Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
17 de Junho de 2024
  • 1º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

TJAC • XXXXX-82.2020.8.01.0070 • Poder Judiciário do Estado do Acre - Inteiro Teor

há 4 anos

Detalhes

Processo

Partes

Documentos anexos

Inteiro TeorSentença (Outras) (pag 146 - 152).pdf
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Autos n.º XXXXX-82.2020.8.01.0070

Classe Procedimento do Juizado Especial Cível

Reclamante Fayfa Santos da Silva

Reclamado Estado do Acre

Sentença

Fayfa Santos da Silva qualificado nos autos, por intermédio de advogado constituído ajuizou a presente ação contra o Estado do Acre - Poder Executivo, objetivando a condenação do Reclamado a pagar à autora o valor de R$ 21.663,61 (vinte e um mil, seiscentos e sessenta e três reais e sessenta e um centavos) referentes aos valores retroativos não pagos à época da efetivação de sua promoção da Classe I para a Classe II.

Citado, o Estado contestou às fls. 78/86.

Decido.

A Lei Complementar Federal nº 101, de 04/05/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) determina regras aos gastos do dinheiro público para os gestores dos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário, estabelecendo disciplina fiscal no tocante à elaboração e execução dos orçamentos da União, Estados e Municípios, contribuindo ainda para maior gestão do orçamento público no controle, na organização e na transparência.

Os crimes de responsabilidade fiscal, também chamados de Crimes Contra as Finanças Públicas, foram inseridos no Código Penal Brasileiro pela Lei Federal nº 10.028/2000. Trata-se do artigo 359-A ao artigo 359-H. São crimes próprios por exigir qualidade especial do sujeito ativo (agente público) e são apurados por intermédio de ação penal pública incondicionada. Vejamos, por exemplo, o tipo penal estabelecido no artigo 359- D:

Ordenação de despesa não autorizada

Art. 359-D. Ordenar despesa não autorizada por lei:

Pena reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

Além das consequências penais que restringem a liberdade pessoal de ir e vir do agente público, há desdobramentos na esfera administrativa com possibilidade de constrição do patrimônio pessoal do gestor público. O artigo , inciso IV, da Lei Federal nº 10.028, de 19 de outubro de 2000 estabelece o seguinte:

Art. 5 o Constitui infração administrativa contra as leis de finanças públicas:

(...)

IV deixar de ordenar ou de promover, na forma e nos prazos da lei, a execução de medida para a redução do montante da despesa total com pessoal que houver excedido a repartição por Poder do limite máximo.

§ 1 o A infração prevista neste artigo é punida com multa de trinta por cento dos vencimentos anuais do agente que lhe der causa, sendo o pagamento da multa de sua responsabilidade pessoal .

§ 2 o A infração a que se refere este artigo será processada e julgada pelo Tribunal de Contas a que competir a fiscalização contábil, financeira e orçamentária da pessoa jurídica de direito público envolvida.

Outra modalidade a que estão sujeitos os agentes públicos são os Crimes de Responsabilidade estipulados na Lei Federal nº 1.079 , de 10 de abril de 1950. O artigo 74 da referida Lei estabelece que os atos definidos como crimes no artigo 4º terão como sujeitos ativos os Governadores e os Secretários de Estado. Vejamos.

Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra:

I - A existência da União:

II - O livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados;

III - O exercício dos direitos políticos, individuais e sociais:

IV - A segurança interna do país:

V - A PROBIDADE NA ADMINISTRAÇÃO ;

VI -A LEI ORÇAMENTÁRIA ;

VII - A GUARDA E O LEGAL EMPREGO DOS DINHEIROS PÚBLICOS ;

VIII - O cumprimento das decisões judiciárias ( Constituição, artigo 89).

(...)

Art. 74. Constituem crimes de responsabilidade dos governadores dos Estados ou dos seus Secretários, quando por eles praticados, os atos definidos como crimes nesta lei.

No âmbito do Município de Rio Branco, os crimes de responsabilidade são tipificados pelo Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967, que dispõe sobre a responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores. Em seu artigo 1º são definidos os crimes. Destacamos.

Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores:

(...)

V - ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei , ou realizá-las em desacordo com as normas financeiras pertinentes ;

Os infratores dos crimes de responsabilidade poderão ainda ser declarados inelegíveis pelo prazo de 08 (oito) anos, conforme estipulado pela Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, que regulamenta os casos de inelegibilidade. Vejamos.

