir do falecimento do sócio responsável pela administração societária, tal previsão não legitima a inventariante do espólio do de cujus a agir na administração da sociedade, pois esta condição não se transfere com a morte, exatamente como sustentado pela ré. Ao espólio, representado por sua inventariante, compete a administração momentânea das quotas da sociedade do falecido, não da sociedade, conforme se vê no julgado a seguir do Superior Tribunal de Justiça: “O falecimento de sócio, em regra, dissolve parcialmente a sociedade por quotas de responsabilidade limitada, hipótese em que caberá ao espólio, representado pelo inventariante, administração transitória das quotas enquanto se apuram os haveres e a divisão do espólio (art. 993, parágrafo único, II, do CPC).” (STJ, REsp 1422934/RJ, rel. Min. Nancy Andrigui, rel. p/ acórdão, Min. João Otávio de Noronha, 3ª Turma, 14.10.2014, DJE 25.11.2014). Destaquei e grifei. “PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. COMERCIAL. ESPÓLIO. ALTERAÇÃO CONTRATUAL. SÓCIO­GERENTE. IMPOSSIBILIDADE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO­CONFIGURADA. ­ A morte de um sócio, dissolve sociedade por cotas de responsabilidade limitada (L. 556/1850, Art. 335, inciso 4). ­ No caso de morte de sócio da sociedade limitada, a tarefa do inventariante se resume à administração transitória das cotas enquanto se apuram os haveres e a divisão do espólio. (CPC; 993, par. único, II). (STJ, REsp 274607/SP, Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª Turma, 22.2.2005; RSTJ 197/276)” O mencionado art. 993, parágrafo único, II, do CPC de 1973 corresponde hoje ao art. 620, § 1º, II, do Código de Processo Civil, que diz que o juiz determinará que se proceda “à apuração de haveres, se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima”, nisso se restringindo, portanto, os direitos e obrigações de que fala a cláusula décima­primeira da alteração contratual de 2 de junho de 2003, de forma que a celebração do contrato de prestação de serviços advocatícios entre os autores e a viúva do então sócio administrador da sociedade limitada, ora em apreço, não pode servir de amparo à pretensão estampada na exordial, vez que o documento foi firmado em nome da empresa ré por quem não ostentava a condição de sua representante legal. Assim, ainda que o conteúdo do contrato em discussão nos autos possa indicar, eventualmente, a vontade prévia do falecido e/ou servir de parâmetro para o arbitramento de honorários advocatícios em favor dos autores, é certo que, como negócio jurídico, por ter sido assinado por pessoa sem capacidade de direito para tanto, é nulo de pleno direito, nos termos do art. 166, I, do Código Civil. Ante essa conclusão, resulta prejudicada a análise de outras razões expendidas pelas partes. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido formulado na Ação de Cobrança de Honorários Advocatícios proposta por João Closs Junior e outros em face da ENCOL – Engenharia e Comércio Ltda e condeno os autores ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com fundamento no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, considerando, para tanto, a importância da demanda e o trabalho profissional realizado. Declaro, por consequência, extinto o processo com resolução do mérito, nos moldes do art. 487, I, do Código de Processo Civil. Intime­se a parte autora a complementar as custas do processo, conforme decidido na apreciação da impugnação ao valor da causa. P. I. Cumpra­se. Cuiabá, 11 de setembro de 2020. JONES GATTASS DIAS Juiz de Direito

7ª Vara Cível

Intimação

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