Art. 1º São inelegíveis:

I para qualquer cargo:

(...)

k) o Presidente da República, o Governador de Estado e do Distrito Federal, o Prefeito, os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas, da Câmara Legislativa, das Câmaras Municipais, que renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de representação ou petição capaz de autorizar a abertura de processo por infringência a dispositivo da Constituição Federal, da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente do mandato para o qual foram eleitos e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término da legislatura;

O descumprimento das determinações da LRF causa ainda danos à própria pessoa jurídica de direito público interno, haja vista as penalidades que lhe são impostas, como limitação de empenho, redução de despesas, proibição de receber transferências voluntárias e contratar operações de crédito, entre outras.

O mesmo descumprimento acarretará a aplicação de sanções políticas, administrativas e penais diretamente ao administrador público causador da infração, SEJA POR AÇÃO OU OMISSÃO , resultando como a cassação de mandato, multa de 30% (trinta por cento) dos vencimentos anuais, inelegibilidade, inabilitação para o exercício da função pública e detenção, ou reclusão, variando entre 6 (seis) meses a 4 (quatro) anos.

Os direitos subjetivos de natureza financeira assegurados ao servidor público, seja no Regime Jurídico Estatutário, no Plano de Cargos, Carreira e Salários (PCCR) ou legislação correlata, são suportados pelas finanças públicas e, por isso, são de responsabilidade fiscal, política, administrativa e penal dos respectivos Chefes do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário.

Em face da responsabilidade política, fiscal, penal e administrativa, compete a cada Chefe de Poder decidir acerca de toda e qualquer movimentação de ativos financeiros na órbita de suas responsabilidades, inclusos os direitos financeiros dos servidores a partir das disposições contidas nos respectivos Diplomas Jurídicos Estatutários.

Aos Órgãos do Poder Judiciário do Estado do Acre (Tribunal e Juízes - CF, artigo 92, inciso VII), no exercício da jurisdição, é vedado exercer a função originária do Chefe do Poder Executivo, Legislativo ou Judiciário, nos termos do artigo 6º, § 2º, da Constituição do Estado do Acre. Vejamos.

Constituição do Estado do Acre

(...)

Art. 6º São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

(...)

§ 2º Quem for investido nas funções de um deles não poderá exercer as de outro.

Trata-se de regra constitucional definidora de incompetência jurisdicional absoluta em razão da função, encontrando ressonância inclusive no artigo 62 do Código de Processo Civil. Vejamos.

Art. 62. A competência determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função é inderrogável por convenção das partes .

A despeito da sua irresignação, o Reclamante não comprovou nos autos a existência de qualquer ato decisório, passível de controle externo judicial, exarado pelo agente público pessoalmente responsável pela observância e aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal e Lei dos Crimes de Responsabilidade, único capaz, originariamente, de ordenar despesa prevista no Regime Jurídico Estatutário e demais diplomas reguladores das relações de trabalho entre o autor e o ente estatal.

Como dito alinhas acima, os Órgãos Jurisdicionais do Poder Judiciário do Estado do Acre (Tribunal e Juízes - CF, artigo 92, inciso VII) são absolutamente incompetentes, em razão da função e da matéria, para apreciar, originariamente, direito material financeiro atrelado aos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal l e Lei dos Crimes de Responsabilidade e e que, por isso, esteja submetido, primeiramente, ao crivo decisório do responsável político, fiscal, penal e administrativo.

Ante o exposto e considerando tudo mais que dos autos consta,

reconheço a incompetência absoluta desse Juizado Especial Fazendário para processar e julgar o feito, em razão da matéria e da função, nos termos do artigo 6º, § 2º, da Constituição do Estado do Acre, c/c o artigo 62 do Código de Processo Civil. Como corolário, extingo o feito sem solução de mérito, nos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, c/c o artigo 27 da Lei Federal na 12.153/2009, por restar configurada a ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, no caso, a incompetência absoluta do Órgão Jurisdicional.

Publique-se. Intimações na forma do CPC (artigo da Lei Federal nº 12.153/2009), observado o artigo , § 6º, da Lei Federal nº 11.419/2006, e ainda a regulamentação do TJAC sobre o processo eletrônico.

No Sistema dos Juizados Especiais os artigos 54 e 55 da Lei Federal nº 9.099/95 já concederam às partes, expressamente, a isenção das custas, taxas e honorários sucumbenciais, não havendo, portanto, necessidade de pronunciamento judicial a esse respeito no primeiro grau de jurisdição.

Ademais disso, o Regimento Interno das Turmas Recursais estabelece em seu artigo 8º, inciso VIII, que cabe ao Relator decidir os pedidos de assistência judiciária gratuita no segundo grau de jurisdição.

Havendo recurso tempestivo, recebo-o no duplo efeito e determino a disponibilização dos autos à Turma Recursal, após o decurso do prazo para resposta.

Cumpra-se, expedindo-se o necessário.

Rio Branco, 11 de setembro de 2020.

Marcelo Badaró Duarte

Juiz de Direito

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-ac/1571616064/inteiro-teor-1571616073